
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0031645-04.2017.4.03.9999/SP
DECLARAÇÃO DE VOTO
Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte autora pugnando pela reforma da sentença que julgou improcedente o pedido de concessão de benefício assistencial de prestação continuada ao idoso.
Levado a julgamento em 12.03.2018, o E. Relator, o Des. Fed. Toru Yamamoto, deu provimento ao recurso. Na sequência, pedindo vênia ao relator, votei no sentido de negar provimento à apelação da parte autora, pelas razões a seguir expostas.
Com efeito, o estudo social realizado em 05/04/2016 (fls. 48/51) revela que a Autora, de 69 anos de idade, reside com seu esposo, de 71 anos de idade.
O imóvel é próprio, composto por 08 cômodos - sala, cozinha, 2 quartos, 1 banheiro, 2 despensas e área de serviço - construída em alvenaria, com piso frio, forro de madeira, telhas romana na área interna e de amianto na externa.
O mobiliário é suficiente e está em condições razoáveis de conservação: sofá de 3 lugares, 2 poltronas, TV, estante de madeira, 2 camas de casal, 3 guarda-roupas, 1 cômoda, 1 fogão de 6 bocas, geladeira duplex, micro-ondas, mesa com 8 cadeiras, tanquinho, máquina de lavar roupas, 1 churrasqueira, um fogão à lenha e um forno de barro.
A renda do núcleo familiar advém do benefício de aposentadoria do seu esposo, no importe de um salário mínimo mensal.
Os gastos mensais ficam em torno de R$ 940,00, incluídos gastos com medicação no valor de R$ 200,00, que afirmam as vezes não conseguir no Sistema Único de Saúde.
Consta, por fim, que a apelante possui quatro filhos maiores casados que com ela não residem.
Por certo que nos termos do § 1o do artigo 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
Contudo, em que pese a princípio os filhos casados não integrarem o núcleo familiar para fins de aferição de renda per capita, nos termos da legislação específica, não se pode perder de vista que o artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece que o benefício é devido quando o idoso ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-lo provido pela família. Por sua vez, a regra do artigo 229 da Lei Maior dispõe que os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, premissa também assentada nos artigos 1694 a 1697 da lei Civil.
Depreende-se assim que o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação da família de prestar a assistência, pelo que o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode ser interpretado de forma isolada na apuração da miserabilidade.
Nesse sentido, aliás, a decisão proferida pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU), datada de 23 de fevereiro de 2017, em sede de pedido de uniformização de jurisprudência formulado pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, que firmou posicionamento no sentido que "o benefício assistencial de prestação continuada pode ser indeferido se ficar demonstrado que os devedores legais podem prestar alimentos civis sem prejuízo de sua manutenção".
Dessa forma, em que pese a ausência de rendimentos da apelante, depreende-se do estudo social que coabita residência com boas condições de uso, havendo possibilidade das suas necessidades básicas serem supridas pela família. Enfatizo que o benefício assistencial não se presta à complementação de renda.
Diante do conjunto probatório que se apresenta nos presentes autos, com a devida vênia do Relator, entendo que não restaram preenchidos os requisitos necessários à concessão do benefício, ante a ausência do requisito de miserabilidade.
Por esses fundamentos, nego provimento à apelação da parte autora.
É o voto.
PAULO DOMINGUES
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0031645-04.2017.4.03.9999/SP
VOTO-VISTA
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO:
Trata-se de apelação interposta por NILZA DIAS DE ALMEIDA contra a r. sentença de fls. 75/76, que julgou improcedente o pedido inicial de concessão de benefício assistencial.
O i. Relator, Desembargador Federal Toru Yamamoto, em seu voto, deu provimento ao apelo da autora, para reformar a sentença e conceder o benefício assistencial a partir do requerimento administrativo, uma vez comprovadas a idade mínima e a hipossuficiência econômica, no que foi acompanhado, em antecipação de voto, pela Juíza Federal convocada Letícia Banks. O i. Desembargador Federal Paulo Domingues inaugurou divergência e, pelo seu voto, negou provimento à apelação.
Pedi vista dos autos para melhor análise da matéria sob julgamento.
Constato que o entendimento esposado pelo nobre Relator, na sessão realizada em 12 de março p.p., diverge com o deste julgador.
No caso, a despeito de cumprido o requisito etário, entendo que a hipossuficiência econômica não restou demonstrada.
Extrai-se do estudo social produzido em 05 de abril de 2016 (fls. 47/51) ser o núcleo familiar composto pela autora e seu cônjuge, os quais residem em imóvel próprio, com dois dormitórios e demais dependências, em regular estado de conservação. A casa é guarnecida com mobiliário simples, além de TV de 29 polegadas, geladeira duplex, micro-ondas e churrasqueira.
A renda familiar decorre dos proventos de aposentadoria auferidos pelo marido da requerente, no valor - informado no estudo social - de um salário mínimo.
No entanto, ao contrário do sugerido pela apelante e consignado nos votos já proferidos, a aposentadoria recebida pelo consorte é em valor superior ao mínimo legal. Informações extraídas do sistema Dataprev/Plenus em duas oportunidades, revelam ser o mesmo beneficiário de aposentadoria por tempo de contribuição desde 1º de setembro de 1997, com renda mensal atualizada (RMA) de R$850,45 (oitocentos e cinquenta reais e quarenta e cinco centavos) na competência setembro/2015 (época em que o salário mínimo era da ordem de R$788,00 - setecentos e oitenta e oito reais) e RMA de R$946,38 (novecentos e quarenta e seis reais e trinta e oito centavos) no mês de maio/2016, ocasião em que fixado o salário mínimo no importe de R$880,00 (oitocentos e oitenta reais), tudo conforme extratos coligidos às fls. 38 e 64.
De outro giro, a assistente social designada informou, ainda, que as despesas com aquisição de medicamentos somam R$200,00 (duzentos reais), mesmo tendo consignado, parágrafos antes de seu relatório, que "os medicamentos são todos fornecidos pela Coordenadoria de Saúde", e que somente quando não encontrados, são adquiridos em drogarias locais. A informação, a meu sentir, afasta o caráter habitual da despesa referenciada.
Registrou-se, na ocasião, que o casal possui quatro filhos, os quais residem em outro local com suas respectivas famílias.
Em relação à prole - mesmo os filhos que constituíram família pelo casamento -, observo que possuem o dever constitucional de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade (art. 229 da Carta Magna). Isso, aliás, é o que dispõem os artigos 1.694, 1.695 e 1.696 do Código Civil, evidenciando o caráter supletivo da atuação estatal.
Por fim, o próprio órgão ministerial com atuação nesta instância opinou desfavoravelmente à concessão da benesse, ao registrar em seu parecer, que "a situação da autora não configura vulnerabilidade social apta à concessão do benefício assistencial. Vale dizer, o padrão de vida revelado indica que, embora simples, não há risco à subsistência do núcleo familiar" (fl. 92).
Tudo somado, o quadro fático retratado, de per se, mostra-se insuficiente ao reconhecimento da procedência do pedido.
É preciso que reste claro ao jurisdicionado que o benefício assistencial da prestação continuada é auxílio que deve ser prestado pelo Estado, portanto, por toda a sociedade, in extremis, ou seja, nas específicas situações que preencham os requisitos legais estritos, bem como se e quando a situação de quem o pleiteia efetivamente o recomende, no que se refere ao pouco deixado pelo legislador para a livre interpretação do Poder Judiciário.
Ciente está este julgador de que, infelizmente, grande parte dos trabalhadores de nosso país não possui qualificação técnica regular, em sua imensa maioria provenientes das classes mais humildes da população, e, portanto, não têm efetivas condições de competir no mercado de trabalho. Esta dolorosa situação resulta de uma ineficiente política educacional levada a efeito pelo Estado, que não fornece educação que atenda níveis mínimos de qualidade, demonstrando o desinteresse estatal na preparação de seus trabalhadores para competição no atual mercado de trabalho, que vem se tornando cada vez mais exigente.
Entretanto, o benefício assistencial da prestação continuada não existe para a correção deste tipo de mazela, mas sim para auxiliar a sobrevivência das pessoas portadoras de impedimento de longo prazo, por idade avançada, ou outras restrições físicas ou psíquicas para o trabalho e que não possuam parentes próximos em condições de lhes prover o sustento. O dever, portanto, é, em primeiro lugar, da família.
Repito que o benefício em questão, que independe de custeio, não se destina à complementação da renda familiar baixa e a sua concessão exige do julgador exerça a ingrata tarefa de distinguir faticamente entre as situações de pobreza e de miserabilidade, eis que tem por finalidade precípua prover a subsistência daquele que o requer.
Ante o exposto, peço licença ao Exmo. Relator para divergir do entendimento esposado por Sua Excelência, de forma a acompanhar o voto divergente proferido pelo Desembargador Federal Paulo Domingues no sentido de negar provimento ao recurso e manter hígida a r. sentença de primeiro grau de jurisdição.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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| D.E. Publicado em 10/07/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Relator para Acórdão
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