
| D.E. Publicado em 05/05/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, negar provimento à apelação interposta pela parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0040342-82.2015.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Cuida-se de apelação da parte autora contra sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do benefício assistencial de amparo social.
Alega, em síntese, o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício vindicado, ressaltando seu caráter social.
O INSS não apresentou contrarrazões.
O DD. Órgão do Ministério Público Federal sugere a anulação da sentença e conversão do julgamento em diligência, para complementação do lado ou realização de nova perícia, a fim de que se avalie, com maior precisão, as moléstias apresentadas pelo autor e seu impacto na vida laboral.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: O recurso preenche os pressupostos de admissibilidade e merece ser conhecido.
Preliminarmente, não prospera o pedido de anulação da sentença e conversão do julgamento em diligência.
Na hipótese, como prevê o art. 443, inciso II, do novo Código de Processo Civil, correspondente ao superado artigo 130, foi coletada a produção de prova pericial, a fim de verificar a existência, ou não, de incapacidade laborativa.
O laudo, apesar de sucinto, mencionou o histórico dos males relatados, descreveu os achados no exame clínico e respondeu aos quesitos formulados.
Ademais, o médico nomeado pelo Juízo possui habilitação técnica para proceder ao exame pericial da parte requerente, de acordo com a legislação em vigência que regulamenta o exercício da medicina.
O fato de o perito ter concluído que a parte autora é portadora das doenças alegadas, as quais, no entanto, não a incapacitam para a atividade laborativa, não torna o laudo médico contraditório. A existência de doenças não significa, necessariamente, incapacidade laboral.
Assim, o laudo judicial apresenta-se conclusivo e esclarecedor sobre existência ou não de moléstia incapacitante para o trabalho, não havendo necessidade de nova perícia para comprovação do estado de saúde da parte autora, por já ter sido devidamente constatado.
Superada a preliminar, passo à análise do mérito.
Discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93, regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
Essa lei deu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição Federal, ao estabelecer, em seu artigo 20, as condições para a concessão do benefício da assistência social, a saber: ser o postulante portador de deficiência ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
Na hipótese de postulante idoso, a idade mínima de 70 (setenta) anos foi reduzida para 67 (sessenta e sete) anos pela Lei n. 9.720/98, a partir de 1º de janeiro de 1998, e, mais recentemente, para 65 (sessenta e cinco) anos, com a entrada em vigor do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03).
O artigo 20 da Lei n. 8.742/93 estabelecia, ainda, para efeitos da concessão do benefício, os conceitos de família (conjunto de pessoas do art. 16 da Lei n. 8.213/91, desde que vivendo sob o mesmo teto - § 1º), de pessoa portadora de deficiência (aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho - § 2º) e de família incapacitada de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa (aquela com renda mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - § 3º).
A Lei n. 12.435, vigente desde 7/7/2011, alterou os §§ 1º e 2º do artigo 20 da Lei n. 8.742/93, estabelecendo que a família, para fins de concessão do benefício assistencial, deve ser aquela composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
No que se refere ao conceito de pessoa portadora de deficiência - previsto no § 2º da Lei n. 8.742/93 -, passou a ser considerada aquela com impedimentos de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, possam obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Assim, ratificou-se o entendimento consolidado nesta Corte de que o rol previsto no artigo 4º do Decreto n. 3.298/99 (regulamentar da Lei n. 7.853/89, que dispõe sobre a Política Nacional da Pessoa Portadora de Deficiência) não era exaustivo; portanto, constatado que os males sofridos pelo postulante impedem sua inserção social, restará preenchido um dos requisitos exigidos para a percepção do benefício.
Já o critério do § 3º do artigo 20 da Lei n. 8.742/93 não impede o julgador de levar em conta outros dados, a fim de identificar a situação de vida do idoso ou do deficiente, principalmente quando estiverem presentes peculiaridades, a exemplo de necessidades especiais com medicamentos ou com educação. Deve-se verificar, na questão in concreto, a ocorrência de situação de pobreza - entendida como a de falta de recursos e de acesso ao mínimo existencial -, a fim de se concluir por devida a prestação pecuniária da assistência social constitucionalmente prevista.
Logo, a presunção objetiva absoluta de miserabilidade, da qual fala a Lei, não afasta a possibilidade de comprovação da condição de miserabilidade por outros meios de prova, conforme precedentes do E. Superior Tribunal de Justiça (REsp n. 435.871, 5ª Turma Rel. Min. Felix Fischer, j. 19/9/2002, DJ 21/10/2002, p. 61, REsp n. 222.764, STJ, 5ªT., Rel. Min. Gilson Dipp, j. 13/2/2001, DJ 12/3/2001, p. 512; REsp n. 223.603/SP, STJ, 5ª T., Rel. Min. Edson Vidigal, DJU 21/2/2000, p. 163).
O próprio Supremo Tribunal Federal recentemente reviu seu posicionamento ao reconhecer que o requisito do artigo 20, §3º, da Lei n. 8.742/93 não pode ser considerado taxativo (STF, RE n. 580963, Tribunal Pleno, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe n. 225, 14/11/2013).
A decisão concluiu que a mera interpretação gramatical do preceito, por si só, pode resultar no indeferimento da prestação assistencial em casos que, embora o limite legal de renda per capita seja ultrapassado, evidenciam um quadro de notória hipossuficiência econômica.
Essa insuficiência da regra decorre não só das modificações fáticas (políticas, econômicas e sociais), mas principalmente das alterações legislativas que ocorreram no País desde a edição da Lei Orgânica da Assistência Social, em 1993.
A legislação federal recente, por exemplo, reiterada pela adoção de vários programas assistenciais voltados a famílias carentes, considera pobres aqueles com renda mensal per capita de até meio salário-mínimo (nesse sentido, a Lei n. 9.533, de 10/12/97 - regulamentada pelos Decretos n. 2.609/98 e 2.728/99; as Portarias n. 458 e 879, de 3/12/2001, da Secretaria da Assistência Social; o Decreto n. 4.102/2002; a Lei n. 10.689/2003, criadora do Programa Nacional de Acesso à Alimentação).
Em conclusão, não há como considerar o critério previsto no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93 como absoluto e único para a aferição da situação de miserabilidade, até porque o próprio Estado Brasileiro elegeu outros parâmetros, como os defluentes da legislação acima citada.
No caso vertente, a parte autora requereu o benefício assistencial por ser deficiente. Entretanto, a perícia médica (outubro/2014) constatou não ser ela portadora de doença incapacitante (f. 94/99).
Consta da anamnese que o autor: "Casou-se, tem três filhos. Há mais ou menos três (3) anos estava agitado, agressivo e com medo das pessoas e achava que as pessoas estavam falando dele. Voltou a se tratar e usar medicamentos e refere melhorou os sintomas".
Ao exame psíquico, destaca que o periciando apresenta "bom contato, lúcido, vestido adequadamente, afeto presente, orientado no tempo e espaço, fala e pensamento sem conteúdo delirante, atento a entrevista e ao meio, no momento nega alucinações auditivas e visuais, não apresenta déficit intelectual e cultural".
E conclui que "o periciando é portador de outros transtornos ansiosos. Transtornos caracterizados essencialmente pela presença de manifestações ansiosas que não são desencadeadas exclusivamente pela exposição a uma situação determinada. Podem se acompanhar de sintomas depressivos ou obsessivos (...). Apesar de sua doença e condições atuais o periciando não apresenta elementos incapacitantes para atividades trabalhistas".
De tudo quanto exposto e da complementação do laudo (f. 137), extrai-se que o autor encontra-se em tratamento, o qual apresenta bons resultados, e que embora a doença ou a medicação possam acarretar sintomas negativos, estes não estavam presentes por ocasião da perícia.
Os documentos médicos dos autos não autorizam convicção em sentido diverso da prova técnica, efetivada sob o crivo do contraditório, até porque a avaliação psicológica, realizada em fevereiro de 2014, de forma particular, já sinalizava uma melhora dos sintomas com o tratamento (f. 42).
Assim, a parte autora não logrou comprovar que está incapacitada para desempenhar suas atividades diárias e laborais, a não fazer jus ao benefício assistencial.
Nesse sentido, transcrevo o seguinte julgado:
Irretorquível, pois, a r. sentença apelada.
Diante do exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, nego provimento à apelação interposta pela parte autora, mantendo a sentença recorrida tal como lançada.
Considerando que a apelação foi interposta antes da vigência do Novo CPC, não incide ao presente caso a regra de seu artigo 85, § 1º, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal, devendo o valor permanecer em R$ 200,00, com as ressalvas da Justiça Gratuita, na forma estabelecida na sentença.
Intimem-se.
Dê-se ciência desta decisão ao DD. Órgão do Ministério Público Federal.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
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| Data e Hora: | 19/04/2016 19:10:13 |
