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PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª TurmaAPELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002692-53.2023.4.03.6112 RELATOR: Gab. 34 - DES. FED. MAURICIO KATO APELANTE: ANDREIA CRISTINA DE OLIVEIRA PRETO Advogado do(a) APELANTE: ANA MARIA RAMIRES LIMA - SP194164-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I OTrata-se de apelação interposta por ANDREIA CRISTINA DE OLIVEIRA PRETO em face da r. sentença (ID 291801320) que, em ação de rito comum, julgou improcedente o pedido de restabelecimento de auxílio por incapacidade temporária (NB 612.820.215-6) ou concessão de aposentadoria por incapacidade permanente. A r. sentença fundamentou-se na conclusão do laudo médico pericial, que fixou a data de início da incapacidade (DII) em dezembro de 2020, em razão de neoplasia maligna de mama. O juízo a quo concluiu que, nessa data, a autora já havia perdido a qualidade de segurada, uma vez que seu último benefício cessara em 30/08/2017, e o correspondente período de graça se esgotara em 2018. Em suas razões recursais (ID 291801321), a parte autora sustenta, preliminarmente, a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, ao argumento de que era indispensável a realização de perícia por médico especialista em psiquiatria. No mérito, alega que a DII foi fixada de forma equivocada, pois sua incapacidade, decorrente de transtorno bipolar, persiste de forma ininterrupta desde a cessação do benefício em 2017, o que garantiria a manutenção da qualidade de segurada. Requer, assim, a anulação ou a reforma da sentença para que o benefício seja concedido. Devidamente intimado, o INSS não apresentou contrarrazões. É o relatório.
V O T OJUÍZO DE ADMISSIBILIDADEO recurso de apelação preenche os pressupostos de admissibilidade e, portanto, deve ser conhecido. CERCEAMENTO DE DEFESAA apelante argui a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, em razão do indeferimento do pedido de realização de perícia por médico especialista em psiquiatria. A preliminar não merece acolhimento. O juiz é o destinatário da prova, cabendo-lhe aferir a necessidade de sua produção, nos termos do artigo 370 do Código de Processo Civil. No caso em tela, a controvérsia não reside na complexidade do diagnóstico da patologia psiquiátrica da autora, mas sim na ausência de qualquer prova material que demonstre a continuidade de seu tratamento e, consequentemente, de sua incapacidade, por um longo período. Conforme se verá na análise de mérito, há um hiato probatório de quase cinco anos, entre agosto de 2017 e maio de 2022. Uma nova perícia, ainda que realizada por especialista, não teria o condão de suprir a completa ausência de documentos médicos (laudos, receitas, prontuários) referentes a esse lapso temporal, tornando-se a análise sobre o estado pretérito da autora meramente especulativa. Assim, sendo a prova inócua para o deslinde da causa, não há que se falar em cerceamento de defesa. MÉRITO RECURSAL3.1. Do Benefício por Incapacidade e seus Requisitos Os benefícios de auxílio por incapacidade temporária e aposentadoria por incapacidade permanente, previstos nos artigos 42 e 59 da Lei nº 8.213/91, exigem o preenchimento cumulativo de três requisitos: a) a qualidade de segurado; b) o cumprimento do período de carência de 12 (doze) contribuições mensais, quando exigível; e c) a incapacidade laborativa, total e temporária para o auxílio, ou total e permanente para a aposentadoria. A qualidade de segurado é mantida durante o chamado "período de graça", nos termos do artigo 15 da Lei nº 8.213/91, mesmo sem o recolhimento de contribuições. 3.2. Análise do Caso Concreto: Qualidade de Segurada e o Hiato Probatório A controvérsia recursal cinge-se a verificar se a autora mantinha a qualidade de segurada na data de início da incapacidade (DII). O laudo pericial (ID 291801284) concluiu que a autora está total e temporariamente incapacitada para o trabalho, fixando a DII em dezembro de 2020, em decorrência de neoplasia maligna de mama em estágio avançado. A apelante, por sua vez, sustenta que sua incapacidade remonta a 30/08/2017, data da cessação de seu benefício anterior, em virtude de transtorno bipolar, o que, se comprovado, a manteria filiada ao sistema. Contudo, a tese recursal não encontra amparo no conjunto probatório dos autos. É fato incontroverso que o último benefício da autora foi cessado em 30/08/2017. A partir de então, iniciou-se a contagem do período de graça de 12 (doze) meses, que se findou em agosto de 2018. A DII, fixada em dezembro de 2020, está, portanto, muito além do termo final de sua cobertura previdenciária. Para afastar essa conclusão, caberia à autora demonstrar, de forma robusta, que a incapacidade laborativa persistiu de forma ininterrupta desde a cessação do benefício anterior. Todavia, compulsando os autos, verifica-se um longo hiato probatório, sem qualquer documento médico, receita ou prontuário que ateste tratamento psiquiátrico contínuo entre agosto de 2017 e outubro de 2020. Não é crível que uma segurada, portadora de uma condição psiquiátrica alegadamente incapacitante, permaneça por mais de três anos sem qualquer tipo de acompanhamento médico especializado. A mera alegação de persistência da doença, desacompanhada de um mínimo de prova material contemporânea, não é suficiente para o reconhecimento da incapacidade no referido período, sendo ônus que incumbia à parte autora, nos termos do art. 373, I, do CPC. Dessa forma, correta a r. sentença ao acolher a DII fixada pelo perito, data em que, inequivocamente, a autora não mais ostentava a qualidade de segurada, requisito indispensável à concessão de qualquer dos benefícios pleiteados. Ressalte-se, por fim, que a presente decisão não impede que a parte autora, em razão da neoplasia maligna que a acomete, pleiteie administrativamente o benefício de prestação continuada (BPC/LOAS), desde que preenchidos os requisitos legais, notadamente o critério de miserabilidade. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação da parte autora. É como voto. E M E N T AEmenta: PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADA NA DATA DE INÍCIO DA INCAPACIDADE (DII). SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. I. Caso em exame Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte autora contra sentença que julgou improcedente o pedido de concessão de benefício por incapacidade, por reconhecer a perda da qualidade de segurada na data de início da incapacidade (DII) fixada em laudo pericial (dezembro de 2020). A apelante alega cerceamento de defesa e erro na fixação da DII, sustentando incapacidade psiquiátrica contínua desde 2017. II. Questão em discussão As questões devolvidas ao Tribunal consistem em analisar: (i) a ocorrência de cerceamento de defesa pela não realização de perícia por médico especialista em psiquiatria; e (ii) a manutenção da qualidade de segurada da autora na DII, a partir da comprovação de incapacidade ininterrupta desde a cessação de benefício anterior. III. Razões de decidir Preliminar de cerceamento de defesa rejeitada. A realização de nova perícia, ainda que por especialista, mostra-se inócua para suprir a completa ausência de prova documental durante o longo hiato probatório, não havendo nulidade a ser sanada. A manutenção da qualidade de segurada depende da comprovação da persistência da incapacidade durante o período de graça. O longo hiato probatório, sem qualquer registro de tratamento ou acompanhamento médico entre a cessação do benefício anterior (08/2017) e o final de 2020, afasta a presunção de incapacidade contínua, ônus probatório que incumbia à parte autora (art. 373, I, CPC). Correta a sentença que acolheu a DII fixada no laudo pericial (12/2020), data em que a autora não mais detinha a qualidade de segurada. IV. Dispositivo e tese Apelação da parte autora desprovida. A C Ó R D Ã OVistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por unanimidade, decidiu NEGAR PROVIMENTO ao recurso de apelação da autora., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
MAURICIO KATO
Desembargador Federal |
