
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002806-05.2023.4.03.6140
RELATOR: Gab. 32 - DES. FED. ANA IUCKER
APELANTE: EDUARDO BARBOSA NOGUEIRA
Advogado do(a) APELANTE: EDIMAR HIDALGO RUIZ - SP206941-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002806-05.2023.4.03.6140
RELATOR: Gab. 32 - DES. FED. ANA IUCKER
APELANTE: EDUARDO BARBOSA NOGUEIRA
Advogado do(a) APELANTE: EDIMAR HIDALGO RUIZ - SP206941-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A EXCELENTÍSSIMA DESEMBARGADORA FEDERAL ANA IUCKER (Relatora):
Vistos.
Trata-se de ação de conhecimento distribuída em 27/11/2023, na qual a parte autora postula a concessão de auxílio-acidente.
O Juiz da 1ª Vara Federal de Mauá/SP rejeitou o pedido da parte autora em sentença proferida em 25/04/2025, sob o argumento de ausência de incapacidade e isentou a parte autora do pagamento de custas processuais e honorários advocatícios ante a falta de citação do réu (Id 335165120).
Houve interposição do recurso de apelação pela parte autora, sendo os autos distribuídos nesta Corte em 01/09/2025.
Alega, a parte autora, em sede de preliminar, nulidade da sentença por cerceamento de defesa. No mérito, sustenta que os exames médicos anexados aos autos comprovam a incapacidade de exercer atividade laborativa. Requer a total reforma da sentença (Id 335165122).
Não foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002806-05.2023.4.03.6140
RELATOR: Gab. 32 - DES. FED. ANA IUCKER
APELANTE: EDUARDO BARBOSA NOGUEIRA
Advogado do(a) APELANTE: EDIMAR HIDALGO RUIZ - SP206941-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A EXCELENTÍSSIMA DESEMBARGADORA FEDERAL ANA IUCKER (Relatora):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora em face de sentença que indeferiu o benefício por incapacidade.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
Da preliminar de cerceamento de defesa
Afasto a preliminar de cerceamento de defesa para realização de nova perícia, eis que, da análise dos autos, verifica-se que o laudo pericial apresentado contém respostas adequadas aos quesitos oferecidos e a análise da documentação médica respectiva.
Os artigos 370 e 371 do Código de Processo Civil determinam que cabe ao magistrado, no uso de seu poder instrutório, avaliar a suficiência da prova produzida para desenvolver seu livre convencimento.
Dessa forma, não há como ser acolhida a tese de cerceamento de defesa para nova análise pericial se o magistrado, fundamentadamente, considerou que o laudo elaborado por profissional qualificado e as provas trazidas aos autos contém elementos suficientes para a análise da alegada incapacidade da parte autora.
Nesse sentido também tem sido o entendimento da C. Nona Turma desta Corte:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA /APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE. PRELIMINAR REJEITADA. REQUISITOS LEGAIS NÃO PREENCHIDOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
- Muito embora o objeto da causa verse sobre matéria de direito e de fato, "in casu", prescinde da produção de novo laudo pericial, uma vez que existem provas material e pericial suficientes para o deslinde da causa, não se configurando hipótese de cerceamento de defesa ou de qualquer outra violação de ordem constitucional ou legal. Da análise do laudo pericial produzido nos autos, verifico que o mesmo fora conduzido de maneira adequada, dispensando qualquer outra complementação. Vale ressaltar que o perito é médico devidamente registrado no respectivo Conselho de Classe (CRM), especializado em perícia médica, presumindo-se detenha conhecimentos gerais da área de atuação, suficientes ao exame e produção da prova determinada.
(...)
- Preliminar rejeitada. Apelação da parte autora não provida. (TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0007398-56.2017.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN, julgado em 14/09/2023, DJEN DATA: 20/09/2023)
Dos benefícios por incapacidade
Os benefícios por incapacidade têm fundamento no artigo 201 da Constituição Federal.
O auxílio-acidente, previsto no artigo 86, § 1º, da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.528/97, é devido, a contar da cessação do auxílio-doença, ou do laudo pericial, ao acidentado que, após a consolidação das lesões resultantes do acidente, apresentando como sequela definitiva, perda anatômica ou redução da capacidade funcional, a qual, embora sem impedir o desempenho da mesma atividade, demande, permanentemente, maior esforço na realização do trabalho.
A comprovação da incapacidade é realizada mediante perícia médica a cargo do INSS ou perito nomeado pelo Juízo, nos termos do artigo 42, §1º, da Lei nº 8.213/91 e arts. 443, II, 464 e 479 do Código de Processo Civil.
Constatada a incapacidade, ainda é preciso observar se a carência e a qualidade de segurado foram comprovadas pela parte requerente.
Da qualidade de segurado
A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes, ou ainda, independentemente do recolhimento de contribuições, no chamado período de graça, previsto no art. 15, da Lei nº 8.213/91.
No que tange ao trabalhador rural não há necessidade de recolhimento das contribuições, bastando a comprovação do efetivo exercício da atividade rural pelo número de meses correspondentes à carência do benefício requerido, conforme o disposto no artigo 39, I e artigo 25, I da Lei 8.213/91.
Ademais, na hipótese da perda da qualidade de segurado, dispõe o art. 27-A, da Lei 8.213/91 que, para a obtenção do benefício, o trabalhador "deverá contar, a partir da data da nova filiação à Previdência Social, com metade dos períodos previstos nos incisos I, III e IV do caput do art. 25 desta Lei."
Saliente-se que há entendimento jurisprudencial no sentido de que não há que se falar em perda da qualidade de segurado se a ausência de recolhimento de contribuições decorreu da impossibilidade de trabalho da pessoa acometida de doença.
A esse respeito, confira-se julgado do E. Superior Tribunal de Justiça:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO ANTES DA OCORRÊNCIA DA MOLÉSTIA INCAPACITANTE. BENEFÍCIO INDEVIDO. REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. AGRAVO DESPROVIDO. I- A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que, após cumprida a carência e conservando a qualidade de segurado, for considerado incapaz para o trabalho e insuscetível de reabilitação em atividade que lhe garanta subsistência. II- A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é firme no sentido de que o segurado que deixa de contribuir para a Previdência Social, por estar incapacitado para o labor, não perde a qualidade de segurado. (...) V- Agravo interno desprovido. (AgRg no REsp 1245217/SP, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 12/06/2012, DJe 20/06/2012)
Da carência
Quanto à carência, exige-se o cumprimento de 12 (doze) contribuições mensais para a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, conforme prescreve a Lei nº 8.213/91, em seu artigo 25, inciso I.
Entretanto, o artigo 26, inciso II, do mesmo texto legal prescreve que independem de carência, o "auxílio-doença e aposentadoria por invalidez nos casos de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho".
Também está dispensado de comprovar a carência o segurado que, após filiar-se ao RGPS, for acometido de alguma das doenças e afecções especificadas em lista elaborada pelos Ministérios da Saúde e da Previdência Social, atualizada a cada 3 (três) anos, de acordo com os critérios de estigma, deformação, mutilação, deficiência ou outro fator que lhe confira especificidade e gravidade que mereçam tratamento particularizado.
A Lei n. 8.213/91, no artigo 151, previu, até a elaboração da referida lista, algumas doenças que, quando constatadas, dispensam o requisito da carência. São elas: tuberculose ativa, hanseníase, alienação mental, esclerose múltipla, hepatopatia grave, neoplasia maligna, cegueira, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, estado avançado da doença de Paget (osteíte deformante), síndrome da deficiência imunológica adquirida (aids) ou contaminação por radiação, com base em conclusão da medicina especializada.
A Portaria Interministerial MPAS/MS n. 2.998, de 23.8.2001, no art. 1º, além das doenças descritas, acrescentou para fins de exclusão da exigência da carência "o estado avançado da doença de Paget (osteíte deformante)" e hepatopatia grave, para fins de concessão dos benefícios aqui tratados.
Por fim, não será devido o auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão (art. 42, §2º, §1º da Lei 8213/91).
Do caso dos autos
A parte autora nasceu em 27/08/1984, contando atualmente com 41 anos.
Em entrevista realizada com o perito declarou que "em 2006, sofreu acidente com lesão em membro superior esquerdo. Fez tratamento cirúrgico e fisioterapia. Nega tratamento médico. Nega ter movimento da mão. Alega ser portador de sequela de traumatismos do membro superior (CID 10 - T92.2, decorrente de fratura do antebraço (CID10 - S52) e de luxação, entorse e distensão das articulações e dos ligamento ao nível do punho e da mão (CID10 - S63), quadro clínico de sinovite e tenossinovite (CID10 - M65)."
Realizada perícia médica, em 07/11/2024, por "expert" nomeado, não foi constatada incapacidade laborativa, nos seguintes termos (ID 335165115):
"(...) Pelo visto e exposto concluímos que:
• O Periciado sofreu fratura de antebraço esquerdo e escafóide;
• Não há repercussão clínica funcional da doença alegada;
• Não há incapacidade ou redução da capacidade de trabalho".
Em resposta aos quesitos das partes, o perito reiterou não haver incapacidade ou limitação funcional para o trabalho.
O fato gerador do auxílio-acidente é a consolidação de sequelas que diminuam a capacidade laboral, situação que não se evidencia nos presentes autos.
Ressalte-se que o laudo pericial foi elaborado por profissional equidistante das partes, devidamente fundamentado, com exposição do exame clínico realizado, dos métodos empregados e das razões que conduziram à conclusão pela ausência de incapacidade.
Assim, embora não esteja o julgador adstrito às conclusões periciais, inexiste nos autos elemento capaz de infirmar o laudo. Ao contrário, a perícia judicial se mostra completa, fornecendo elementos suficientes para a formação da convicção acerca da plena capacidade laborativa do requerente.
Nesse sentido, colhe-se precedente desta Egrégia Corte:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORAL. ACIDENTE DE QUALQUER NATUREZA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. BENEFÍCIO INDEVIDO.
Quanto à existência ou não de incapacidade e sua extensão, a questão foi objeto de prova pericial, concluindo o expert do Juízo que a parte autora, com 37 anos de idade, na data da perícia (01/10/2021), apresentava sequelas de traumatismo em membro superior direito, com amputação traumática parcial da falange distal do 5º dedo e deformidade. Entretanto, concluiu que “o periciado apresenta dano anatômico-funcional sem repercussão na capacidade laborativa (autônomo)”.
O fato gerador do benefício de auxílio-acidente é a sequela decorrente de acidente de qualquer natureza que reduza a capacidade para o trabalho habitual, situação não configurada nos autos, segundo o laudo pericial.
O laudo, elaborado por perito de confiança do Juízo e equidistante das partes, considerou tanto o exame clínico presencial quanto os documentos e quesitos apresentados, constituindo prova idônea e prevalecendo sobre atestados médicos particulares.
Apelação não provida. (TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv 5002176-12.2023.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Cristina Nascimento de Melo, j. 26/10/2023, DJF3 06/11/2023).
Dessa forma, o benefício postulado não deve ser concedido, uma vez que ficou demonstrado que a parte autora não apresentava incapacidade laborativa no momento do requerimento, sendo capaz de exercer atividades que lhe garantem a subsistência.
Ausente, portanto, o requisito da incapacidade, restam prejudicados os demais, não fazendo jus a parte autora ao benefício pleiteado.
Dispositivo
Posto isto, voto por rejeitar a preliminar e, NEGAR PROVIMENTO ao recurso de apelação da parte autora.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE NÃO COMPROVADA. LAUDO PERICIAL CONCLUSIVO. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. RECURSO DO AUTOR DESPROVIDO.
I. Caso em exame
1. Trata-se de ação previdenciária em que se postula o restabelecimento de benefício por incapacidade temporária ou a concessão de benefício por incapacidade permanente, bem como o pagamento dos retroativos. A sentença julgou improcedente o pedido, condenando a parte ao pagamento de honorários advocatícios. A parte autora interpôs recurso de apelação alegando insuficiência técnica do laudo pericial e cerceamento de defesa.
II. Questão em discussão
2. Há duas questões em discussão: (i) saber se houve cerceamento de defesa pela falta de realização de perícia complementar e testes específicos; e (ii) saber se a parte autora faz jus ao benefício por incapacidade, considerando as conclusões do laudo pericial.
III. Razões de decidir
3. Não há cerceamento de defesa quando a prova produzida é suficiente para a formação do convencimento do julgador, sendo desnecessária a produção de prova complementar diante da realização de perícia médica judicial por perito idôneo e qualificado.
4. A comprovação da incapacidade é realizada mediante perícia médica, conforme artigo 42, §1º, da Lei nº 8.213/91. O laudo pericial elaborado por especialista em ortopedia concluiu pela ausência de incapacidade laborativa, sendo tecnicamente fundamentado e não havendo elementos nos autos capazes de infirmá-lo.
5. Embora o julgador não esteja adstrito às conclusões periciais, a perícia judicial se mostrou completa, fornecendo elementos suficientes para a formação da convicção acerca da plena capacidade laborativa do requerente.
IV. Dispositivo
6. Preliminar de cerceamento de defesa rejeitada. Recurso improvido.
ACÓRDÃO
Desembargadora Federal
