
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003027-15.2022.4.03.6110
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: LUIZ BRAS LOPES
Advogados do(a) APELANTE: FLAVIO BIANCHINI DE QUADROS - SP220411-A, LUIZ MIGUEL ROCIA - SP284215-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003027-15.2022.4.03.6110
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: LUIZ BRAS LOPES
Advogados do(a) APELANTE: FLAVIO BIANCHINI DE QUADROS - SP220411-A, LUIZ MIGUEL ROCIA - SP284215-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Trata-se de ação ordinária em que se objetiva a conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de períodos laborados em atividades especiais, com pedido subsidiário de revisão da RMI do benefício.
A sentença julgou improcedente o pedido. Condenou a parte autora ao pagamento de custas e honorários de advogado, fixados no percentual mínimo do art. 85, § 3º, do CPC sobre o valor atualizado da causa, cuja exigibilidade, nos casos de beneficiário da assistência judiciária gratuita, fica suspensa e condicionada à hipótese prevista no §3º do artigo 98 da Lei Processual em vigor.
Apela a parte autora, alegando, preliminarmente, cerceamento de defesa, ante o indeferimento da prova pericial. No mérito, pugnou pelo reconhecimento do labor em condições especiais no período de 09/12/1985 a 27/04/2015 e acolhimento integral do pedido exordial. Subsidiariamente, requer o acolhimento dos laudos periciais de terceiros como prova emprestada, o sobrestamento do feito até a realização da perícia técnica na Justiça do Trabalho ou a extinção do processo sem resolução do mérito, para possibilitar a rediscussão da matéria.
Sem contrarrazões pela parte apelada, vieram os autos ao Tribunal.
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003027-15.2022.4.03.6110
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: LUIZ BRAS LOPES
Advogados do(a) APELANTE: FLAVIO BIANCHINI DE QUADROS - SP220411-A, LUIZ MIGUEL ROCIA - SP284215-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Preliminarmente, afasto a alegação de cerceamento de defesa, posto que, no caso dos autos, os documentos acostados são, em tese, hábeis à comprovação das atividades especiais, mostrando-se desnecessária a produção de outras provas
O documento contemporâneo ao contrato de trabalho demonstra quais eram os eventuais fatores de riscos ambientais a que estava exposto o autor e, atualmente, a realização de perícia ou outra prova não seria capaz de contradizê-lo ou demonstrar com tanta fidedignidade quais eram as condições de trabalho àquela época.
Consoante dispõe o art. 373, I, do CPC/2015, o ônus probatório quanto aos fatos alegados cabe à parte autora, de modo que no caso, cabe ao autor diligenciar visando à obtenção dos documentos necessários, comprobatórios da especialidade alegada, ante a negativa da empresa no seu fornecimento, valendo-se, inclusive, se considerar necessário/conveniente, de ação autônoma para tanto.
Verificando o autor incongruências nos documentos fornecidos, deverá ajuizar ação própria para retificação dessas informações, no âmbito trabalhista (TRF 3ª Região, AC nº 2018.03.99.000832-2, Rel. Des. Fed. Inês Virgínia, j. 30/01/2019, v.u., p. DE 11/02/2019).
No entanto, não se justifica o sobrestamento da presente ação para aguardar a conclusão de eventual processo trabalhista, uma vez que cabe ao autor instruir a petição inicial com os documentos indispensáveis à propositura da ação, nos termos do art. 320 do CPC.
A realização da perícia direta somente se justifica na hipótese da empresa empregadora, mesmo regularmente notificada, negar o fornecimento do documento comprobatório (formulário, PPP ou laudo técnico), o que não se verifica nos autos.
Além disso, não há que se falar em extinção do processo sem resolução de mérito, ante a ausência de documento comprobatório da alegada atividade especial.
O Superior Tribunal de Justiça nos autos do REsp nº 1.352.721/SP, recebido como representativo de controvérsia (Tema 629), firmou a seguinte tese: “A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.”.
No entanto, não é possível estender a aplicação da mencionada tese para a ausência de documento comprobatório de atividade especial, tendo em vista que a questão controvertida naqueles autos se limita ao “Argumento de que a parte autora deixou de instruir seu pedido inicial com documentos que comprovassem o exercício de atividade rural em momento imediatamente anterior ao ajuizamento da ação, consoante exigência legal prevista no art. 143 da Lei 8.213/91 (...).” (grifos meus).
Passo ao exame do mérito.
Aposentadoria Especial
A aposentadoria por tempo de serviço especial teve assento primeiro no artigo 31 da Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960, Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS, que estabeleceu que seria concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinquenta) anos de idade e 15 (quinze) anos de contribuições, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, em serviços que, para esse efeito, fossem considerados penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo.
Prevê ainda, o mencionado diploma legal, no art. 162, o reconhecimento de atividade especial prestada em data anterior à sua edição, na hipótese de seu cômputo ser mais benéfico ao segurado.
Como assentado pelas Cortes Superiores "tal hipótese, apesar de similar, não se confunde com a questão da legislação aplicável ao caso de concessão de aposentadoria, tampouco com aquela que diz respeito à possibilidade de aplicação retroativa da lei nova que estabeleça restrição ao cômputo do tempo de serviço. (...) Interpretação diversa levaria à conclusão de que o segurado, sujeito a condições insalubres de trabalho, só teria direito à aposentadoria especial após 15, 20 e 25 anos de trabalho exercida depois da Lei nº 3.807/60, desconsiderando, portanto, todo o período de labor, também exercido em tal situação, porém em data anterior à lei de regência" (Ag Rg no REsp nº 1015694, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza Assis de Moura, DJe 01/02/2011)
Essa norma foi expressamente revogada pela Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973, que passou a discipliná-la no artigo 9º, alterando, em efeitos práticos, apenas o período de carência de 15 (quinze) anos para 5 (cinco) anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
Sobreveio, então, o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, reclassificando as atividades profissionais segundo os agentes nocivos e os grupos profissionais tidos por perigosos, insalubres ou penosos, com os respectivos tempos mínimos de trabalho.
Importante ressaltar que os Decretos nºs. 53.831/64 e 83.080/79 tiveram vigências simultâneas, de modo que, conforme reiteradamente decidido pelo C. STJ, havendo colisão entre as mencionadas normas, prevalece a mais favorável ao segurado. (REsp nº 412351, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, pág. 355).
As atividades insalubres previstas nas aludidas normas são meramente exemplificativas, podendo outras funções ser assim reconhecidas, desde que haja similitude em relação àquelas legalmente estatuídas ou, ainda, mediante laudo técnico-pericial demonstrativo da nocividade da ocupação exercida. Nesse sentido, o verbete 198 da Súmula do TFR.
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, a matéria passou a ser prevista no inciso II do artigo 202 e disciplinada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação original previa que o benefício de aposentadoria especial seria devido ao segurado que, após cumprir a carência exigida, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade física, restando assegurada, ainda, a conversão do período trabalhado no exercício de atividades danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em seguida, foi editada a Lei nº 9.032/95, alterando o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, dispondo que a partir desse momento não basta mais o mero enquadramento da atividade exercida pelo segurado na categoria profissional considerada especial, passando a ser exigida a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, que poderá se dar por meio da apresentação de informativos e formulários, tais como o SB-40 ou o DSS-8030.
Posteriormente, com a edição do Decreto n.º 2.172, de 05/03/1997, que estabeleceu requisitos mais rigorosos para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, passou-se a exigir-se a apresentação de laudo técnico para a caracterização da condição especial da atividade exercida. Todavia, por se tratar de matéria reservada à lei, tal exigência apenas tem eficácia a partir da edição da Lei n.º 9.528, de 10/12/1997.
Cumpre observar que a Lei nº 9528/97 também passou a aceitar o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, documento que busca retratar as características de cada emprego do segurado, de forma a facilitar a futura concessão de aposentadoria especial. Assim, identificado no documento o perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, é possível a sua utilização para comprovação da atividade especial em substituição ao laudo pericial.
Ressalto que no tocante ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e à forma da sua demonstração, deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho, conforme jurisprudência pacificada da matéria (STJ - Pet 9.194/PR, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
Nos termos da Súmula nº 68 da TNU, “o laudo pericial não contemporâneo ao período trabalhado é apto à comprovação da atividade especial do segurado”. A extemporaneidade do documento comprobatório das condições especiais de trabalho não prejudica o seu reconhecimento como tal, "pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual a constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica." (Des. Fed. Fausto De Sanctis, AC nº 2012.61.04.004291-4, j. 07/05/2014); “inexiste exigência legal de contemporaneidade dos documentos técnicos que comprovam o exercício de labor especial” (8ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5008647-15.2021.4.03.6119, Rel. Desembargador Federal DAVID DINIZ DANTAS, julgado em 09/08/2022, DJEN DATA: 12/08/2022).
Da vedação prevista no art. 57, § 8º, da Lei 8.213/91
O Plenário do E. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 709 de repercussão geral (RE nº 791.961-PR, j.08.06.2020), em que se discute, à luz dos arts. 5º, XIII; 7º, XXXIII, e 201, § 1º, da Constituição Federal, a constitucionalidade do § 8º do art. 57 da Lei 8.213/1991, que veda a percepção do benefício da aposentadoria especial pelo segurado que continuar exercendo atividade ou operação nociva à saúde ou à integridade física, firmou a seguinte tese: “I) É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não. II) Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o benefício previdenciário em questão”.
Em 24.02.2021, o Pleno do STF, por maioria, acolheu parcialmente os embargos de declaração, para: “a) esclarecer que não há falar em inconstitucionalidade do § 8º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, em razão da alegada ausência dos requisitos autorizadores da edição da Medida Provisória que o originou, pois referida MP foi editada com a finalidade de se promoverem ajustes necessários na Previdência Social à época, cumprindo, portanto, as exigências devidas; b) alterar a redação da tese de repercussão geral fixada, para evitar qualquer contradição entre os termos utilizados no acórdão ora embargado, devendo ficar assim redigida: “4. Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral: ‘(i) [é] constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não; (ii) nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros; efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o pagamento do benefício previdenciário em questão.’”; c) modular os efeitos do acórdão embargado e da tese de repercussão geral, de forma a preservar os segurados que tiveram o direito reconhecido por decisão judicial transitada em julgado até a data deste julgamento; e d) declarar a irrepetibilidade dos valores alimentares recebidos de boa-fé, por força de decisão judicial ou administrativa, até a proclamação do resultado deste julgamento, nos termos do voto do Relator.”
Em 04.10.2021, o Pleno retomou a análise da matéria em sede de embargos de declaração opostos pelo Ministério Público Federal para modular os efeitos, excepcionalmente e temporalmente, da incidência do acórdão, no tocante aos profissionais de saúde constantes do rol do art. 3º-J da Lei nº 13.979/2020, e que estejam trabalhando diretamente no combate à pandemia do COVID-19, ou prestando serviços de atendimento a pessoas atingidas pela doença em hospitais ou instituições congêneres, públicos ou privados, ficando suspensos os efeitos do acórdão proferido nos autos, enquanto estiver vigente a referida lei, que dispõe sobre as medidas de emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do vírus SARS-COV2, rejeitando os aclaratórios opostos pelo Sindicato dos Trabalhadores no Comércio de Minérios, Derivados de Petróleo e Combustíveis de Santos e Região.
Depreende-se assim, que o exercício da atividade especial pelo segurado durante o trâmite do processo administrativo ou judicial, seja de concessão ou de revisão, não altera o seu direito à percepção do benefício e dos efeitos financeiros decorrentes. Apenas com a implantação efetiva do benefício é que se lhe aplica a vedação do § 8º do art. 57 da Lei 8.213/1991, cabendo ao INSS, dentro das suas atribuições, fiscalizar o afastamento do segurado das atividades a partir de então.
Calor
Com relação ao agente físico calor, houve inicialmente previsão de insalubridade no item 1.1.1 do Decreto 53.831/64 e 1.1.1 do Decreto 83.080/79, no caso da exposição, de forma habitual e permanente, proveniente de fontes artificiais, de intensidade superior a 28ºC.
A partir da vigência dos Decretos 2.172/97 e 3.048/99, a sistemática de medição foi substituída pela avaliação por meio do Índice de Bulbo Úmido - Termômetro de Globo (IBUTG), cujos limites de tolerância foram estabelecidos no Anexo III da Norma Regulamentadora NR-15, aprovada pela Portaria/MTE n° 3.214/78, inexistindo previsão acerca da fonte do calor, se proveniente de fontes artificiais ou naturais.
Consoante Anexo III da NR-15 (Quadro 1), o limite de exposição permitido para trabalho contínuo de natureza leve é de até 30ºC IBUTG; para atividade de natureza moderada, o limite de exposição é de até 26,7ºC IBUTG e para atividade de natureza pesada, o limite de exposição é de até 25ºC IBUTG.
Conforme estabelecido na NR-15 (Quadro 3), constitui (a) trabalho leve: “sentado, movimentos moderados com braços e tronco (ex.: datilografia), sentado, movimentos moderados com braços e pernas (ex.: dirigir), de pé, trabalho leve, em máquina ou bancada, principalmente com os braços”; (b) trabalho moderado: “sentado, movimentos vigorosos com braços e pernas”, “de pé, trabalho leve em máquina ou bancada, com alguma movimentação”, “de pé, trabalho moderado em máquina ou bancada, com alguma movimentação”, “em movimento, trabalho moderado de levantar ou empurrar”; (c) trabalho pesado: “trabalho intermitente de levantar, empurrar ou arrastar pesos (ex.: remoção com pá)” e trabalho fatigante.
Considerando-se as alterações normativas e o princípio tempus regit actum, de rigor o reconhecimento do labor em condições especiais exercido até 05/03/97 (Decreto nº 2.172/97) sob a exposição habitual e permanente ao agente calor, proveniente de fonte artificial, em temperatura superior a 28ºC (código 1.1.1 do Decreto nº 53.831/64 e do item 1.1.1 do Decreto nº 83.080/79).
Por sua vez, a partir de 06/03/1997, em que pese entendimento anteriormente esposado, entendo ser viável o reconhecimento como especial da atividade desempenhada sob a exposição ao calor proveniente de fontes artificiais ou naturais, de forma habitual e permanente, se comprovada a superação dos patamares estabelecidos na NR-15, observada a aferição da temperatura pela sistemática do IBUTG (Quadro n.º 1 do Anexo III da NR-15, item 2.0.4 do Anexo IV do Decreto 3.048/99).
Neste sentido, cito os seguintes precedentes desta C. 7ª Turma: ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 0008166-16.2016.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 10/08/2023, DJEN DATA: 17/08/2023; ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000007-02.2021.4.03.6126, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 09/05/2023, DJEN DATA: 15/05/2023; ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5168097-91.2021.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 31/01/2023, DJEN DATA: 08/02/2023.
Uso de equipamento de proteção individual - EPI, como fator de descaracterização do tempo de serviço especial
A questão foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do ARE nº 664335, da relatoria do E. Ministro Luiz Fux, com reconhecimento de repercussão geral, na data de 04.12.2014, em que restou decidido que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional ao reconhecimento das atividades especiais.
Restou assentado também que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
O fato de a empresa fornecer equipamento de proteção individual - EPI para neutralização dos agentes agressivos não afasta, por si só, a contagem do tempo especial, pois cada caso deve ser examinado em suas peculiaridades, comprovando-se a real efetividade do aparelho e o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça (AgInt no AREsp n. 1.889.768/MG, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 22/11/2021, DJe de 10/12/2021; REsp n. 1.800.908/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 11/4/2019, DJe de 22/5/2019; REsp 1428183/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 25/02/2014, DJe 06/03/2014).
Ainda, conforme a jurisprudência citada, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído, desde que em níveis acima dos limites legais, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas.
Conversão do tempo de serviço especial em comum
Deve ser afastada qualquer tese de limitação temporal de conversão de tempo de serviço especial em comum, seja em períodos anteriores à vigência da Lei nº 6.887, de 10/12/1980, ou posteriores a Lei nº 9.711, de 20/11/1998, permanecendo, assim, a possibilidade legal de conversão, inclusive para períodos posteriores a maio de 1998, uma vez que a norma prevista no artigo 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91 permanece em vigor, tendo em vista que a revogação pretendida pela 15ª reedição da MP 1663 não foi mantida quando da conversão na Lei nº 9.711/98. Nesse sentido decidiu a Terceira Seção do STJ no Resp 1.151.363/MG, Relator Ministro Jorge Mussi, data do julgamento: 23/03/2011.
O Decreto nº 83.080/79 foi renovado pelo Decreto nº 3.048/99 e este, por sua vez, prevê expressamente em seu art. 70 e seguintes (na redação dada pelo Decreto nº 4.827/03), que os fatores de conversão (multiplicadores) nele especificados aplicam-se na conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum ao trabalho prestado em qualquer período.
Fonte de custeio
Quanto à alegação de necessidade de prévio custeio, cumpre ressaltar inexistir vinculação do ato de reconhecimento de tempo de atividade perigosa/nociva ao eventual pagamento de encargos tributários com alíquotas diferenciadas, eis que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 não demandam tal exigência, que constituiria encargo para o empregador, não podendo o empregado ser por isso prejudicado. Assim já definiu o C. STF, ao apreciar o tema em repercussão geral ARE nº 664.335/SC, Rel. Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 09/12/2014, DJE 27/03/2015.
Caso concreto - elementos probatórios
Cinge-se a controvérsia acerca da especialidade das atividades trabalhadas no período de 09/12/1985 a 27/04/2015.
Atividade especial
Quanto ao período de labor como carteiro e agente de correios/carteiro, junto à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (09/12/1985 a 27/04/2015), é inviável o reconhecimento da especialidade das atividades por enquadramento pela categoria profissional, ante a ausência de previsão legal das ocupações na legislação de regência da matéria (Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79).
Além disso, consoante PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário (ID 281480354), o “empregado não desenvolve/desenvolveu nenhuma atividade insalubre ou perigosa durante o período laborado, que justifique/justificasse a utilização de EPC ou EPI e tampouco uma avaliação quantitativa (Intensidade/Concentração) ou utilização de alguma técnica de mensuração (Técnica Utilizada)”.
Ressalto, ainda, que embora os laudos periciais, emprestados de outros processos, tenham sido elaborados na mesma empresa em que a parte autora trabalhou, na mesma função e período, possam ser admitidos como prova emprestada, no presente caso, não possuem o condão de refutar o documento contemporâneo ao contrato de trabalho do autor.
Afastado o reconhecimento da especialidade das atividades no período pleiteado, de rigor a manutenção da sentença de improcedência.
Por fim, considerando o não provimento do recurso do autor, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de advogado arbitrados na sentença em 2% (dois por cento), cuja exigibilidade, nos casos de beneficiário da assistência judiciária gratuita, fica suspensa e condicionada à hipótese prevista no §3º do artigo 98 da Lei Processual em vigor.
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar, no mérito, nego provimento à apelação e, com fulcro no §11 do art. 85 do CPC, majoro os honorários de advogado em 2% (dois por cento) sobre o valor arbitrado na sentença, cuja exigibilidade, nos casos de beneficiário da assistência judiciária gratuita, fica suspensa e condicionada à hipótese prevista no §3º do artigo 98 da Lei Processual em vigor.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. CERCEAMENTO DE DEFESA. DESNECESSIDADE DE MAIS PROVAS. APOSENTADORIA ESPECIAL. NÃO COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. CARTEIRO. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. SUCUMBÊNCIA RECURSAL. MAJORAÇÃO. JUSTIÇA GRATUITA.
1. Consoante dispõe o art. 373, I, do CPC/2015, o ônus probatório quanto aos fatos alegados cabe à parte autora, a quem compete diligenciar visando à obtenção dos documentos necessários, comprobatórios da especialidade suscitada.
2. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua demonstração.
3. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário (a partir de 11/12/97).
4. No tocante ao período de labor como carteiro e agente de correios junto à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, o autor juntou aos autos PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário, o qual não contém indicação de exposição a quaisquer fatores de risco ou agentes nocivos em seu ambiente de trabalho, tampouco é possível o reconhecimento da especialidade das atividades por enquadramento pela categoria profissional, ante a ausência de previsão legal das ocupações na legislação de regência da matéria (Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79).
5. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados. §11º do artigo 85 do CPC/2015. Suspensão da exigibilidade da cobrança, nos termos do § 3º do artigo 98 da Lei Processual em vigor.
6. Preliminar rejeitada e, no mérito, apelação improvida.
