Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA / SP
5560346-56.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
27/04/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 29/04/2020
Ementa
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. LOAS. DEFICIÊNCIA E MISERABILIDADE.
PRELIMINAR. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS. HONORÁRIOS RECURSAIS. APELAÇÃO
DO INSS IMPROVIDA. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. TUTELA ANTECIPADA
MANTIDA.
1 - Por primeiro, recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e,
em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do
Codex processual.
2 - Ainda em sede preliminar, o recurso deve ser recebido apenas no efeito devolutivo, uma vez
que se trata de benefício assistencial, estando o autor em situação de vulnerabilidade e extrema
necessidade, bem como, presentes a verossimilhança do pedido e o fundado receio da demora, o
que, aliás, justifica a concessão da Tutela Antecipada.
3 - O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.
4 - A concessão do benefício assistencial (LOAS) requer o preenchimento concomitante do
requisito de deficiência (ou idade) e de miserabilidade. Requisitos legais preenchidos.
5 - Da análise do laudo médico e do estudo social, é forçoso reconhecer a deficiência do autor e o
quadro de pobreza e extrema necessidade que se apresenta.
6 - Preenchidos os requisitos legais, no caso deficiência e miserabilidade, a parte autora faz jus
ao benefício assistencial pleiteado.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
7 - Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de
2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial -
IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do
julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de
Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração
opostos pelo INSS.
8 - Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte
alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos
Tribunais Superiores.
9 - Mantida a verba honorária nos termos da sentença, ausente insurgência do réu a esse
respeito.
10 - Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11,
como um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos
honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte
contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os
limites estabelecidos na lei. Assim, desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei,
os honorários fixados na sentença devem, no caso, ser majorados em 2%, nos termos do artigo
85, parágrafo 11, do CPC/2015.
11 - A Autarquia Previdenciária está isenta das custas processuais, tanto no âmbito da Justiça
Federal (Lei nº 9.289/96, art. 4º, I) como da Justiça do Estado de São Paulo (Leis Estaduais nºs
4.952/85 e 11.608/2003), mas (i) não do reembolso das custas recolhidas pela parte autora
(artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no caso, tendo em conta a
gratuidade processual que foi concedida à parte autora.
12 - Presentes os requisitos - verossimilhança das alegações, conforme exposto na sentença, e o
perigo da demora, o qual decorre da natureza alimentar do benefício -, confirmo a tutela
anteriormente concedida.
13 - Ante o exposto, REJEITO a preliminar de nulidade, por cerceamento de defesa, NEGO
PROVIMENTO à apelação do INSS, condenando-o ao pagamento dos honorários recursais, e
determino, DE OFÍCIO, a alteração dos juros e da correção monetária, nos termos expendidos no
voto. Mantida, quanto ao mais, a sentença recorrida, inclusive ao que se refere à concessão da
tutela antecipada.
Acórdao
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5560346-56.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CELIO GIMENES
Advogado do(a) APELADO: PAULO RICARDO BICEGO FERREIRA - SP329921-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 5560346-56.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CELIO GIMENES
Advogado do(a) APELADO: PAULO RICARDO BICEGO FERREIRA - SP329921-N
R E L A T Ó R I O
A EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora): Trata-se de apelação
interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS contra a r. sentença (Id.:55042812,
págs. 1 a 8) que julgou procedente o pedido de concessão do Benefício de Prestação
Continuada, a partir do requerimento administrativo, condenando-a ao pagamento do benefício,
acrescido de correção monetária, juros, custas, e honorários advocatícios fixados em 10% do
valor das prestações vencidas até a data da sentença, com concessão de tutela antecipada.
Em suas razões de apelação (Id.: 55042817, págs. 1 a 4), o INSS, preliminarmente, alega
nulidade da sentença e pede que o recurso seja recebido no efeito suspensivo para que revogue
a tutela antecipada, quanto ao mérito, pleiteia o reconhecimento da prescrição quinquenal e a
isenção de custas.
Prequestiona, para efeito de recurso especial ou extraordinário, ofensa a dispositivos de lei
federal e de preceitos constitucionais.
Com contrarrazões, os autos foram remetidos a esta E. Corte Regional.
Parecer do Ministério Público Federal pelo desprovimento da apelação (Id.:107685398, págs. 1 a
3).
É o relatório.
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 5560346-56.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CELIO GIMENES
Advogado do(a) APELADO: PAULO RICARDO BICEGO FERREIRA - SP329921-N
V O T O
A EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora):
Recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de sua
regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo
Civil.
Em sede preliminar, o recurso deve ser recebido apenas no efeito devolutivo, uma vez que se
trata de benefício assistencial, estando o autor em situação de vulnerabilidade e extrema
necessidade, bem como, presentes a verossimilhança do pedido e o fundado receio da demora,
conforme se verá adiante, o que, aliás, justifica a concessão da Tutela Antecipada.
Ainda em sede preliminar, o INSS alega cerceamento de defesa, vez que a sentença foi proferida
antes do decurso do prazo para manifestação da autarquia sobre o laudo médico. Em princípio, a
preliminar deve ser afastada, em razão da ausência de demonstração de prejuízo para o INSS,
devendo as questões acerca da nulidade ser melhor enfrentadas no mérito do recurso.
Pede ainda, a autarquia, que seja reconhecida a prescrição quinquenal, contudo, tal pedido é
inócuo pois entre o requerimento administrativo do benefício (18/03/2018) e a propositura da ação
(19/11/2018), não decorreu o prazo de cinco anos.
MÉRITO
O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal,
e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da Lei
8.742/1993.
O Benefício da Prestação Continuada (BPC) consiste na garantia de um salário mínimo mensal
ao idoso com 65 anos ou mais ou pessoa com deficiência de qualquer idade com impedimentos
de natureza física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo (que produza efeitos pelo prazo
mínimo de 2 anos), que o impossibilite de participar, em igualdade de condições, com as demais
pessoas da vida em sociedade de forma plena e efetiva. Tratando-se de benefício assistencial,
não há período de carência, tampouco é necessário que o requerente seja segurado do INSS ou
desenvolva alguma atividade laboral, sendo imprescindível, porém, a comprovação da
hipossuficiência própria e/ou familiar.
O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal garante o benefício em comento às pessoas com
deficiência que não possuam meios de prover à sua própria manutenção ou de tê-la provida por
sua família.
A previsão deste benefício guarda perfeita harmonia com a Constituição de 1988, que hospedou
em seu texto princípios que incorporam exigências de justiça e valores éticos, com previsão de
tarefas para que o Estado proceda à reparação de injustiças.
Concebida dentro de uma perspectiva do Estado Social de Direito, a Constituição valoriza e
protege os direitos sociais básicos, estabelece normas pragmáticas, enfim, apresenta conteúdo
contrário ao de uma Constituição do Estado Liberal, afastando-se do repouso, do formalismo e do
divórcio entre Estado e Sociedade.
A dignidade humana permeia todas as matérias constitucionais, sendo um valor supremo. E a
cidadania não se restringe ao seu conteúdo formal, sendo a legitimidade do exercício político
pelos indivíduos apenas uma das vertentes da cidadania, que é muito mais ampla e tem em seu
conteúdo constitucional a legitimidade do exercício dos direitos sociais, culturais e econômicos.
Os Princípios Fundamentais previstos no artigo 3º da Constituição Federal de 1988, voltados para
a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, objetivando a erradicação da pobreza e a
redução das desigualdades sociais e regionais, dão suporte às normas públicas voltadas ao
amparo de pessoas em situação de miséria.
A estrutura do Estado brasileiro insculpida no texto constitucional está informada pelos direitos e
valores nela declarados, que necessitam de permanente conformação com às demandas sociais.
Como destaca Paulo Bonavides, seguindo o norte das constituições democráticas, a Constituição
brasileira carrega traços do conflito, dos conteúdos dinâmicos, do pluralismo, da tensão sempre
renovada entre igualdade e a liberdade.
É com esse espírito que o benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V da Carta deve ser
compreendido.
O §2º do artigo 20 da Lei 8742/1993, define pessoa com deficiência como aquela que tem
impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em
interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade
em igualdade de condições com as demais pessoas.
O conceito adotado pela ONU (Organização das Nações Unidas), na Convenção Sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência, ingressou formalmente no ordenamento pátrio com a
ratificação desta Convenção e promulgado pelo Decreto nº 6.949/2009. Em 2015, com a Lei
13.146/2015, o conceito de pessoa com deficiência foi ampliado. A norma preceitua que as
barreiras limitadoras não precisam ser "diversas", não precisam se "somar", bastando a presença
de única limitação. Ao mesmo tempo, verifica-se que as limitações de que trata a Lei atual
ampliam a noção de incapacidade pura e simples para o trabalho e para a vida independente, eis
que devem ser considerados, também, para a perfeita análise da situação de vulnerabilidade do
requerente, fatores sociais e o meio em que a pessoa com deficiência vive, isto é, um conjunto de
circunstâncias capazes de impedir a integração justa, plena e igualitária na sociedade daquele
que necessita de proteção social.
Nesse sentido, as avaliações de que trata o §6º do artigo 20, que sujeita a concessão do
benefício às avaliações médica e social, devendo a primeira considerar as deficiências nas
funções e nas estruturas do corpo do requerente, e, a segunda, os fatores ambientais, sociais e
pessoais a que está sujeito.
Insta salientar, ainda, que o fato de a incapacidade ser temporária não impede a concessão do
benefício, nos termos da Súmula 48 da TNU:
"A incapacidade não precisa ser permanente para fins de concessão do benefício assistencial de
prestação continuada".
No que diz respeito ao requisito socioeconômico, o § 3º do artigo 20 da Lei 8.742/1993, em linhas
gerais, considera como hipossuficiente para consecução deste benefício pessoa cuja renda por
pessoa do grupo familiar seja inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo.
A renda per capita a ser considerada para a concessão do benefício passou a ser inferior a 1/2
salário mínimo, pois oSTF reconheceu a existência de repercussão geral da questão
constitucional suscitada no RE 567985 RG / MT assim ementado:
Ementa
REPERCUSSÃO GERAL - BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA -
IDOSO - RENDA PER CAPITA FAMILIAR INFERIOR A MEIO SALÁRIO MÍNIMO - ARTIGO 203,
INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Admissão pelo Colegiado Maior.
(Relator: Ministro Marco Aurélio, Publicação: DJe-065, DIVULG. 10-04-2008, PUBLIC. 11-04-
2008).
Andou bem o legislador, ao incluir o § 11 no artigo 20, com a publicação da Lei 13.146/2015,
normatizando expressamente que a comprovação da miserabilidade do grupo familiar e da
situação de vulnerabilidade do requerente possam ser comprovadas por outros elementos
probatórios, além da limitação da renda per capita familiar.
Com efeito, cabe ao julgador avaliar o estado de necessidade daquele que pleiteia o benefício,
consideradas suas especificidades, não devendo se ater à presunção absoluta de miserabilidade
que a renda per capita sugere: Precedentes do C. STJ: AgRg no AREsp 319.888/PR, 1ª Turma,
Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJE 03/02/2017; AgRg no REsp 1.514.461/SP, 2ª
Turma, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJE 24/05/2016; REsp 1.025.181/RS, 6ª Turma, Rel.
Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJE 29/09/2008)
Para efeito da mensuração da renda per capita, o Regulamento do Benefício de Prestação
Continuada, instituído pelo Decreto nº 6.214/2007, definiu Grupo Familiar em seu artigo 4º, assim
dispondo:
Art. 4º. Para os fins do reconhecimento do direito ao benefício, considera-se:
(...)
V- família para cálculo da renda per capita: conjunto de pessoas composto pelo requerente, o
cônjuge, o companheiro, a companheira, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o
padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que
vivam sob o mesmo teto;
(...)
Mencionado artigo também normatizou, em seu inciso VI e §2º, as rendas que poderão ser
excluídas no cômputo da renda familiar, bem como as que devem ser consideradas nesse
cálculo, vejamos:
(...)
VI - renda mensal bruta familiar: a soma dos rendimentos brutos auferidos mensalmente pelos
membros da família composta por salários, proventos, pensões, pensões alimentícias, benefícios
de previdência pública ou privada, seguro-desemprego, comissões, pro-labore, outros
rendimentos do trabalho não assalariado, rendimentos do mercado informal ou autônomo,
rendimentos auferidos do patrimônio, Renda Mensal Vitalícia e Benefício de Prestação
Continuada, ressalvado o disposto no parágrafo único do artigo 19.
(...)
§ 2º - Para fins do disposto no inciso VI do caput, não serão computados como renda mensal
bruta familiar:
I - benefícios e auxílios assistenciais de natureza eventual e temporária;
II - valores oriundos de programas sociais de transferência de renda;
III - bolsas de estágio supervisionado;
IV - pensão especial de natureza indenizatória e benefício de assistência médica, conforme
disposto no art. 5º;
V - rendas de natureza eventual ou sazonal, a serem regulamentadas em ato conjunto do
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e do INSS; e
VI - rendimentos decorrentes de contrato de aprendizagem.
(...)
Por fim, cabe uma última ponderação, que é a consideração feita ao artigo 19, mencionado no
inciso VI do artigo supracitado:
Art. 19. O Benefício de Prestação Continuada será devido a mais de um membro da mesma
família enquanto atendidos os requisitos exigidos neste Regulamento.
Parágrafo único. O valor do Benefício de Prestação Continuada concedido a idoso não será
computado no cálculo da renda mensal bruta familiar a que se refere o inciso VI do art. 4º, para
fins de concessão do Benefício de Prestação Continuada a outro idoso da mesma família.
De acordo com esse artigo, se algum dos membros do Grupo Familiar receber igual benefício
assistencial, referido benefício deve ser excluído da renda per capita familiar.
O STJ, em sede de Recurso Repetitivo, já sedimentou o entendimento de que a mesma regra
deve ser aplicada, por analogia, também para quando houver benefício previdenciário recebido
por idoso, no valor de um salário mínimo.
Vejamos:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA.
AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA .
IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NO
VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO.
1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no valor
de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do benefício
de prestação mensal continuada a pessoa deficiente.
2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito
do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso
(Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com
deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário
mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n.
8.742/93.
3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código de
Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008.
(STJ, REsp nº 1.355.052/SP, Primeira Seção, Ministro Relator BENEDITO GONÇALVES, DJe
05/11/2015 )
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. RENDA PER CAPITA FAMILIAR.
EXCLUSÃO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO
RECEBIDO POR IDOSO QUE FAÇA PARTE DO NÚCLEO FAMILIAR. APLICAÇÃO, POR
ANALOGIA, DO ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI N. 10.741/03 (ESTATUTO DO IDOSO).
ENTENDIMENTO ASSENTADO NO JULGAMENTO DO RESP N. 1.355.052/SP, JULGADO SOB
O RITO DO ART. 543-C DO CPC. 1. A Primeira Seção, no julgamento do REsp n. 1.355.052/SP,
sob o regime dos recursos repetitivos do artigo 543-C do Código de Processo Civil, firmou o
entendimento de que: "Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n.
10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim
de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja
computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93". 2.
Agravo regimental não provido.
(STJ, AgRg no AResp 332.275/RS, 1ª Turma, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, 07/12/2015 )
Nesse sentido, os julgados desta C. Corte Regional (7ª Turma, Ap 2015.03.99.030993-0, Rel.
Des. Fed. Carlos Delgado, DJ 24/10/2016; 7ª Turma, Ap 2014.03.00.013459-1, Rel. Des. Fed.
Toru Yamamoto, DJ 27/04/2017; 8ª Turma, ApReeNec2013.61.39.001566-7, Rel. Des. Fed. Tania
Marangoni, e-DJF3 04/09/2017).
No caso dos autos, no que tange à preliminar de cerceamento de defesa sob a alegação de que a
sentença foi proferida antes do escoamento do prazo para manifestação sobre o laudo médico,
entendo que a mesma deve ser rejeitada, pois o INSS, em sua apelação, em nenhum momento
contestou o diagnóstico proferido pelo médico perito, o que torna a incapacidade do autor
incontroversa.
"Nesse sentido o pronunciamento do Ministério Público Federal, que em seu parecer entendeu
que o INSS "sequer impugnou os fundamentos da decisão proferido, não trazendo qualquer
argumento concreto quanto a eventual prejuízo". "Desta forma, deve ser rechaçada a preliminar."
(Id.: 107685398, pág. 2)."
Assim sendo, o inconformismo da parte apelante não procede, devendo ser mantida a r. sentença
monocrática (Id.:55042812, págs. 1 a 8), por seus próprios fundamentos, os quais seguem
reproduzidos:
"No caso dos autos, a questão foi elucidada pelo laudo médico (fls. 207/218), que concluiu que
ser o periciando portadora de fraturas na coluna e calcanhares, com impossibilidade de exercer a
função habitual e deambular distâncias consideráveus (sic)."
"Desta forma, entendo que foi atendido o requisito previsto pelo § 2º do art. 20 da Loas, tendo em
vista sua idade 55 anos e seu grave e variado comprometimento ortopédico, o que implica na
impossibilidade de vida econômica independente."
"No presente caso, o laudo social (fls. 144/154) esclarece que a parte autora reside com sua
esposa, que aufere renda esporádica de R$ 100,00 mensais, de modo que a per capta está
dentro do paradigma supracitado."
"Sendo assim, foi atendido o disposto pelo § 3º do art. 20 da Loas."
"O direito ao benefício existe sem qualquer margem para dúvida e, ante a precária situação de
vida do autor, atestada pelos laudos constantes dos autos, impõe-se sejam antecipados, de
ofício, os efeitos da tutela, para assegurar a imediata implantação do benefício."
Destaco que o estudo social, datado de 15/12/2018, deixou expressa a insuficiência de recursos
da parte autora, sendo forçoso reconhecer o quadro de pobreza e extrema necessidade que se
apresenta (Id.:55042786, págs. 1 a 11):
"A composição familiar é composta pelo requerente e sua esposa, perfazendo um total de duas
pessoas adultas. As relações de convivência e vínculos familiares estão preservados."
"O requerente reside na parte inferior, composta por 01 quarto, 01 sala, 01 cozinha, 01 banheiro,
o restante do imóvel a construção não foi finalizada."
"A composição da renda financeira, é composta pelo trabalho de diarista que a esposa do
requerente realiza uma vez por semana, perfazendo o total de R$ 100,00 por mês."
"Conforme avaliação da perícia socioeconômica, podemos afirmar que o requerente e seus
familiares se encontram em Alta Vulnerabilidade Social e Pessoal, em situação de renda
insuficiente para manter as necessidades essenciais de vida."
O laudo médico pericial (Id.:55042806, págs. 1 a 12), datado de 28/02/2019, deixa claro que o
autor está incapacitado para o exercício das atividades exercidas anteriormente ao acidente
sofrido. Vejamos:
"Laudo do HC – queda de 5 m de altura – 27/06/2017 - fraturas na coluna lombar com
encurtamento de L 1 (CID 10 – S 32.7), além de fratura em ambos os calcanhares (CID 10 – S.
92.0) – osteossíntese dos calcanhares."
"O (a) periciando (a) é portador (a) de: portador de sequela de fratura nos calcanhares (CID 10 –
S. 92.0) transtorno depressivo recorrente (CID 10 – F. 33), espondiloartrose cervical em C5 e C6
fratura na coluna lombar com encurtamento de L 1 (CID 10 – S 32.7.).
A doença apresentada no calcanhar causa incapacidade para as atividades anteriormente
desenvolvidas.
A data provável do início da doença é 29/06/2017, segundo conta.
Para tanto se aplica data de inicio da incapacidade em 29/06/2017, data da fratura, segundo
radiografia."
Conforme elucidado no parecer do Ministério Público Federal (Id.: 107685398, págs. 1 a 3):
"A autarquia aduz que existe nulidade em razão da sentença ter sido proferida antes de sua
análise do laudo pericial.
Contudo, nesta sede recursal não demonstra, minimamente, qual seria o prejuízo do INSS (...)"
"Do cotejo de todas essas informações, é possível concluir que o autor vive em situação de
miserabilidade, de modo que o benefício requerido é, de fato, devido."
Assim, entendo que o autor demonstrou preencher os requisitos legais de deficiência e
miserabilidade, de modo que faz jus ao benefício assistencial requerido.
O termo inicial do benefício, em regra, deve ser fixado à data do requerimento administrativo ou,
na sua ausência, à data da citação (Súmula nº 576/STJ) ou, ainda, na hipótese de auxílio-doença
cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício.
No caso, o termo inicial do benefício é mantido, conforme fixado na sentença, em 16/03/2018,
data do requerimento administrativo (Id.: 55042788, pág. 15), pois foi neste momento que o INSS
tomou conhecimento da pretensão do autor.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices previstos
no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo
Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de 2009, período
em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-e, critério
estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso
Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, e
confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração opostos pelo INSS.
Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte
alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos
Tribunais Superiores.
Mantenho a verba honorária nos termos da sentença, ausente insurgência do réu a esse respeito.
Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11, como
um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos
honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte
contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os
limites estabelecidos na lei.
Assim, desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados na
sentença devem, no caso, ser majorados em 2%, nos termos do artigo 85, parágrafo 11, do
CPC/2015.
No que se refere às custas processuais, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, tanto no
âmbito da Justiça Federal (Lei nº 9.289/96, art. 4º, I) como da Justiça Estadual de São Paulo (Lei
9.289/96, art. 1º, § 1º, e Leis Estaduais nºs 4.952/85 e 11.608/2003).
Tal isenção, decorrente de lei, não exime o INSS do reembolso das custas recolhidas pela parte
autora (artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no caso, tendo em conta a
gratuidade processual que foi concedida à parte autora.
Presentes os requisitos - verossimilhança das alegações, conforme exposto na sentença, e o
perigo da demora, o qual decorre da natureza alimentar do benefício -, confirmo a tutela
anteriormente concedida.
Relativamente ao prequestionamento de matéria ofensiva a dispositivos de lei federal e de
preceitos constitucionais, tendo sido o recurso apreciado em todos os seus termos, nada há que
ser discutido ou acrescentado aos autos.
Ante o exposto, REJEITO a preliminar de nulidade, por cerceamento de defesa, NEGO
PROVIMENTO à apelação do INSS, condenando-o ao pagamento dos honorários recursais, e
determino, DE OFÍCIO, a alteração dos juros e da correção monetária, nos termos expendidos no
voto. Mantida, quanto ao mais, a sentença recorrida, inclusive ao que se refere à concessão da
tutela antecipada.
É COMO VOTO.
/gabiv/kmb
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. LOAS. DEFICIÊNCIA E MISERABILIDADE.
PRELIMINAR. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS. HONORÁRIOS RECURSAIS. APELAÇÃO
DO INSS IMPROVIDA. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. TUTELA ANTECIPADA
MANTIDA.
1 - Por primeiro, recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e,
em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do
Codex processual.
2 - Ainda em sede preliminar, o recurso deve ser recebido apenas no efeito devolutivo, uma vez
que se trata de benefício assistencial, estando o autor em situação de vulnerabilidade e extrema
necessidade, bem como, presentes a verossimilhança do pedido e o fundado receio da demora, o
que, aliás, justifica a concessão da Tutela Antecipada.
3 - O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.
4 - A concessão do benefício assistencial (LOAS) requer o preenchimento concomitante do
requisito de deficiência (ou idade) e de miserabilidade. Requisitos legais preenchidos.
5 - Da análise do laudo médico e do estudo social, é forçoso reconhecer a deficiência do autor e o
quadro de pobreza e extrema necessidade que se apresenta.
6 - Preenchidos os requisitos legais, no caso deficiência e miserabilidade, a parte autora faz jus
ao benefício assistencial pleiteado.
7 - Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de
2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial -
IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do
julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de
Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração
opostos pelo INSS.
8 - Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte
alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos
Tribunais Superiores.
9 - Mantida a verba honorária nos termos da sentença, ausente insurgência do réu a esse
respeito.
10 - Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11,
como um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos
honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte
contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os
limites estabelecidos na lei. Assim, desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei,
os honorários fixados na sentença devem, no caso, ser majorados em 2%, nos termos do artigo
85, parágrafo 11, do CPC/2015.
11 - A Autarquia Previdenciária está isenta das custas processuais, tanto no âmbito da Justiça
Federal (Lei nº 9.289/96, art. 4º, I) como da Justiça do Estado de São Paulo (Leis Estaduais nºs
4.952/85 e 11.608/2003), mas (i) não do reembolso das custas recolhidas pela parte autora
(artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no caso, tendo em conta a
gratuidade processual que foi concedida à parte autora.
12 - Presentes os requisitos - verossimilhança das alegações, conforme exposto na sentença, e o
perigo da demora, o qual decorre da natureza alimentar do benefício -, confirmo a tutela
anteriormente concedida.
13 - Ante o exposto, REJEITO a preliminar de nulidade, por cerceamento de defesa, NEGO
PROVIMENTO à apelação do INSS, condenando-o ao pagamento dos honorários recursais, e
determino, DE OFÍCIO, a alteração dos juros e da correção monetária, nos termos expendidos no
voto. Mantida, quanto ao mais, a sentença recorrida, inclusive ao que se refere à concessão da
tutela antecipada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu REJEITAR a preliminar de nulidade, por cerceamento de defesa, NEGAR
PROVIMENTO à apelação do INSS, alterar, DE OFÍCIO, a correção monetária e os juros de
mora, e MANTER, quanto ao mais, a sentença recorrida, inclusive ao que se refere à concessão
da tutela antecipada, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
