Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5227185-31.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
16/03/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 05/05/2020
Ementa
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. LOAS. DEFICIÊNCIA E MISERABILIDADE. TUTELA
ANTECIPADA. VERBA HONORÁRIA. DIB. APELAÇÃO DO INSS IMPROVIDA. JUROS DE
MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA ALTERADOS, DE OFÍCIO. SENTENÇA REFORMADA EM
PARTE.
1 - Por primeiro, recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e,
em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do
Codex processual.
2 - Ainda em sede preliminar, o recurso deve ser recebido apenas no efeito devolutivo, uma vez
que se trata de benefício assistencial, estando o autor em situação de vulnerabilidade e extrema
necessidade, bem como, presentes a verossimilhança do pedido e o fundado receio da demora, o
que, aliás, justifica a concessão da Tutela Antecipada.
3 - O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.
4 - A concessão do benefício assistencial (LOAS) requer o preenchimento concomitante do
requisito de deficiência / idade e de miserabilidade. Requisitos legais preenchidos
5 - Do cotejo do estudo social, da deficiência avançada da parte autora e sua dependência
econômica, bem como a insuficiência de recursos da família, é forçoso reconhecer o quadro de
pobreza e extrema necessidade que se apresenta.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
6 - No caso, o termo inicial do benefício é mantido, conforme fixado na sentença, em 02/05/2017,
data do requerimento administrativo, uma vez que foi neste momento que a autarquia teve ciência
da pretensão da parte autora.
7 -Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de
2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial -
IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do
julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de
Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração
opostos pelo INSS.
8 - Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte
alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos
Tribunais Superiores.
9 -Mantida a verba honorária nos termos da sentença, ausente insurgência do réu a esse
respeito.
10 -Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% do
valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ).
11 -Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu art. 85, § 11, como um
desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos honorários
de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte contrária, não
podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os limites
estabelecidos na lei.
12 - Desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados devem,
no caso, ser majorados em 2%, nos termos do art. 85, § 11, do CPC/2015.
13 - A Autarquia Previdenciária está isenta das custas processuais, tanto no âmbito da Justiça
Federal (Lei nº 9.289/96, art. 4º, I) como da Justiça do Estado de São Paulo (Leis Estaduais nºs
4.952/85 e 11.608/2003), mas não do reembolso das custas recolhidas pela parte autora (artigo
4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no caso, tendo em conta a gratuidade
processual que foi concedida à parte autora.
14 -Presentes os requisitos - verossimilhança das alegações, conforme exposto na sentença, e o
perigo da demora, o qual decorre da natureza alimentar do benefício -, confirmo a tutela
anteriormente concedida.
15 - Apelação do INSS improvida. Correção monetária e juros de mora alterados, de ofício.
Honorários advocatícios fixados em 10% das prestações vencidas até a data da sentença,
acrescidos de 2% a título de honorários recursais. Sentença reformada em parte.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5227185-31.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: RAIMUNDA PEREIRA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: YARA OLIVEIRA FLORENCIO DA HORA - SP375173-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5227185-31.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: RAIMUNDA PEREIRA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: YARA OLIVEIRA FLORENCIO DA HORA - SP375173-N
R E L A T Ó R I O
A EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora): Trata-se de apelação
interposta peloInstituto Nacional do Seguro Social - INSS contra a r. sentença (Id.: 31428237,
págs. 1 a 6) que julgou procedente o pedido de concessão do Benefício de Prestação
Continuada, a partir da data do requerimento administrativo, em 02/05/2017 (Id.: 31427909, pág.
1), e concedeu a tutela antecipada, condenando-o ao pagamento dos honorários advocatícios
postergada a sua fixação para a fase de liquidação, nos moldes do artigo 85, §§ 3º e 4º, inciso II,
do Novo Código de Processo Civil (Súmula 111 do STJ), com juros e correção monetária, nos
termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, e fixou
os honorários dos peritos em R$200,00 cada, sem condenação em custas.
Em suas razões de apelação (Id.: 31428333, págs. 1 a 5), sustenta o INSS que a parte autora
não se enquadra no conceito de deficiência do artigo 20, § 2º, da Lei nº 8.742/1993, e que não
existe impedimento de longo prazo, podendo a parte autora exercer atividades laborativas que lhe
garantam a subsistência.
Pugna pela reforma da sentença e inversão dos ônus sucumbenciais.
Com contrarrazões, os autos foram remetidos a esta E. Corte Regional.
Parecer do Ministério Público Federal pelo improvimento da apelação do INSS (Id.: 89908863,
págs. 1 a 7).
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5227185-31.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: RAIMUNDA PEREIRA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: YARA OLIVEIRA FLORENCIO DA HORA - SP375173-N
V O T O
A EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora):
Recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de sua
regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo
Civil.
O recurso deve ser recebido apenas no efeito devolutivo, uma vez que se trata de benefício
assistencial, estando o autor em situação de vulnerabilidade e extrema necessidade, bem como,
presentes a verossimilhança do pedido e o fundado receio da demora, conforme se verá adiante,
o que, aliás, justifica a concessão da Tutela Antecipada.
O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal,
e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da Lei
8.742/1993.
O Benefício da Prestação Continuada (BPC) consiste na garantia de um salário mínimo mensal
ao idoso com 65 anos ou mais ou pessoa com deficiência de qualquer idade com impedimentos
de natureza física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo (que produza efeitos pelo prazo
mínimo de 2 anos), que o impossibilite de participar, em igualdade de condições, com as demais
pessoas da vida em sociedade de forma plena e efetiva. Tratando-se de benefício assistencial,
não há período de carência, tampouco é necessário que o requerente seja segurado do INSS ou
desenvolva alguma atividade laboral, sendo imprescindível, porém, a comprovação da
hipossuficiência própria e/ou familiar.
O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal garante o benefício em comento às pessoas com
deficiência que não possuam meios de prover à sua própria manutenção ou de tê-la provida por
sua família.
A previsão deste benefício guarda perfeita harmonia com a Constituição de 1988, que hospedou
em seu texto princípios que incorporam exigências de justiça e valores éticos, com previsão de
tarefas para que o Estado proceda à reparação de injustiças.
Concebida dentro de uma perspectiva do Estado Social de Direito, a Constituição valoriza e
protege os direitos sociais básicos, estabelece normas pragmáticas, enfim, apresenta conteúdo
contrário ao de uma Constituição do Estado Liberal, afastando-se do repouso, do formalismo e do
divórcio entre Estado e Sociedade.
A dignidade humana permeia todas as matérias constitucionais, sendo um valor supremo. E a
cidadania não se restringe ao seu conteúdo formal, sendo a legitimidade do exercício político
pelos indivíduos apenas uma das vertentes da cidadania, que é muito mais ampla e tem em seu
conteúdo constitucional a legitimidade do exercício dos direitos sociais, culturais e econômicos.
Os Princípios Fundamentais previstos no artigo 3º da Constituição Federal de 1988, voltados para
a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, objetivando a erradicação da pobreza e a
redução das desigualdades sociais e regionais, dão suporte às normas públicas voltadas ao
amparo de pessoas em situação de miséria.
A estrutura do Estado brasileiro insculpida no texto constitucional está informada pelos direitos e
valores nela declarados, que necessitam de permanente conformação com às demandas sociais.
Como destaca Paulo Bonavides, seguindo o norte das constituições democráticas, a Constituição
brasileira carrega traços do conflito, dos conteúdos dinâmicos, do pluralismo, da tensão sempre
renovada entre igualdade e a liberdade.
É com esse espírito que o benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V da Carta deve ser
compreendido.
O §2º do artigo 20 da Lei 8742/1993, define pessoa com deficiência como aquela que tem
impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em
interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade
em igualdade de condições com as demais pessoas.
O conceito adotado pela ONU (Organização das Nações Unidas), na Convenção Sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência, ingressou formalmente no ordenamento pátrio com a
ratificação desta Convenção e promulgado pelo Decreto nº 6.949/2009. Em 2015, com a Lei
13.146/2015, o conceito de pessoa com deficiência foi ampliado. A norma preceitua que as
barreiras limitadoras não precisam ser "diversas", não precisam se "somar", bastando a presença
de única limitação. Ao mesmo tempo, verifica-se que as limitações de que trata a Lei atual
ampliam a noção de incapacidade pura e simples para o trabalho e para a vida independente, eis
que devem ser considerados, também, para a perfeita análise da situação de vulnerabilidade do
requerente, fatores sociais e o meio em que a pessoa com deficiência vive, isto é, um conjunto de
circunstâncias capazes de impedir a integração justa, plena e igualitária na sociedade daquele
que necessita de proteção social.
Nesse sentido, as avaliações de que trata o §6º do artigo 20, que sujeita a concessão do
benefício às avaliações médica e social, devendo a primeira considerar as deficiências nas
funções e nas estruturas do corpo do requerente, e, a segunda, os fatores ambientais, sociais e
pessoais a que está sujeito.
Insta salientar, ainda, que o fato de a incapacidade ser temporária não impede a concessão do
benefício, nos termos da Súmula 48 da TNU:
"A incapacidade não precisa ser permanente para fins de concessão do benefício assistencial de
prestação continuada".
No que diz respeito ao requisito socioeconômico, o § 3º do artigo 20 da Lei 8.742/1993, em linhas
gerais, considera como hipossuficiente para consecução deste benefício pessoa cuja renda por
pessoa do grupo familiar seja inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo.
A renda per capita a ser considerada para a concessão do benefício passou a ser inferior a 1/2
salário mínimo, pois o STF reconheceu a existência de repercussão geral da questão
constitucional suscitada no RE 567985 RG / MT assim ementado:
Ementa
REPERCUSSÃO GERAL - BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA -
IDOSO - RENDA PER CAPITA FAMILIAR INFERIOR A MEIO SALÁRIO MÍNIMO - ARTIGO 203,
INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Admissão pelo Colegiado Maior.
(Relator: Ministro Marco Aurélio, Publicação: DJe-065, DIVULG. 10-04-2008, PUBLIC. 11-04-
2008).
Andou bem o legislador, ao incluir o § 11 no artigo 20, com a publicação da Lei 13.146/2015,
normatizando expressamente que a comprovação da miserabilidade do grupo familiar e da
situação de vulnerabilidade do requerente possam ser comprovadas por outros elementos
probatórios, além da limitação da renda per capita familiar.
Com efeito, cabe ao julgador avaliar o estado de necessidade daquele que pleiteia o benefício,
consideradas suas especificidades, não devendo se ater à presunção absoluta de miserabilidade
que a renda per capita sugere: Precedentes do C. STJ: AgRg no AREsp 319.888/PR, 1ª Turma,
Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJE 03/02/2017; AgRg no REsp 1.514.461/SP, 2ª
Turma, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJE 24/05/2016; REsp 1.025.181/RS, 6ª Turma, Rel.
Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJE 29/09/2008)
Para efeito da mensuração da renda per capita, o Regulamento do Benefício de Prestação
Continuada, instituído pelo Decreto nº 6.214/2007, definiu Grupo Familiar em seu artigo 4º, assim
dispondo:
Art. 4º. Para os fins do reconhecimento do direito ao benefício, considera-se:
(...)
V- família para cálculo da renda per capita: conjunto de pessoas composto pelo requerente, o
cônjuge, o companheiro, a companheira, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o
padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que
vivam sob o mesmo teto;
(...)
Mencionado artigo também normatizou, em seu inciso VI e §2º, as rendas que poderão ser
excluídas no cômputo da renda familiar, bem como as que devem ser consideradas nesse
cálculo, vejamos:
(...)
VI - renda mensal bruta familiar: a soma dos rendimentos brutos auferidos mensalmente pelos
membros da família composta por salários, proventos, pensões, pensões alimentícias, benefícios
de previdência pública ou privada, seguro-desemprego, comissões, pro-labore, outros
rendimentos do trabalho não assalariado, rendimentos do mercado informal ou autônomo,
rendimentos auferidos do patrimônio, Renda Mensal Vitalícia e Benefício de Prestação
Continuada, ressalvado o disposto no parágrafo único do artigo 19.
(...)
§ 2º - Para fins do disposto no inciso VI do caput, não serão computados como renda mensal
bruta familiar:
I - benefícios e auxílios assistenciais de natureza eventual e temporária;
II - valores oriundos de programas sociais de transferência de renda;
III - bolsas de estágio supervisionado;
IV - pensão especial de natureza indenizatória e benefício de assistência médica, conforme
disposto no art. 5º;
V - rendas de natureza eventual ou sazonal, a serem regulamentadas em ato conjunto do
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e do INSS; e
VI - rendimentos decorrentes de contrato de aprendizagem.
(...)
Por fim, cabe uma última ponderação, que é a consideração feita ao artigo 19, mencionado no
inciso VI do artigo supracitado:
Art. 19. O Benefício de Prestação Continuada será devido a mais de um membro da mesma
família enquanto atendidos os requisitos exigidos neste Regulamento.
Parágrafo único. O valor do Benefício de Prestação Continuada concedido a idoso não será
computado no cálculo da renda mensal bruta familiar a que se refere o inciso VI do art. 4º, para
fins de concessão do Benefício de Prestação Continuada a outro idoso da mesma família.
De acordo com esse artigo, se algum dos membros do Grupo Familiar receber igual benefício
assistencial, referido benefício deve ser excluído da renda per capita familiar.
O STJ, em sede de Recurso Repetitivo, já sedimentou o entendimento de que a mesma regra
deve ser aplicada, por analogia, também para quando houver benefício previdenciário recebido
por idoso, no valor de um salário mínimo.
Vejamos:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA.
AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA .
IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NO
VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO.
1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no valor
de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do benefício
de prestação mensal continuada a pessoa deficiente.
2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito
do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso
(Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com
deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário
mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n.
8.742/93.
3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código de
Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008.
(STJ, REsp nº 1.355.052/SP, Primeira Seção, Ministro Relator BENEDITO GONÇALVES, DJe
05/11/2015 )
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. RENDA PER CAPITA FAMILIAR.
EXCLUSÃO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO
RECEBIDO POR IDOSO QUE FAÇA PARTE DO NÚCLEO FAMILIAR. APLICAÇÃO, POR
ANALOGIA, DO ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI N. 10.741/03 (ESTATUTO DO IDOSO).
ENTENDIMENTO ASSENTADO NO JULGAMENTO DO RESP N. 1.355.052/SP, JULGADO SOB
O RITO DO ART. 543-C DO CPC. 1. A Primeira Seção, no julgamento do REsp n. 1.355.052/SP,
sob o regime dos recursos repetitivos do artigo 543-C do Código de Processo Civil, firmou o
entendimento de que: "Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n.
10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim
de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja
computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93". 2.
Agravo regimental não provido.
(STJ, AgRg no AResp 332.275/RS, 1ª Turma, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, 07/12/2015 )
Nesse sentido, os julgados desta C. Corte Regional (7ª Turma, Ap 2015.03.99.030993-0, Rel.
Des. Fed. Carlos Delgado, DJ 24/10/2016; 7ª Turma, Ap 2014.03.00.013459-1, Rel. Des. Fed.
Toru Yamamoto, DJ 27/04/2017; 8ª Turma, ApReeNec2013.61.39.001566-7, Rel. Des. Fed. Tania
Marangoni, e-DJF3 04/09/2017)
Assim sendo, o inconformismo da parte apelante não procede, devendo ser mantida a r. sentença
monocrática (Id.: 31428237, págs. 1 a 6),por seus próprios fundamentos, os quais seguem
reproduzidos:
"Volvendo ao caso concreto, os documentos de fls. 44, 54/56 e 60/81 apontam que a demandante
possui problemas de saúde. O laudo pericial de fls. 483/494, indicou que a parte autora é
portadora de miocardiopatia isquêmica (“infarto agudo do miocárdio com supra de segmento ST
prévio”).
Referido laudo, em resposta ao quesito 9 (nove) de fl. 488, informa que da parte autora seria
exigido “boa saúde física e mental” para desempenho de sua atividade laborativa habitual.
Contudo, ficou noticiado à fl. 485, quesito “d”, que a autora está impedida de realizar atividades
que requeiram esforços físicos, caminhar pequenas distâncias ou carregar peso. Para tais
atividades encontra-se inapta, apresentando incapacidade parcial permanente, conforme explica
a perita (fl. 493).
O laudo acima citado relata que a autora “apresenta possibilidade remota de reabilitação,
levando-se em conta o quadro clínico delicado da periciada, assim como seu histórico
profissional, escolar e faixa etária avançada” (fl. 493; grifei)."
Destaco que o estudo social deixou expressa a insuficiência de recursos da parte autora, sendo
forçoso reconhecer o quadro de pobreza e extrema necessidade que se apresenta (Id.:
31428142, págs. 1 a 6):
"A situação do requerente é de fato gravíssima, sua condição é de miserabilidade em virtude do
manifestado e das dificuldades aqui apresentadas. Não existe a menor hipótese dessa requerente
retornar ao mercado de trabalho, na visita domiciliar ficou evidente e comprovado de fato que com
RS 77,00 (setenta e sete reais) serem insuficientes para suprir as necessidades de sua saúde, e
vida digna. “Aparentemente”, tem deficiência física sim, em virtude dos vários problemas de
saúde, embora esse quesito não ser de responsabilidade da perita, a requerente locomoveu-se
na visita domiciliar com muita dificuldade nas pernas, tem idade avançada, e vive sem nenhuma
condição socioeconômica para sobreviver com dignidade que faz juz. Está se recuperando de um
infarto que requere tratamento contínuo. Sobrevive da ajuda das pessoas e dos atendimentos
prestados pelo SUS. Enfim, a requerente é extremamente pobre, não tem condições de retornar
ao mercado de trabalho, encontra-se doente e impossibilitada de exercer atividade laborativa, o
que a impossibilita de prover seu próprio sustento. É essa a real situação financeira da Sra.
Raimunda Pereira da Silva, 59 anos no estudo socioeconômico ora solicitado".
Dentro desse cenário, entendo que o juízo de primeiro grau, de acordo com o seu livre
convencimento, julgou acertadamente, pois ficou demonstrado que a parte autora preencheu os
requisitos legais, notadamente, os que dizem respeito à deficiência e hipossuficiência econômica,
comprovando estar em situação de vulnerabilidade, fazendo jus ao benefício assistencial
requerido.
O termo inicial do benefício, em regra, deve ser fixado à data do requerimento administrativo ou,
na sua ausência, à data da citação (Súmula nº 576/STJ) ou, ainda, na hipótese de auxílio-doença
cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício.
Tal entendimento, pacificado no Egrégio Superior Tribunal de Justiça, está embasado no fato de
que "o laudo pericial norteia somente o livre convencimento do juiz quanto aos fatos alegados
pelas partes, mas não serve como parâmetro para fixar termo inicial de aquisição de direitos"
(AgRg no AREsp 95.471/MG, 5ª Turma, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe 09/05/2012), sendo
descabida, portanto, a fixação do termo inicial do benefício à data da perícia / do laudo pericial /
da juntada do laudo / de início da incapacidade, estabelecida pelo perito.
No caso, o termo inicial do benefício é mantido, conforme fixado na sentença, em 02/05/2017,
data do requerimento administrativo (Id.: 31427909, pág. 1).
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices previstos
no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo
Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de 2009, período
em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-e, critério
estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso
Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, e
confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração opostos pelo INSS.
Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte
alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos
Tribunais Superiores.
Não é o caso de se postergar a fixação do percentual dos honorários de sucumbência, como fez
a sentença.
Com base em simples cálculo aritmético, que leva em conta o valor do benefício e o lapso
temporal desde a sua implantação até a data da prolação da sentença, constata-se que o
montante devido nesse período, base de cálculo da verba honorária (Súmula nº 111/STJ), não
ultrapassará 200 salários mínimos, de modo que os honorários advocatícios já podem ser
estabelecidos na fase de conhecimento, sem afronta ao artigo 85, parágrafo 4º e inciso II, do
CPC/2015.
Aplica-se, in casu, um percentual entre 10 e 20%, nos termos do artigo 85, parágrafos 2º e 3º, do
CPC/2015 e da jurisprudência desta Colenda Turma (Apel Reex nº 0002060-
65.2011.4.03.6102/SP, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, DE 26/09/2017).
Assim, vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10%
do valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ).
Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11, como
um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos
honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte
contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os
limites estabelecidos na lei.
Assim, desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados
devem, no caso, ser majorados em 2%, nos termos do artigo 85, parágrafo 11, do CPC/2015.
No que se refere às custas processuais, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, tanto no
âmbito da Justiça Federal (Lei nº 9.289/96, art. 4º, I) como da Justiça Estadual de São Paulo (Lei
9.289/96, art. 1º, § 1º, e Leis Estaduais nºs 4.952/85 e 11.608/2003).
Tal isenção, decorrente de lei, não exime o INSS do reembolso das custas recolhidas pela parte
autora (artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no caso, tendo em conta a
gratuidade processual que foi concedida à parte autora.
Presentes os requisitos - verossimilhança das alegações, conforme exposto na sentença, e o
perigo da demora, o qual decorre da natureza alimentar do benefício -, confirmo a tutela
anteriormente concedida.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação do INSS,determino, DE OFÍCIO, a alteração
dos juros e da correção monetária, e fixo os honorários advocatícios em 10% do valor das
prestações vencidas até a data da sentença, acrescidos de 2% a título de honorários recursais.
Sentença reformada em parte.
É COMO VOTO.
/gabiv/kmb
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. LOAS. DEFICIÊNCIA E MISERABILIDADE. TUTELA
ANTECIPADA. VERBA HONORÁRIA. DIB. APELAÇÃO DO INSS IMPROVIDA. JUROS DE
MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA ALTERADOS, DE OFÍCIO. SENTENÇA REFORMADA EM
PARTE.
1 - Por primeiro, recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e,
em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do
Codex processual.
2 - Ainda em sede preliminar, o recurso deve ser recebido apenas no efeito devolutivo, uma vez
que se trata de benefício assistencial, estando o autor em situação de vulnerabilidade e extrema
necessidade, bem como, presentes a verossimilhança do pedido e o fundado receio da demora, o
que, aliás, justifica a concessão da Tutela Antecipada.
3 - O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.
4 - A concessão do benefício assistencial (LOAS) requer o preenchimento concomitante do
requisito de deficiência / idade e de miserabilidade. Requisitos legais preenchidos
5 - Do cotejo do estudo social, da deficiência avançada da parte autora e sua dependência
econômica, bem como a insuficiência de recursos da família, é forçoso reconhecer o quadro de
pobreza e extrema necessidade que se apresenta.
6 - No caso, o termo inicial do benefício é mantido, conforme fixado na sentença, em 02/05/2017,
data do requerimento administrativo, uma vez que foi neste momento que a autarquia teve ciência
da pretensão da parte autora.
7 -Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de
2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial -
IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do
julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de
Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração
opostos pelo INSS.
8 - Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte
alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos
Tribunais Superiores.
9 -Mantida a verba honorária nos termos da sentença, ausente insurgência do réu a esse
respeito.
10 -Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% do
valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ).
11 -Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu art. 85, § 11, como um
desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos honorários
de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte contrária, não
podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os limites
estabelecidos na lei.
12 - Desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados devem,
no caso, ser majorados em 2%, nos termos do art. 85, § 11, do CPC/2015.
13 - A Autarquia Previdenciária está isenta das custas processuais, tanto no âmbito da Justiça
Federal (Lei nº 9.289/96, art. 4º, I) como da Justiça do Estado de São Paulo (Leis Estaduais nºs
4.952/85 e 11.608/2003), mas não do reembolso das custas recolhidas pela parte autora (artigo
4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no caso, tendo em conta a gratuidade
processual que foi concedida à parte autora.
14 -Presentes os requisitos - verossimilhança das alegações, conforme exposto na sentença, e o
perigo da demora, o qual decorre da natureza alimentar do benefício -, confirmo a tutela
anteriormente concedida.
15 - Apelação do INSS improvida. Correção monetária e juros de mora alterados, de ofício.
Honorários advocatícios fixados em 10% das prestações vencidas até a data da sentença,
acrescidos de 2% a título de honorários recursais. Sentença reformada em parte.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu NEGAR PROVIMENTO à apelação do INSS, determinar, DE OFÍCIO, a
alteração dos juros e da correção monetária, e fixo os honorários advocatícios em 10% do valor
das prestações vencidas até a data da sentença, acrescidos de 2% a título de honorários
recursais, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
