Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5081254-26.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
24/06/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 30/06/2021
Ementa
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. LOAS. DEFICIÊNCIA NÃO COMPROVADA.
REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.VERBA HONORÁRIA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA
DESPROVIDA.SENTENÇA MANTIDA.
1 - O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.
2 - A concessão do benefício assistencial (LOAS) requer o preenchimento concomitante do
requisito de deficiência/idade e de miserabilidade. Requisitos legais não preenchidos.
3 -Olaudo pericial foi exaustivo e preciso ao atestar que a autora não possui efetivo impedimento
ou incapacidade para atividade laboral, ou inserção no meio social, sendo capaz de exercer suas
atividades habituais de forma plenamente autônoma, de modo que não faz jus ao benefício
requerido.
4 - Não comprovada a deficiência ou incapacidade de longo prazo, torna-se desnecessária a
análise de eventual situação de hipossuficiência da parte autora, por se tratarem de requisitos
cumulativos para a concessão do benefício.
5 - Desprovido o apelo da parte autora interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados
na sentença devem, no caso, ser majorados em 2%, nos termos do art. 85, parágrafo 11, do
CPC/2015, observada a suspensão prevista no artigo 98, parágrafo 3º, da mesma lei.
6 - Apelação da parte autora desprovida. Sentença mantida.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5081254-26.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: ELLEN NOVAES
Advogado do(a) APELANTE: ARLETE ALVES DOS SANTOS MAZZOLINE - SP141845-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5081254-26.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: ELLEN NOVAES
Advogado do(a) APELANTE: ARLETE ALVES DOS SANTOS MAZZOLINE - SP141845-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
A EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora): Trata-se deapelação
interpostapela parte autora ELLEN NOVAES contra a r. sentença (Id.:158311122) que julgou
improcedente o pedido de concessão do Benefício de Prestação Continuada, condenando-a ao
pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por
cento) do valor da causa, suspensa a execução, por serbeneficiáriada assistência judiciária
gratuita.
Em suas razões de apelação(Id.:158311128), sustenta a parte autorao preenchimento dos
requisitos necessários à concessão do benefício requerido, vez que restou comprovada sua
deficiência e a miserabilidade de seu núcleo familiar.
Pugna pela reforma da sentença.
Sem contrarrazões, os autos foram remetidos a esta E. Corte Regional.
Parecer do Ministério Público Federal pelo regular prosseguimento do feito (Id.:158806055).
É O RELATÓRIO.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5081254-26.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: ELLEN NOVAES
Advogado do(a) APELANTE: ARLETE ALVES DOS SANTOS MAZZOLINE - SP141845-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
A EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora): Recebo a apelação
interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de sua regularidade
formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
MÉRITO
O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.
O Benefício da Prestação Continuada (BPC) consiste na garantia de um salário mínimo mensal
ao idoso com 65 anos ou mais ou pessoa com deficiência de qualquer idade com impedimentos
de natureza física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo (que produza efeitos pelo
prazo mínimo de 2 anos), que o impossibilite de participar, em igualdade de condições, com as
demais pessoas da vida em sociedade de forma plena e efetiva. Tratando-se de benefício
assistencial, não há período de carência, tampouco é necessário que o requerente seja
segurado do INSS ou desenvolva alguma atividade laboral, sendo imprescindível, porém, a
comprovação da hipossuficiência própria e/ou familiar.
O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal garante o benefício em comento às pessoas
com deficiência que não possuam meios de prover à sua própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família.
A previsão deste benefício guarda perfeita harmonia com a Constituição de 1988, que
hospedou em seu texto princípios que incorporam exigências de justiça e valores éticos, com
previsão de tarefas para que o Estado proceda à reparação de injustiças.
A dignidade humana permeia todas as matérias constitucionais, sendo um valor supremo. E a
cidadania não se restringe ao seu conteúdo formal, sendo a legitimidade do exercício político
pelos indivíduos apenas uma das vertentes da cidadania, que é muito mais ampla e tem em seu
conteúdo constitucional a legitimidade do exercício dos direitos sociais, culturais e econômicos.
Os Princípios Fundamentais previstos no artigo 3º da Constituição Federal de 1988, voltados
para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, objetivando a erradicação da
pobreza e a redução das desigualdades sociais e regionais, dão suporte às normas públicas
voltadas ao amparo de pessoas em situação de miséria.
No mais, destaco que o julgamentos dos casos de LOAS, pela análise do cabimento ou não da
percepção do Benefício de Prestação Continuada (BPC) contribui para o cumprimento da Meta
9 do CNJ,que prevê a integração da Agenda 2030 da ONU pelo Poder Judiciário, guardando
especial consonância os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável de número 1 e 2 (ODS 1 e
2) desta Agenda, qual sejam: "erradicação da pobreza; e fome zero”, especialmente com as
metas1.3“Implementar, em nível nacional, medidas e sistemas de proteção social adequados,
para todos, incluindo pisos, e até 2030 atingir a cobertura substancial dos pobres e vulneráveis
(...)”; e 2.1“Até 2030, acabar com a fome e garantir o acesso de todas as pessoas, em particular
os pobres e pessoas em situações vulneráveis, incluindo crianças, a alimentos seguros,
nutritivos e suficientes durante todo o ano.”
É com esse espírito que o benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V da Carta deve
ser compreendido.
O §2º do artigo 20 da Lei 8742/1993, define pessoa com deficiência como aquela que tem
impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em
interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
O conceito adotado pela ONU (Organização das Nações Unidas), na Convenção Sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência, ingressou formalmente no ordenamento pátrio com a
ratificação desta Convenção e promulgado pelo Decreto nº 6.949/2009. Em 2015, com a Lei
13.146/2015, o conceito de pessoa com deficiência foi ampliado. A norma preceitua que as
barreiras limitadoras não precisam ser "diversas", não precisam se "somar", bastando a
presença de única limitação. Ao mesmo tempo, verifica-se que as limitações de que trata a Lei
atual ampliam a noção de incapacidade pura e simples para o trabalho e para a vida
independente, para a análise da situação de vulnerabilidade do requerente pelo conjunto de
circunstâncias capazes de impedir a integração justa, plena e igualitária na sociedade daquele
que necessita de proteção social.
Nesse sentido, as avaliações de que trata o §6º do artigo 20, que sujeita a concessão do
benefício às avaliações médica e social, devendo a primeira considerar as deficiências nas
funções e nas estruturas do corpo do requerente, e, a segunda, os fatores ambientais, sociais e
pessoais a que está sujeito.
Insta salientar, ainda, que o fato de a incapacidade ser temporária não impede a concessão do
benefício, nos termos da Súmula 48 da TNU:
"A incapacidade não precisa ser permanente para fins de concessão do benefício assistencial
de prestação continuada".
No que diz respeito ao requisito socioeconômico, ainda que o § 3º do artigo 20 da Lei
8.742/1993, com redação dada pela recente MP 1.023/2020, considere como hipossuficiente
para consecução deste benefício pessoa incapaz de prover a sua manutenção por integrar
família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo (critério a
ser submetido à apreciação do Congresso Nacional), fato é que a jurisprudência entende
bastante razoável a adoção de ½ (meio) salário mínimo como parâmetro, eis que os programas
de assistência social no Brasil utilizam atualmente o valor demeio saláriomínimo como
referencial econômico para a concessão dos respectivos benefícios, tendo referido o Programa
Nacional de Acesso à Alimentação - Cartão Alimentação (Lei n.º 10.689/03), o Programa Bolsa
Família - PBF (Lei n.º 10.836/04), o Programa Nacional de Renda Mínima Vinculado à
Educação - Bolsa Escola (Lei 10.219/2001), Programa Nacional de Renda Mínima Vinculado à
Saúde - Bolsa Alimentação (MP 2.206-1/2001) Programa Auxílio-Gás (Decreto n.º 4.102/2002),
Cadastramento Único do Governo Federal (Decreto 3.811/2001).
Neste sentido, o E. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 567985/MT (18-04-13),
com repercussão geral reconhecida, revendo o seu posicionamento anterior (ADI nº 1.232/DF e
Reclamações nº 2303/RS e 2298/SP), reconheceu e declarou,incidenter tantum, a
inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93, que
estabelecia a renda familiar mensalper capitainferior a ¼ do salário mínimo para a concessão
de benefício a idosos ou deficientes, em razão da defasagem do critério caracterizador da
miserabilidade contido na mencionada norma. Segundo o Relator do acórdão, Min. Gilmar
Mendes, os programas de assistência social no Brasil utilizam atualmente o valor demeio
saláriomínimo como referencial econômico.
O §11 do artigo 20, incluído pela Lei 13.146/2015, normatizou que a comprovação da
miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade do requerente podem ser
aferidos por outros elementos probatórios, além da limitação da renda per capita familiar.
Com efeito, cabe ao julgador avaliar o estado de necessidade daquele que pleiteia o benefício,
consideradas suas especificidades, não devendo se ater à presunção absoluta de
miserabilidade que a renda per capita sugere: Precedentes do C. STJ: AgRg no AREsp
319.888/PR, 1ª Turma, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJE 03/02/2017; AgRg no
REsp 1.514.461/SP, 2ª Turma, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJE 24/05/2016; REsp
1.025.181/RS, 6ª Turma, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJE 29/09/2008).
No caso dos autos, o inconformismo da parte autora não procede, devendo ser mantida a r.
sentença monocrática (Id.:158311122).
No que tange à incapacidade, olaudo pericial atestou ser a autora portadora de hemangioma
cavernoso,estandoincapacitada de formaparcial e definitiva com limitações para exercer
atividades de sobrecarga com os braços(Id.:158311068).
Em que pese nunca ter exercido atividade laborativa, observa-se que a autora é
jovem(atualmente com 42anos) e possui o ensino médio completo,sendo possível sua
colocação no mercado de trabalho, ainda que com limitações.
Entendo, assim, que o laudo pericial foi exaustivo e preciso ao atestar que a autora não possui
efetivo impedimento ou incapacidade para atividade laboral, ou inserção no meio social, sendo
capaz de exercer suas atividades habituais de forma plenamente autônoma.
Não comprovada a deficiência ou incapacidade de longo prazo, torna-se desnecessária a
análise de eventual situação de hipossuficiência da parte autora, por se tratarem de requisitos
cumulativos para a concessão do benefício.
Assim, inexistindo outras provas em contrário, entendo que a autora não demonstrou preencher
os requisitos legais, notadamente, os que dizem respeito à deficiência total e permanente, de
modo que não faz jus ao benefício assistencial requerido.
Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11, como
um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos
honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte
contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os
limites estabelecidos na lei.
Assim, desprovido o apelo da parte autora interposto na vigência da nova lei, os honorários
fixados na sentença devem, no caso, ser majorados em 2%, nos termos do art. 85, parágrafo
11, do CPC/2015, observada a suspensão prevista no artigo 98, parágrafo 3º, da mesma lei.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à Apelação da parte AUTORA, condenando-aao
pagamento dos honorários recursais, na forma antes delineada,mantendo íntegra a sentença
recorrida.
É COMO VOTO.
/gabiv/gvillela
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. LOAS. DEFICIÊNCIA NÃO COMPROVADA.
REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.VERBA HONORÁRIA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA
DESPROVIDA.SENTENÇA MANTIDA.
1 - O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.
2 - A concessão do benefício assistencial (LOAS) requer o preenchimento concomitante do
requisito de deficiência/idade e de miserabilidade. Requisitos legais não preenchidos.
3 -Olaudo pericial foi exaustivo e preciso ao atestar que a autora não possui efetivo
impedimento ou incapacidade para atividade laboral, ou inserção no meio social, sendo capaz
de exercer suas atividades habituais de forma plenamente autônoma, de modo que não faz jus
ao benefício requerido.
4 - Não comprovada a deficiência ou incapacidade de longo prazo, torna-se desnecessária a
análise de eventual situação de hipossuficiência da parte autora, por se tratarem de requisitos
cumulativos para a concessão do benefício.
5 - Desprovido o apelo da parte autora interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados
na sentença devem, no caso, ser majorados em 2%, nos termos do art. 85, parágrafo 11, do
CPC/2015, observada a suspensão prevista no artigo 98, parágrafo 3º, da mesma lei.
6 - Apelação da parte autora desprovida. Sentença mantida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora, condenando-a ao
pagamento dos honorários recursais, mantendo íntegra a sentença recorrida, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
