Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5000277-25.2016.4.03.6183
Relator(a)
Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
18/08/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 21/08/2020
Ementa
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL/5000277-25. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO
DE CONTRIBUIÇÃO. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS.AGENTE QUÍMICO.
HIDROCARBONETO. EPI. HABITUALIDADE DA EXPOSIÇÃO. INDICADOR IEAN.
ESPECIALIDADE RECONHECIDA. LIMITAÇÃO DO ARTIGO 57, §8°, DA LEI 8.213/91. JUROS
DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS RECURSAIS. APELAÇÃO
CONHECIDA EM PARTE E DESPROVIDA.
- Recebida a apelação interposta tempestivamente, conforme certificado nos autos e observância
da regularidade formal, nos termos do Código de Processo Civil/2015.
- A aposentadoria por tempo de contribuição integral, antes ou depois da EC/98, necessita da
comprovação de 35 anos de serviço, se homem, e 30anos, se mulher, além do cumprimento da
carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos já filiados quando do advento da
mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de
implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de
meses de contribuição inferior aos 180 exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II. O art.
4º, por sua vez, estabeleceu que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente deve ser
considerado como tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no regime geral da
previdência social (art. 55 da Lei 8213/91).
- Sobre o tempo de atividade especial, o artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A
aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a
saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme
dispuser a lei". Considerando a evolução da legislação de regência pode-se concluir que (i) a
aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido trabalho
permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou integridade
física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao
labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de
reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento,
desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o labor exercido de
forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja
indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as condições de trabalho
podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral
(PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030
e CAT) ou outros meios de prova.
- Com relação aos agentes hidrocarbonetos, é considerado especial o labor realizado pelo
indivíduo que fica exposto, de forma habitual e permanente, a agentes químicos (hidrocarbonetos
e derivados e outros tóxicos inorgânicos), conforme estabelecido pelos itens 1.2.9 e 1.2.11, do
Quadro do Decreto nº 53.831/64; e 1.2.10 e 1.2.11, do Anexo I do Decreto nº 83.080/79 e 1.0.17
e 1.0.19 dos Decretos 2.172/97 e 3.048/99.
- Segundo o Anexo 13, da NR-15 do Ministério do Trabalho, a exposição do trabalhador a
agentes químicos à base de hidrocarbonetos tem sua intensidade medida a partir de análise
qualitativa, bastando apenas o contato físico para caracterização da especialidade do labor.
- Apresentando o segurado prova que indique sua exposição a um agente nocivo, e inexistindo
prova de que o EPI eventualmente fornecido ao trabalhador era efetivamente capaz de neutralizar
a nocividade do ambiente laborativo, a configurar uma dúvida razoável no particular, deve-se
reconhecer o labor como especial.
- Constando da perícia que o segurado ficava exposto a agente nocivo, seja pela simples
presença do agente no ambiente, ou porque estava acima do limite de tolerância, deve-se
concluir que tal exposição era, nos termos do artigo 65, do RPS - Regulamento da Previdência
Social, habitual, não ocasional nem intermitente e indissociável da produção do bem ou da
prestação do serviço.
-Ressalte-seque no modelo de PPP concebido pelo INSS não existe campo específico
àhabitualidade e permanência de exposição ao agente nocivo, não podendo serexigidamenção
expressa em talformulário.
- É possível a averbação dos intervalos como especial, quando o CNIS apresenta o indicador
IEAN (Indicador de Exposição de Agente Nocivo), bem como quando a empresa esteve sujeita ao
pagamento da contribuição descrita no art. 22, inciso II, da Lei 8.212/91 (SAT), o qual custeia as
aposentadorias especiais. O indicativo IEAN é hábil para a comprovação da atividade especial,
porquanto as informações do CNIS gozam de presunção de veracidade, consoante disposto no
art. 19 do Decreto 3.048/99. Precedente desta C. Turma. Ademais, o próprio Conselho de
Recursos da Previdência Social admite a averbação do labor especial com base no indicador
IEAN.
- Não se conhece das alegações relativas à exposição ao agente eletricidade, pois versam sobre
questão estranha ao feito, sendo as razões recursais, no particular, dissociadas da sentença
apelada.
- Nos termos assentados pelo Supremo Tribunal Federal - STF, ao apreciar o RE 79161/PR, pela
sistemática da repercussão geral da matéria (art. 543-B do CPC/1972), foi reconhecida a
constitucionalidade do artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91. No entanto, o segurado que tem o seu
pedido de aposentadoria especial indeferido pelo INSS e que, posteriormente, tenha seu direito à
aposentadoria especial reconhecido no âmbito judicial, faz jus ao recebimento dos valores
atrasados de tal benefício, desde a data do requerimento administrativo até a data da efetiva
implantação (administrativa ou judicial) da aposentadoria, ainda que tenha continuado a laborar
em condições especiais nesse intervalo de tempo.
- Uma vez implantada a aposentadoria especial deferida neste processo e comunicado tal fato à
parte autora, o INSS poderá cassar referido benefício, em regular processo administrativo, se vir
a ser apurado que a parte autora não se desligou ou retornou a laborar em atividades especiais.
- Reconhecida a especialidade dos períodos pleiteados, somados aos demais períodos já
reconhecidos, totalizam mais de 25 anos de tempo especial, fazendo o autor jus à aposentadoria
por tempo especial.
- Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de
2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial -
IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do
julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de
Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração
opostos pelo INSS.
- Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte
alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos
Tribunais Superiores.
- Não obstante desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, não há que se
determinar a majoração dos honorários de sucumbência, pois, não tendo a sentença estabelecido
o seu valor, cumpre ao juiz da execução, quando fixá-los, já levar em conta o trabalho
desempenhado pelo advogado em grau de recurso.
- Apelação conhecida em parte e desprovida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000277-25.2016.4.03.6183
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIZ FERNANDO DA SILVA PRATA
Advogados do(a) APELADO: SONIA REGINA USHLI - SP228487-A, FERNANDA USHLI RACZ -
SP308879-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000277-25.2016.4.03.6183
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIZ FERNANDO DA SILVA PRATA
Advogados do(a) APELADO: SONIA REGINA USHLI - SP228487-A, FERNANDA USHLI RACZ -
SP308879-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de
apelação interposta contra sentença que julgou procedente o pedido deduzido na inicial, nos
seguintes termos (ID 20382999):
"LUIZ FERNANDO DA SILVA PRATA, com qualificação nos autos, propôs a presente demanda,
sob o procedimento comum, em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL,
objetivando, em síntese, a revisão da aposentadoria por tempo de contribuição, com a conversão
em aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de períodos especiais.
(...)
Inicialmente, não se verifica a necessidade da realização da perícia técnica requerida pelo autor,
haja vista os documentos contidos nos autos.
O autor objetiva a revisão da aposentadoria por tempo de contribuição, com a conversão em
aposentadoria especial, mediante o reconhecimento da especialidade do período de 06/03/1997 a
31/05/2004 (CPTM).
Narra que o pedido de aposentadoria foi requerido três vezes (NB 159.799.777-0, 161.390.018-4
e 165.636.186-7), sendo concedida a aposentadoria por tempo de contribuição na última DER.
Sustenta, contudo, que já teria preenchido os requisitos para a aposentadoria especial desde a
primeira DER, em 23/03/2012.
Consoante se observa das decisões administrativas do INSS (ids 611965, fl. 17, 611974, fls. 01-
06, e 1177640), os lapsos de 09/09/1983 a 18/12/1984 (GERDAU), 28/01/1985 a 05/03/1997
(CPTM) e 01/06/2004 a 10/07/2013 (CPTM) já foram reconhecidos como especiais, sendo,
portanto, incontroversos.
Remanesce, assim, a aferição do período de 06/03/1997 a 31/05/2004. Nesse passo, o extrato do
CNIS, em anexo, demonstra que foi reconhecida a especialidade do labor desenvolvido na
CPTM, entre 28/01/1985 e 06/2018. Nota-se que consta o indicador IEAN (“Exposição da Agente
Nocivo”) junto ao aludido vínculo. Por estar inserida no CNIS, tal informação goza de presunção
de veracidade, conforme disposto no artigo 19 do Decreto nº 3.048/99. Além disso, infere-se que
o IEAN aponta que a empresa esteve sujeita ao pagamento da contribuição do artigo 22, II, da Lei
nº 8.212/91 (SAT), que financia justamente as aposentadorias especiais. Dessa forma, exigir a
contribuição (SAT) e negar o benefício (aposentadoria especial ou reconhecimento da
especialidade do vínculo) representaria contraditoriamente reconhecer a especialidade de um
lado e negá-la de outro, em afronta à regra da contrapartida prevista no artigo 195, §5º, da
Constituição da República. Portanto, havendo o indicador IEAN, presume-se que o INSS
reconhecera a especialidade do vínculo correspondente, de modo que reconheço a especialidade
do lapso de 06/03/1997 a 31/05/2004.
Computando-se o lapso especial supramencionado, junto com os demais interregnos especiais
reconhecidos administrativamente, verifica-se que o segurado, na DER do benefício NB
159.799.777-0, em 23/03/2012, totaliza 28 anos, 05 meses e 06 dias de tempo especial, conforme
tabela abaixo, suficiente para a concessão da aposentadoria especial pleiteada nos autos.
(...)
Quanto à alegação do INSS no sentido de que o termo inicial do benefício seja fixado a partir da
citação, não merece prosperar, pois, como salientado antes, o Superior Tribunal de Justiça firmo
entendimento de que a comprovação extemporânea da implementação dos requisitos para a
concessão de aposentadoria em data anterior não tem o condão de afastar o direito adquirido ao
benefício desde a data do requerimento administrativo.
Ressalte-se, por fim, que não há que se falar em prescrição de nenhuma das parcelas devidas,
haja vista que a DER ocorreu em 2012, sendo a demanda proposta em 2016.
Diante do exposto, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Novo Código de Processo Civil (Lei nº
13.105/2015), julgo PROCEDENTE a demanda para, reconhecendo o período especial de
06/03/1997 a 31/05/2004, e somando-o aos lapsos especiais já computados administrativamente,
converter a aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial sob NB
159.799.777-0, num total de 28 anos, 05 meses e 06 dias de tempo especial, conforme
especificado na tabela acima, com o pagamento das parcelas a partir de 23/03/2012, pelo que
extingo o processo com resolução de mérito.
Deixo de conceder a tutela antecipada, porquanto a parte autora já é beneficiária de
aposentadoria por tempo de contribuição, não restando configurado risco de dano irreparável ou
de difícil reparação.
Os valores em atraso, dos quais deverão ser descontados benefícios inacumuláveis, e parcelas já
pagas administrativamente ou por força de decisão judicial, deverão ser atualizados nos termos
da legislação previdenciária, bem como da Resolução n.º 267, de 02 de dezembro de 2013, do
Conselho da Justiça Federal, que aprovou o Manual de Orientação de Procedimentos para os
cálculos na Justiça Federal, respeitados os parâmetros da questão de ordem nas ADIs nº 4.357 e
4.425, igualmente aplicáveis à fase de conhecimento, conforme decidido no RE nº 870.947/SE.
Os juros de mora devidos à razão de 6% (seis por cento) ao ano, contados a partir da citação,
nos termos do artigo 219 do Código de Processo Civil. A partir da vigência do novo Código Civil,
Lei n.º 10.406/2002, deverão ser computados nos termos do artigo 406 deste diploma, em 1%
(um por cento) ao mês, nesse caso até 30/06/2009. A partir de 1.º de julho de 2009, incidirão,
uma única vez, até a conta final que servir de base para a expedição do precatório, para fins de
juros de mora, os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de
poupança, nos termos do artigo 1º-F, da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº
11.960/2009.
Sem custas para a autarquia, em face da isenção de que goza.
Condeno o Instituto Nacional do Seguro Social ao pagamento de honorários advocatícios, que
fixo sobre o valor da condenação, considerando as parcelas vencidas até a sentença, nos termos
da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça. Para evitar maiores discussões, passo a
esclarecer desde já que o percentual será o mínimo estabelecido nos incisos do §3º do artigo 85
do Novo Código de Processo Civil, conforme o valor a ser definido na liquidação do julgado. Em
outros termos, se, quando da liquidação do julgado, for verificado que a condenação não
ultrapassa os limites do inciso I do §3º do artigo 85 (até 200 salários-mínimos), o percentual de
honorários será de 10% sobre as prestações vencidas até a data da sentença; se a condenação
se enquadrar nos limites do inciso II (200 até 2000 salários-mínimos), o percentual será de 8%
das prestações vencidas até a sentença, e assim por diante."
Em suas razões de apelação, sustenta o INSS que (ID 20383004):
- não restou comprovado que, em todo o período de trabalho, o autor desenvolvia atividade com
exposição ao agente eletricidade, pois não foram apresentados laudos técnicos para os períodos
pleiteados, obrigatórios a partir da Lei 9.032/95;
- os períodos requeridos não podem ser reconhecidos por enquadramento na categoria e, após
05.03.1997, a eletricidade foi excluída da lista de agentes agressivos, daí porque, mencionada
data é o limite para o reconhecimento do tempo especial;
- o registro em CTPS constitui apenas indício de que o titular exerceu a atividade ali registrada,
sendo imprescindível a apresentação de relatório firmado pelo empregador (SB-40, DISES SE
5235, DSS 8030 ou PPP), que especifique a real atividade do empregado;
- embora o autor sustente ter exercido a função de eletricista, não apresentou qualquer
documento a comprovar satisfatoriamente a exposição a eletricidade em alta voltagem de forma
permanente, sendo certo, ainda, que há forte indício de que ocupava cargo administrativo, dado o
valor de sua remuneração mensal superior a R$ 15.000,00, conforme CNIS juntado com a
contestação;
- o judiciário não pode afastar a eficácia do uso de EPI sem apresentar fundamentação para
tanto;
- a correção monetária e os juros de mora das dívidas da Fazenda Pública devem respeitar o
disposto no art. 1º-F, da Lei nº 9.494/97, com observação da redação dada pela Lei nº 11.960/09.
Subsidiariamente, requer a suspensão do feito até o trânsito em julgado da decisão do STF no
RE 870.947.
Com contrarrazões da autora (ID 20383009), os autos vieram a esta E. Corte Regional.
Justiça gratuita deferida (ID 20382531).
É O RELATÓRIO.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000277-25.2016.4.03.6183
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIZ FERNANDO DA SILVA PRATA
Advogados do(a) APELADO: SONIA REGINA USHLI - SP228487-A, FERNANDA USHLI RACZ -
SP308879-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Por primeiro,
recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua
regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Codex processual.
REGRA GERAL PARA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO
Como é sabido, pela regra anterior à Emenda Constitucional 20, de 16.12.98 (EC 20/98), a
aposentadoria por tempo de serviço (atualmente denominada aposentadoria por tempo de
contribuição) poderia ser concedida na forma proporcional, ao segurado que completasse 25
(vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30 (trinta) anos de serviço, se do sexo
masculino, restando assegurado o direito adquirido, para aquele que tivesse implementado todos
os requisitos anteriormente a vigência da referida Emenda (Lei 8.213/91, art. 52).
Após a EC 20/98, aquele que pretende se aposentar com proventos proporcionais impõe-se o
cumprimento das seguintes condições: estar filiado ao RGPS quando da entrada em vigor da
Emenda; contar com 53 anos de idade, se homem, e 48 anos de idade, se mulher; somar no
mínimo 30 anos, homem, e 25 anos, mulher, de tempo de serviço; e adicionar o "pedágio" de
40% sobre o tempo faltante ao tempo de serviço exigido para a aposentadoria proporcional.
Vale lembrar que, para os segurados filiados ao RGPS posteriormente ao advento da EC/98, não
há mais que se falar em aposentadoria proporcional, sendo extinto tal instituto.
De outro lado, comprovado o exercício de 35 (trinta e cinco) anos de serviço, se homem, e 30
(trinta) anos, se mulher, concede-se a aposentadoria na forma integral, pelas regras anteriores à
EC 20/98, se preenchido o requisito temporal antes da vigência da Emenda, ou pelas regras
permanentes estabelecidas pela referida Emenda, se após a mencionada alteração constitucional
(Lei 8.213/91, art. 53, I e II).
Ressalta-se que, além do tempo de serviço, deve o segurado comprovar, também, o cumprimento
da carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos já filiados quando do advento da
mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de
implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de
meses de contribuição inferior aos 180 exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II.
Registro que a regra transitória introduzida pela EC 20/98, no art. 9º, aos já filiados ao RGPS,
quando de sua entrada em vigor, impõe para a aposentadoria integral o cumprimento de um
número maior de requisitos (requisito etário e pedágio) do que os previstos na norma
permanente, de sorte que sua aplicabilidade tem sido afastada pelos Tribunais.
Ainda, insta salientar que o art. 4º, da referida Emenda estabeleceu que o tempo de serviço
reconhecido pela lei vigente deve ser considerado como tempo de contribuição, para efeito de
aposentadoria no regime geral da previdência social (art. 55 da Lei 8213/91).
E, nos termos do artigo 55, §§1º e 3º, da Lei 8.213/1991, a comprovação do tempo de serviço em
atividade urbana, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de
tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme
preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente
testemunhal.
No que tange à possibilidade do cômputo da atividade laborativa efetuada pelo menor de idade, o
próprio C. STF entende que as normas constitucionais devem ser interpretadas em benefício do
menor.
Por conseguinte, a norma constitucional que proíbe o trabalho remunerado a quem não possua
idade mínima para tal não pode ser estabelecida em seu desfavor, privando o menor do direito de
ver reconhecido o exercício da atividade laborativa, para fins do benefício previdenciário (ARE
1045867, Relator: Ministro Alexandre de Moraes, 03/08/2017, RE 906.259, Rel: Ministro Luiz Fux,
in DJe de 21/09/2015).
Nesse sentido os precedentes desta E. 7ª Turma: AC nº 2016.03.99.040416-4/SP, Rel. Des. Fed.
Toru Yamamoto, DJe 13/03/2017; AC 2003.61.25.001445-4, Rel. Des. Fed. Carlos Delgado, DJ
09/04/2018.
Por fim, as anotações de vínculos empregatícios constantes da CTPS do segurado tem
presunção de veracidade relativa, cabendo ao INSS o ônus de provar seu desacerto, caso o
contrário, representam início de prova material, mesmo que não constem do Cadastro Nacional
de Informações Sociais - CNIS.
Nesse sentido a Súmula 75 da TNU: "A Carteira de Trabalho e Previdência social (CTPS) em
relação à qual não se aponta defeito formal que lhe comprometa a fidedignidade goza de
presunção relativa de veracidade, formando prova suficiente de tempo de serviço para fins
previdenciários, ainda que a anotação de vínculo de emprego não conte no Cadastro Nacional de
Informações Sociais (CNIS)."
Em outras palavras, nos casos em que o INSS não trouxer aos autos qualquer prova que infirme
as anotações constantes na CTPS da parte autora, tais períodos devem ser considerados como
tempo de contribuição/serviço, até porque eventual não recolhimento das contribuições
previdenciárias devidas nesse período não pode ser atribuído ao segurado, nos termos do artigo
30, inciso I da Lei 8.212/1991. Precedentes desta C. Turma (TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA,
ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1344300 - 0005016-55.2005.4.03.6105, Rel.
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO, julgado em 27/11/2017, e-DJF3 Judicial 1
DATA:06/12/2017).
DO TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS - CONSIDERAÇÕES INICIAIS.
O artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A aposentadoria especial será devida, uma vez
cumprida a carência exigida nesta Lei (180 contribuições), ao segurado que tiver trabalhado
sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15
(quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei".
Desde a edição da Lei 9.032/95, que conferiu nova redação ao artigo 57, §§ 3º e 4º, da Lei
8.213/91, o segurado passou a ter que comprovar o trabalho permanente em condições especiais
que prejudiquem a sua saúde ou a sua integridade física; a efetiva exposição a agentes físicos,
químicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou integridade física. Até
então, reconhecia-se a especialidade do labor de acordo com a categoria profissional,
presumindo-se que os trabalhadores de determinadas categorias se expunham a ambiente
insalubre.
O RPS - Regulamento da Previdência Social, no seu artigo 65, reputa trabalho permanente
"aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do
empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja indissociável da
produção do bem ou da prestação do serviço". Não se exige, portanto, que o trabalhador se
exponha durante todo o período da sua jornada ao agente nocivo.
Consoante o artigo 58, da Lei 8.213/91, cabe ao Poder Público definir quais agentes configuram o
labor especial e a forma como este será comprovado. A relação dos agentes reputados nocivos
pelo Poder Público é trazida, portanto, por normas regulamentares, de que é exemplo o Decreto
n. 2.172/97. Contudo, se a atividade exercida pelo segurado realmente importar em exposição a
fatores de risco, ainda que ela não esteja prevista em regulamento, é possível reconhecê-la como
especial . Segundo o C. STJ, "As normas regulamentadoras que estabelecem os casos de
agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como
distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao
obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições
especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991)" (Tema Repetitivo 534, REsp 1306113/SC).
Diante das inúmeras alterações dos quadros de agentes nocivos, a jurisprudência consolidou o
entendimento no sentido de que deve se aplicar, no particular, o princípio tempus regit actum,
reconhecendo-se como especiais os tempos de trabalho se na época respectiva a legislação de
regência os reputava como tal.
Tal é a ratio decidendi extraída do julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do
art. 543-C do CPC/73, no qual o C. STJ firmou a tese de que "O limite de tolerância para
configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no
período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do
Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o
patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).
Já quanto à conversão do tempo de trabalho, deve-se obedecer à legislação vigente no momento
do respectivo requerimento administrativo, o que também já foi objeto de decisão proferida pelo
C. STJ em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva (art. 543-C, do CPC/73), no
qual se firmou a seguinte tese: "A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito
à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à
época da prestação do serviço" (Tese Repetitiva 546, REsp 1310034/PR).
As condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de
proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE
5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT), sem prejuízos de outros meios de prova, sendo de se
frisar que apenas a partir da edição do Decreto 2.172, de 05.03.1997, tornou-se exigível a
apresentação de laudo técnico a corroborar as informações constantes nos formulários, salvo
para o agente ruído e calor, que sempre exigiu laudo técnico.
Desde 01.01.2004, é obrigatório o fornecimento aos segurados expostos a agentes nocivos do
PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário, documento que retrata o histórico laboral do
segurado, evidencia os riscos do respectivo ambiente de trabalho e consolida as informações
constantes nos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral antes
mencionados.
No julgamento do ARE 664335, o E. STF assentou a tese segundo a qual "o direito à
aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua
saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de
neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial". Nessa
mesma oportunidade, a Corte assentou ainda que "na hipótese de exposição do trabalhador a
ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil
Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI),
não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
Nos termos do artigo 57, §5°, da Lei 8.213/91, admite-se a conversão de tempo de atividade
especial para comum, devendo-se observar a tabela do artigo 70, do Decreto 3.048/99, a qual
estabelece (i) o multiplicador 2,00 para mulheres e 2,33 para homens, nos casos em que
aposentadoria especial tem lugar após 15 anos de trabalho; (ii) o multiplicador 1,50 para mulheres
e 1,75 para homens, nos casos em que aposentadoria especial tem lugar após 20 anos de
trabalho; e (iii) o multiplicador 1,2 para mulheres e 1,4 para homens, nos casos em que
aposentadoria especial tem lugar após 25 anos de trabalho.
Pelo exposto, pode-se concluir que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que
comprovar ter exercido trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente
nocivo à sua saúde ou integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido
em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como
nociva para fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não
previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se
permanente o labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do
segurado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e
(iv) as condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de
proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE
5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
DOS AGENTES QUÍMICOS HIDROCARBONETOS
Com relação aos agentes hidrocarbonetos, é considerado especial o labor realizado pelo
indivíduo que fica exposto, de forma habitual e permanente, a agentes químicos (hidrocarbonetos
e derivados e outros tóxicos inorgânicos), conforme estabelecido pelos itens 1.2.9 e 1.2.11, do
Quadro do Decreto nº 53.831/64; e 1.2.10 e 1.2.11, do Anexo I do Decreto nº 83.080/79 e 1.0.17
e 1.0.19 dos Decretos 2.172/97 e 3.048/99.
O laudo técnico fornecido pela empresa (ID 20382518, págs. 4/7) revela que, no período em
questão, a parte autora ficou exposta aos agentes químicos graxa, óleo, solventes, gases e fumos
metálicos, de forma habitual e permanente, o que impõe o reconhecimento do trabalho em
condições especiais nesse período.
Nessa linha:
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. REMESSA NECESSÁRIA. APOSENTADORIA POR TEMPO
DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. AGENTES
QUÍMICOS. PROCESSO PRODUTIVO. DEMONSTRAÇÃO. DESNECESSIDADE. EPI EFICAZ.
EXPOSIÇÃO PERMANENTE. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. DIB. JUROS E
CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. HONORÁRIOS
DE ADVOGADO MANTIDOS. TUTELA ANTECIPADA. SUBSTITUIÇÃO IMEDIATA DO
BENEFÍCIO.
(...) 4. A exposição habitual e permanente a agentes químicos (diclorometano, ácido perclorídrico,
ácido acético glacial, ácido clorídrico, ácido fosfórico, ácido fluorídrico, ácido fórmico, ácido
sulfúrico, etanol, acetona, bromo, formol, soda cáustica) torna a atividade especial, enquadrando-
se nos códigos 1.2.9 e 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64 e no item 1.2.10 do Decreto nº 83.080/79.
(...)
15. Sentença corrigida de ofício. Apelação do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS e
remessa necessária parcialmente providas.
(TRF 3ª Região, AC nº 0002415-40.2014.4.03.6112, Relator Desembargador Federal Paulo
Domingues, 7ª Turma, DE 28/11/2018)
Segundo o Anexo 13, da NR-15 do Ministério do Trabalho, a exposição do trabalhador a agentes
químicos à base de hidrocarbonetos tem sua intensidade medida a partir de análise qualitativa,
bastando apenas o contato físico para caracterização da especialidade do labor.
Nesse sentido é o entendimento desta Colenda 7ª Turma de Julgamentos:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE
ESPECIAL COMPROVADA EM PARTE. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. REQUSITOS
COMPROVADOS. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. APELAÇÃO DA PARTE
AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Alega a parte autora que exerceu atividades consideradas especiais por um período de tempo
suficiente para a concessão do benefício de aposentadoria especial, previsto nos artigos 57 e 58
da Lei nº 8.213/91.
2. No presente caso, da análise da documentação acostada aos autos, e de acordo com a
legislação previdenciária vigente à época, a parte autora comprovou o exercício de atividades
especiais nos seguintes períodos:
- 01/07/1991 a 31/10/1992, de 01/11/1992 a 31/05/1994, de 01/06/1994 a 09/12/1997, - e de
17/02/1999 a 19/03/2008, ficando exposto de modo habitual e permanente a produtos químicos
(hidrocarbonetos): óleos, graxas, thinner, lubrificadores, ciclosol e gás butano, enquadradas nos
códigos 1.2.11, Anexo III do Decreto nº 53.831/64, códigos 1.2.10, Anexo I do Decreto nº
83.080/79, código 1.0.17, Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 e código 1.0.17, Anexo IV do Decreto
nº 3.048/99 (formulário, fls. 150/156, e Perfil Profissiográfico Previdenciário, 81/81v).
3. Cumpre esclarecer, que a exposição aos agentes químicos à base de hidrocarbonetos tem sua
intensidade/concentração apurada de forma qualitativa, nos termos do Anexo 13 da NR-15, os
quais são considerados nocivos à saúde do trabalhador por serem notadamente cancerígenos,
bastando apenas o contato físico com tal agente.
9. Preliminar rejeitada. Apelação do INSS e Apelação da parte autora parcialmente providas.
(AC nº 0001879-77.2010.4.03.6109, 7ª Turma, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto,
DE 29/05/2018)
DO EPI EFICAZ OU NEUTRALIZADOR
Consoante já destacado, no julgamento do ARE 664335, o E. STF assentou a tese segundo a
qual "o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente
nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente
capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial".
Sendo assim, apresentando o segurado um PPP ou laudo que indique sua exposição a um
agente nocivo, e inexistindo prova de que o EPI eventualmente fornecido ao trabalhador era
efetivamente capaz de neutralizar a nocividade do ambiente laborativo, a configurar uma dúvida
razoável no particular, deve-se reconhecer o labor como especial.
Conforme se infere do Anexo XV, da Instrução Normativa 11/2006, do INSS, o campo 15.7 do
PPP deve ser preenchido com "S - Sim; N - Não, considerando se houve ou não a atenuação,
com base no informado nos itens 15.2 a 15.5, observado o disposto na NR-06 do TEM,
observada a observância: [...]".
Portanto, quando o PPP consigna que o EPI era eficaz, tal eficácia diz respeito à sua aptidão de
atenuar ou reduzir os efeitos do agente nocivo. Isso não significa, contudo, que o EPI era
"realmente capaz de neutralizar a nocividade". A dúvida, nesse caso, beneficia o trabalhador.
Noutras palavras, o fato de o PPP consignar que o EPI era "eficaz" (para atenuar os efeitos do
agente nocivo) não significa que tal equipamento era capaz de "neutralizar a nocividade". Logo,
não se pode, com base nisso, afastar a especialidade do labor, até porque, nos termos do artigo
264 § 5º, do RPS, "sempre que julgar necessário, o INSS poderá solicitar documentos para
confirmar ou complementar as informações contidas no PPP, de acordo com § 7º do art. 68 e
inciso III do art. 225, ambos do RPS".
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL/POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
SAPATEIRO. INDÚSTRIA DE CALÇADOS. MECÂNICO. PROFISSÕES NÃO PREVISTAS NOS
DECRETOS. LAUDO JUDICIAL. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL POR
SIMILARIDADE. AFASTADA. HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS. ENQUADRAMENTO
PARCIAL. AUSENTES REQUISITOS À OBTENÇÃO DE BENEFÍCIO. REMESSA OFICIAL NÃO
CONHECIDA. APELAÇÃO AUTORAL CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA
(...)
- Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na
legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do
trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
- Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover
o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
- Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em
regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a
nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto,
divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a
nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição
do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade
do agente.
- Sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico
Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou
não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de
preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à
real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
(...)
TRF 3ª Região, NONA TURMA, ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2228745 -
0001993-28.2015.4.03.6113, Rel. JUIZ CONVOCADO RODRIGO ZACHARIAS, julgado em
07/03/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/03/2018 )
HABITUALIDADE DA EXPOSIÇÃO
Constando do PPP que o segurado ficava exposto a agente nocivo, seja pela simples presença
do agente no ambiente , ou porque estava acima do limite de tolerância, deve-se concluir que tal
exposição era, nos termos do artigo 65, do RPS - Regulamento da Previdência Social, habitual,
não ocasional nem intermitente e indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço.
De fato, não se pode exigir menção expressa, no formulário, a habitualidade e permanência de
exposição ao agente nocivo, já que no modelo de PPP concebido pelo INSS não existe campo
específico para tanto.
Por tais razões, não há como acolher eventual assertiva de que não seria possível reconhecer a
especialidade do labor pelo fato de o PPP não consignar expressamente que a exposição era
habitual. Nesse sentido, a jurisprudência desta C. Turma: APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA
- 1773938 - 0008160-27.2011.4.03.6105, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS
DELGADO, julgado em 12/03/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/03/2018.
CASO CONCRETO
A sentença reconheceu o período de 06.03.1997 a 31.05.2004, trabalhado na CPTM, como
especial, em razão de constar no CNIS o indicador IEAN para o vínculo em análise.
As atividades executadas pelo autor, para o período, estão assim descritas no laudo técnico
fornecido pela empregadora (ID 20382518, págs. 4/7):
“Período: 01/05/96 até a Presente Data
Cargo: Supervisor de Manutenção
Local III: Oficina Lapa – Seção de Truques e Rodeiros, até 16/02/99; Departamento de
Manutenção de Via Permanente – Seção de Solda – Lapa de 17/02/99 até a Presente Data.
DESCRIÇÃO DETALHADA DA TAREFA EXECUTADA: O funcionário executava serviços
técnicos, auxiliando nos reparos, desenvolvimento, montagem e desmontagem de truques e
rodeiros, testes em via, com trens reformados, inspeções internas e externas de motores de
tração, geradores e alternadores, com ensaios mecânicos e elétricos; tais tarefas foram
executadas até 16/02/99, sendo que após esta data, até a presente, passou a supervisionar,
fiscalizar e orientar trabalhos de serviços na Oficina de Solda e ao longo das linha A/D, como:
carga e descarga de materiais, substituição de trilhos e componentes de AMV ou acidentais:
descarrilamentos e outras ocorrências que sejam necessários a solda, corte a maçarico,
iluminação, etc.; orientação dos encarregados na execução dos serviços que necessitem uso de
máquinas para iluminação de esmeril e chicote, serviços nas vias, soldando trilhos, no processo
aluminotérmico e elétrico, corte e furação de trilhos a maçarico, no trecho, a céu aberto com
exposição às intempéries.”
Foi informada, ainda, a exposição de modo habitual e permanente, não ocasional, nem
intermitente, aos agente químicos graxa, óleo, solventes, gases e fumos de solda, motivo
suficiente para o enquadramento da atividade como especial.
Ademais, conforme destacado na sentença, no extrato CNIS (ID 2038300) consta o indicador
IEAN (“Exposição a Agente Nocivo”) junto ao vínculo em exame.
Destarte, é possível a averbação do intervalo como especial, tendo em vista que o CNIS
apresenta o indicador IEAN (Indicador de Exposição de Agente Nocivo), bem como de que a
empresa esteve sujeita ao pagamento da contribuição descrita no art. 22, II, da Lei 8.212/91
(SAT), o qual custeia as aposentadorias especiais.
Destaco que o indicativo IEAN é hábil para a comprovação da atividade especial, porquanto as
informações do CNIS gozam de presunção de veracidade, consoante disposto no art. 19 do
Decreto 3.048/99. Nesse sentido, precedente desta C. Turma:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. REGRA “85/95”. REQUISITOS PREENCHIDOS. PRELIMINAR
REJEITADA. APELAÇÃO DO INSS IMPROVIDA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA
PARCIALMENTE PROVIDA.
1. A concessão da aposentadoria por tempo de serviço, hoje tempo de contribuição, está
condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91. 2.
Cumpre observar que a Medida Provisória n. 676, de 17.06.2015 (D.O.U. de 18.06.2015),
convertida na Lei n. 13.183, de 04.11.2015 (D.O.U. de 05.11.2015), inseriu o artigo 29-C na Lei n.
8.213/91 e criou hipótese de opção pela não incidência do fator previdenciário, denominada
"regra progressiva 85/95", quando, preenchidos os requisitos para a aposentadoria por tempo de
contribuição, a soma da idade do segurado e de seu tempo de contribuição, incluídas as frações,
for: a) igual ou superior a 95 (noventa e cinco pontos), se homem, observando o tempo mínimo de
contribuição de trinta e cinco anos; b) igual ou superior a 85 (oitenta e cinco pontos), se mulher,
observando o tempo mínimo de contribuição de trinta anos. 3. Ademais, as somas referidas no
caput e incisos do artigo 29-C do Plano de Benefícios computarão "as frações em meses
completos de tempo de contribuição e idade" (§ 1º), e serão acrescidas de um ponto ao término
dos anos de 2018, 2020, 2022, 2024 e 2026, até atingir os citados 90/100 pontos. 4. Ressalve-se,
ainda, que ao segurado que preencher o requisito necessário à concessão do benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição sem a aplicação do fator previdenciário será assegurado
o direito à opção com a aplicação da pontuação exigida na data do cumprimento do requisito,
ainda que assim não o requeira, conforme disposto no artigo 29-C, § 4º, da Lei 8.213/1991. 5. No
presente caso, as atividades exercidas pela parte autora nos períodos de 06/03/1997 a
29/03/2002, de 01/04/2002 a 30/11/2004 e de 03/03/2008 a 01/03/2011 teve sua especialidade
comprovada pelo indicador IEAN (“Exposição da Agente Nocivo”) conforme extrato do CNIS
(Num. 3112640 - Pág. 20), bem como há a informação de que a referida empresa esteve sujeita
ao pagamento da contribuição do artigo 22, II, da Lei nº 8.212/91 (SAT), que custeia as
aposentadorias especiais. 6. Ressalte-se, que tal informação goza de presunção de veracidade,
conforme disposto no artigo 19 do Decreto nº 3.048/99. 7. Cabe ressaltar, que o período
trabalhado pela parte autora de 10/07/2006 a 06/12/2014 no Senac, na função de “monitor” não
pode ser considerado insalubre, pois, em que pese constar do Perfil Profissiográfico
Previdenciário (Num.3112631 - Pág. 23/24) que estava exposto a agentes biológicos, verifico que
desempenhou atividades de cunho pedagógico, sem o efetivo contato com pacientes ou materiais
infectados. 8. E quanto ao período trabalhado pela parte autora de 01/12/2004 a 30/07/2006, não
há qualquer documento que comprove a sua exposição a agentes nocivos. 9. Desse modo,
computando-se os períodos de atividade especial reconhecidos na r. sentença recorrida,
somados aos demais períodos de atividade comum constantes da planilha de cálculo do INSS,
até o ajuizamento da
ação (05/08/2015), perfazem-se mais de 32 anos, conforme fixado na r. sentença (Num. 3112640
- Pág. 19), bem como totalizou a autora a idade de 53 (cinquenta e três) anos e 02 (dois) meses
de idade, atingindo mais de 85 pontos, suficientes para a obtenção de aposentadoria por tempo
de contribuição sem a aplicação do fator previdenciário, na forma prevista no art. 29-C da Lei
8.213/1991. (...)15. Preliminar rejeitada. Apelação do INSS improvida. Apelação da parte autora
parcialmente provida.
(TRF3, AC nº 5003730-57.2018.4.03.6183, Sétima Turma, Rel. Des. Fed. Toru Yamamoto, e-
DJF3: 19.09.2019)
Ademais, o próprio Conselho de Recursos da Previdência Social admite a averbação do labor
especial com base no indicador IEAN, in verbis:
"O período de 19/02/2002 a 01/04/2012, exercido na empresa Estaleiro Mauá Petro-Um S.A.,
deve ser enquadrado no Código 2.0.1, do Anexo IV ao Dec. nº 3.048/99, tendo em vista constar
informação de exposição a agentes nocivos e alíquota majorada, conforme artigo 22, II da Lei nº
8.212/91, bem como, contém o indicativo IEAN – Indicador de Vínculo com Remunerações que
possuem exposição a agente nocivo. Portanto, tem-se que não há impedimento para o
reconhecimento da natureza especial do lapso, eis que houve o correspondente custeio.
(Processo Administrativo nº 44232.001202/2014-24, APS Niterói – Barreto , NB nº
42/163.681.066-4, Rel. Julia Nojosa Lessa de Freitas)
Desta feita, incensurável a r. sentença que reconheceu a especialidade do labor no intervalo de
06.03.1997 a 31.05.2004.
Quanto às alegações trazidas em apelação, relativas à exposição ao agente eletricidade, o
recurso não merece conhecimento, pois versa sobre questão estranha ao feito, sendo as razões
recursais, no particular, dissociadas da sentença apelada. Friso que o reconhecimento da
especialidade, pela sentença, deu-se em razão de outros agentes.
Considerando o tempo de atividade especial reconhecido judicialmente, verifica-se, consoante
planilha contida na r. sentença, a qual ora ratifico, que o autor atingiu mais de 25 anos em
atividade especial, tempo suficiente para a concessão da aposentadoria especial.
Assevero que não houve insurgência quanto ao termo inicial do benefício, pelo que descabidas
quaisquer ponderações nesta sede recursal.
Assinalo, outrossim, que a sentença recorrida reconheceu a ocorrência da prescrição quinquenal,
daí porque desnecessária manifestação quanto ao tema.
DA LIMITAÇÃO DO ART. 57, §8º DA LEI 8.213/91
O artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, estabelece que "Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado
aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação que o
sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei". Já o artigo 46, da
Lei 8.231/91, determina que "o aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade
terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno".
A inteligência do artigo 57, §8° c.c o artigo 46, ambos da Lei 8.231/91, revela que o segurado que
estiver recebendo aposentadoria especial terá tal benefício cancelado se retornar voluntariamente
ao exercício da atividade especial. Logo, só há que se falar em cancelamento do benefício e,
consequentemente, em incompatibilidade entre o recebimento deste e a continuidade do
exercício da atividade especial se houver (i) a concessão do benefício e, posteriormente, (ii) o
retorno ao labor especial.
No caso, não houve a concessão administrativa da aposentadoria especial, tampouco o retorno
ao labor especial. A parte autora requereu o benefício; o INSS o indeferiu na esfera
administrativa, circunstância que, evidentemente, levou o segurado a continuar a trabalhar, até
mesmo para poder prover a sua subsistência e da sua família.
Considerando que a aposentadoria especial só foi concedida na esfera judicial e que o segurado
não retornou ao trabalho em ambiente nocivo, mas sim continuou nele trabalhando após o INSS
ter indeferido seu requerimento administrativo, tem-se que a situação fática verificada in casu não
se amolda ao disposto no artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, de sorte que esse dispositivo não pode
ser aplicado ao caso vertente, ao menos até que ocorra o trânsito em julgado da decisão que
concedeu a aposentadoria especial.
Destaque-se que esta C. Turma, ao interpretar tal dispositivo, já decidiu que "Não há que se falar
na impossibilidade do beneficiário continuar exercendo atividade especial, pois diferentemente do
benefício por incapacidade, cujo exercício de atividade remunerada é incompatível com a própria
natureza da cobertura securitária, a continuidade do labor sob condições especiais na pendência
de ação judicial, na qual postula justamente o respectivo enquadramento, revela cautela do
segurado e não atenta contra os princípios gerais de direito; pelo contrário, privilegia a norma
protetiva do trabalhador". (ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1928650 / SP
0002680-43.2012.4.03.6102, DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS).
Não se pode olvidar, ainda, que o entendimento que, com base numa interpretação extensiva,
aplica o artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, a casos em que a aposentadoria especial é concedida
apenas judicialmente, impedindo o pagamento dos valores correspondentes à aposentadoria
especial no período em que o segurado continuou trabalhando em ambiente nocivo, não se
coaduna com a interpretação teleológica, tampouco com o postulado da proporcionalidade e com
a proibição do venire contra factum proprium (manifestação da boa-fé objetiva).
De fato, o artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, tem como finalidade proteger a saúde do trabalhador,
vedando que o beneficiário de uma aposentadoria especial continue trabalhando num ambiente
nocivo. Sendo assim, considerando que tal norma visa proteger o trabalhador, ela não pode ser
utilizada para prejudicar aquele que se viu na contingência de continuar trabalhando pelo fato de
o INSS ter indevidamente indeferido seu benefício.
A par disso, negar ao segurado os valores correspondentes à aposentadoria especial do período
em que ele, após o indevido indeferimento do benefício pelo INSS, continuou trabalhando em
ambiente nocivo significa, a um só tempo, beneficiar o INSS por um equívoco seu - já que, nesse
cenário, a autarquia deixaria de pagar valores a que o segurado fazia jus por ter indeferido
indevidamente o requerido - e prejudicar duplamente o trabalhador - que se viu na contingência
de continuar trabalhando em ambiente nocivo mesmo quando já tinha direito ao benefício que
fora indevidamente indeferido pelo INSS - o que colide com os princípios da proporcionalidade e
da boa-fé objetiva (venire contra factum proprium).
O Supremo Tribunal Federal - STF, de seu turno, ao apreciar o RE 79161/PR, pela sistemática da
repercussão geral da matéria (art. 543-B do CPC/1972), assentou, no julgamento realizado em
08/06/2020, as seguintes teses: “I) É constitucional a vedação de continuidade da percepção de
aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela
retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não. II) Nas
hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a
data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco,
inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial a
implantação do benefício, uma vez verificado o retorno ao labor nocivo ou sua continuidade,
cessará o benefício previdenciário em questão".
Vê-se, assim, que o STF, embora tenha reconhecido a constitucionalidade do artigo 57, §8°, da
Lei 8.213/91, e da vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o
beneficiário permanece laborando em atividade especial, concluiu que tal vedação só se aplica
após a efetivação, na via administrativa ou judicial, da aposentadoria especial.
Portanto, na forma delineada pelo E. STF, o segurado que tem o seu pedido de aposentadoria
especial indeferido pelo INSS e que, posteriormente, tenha seu direito à aposentadoria especial
reconhecido no âmbito judicial, faz jus ao recebimento dos valores atrasados de tal benefício,
desde a data do requerimento administrativo até a data da efetiva implantação (administrativa ou
judicial) da aposentadoria, ainda que tenha continuado a laborar em condições especiais nesse
intervalo de tempo.
Por tais razões, é devido o pagamento dos valores atrasados relativos à aposentadoria especial
deferida neste feito, desde a data do requerimento administrativo até a véspera da data da efetiva
implantação (administrativa ou judicial) de referida jubilação.
Por fim, cabe advertir que, uma vez implantada a aposentadoria especial deferida neste processo
e comunicado tal fato à parte autora, o INSS poderá cassar referido benefício, em regular
processo administrativo, se vir a ser apurado que a parte autora não se desligou ou retornou a
laborar em atividades especiais.
JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices previstos
no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo
Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de 2009, período
em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-e, critério
estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso
Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, e
confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração opostos pelo INSS.
Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte
alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos
Tribunais Superiores.
HONORÁRIOS RECURSAIS
Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11, como
um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos
honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte
contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os
limites estabelecidos na lei.
Assim, não obstante desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, deixo de
determinar a majoração dos honorários de sucumbência, pois, não tendo a sentença estabelecido
o seu valor, cumpre ao juiz da execução, quando fixá-los, já levar em conta o trabalho
desempenhado pelo advogado em grau de recurso.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, CONHEÇO PARCIALMENTE DA APELAÇÃO DO INSS E, NA PARTE
CONHECIDA, NEGO-LHE PROVIMENTO, e determino, DE OFÍCIO, a alteração dos juros e da
correção monetária, nos termos expendidos no voto. Mantenho, quanto ao mais, a sentença
recorrida.
É COMO VOTO.
gabiv/ka
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL/5000277-25. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO
DE CONTRIBUIÇÃO. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS.AGENTE QUÍMICO.
HIDROCARBONETO. EPI. HABITUALIDADE DA EXPOSIÇÃO. INDICADOR IEAN.
ESPECIALIDADE RECONHECIDA. LIMITAÇÃO DO ARTIGO 57, §8°, DA LEI 8.213/91. JUROS
DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS RECURSAIS. APELAÇÃO
CONHECIDA EM PARTE E DESPROVIDA.
- Recebida a apelação interposta tempestivamente, conforme certificado nos autos e observância
da regularidade formal, nos termos do Código de Processo Civil/2015.
- A aposentadoria por tempo de contribuição integral, antes ou depois da EC/98, necessita da
comprovação de 35 anos de serviço, se homem, e 30anos, se mulher, além do cumprimento da
carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos já filiados quando do advento da
mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de
implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de
meses de contribuição inferior aos 180 exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II. O art.
4º, por sua vez, estabeleceu que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente deve ser
considerado como tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no regime geral da
previdência social (art. 55 da Lei 8213/91).
- Sobre o tempo de atividade especial, o artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A
aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180
contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a
saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme
dispuser a lei". Considerando a evolução da legislação de regência pode-se concluir que (i) a
aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido trabalho
permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou integridade
física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao
labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de
reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento,
desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o labor exercido de
forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja
indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as condições de trabalho
podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral
(PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030
e CAT) ou outros meios de prova.
- Com relação aos agentes hidrocarbonetos, é considerado especial o labor realizado pelo
indivíduo que fica exposto, de forma habitual e permanente, a agentes químicos (hidrocarbonetos
e derivados e outros tóxicos inorgânicos), conforme estabelecido pelos itens 1.2.9 e 1.2.11, do
Quadro do Decreto nº 53.831/64; e 1.2.10 e 1.2.11, do Anexo I do Decreto nº 83.080/79 e 1.0.17
e 1.0.19 dos Decretos 2.172/97 e 3.048/99.
- Segundo o Anexo 13, da NR-15 do Ministério do Trabalho, a exposição do trabalhador a
agentes químicos à base de hidrocarbonetos tem sua intensidade medida a partir de análise
qualitativa, bastando apenas o contato físico para caracterização da especialidade do labor.
- Apresentando o segurado prova que indique sua exposição a um agente nocivo, e inexistindo
prova de que o EPI eventualmente fornecido ao trabalhador era efetivamente capaz de neutralizar
a nocividade do ambiente laborativo, a configurar uma dúvida razoável no particular, deve-se
reconhecer o labor como especial.
- Constando da perícia que o segurado ficava exposto a agente nocivo, seja pela simples
presença do agente no ambiente, ou porque estava acima do limite de tolerância, deve-se
concluir que tal exposição era, nos termos do artigo 65, do RPS - Regulamento da Previdência
Social, habitual, não ocasional nem intermitente e indissociável da produção do bem ou da
prestação do serviço.
-Ressalte-seque no modelo de PPP concebido pelo INSS não existe campo específico
àhabitualidade e permanência de exposição ao agente nocivo, não podendo serexigidamenção
expressa em talformulário.
- É possível a averbação dos intervalos como especial, quando o CNIS apresenta o indicador
IEAN (Indicador de Exposição de Agente Nocivo), bem como quando a empresa esteve sujeita ao
pagamento da contribuição descrita no art. 22, inciso II, da Lei 8.212/91 (SAT), o qual custeia as
aposentadorias especiais. O indicativo IEAN é hábil para a comprovação da atividade especial,
porquanto as informações do CNIS gozam de presunção de veracidade, consoante disposto no
art. 19 do Decreto 3.048/99. Precedente desta C. Turma. Ademais, o próprio Conselho de
Recursos da Previdência Social admite a averbação do labor especial com base no indicador
IEAN.
- Não se conhece das alegações relativas à exposição ao agente eletricidade, pois versam sobre
questão estranha ao feito, sendo as razões recursais, no particular, dissociadas da sentença
apelada.
- Nos termos assentados pelo Supremo Tribunal Federal - STF, ao apreciar o RE 79161/PR, pela
sistemática da repercussão geral da matéria (art. 543-B do CPC/1972), foi reconhecida a
constitucionalidade do artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91. No entanto, o segurado que tem o seu
pedido de aposentadoria especial indeferido pelo INSS e que, posteriormente, tenha seu direito à
aposentadoria especial reconhecido no âmbito judicial, faz jus ao recebimento dos valores
atrasados de tal benefício, desde a data do requerimento administrativo até a data da efetiva
implantação (administrativa ou judicial) da aposentadoria, ainda que tenha continuado a laborar
em condições especiais nesse intervalo de tempo.
- Uma vez implantada a aposentadoria especial deferida neste processo e comunicado tal fato à
parte autora, o INSS poderá cassar referido benefício, em regular processo administrativo, se vir
a ser apurado que a parte autora não se desligou ou retornou a laborar em atividades especiais.
- Reconhecida a especialidade dos períodos pleiteados, somados aos demais períodos já
reconhecidos, totalizam mais de 25 anos de tempo especial, fazendo o autor jus à aposentadoria
por tempo especial.
- Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de
2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial -
IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do
julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de
Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração
opostos pelo INSS.
- Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte
alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos
Tribunais Superiores.
- Não obstante desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, não há que se
determinar a majoração dos honorários de sucumbência, pois, não tendo a sentença estabelecido
o seu valor, cumpre ao juiz da execução, quando fixá-los, já levar em conta o trabalho
desempenhado pelo advogado em grau de recurso.
- Apelação conhecida em parte e desprovida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu conhecer parcialmente da apelação e negar-lhe provimento e, de ofício,
alterar os juros de mora e correção monetária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA