
7ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0033582-49.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VANDERLEI JOSE CAMPOS
Advogado do(a) APELADO: LUCIO AUGUSTO MALAGOLI - SP134072-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0033582-49.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VANDERLEI JOSE CAMPOS
Advogado do(a) APELADO: LUCIO AUGUSTO MALAGOLI - SP134072-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL CONVOCADA LUCIANA ORTIZ (RELATORA): Trata-se de reexame necessário, apelação interposta pelo INSS e recurso adesivo da parte autora em face da r. sentença que julgou o pedido inicial nos seguintes termos:
“(...) julgo procedente a ação, o que faço para (i) declarar especial a atividade exercida pelo autor, no período descrito na inicial (ii) determinar ao Instituto Nacional do Seguro Social a sua apostilação e consequente conversão para tempo comum, para fins de acréscimo ao tempo de aposentadoria, e (iii) condenar o instituto requerido a pagar ao autor o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição com renda mensal a ser calculada nos termos do art. 29 da lei de benefícios, desde a data de do pedido administrativo (19/06/2015 - fl. 56), observando-se se o caso de incidência do fator previdenciário, devendo as prestações vencidas serem pagas de uma só vez, os acréscimos legais, respeitada a prescrição quinquenal.
Observada a isenção legal de custas, arcará o instituto réu, porque sucumbiu, com honorários advocatícios de 10% sobre o valor das prestações vencidas até esta data, devidamente corrigidas (STJ/l II).”
Nas razões recursais, o INSS argui, preliminarmente, falta de interesse de agir, ante a ausência de prévio requerimento administrativo do reconhecimento de atividade especial. No mérito, pleiteia a reforma da sentença sustentando que não restou comprovada a exposição a agentes nocivos previstos nos decretos regulamentares. Subsidiariamente, pede a alteração da sentença no tocante ao termo inicial do benefício, juros de mora e correção monetária.
A parte autora, em recurso adesivo, pugna pela anulação da sentença e retorno dos autos à Vara de Origem para a realização de prova técnica pericial. Se mantida a sentença de procedência, pede a alteração da forma de incidência da correção monetária e dos juros de mora, bem assim a majoração da verba honorária.
Com as contrarrazões, os autos foram remetidos a esta E. Corte.
Pela decisão constante do ID257037145, o reexame necessário não foi conhecido, a preliminar foi rejeitada, o apelo do INSS parcialmente provido, para afastar o enquadramento especial dos períodos 01/03/1971 a 20/11/1973, 10/07/1990 a 01/10/1992, 01/02/1993 a 17/11/1999 e de 03/05/2001 a 02/08/2003 e conceder o benefício de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, com termo inicial do benefício a ser fixado na fase de cumprimento de sentença, observando-se o que vier a ser consolidado pelo C. STJ no exame do tema 1.124, o recurso adesivo desprovido e os critérios de juros de mora e correção monetária foram alterados, de ofício.
A parte autora opôs embargos de declaração, por mim recebido como agravo interno e levado à apreciação pelo Colegiado, oportunidade em que esta Colenda Turma acolheu a preliminar, para reconhecer a inviabilidade do julgamento unipessoal.
Determinado o sobrestamento do presente feito, com fundamento no artigo 1.037, II, do Código de Processo Civil, que regula os procedimentos relativos à tramitação dos recursos cuja matéria foi submetida ao regime dos Recursos Repetitivos e de Repercussão Geral (Tema 1.124 STJ).
A parte autora apresentou pedido de reconsideração pugnando pelo regular prosseguimento do feito.
É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0033582-49.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VANDERLEI JOSE CAMPOS
Advogado do(a) APELADO: LUCIO AUGUSTO MALAGOLI - SP134072-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL CONVOCADA LUCIANA ORTIZ (RELATORA): Recebo os recursos interpostos sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Codex processual.
DO SOBRESTAMENTO DO FEITO
De fato, com relação à possibilidade de regular prosseguimento do feito, razão assiste à parte autora.
Considerando que o feito foi sobrestado por uma questão que diz respeito a uma discussão lateral da lide e própria da execução, reconsidero a decisão que determinou o sobrestamento do feito em função do Tema 1124, e determino que, na execução, seja observado o que vier a ser decidido pelo STJ.
DO NÃO CABIMENTO DO REEXAME NECESSÁRIO
A hipótese dos autos não demanda reexame necessário.
A sentença recorrida foi proferida sob a égide do Novo Código de Processo Civil, o qual afasta a submissão da sentença proferida contra a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público ao reexame necessário quando a condenação imposta for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos (art. 496, I c.c. § 3º, I, do CPC/2015).
In casu, considerando os elementos dos autos - o INSS foi condenado a averbar períodos considerados especiais e comum, por conseguinte, implantar e pagar a aposentadoria por tempo de contribuição desde o requerimento administrativo (19/06/2015) até o deferimento do benefício, ocorrido em (21/10/2016) na r. sentença, o montante da condenação não excederá a 1.000 (mil) salários mínimos, ainda que o valor da aposentadoria seja igual ao teto previdenciário.
Logo, a r. sentença não está sujeita ao reexame necessário, que não deve ser conhecido.
DA PRELIMINAR DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR
O INSS alega a ausência de prévio requerimento administrativo, o que implicaria na carência da ação.
O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE nº 631.240/MG, resolvido nos termos do artigo 543-B do CPC/73, assentou o entendimento de que a exigência de prévio requerimento administrativo a ser formulado perante o INSS antes do ajuizamento de demanda previdenciária não viola a garantia constitucional da inafastabilidade da jurisdição (CR/88, art. 5º, XXXV). Ressalvou-se, contudo, a possibilidade de formulação direta do pedido perante o Poder Judiciário quando se cuidar de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, ou ainda, quando notório e reiterado o entendimento do INSS em desfavor da pretensão do segurado e, por fim, se a autarquia ofereceu contestação.
O precedente restou assim ementado, verbis:
"RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR.
1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo.
2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.
3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.
4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão.
5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos.
6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir.
(...)
8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.
9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir."
(STF, RE nº 631.240/MG, Pleno, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, j. 03.09.2014, DJe 10.11.2014). (grifos nossos)
No caso em exame, malgrado trate-se de pedido concessivo de benefício, o INSS ofereceu contestação opondo-se à pretensão inicial, razão pela qual incide a hipótese contemplada na alínea "ii" do item 6 do aresto em questão (ID.: 89937147 - Pág. 63/98 e 89937148 - Pág. 01/13).
De qualquer maneira, não há que ser considerada a ausência de requerimento administrativo, que efetivamente se verificou (NB 42/ 169.404.710-2– ID.: 89937147 - Pág. 58) ainda que não apresentados todos os documentos na seara administrativa.
Portanto, com essas considerações, não prospera a alegação da autarquia.
DA PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA
A prova tem por objeto os fatos deduzidos pelas partes e sua finalidade é a formação do convencimento do juízo, de modo que a decisão pela necessidade ou não de sua produção é faculdade do magistrado, a quem caberá avaliar se há nos autos elementos e provas suficientes para formar sua convicção (artigos 370, 371 e 464, §1°, do CPC/15). Assim, é ônus da parte que requer a realização de perícia, justificar a necessidade de sua produção, bem como indicar quais fatos pretende provar.
No presente caso, pugna a parte autora pela realização de prova pericial para comprovar o exercício de atividade especial nos períodos de 01/03/1971 a 20/11/1973 (Squisvetto e Cia Ltda.- aprendiz de marceneiro), 18/08/1975 a 27/06/1978 (Ind. de Móveis 3D Ltda. - aux manutenção), 02/05/1979 a 03/01/1984 (Ind. de Móveis 3D Ltda. – mecânico de manutenção), 12/02/1986 a 30/11/1988 (Fafá Móveis Ltda. - mecânico manutenção), 09/01/1989 a 13/06/1990 (Fafá Móveis Ltda. - encarrega manutenção), 10/07/1990 a 01/10/1992 (Fabrilar Ind. e Com. de Móveis encarregado manutenção), 01/02/1993 a 17/11/1999 (Fabrilar Ind. e Com, de Móveis Ltda. encarregado manutenção) e de 03/05/2001 a 02/08/2003 (G. Minas S/A - Ind. de Móveis -encarregado de manutenção).
Com relação aos períodos de 01/03/1971 a 20/11/1973 e de 03/05/2001 a 02/08/2003 em que trabalhou como aprendiz de marceneiro e encarregado de manutenção, observa-se que a parte autora sequer comprovou documentalmente haver realizado qualquer diligência junto às empresas em que laborou a fim de obter a comprovação do seu alegado direito, tampouco comprovou a existência de recusa por parte das empresas. Dessa forma, não havendo se desincumbido de seu ônus, não pode em sede recursal alegar cerceamento de defesa quanto a prova que lhe cabia produzir.
No que se refere aos demais períodos, a elaboração da perícia técnica, de fato, é totalmente desnecessária, tendo em vista que o processo está instruído com os documentos essenciais à demanda, não havendo que se falar em cerceamento de defesa. Rejeito, portanto, a preliminar de cerceamento de defesa.
Superada a matéria preliminar, passo à apreciação do mérito recursal.
REGRA GERAL PARA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO/PROGRAMADA
Como é sabido, após a EC 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço cedeu lugar à aposentadoria por tempo de contribuição.
Em resumo, antes de 16/12/1998 (data da vigência da Emenda 20), bastava o segurado comprovar 30 anos de tempo de serviço, se mulher, ou 35 anos, se homem, para concessão da aposentadoria integral; ou 25 anos, se mulher, e 30 anos, se homem, para concessão da aposentadoria proporcional.
Após a EC 20/98, o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente deve ser considerado como tempo de contribuição, passando a ser necessário comprovar 35 anos de tempo contributivo, se homem, e 30 anos, se mulher, além da carência correspondente a 180 contribuições mensais (art. 25, inciso II, c/c art. 142, ambos da Lei 8.213/1991), deixando de existir a aposentadoria proporcional. Esta última, no entanto, foi assegurada aos já filiados antes do advento da Emenda, mediante os seguintes requisitos: 53 anos de idade e 30 anos de tempo de serviço, se homem; ou 48 anos de idade e 25 anos de tempo de serviço, se mulher; bem como o adicional de 40% sobre o tempo faltante ao tempo de serviço exigido para a aposentadoria proporcional.
A EC 103/2019, vigente a partir de 13/11/2019, por sua vez, extinguiu a aposentadoria por tempo de contribuição, estabelecendo a aposentadoria programada, com exigência de novos requisitos: 65 anos de idade, se homem, e 62 anos, se mulher, observado o tempo mínimo de contribuição; ou 60 anos de idade, se homem, e 55 anos, se mulher, para os trabalhadores rurais e segurados especiais (art. 201, § 7º, da Constituição Federal).
Restou assegurado, também, no artigo 3º da nova Emenda Constitucional, o direito à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição para os segurados que tivessem preenchido as condições em data anterior a sua vigência (13/11/2019), os quais podem pedir benefício a qualquer tempo (art. 3º da EC), garantindo-se cálculo e reajuste com base na legislação vigente à época em que foram cumpridos os requisitos (art. 3º, §§ 1º e 2º, da EC).
Além disso, restaram estabelecidas 04 (quatro) regras de transição para àqueles que já eram filiados ao RGPS e ainda não tinham implementado os requisitos até 13/11/2019, a saber (arts. 15, 16, 17 e 20 da EC 103/2019): a) sistema de pontos, idade e tempo de contribuição; b)tempo de contribuição e idade mínima; c) tempo de contribuição e pedágio de 50% com fator previdenciário, sem o requisito da idade; d) tempo de contribuição, pedágio e requisito da idade mínima
DO TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS - CONSIDERAÇÕES INICIAIS.
Em linhas gerais, até o advento da EC 103/2019, a aposentadoria especial era devida após 180 contribuições, para os trabalhadores expostos a condições prejudiciais à saúde por 15, 20 ou 25 anos.
Até 28.04.1995, a especialidade poderia ser reconhecida sem comprovação da exposição, desde que a atividade estivesse enquadrada nos decretos n° 53.831/64 ou n° 83.080/1979, sendo possível e desejável o uso de analogia, para considerar a inserção de determinada categoria profissional, aproximando os diversos grupos de trabalhadores que se enquadrem em atividades assemelhadas, a fim de evitar situações injustas, acarretando sua não aplicação.
Após 28.04.1995, com o advento da Lei 9.032/1995, o segurado passou a ter que comprovar a exposição permanente a agentes prejudiciais à saúde, de forma permanente, não ocasional nem intermitente; entendendo-se como permanente, o trabalho em que a exposição ao agente nocivo é indissociável da produção ou serviço.
As condições especiais de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT), sem prejuízos de outros meios de prova, sendo de se frisar que apenas a partir da edição do Decreto 2.172, de 05.03.1997, tornou-se exigível a apresentação de laudo técnico a corroborar as informações constantes nos formulários, salvo para o agente ruído e calor, que sempre exigiu laudo técnico. Todavia, consoante entendimento já sufragado por esta Turma, por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei n 9.528, de 10/12/1997.
O artigo 58 da Lei 8.213/91 dispõe que cabe ao Poder Público definir quais agentes configuram o labor especial e a forma como este será comprovado. A relação dos agentes reputados nocivos pelo Poder Público é trazida, portanto, por normas regulamentares consideradas exemplificativas (Tema Repetitivo 534, REsp 1306113/SC), de que é exemplo o Decreto n. 2.172/97. Assim, se a atividade exercida pelo segurado realmente importar em exposição a fatores de risco, ainda que ela não esteja prevista em regulamento, é possível reconhecê-la como especial.
A partir de 01.01.2004, é obrigatório o fornecimento do PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário aos segurados expostos a agentes nocivos, documento que retrata o histórico laboral do segurado, evidencia os riscos do respectivo ambiente de trabalho e consolida as informações constantes nos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral antes mencionados.
Diante das inúmeras alterações dos quadros de agentes nocivos, a jurisprudência reconhece como especial o trabalho que assim era considerado pela legislação em vigor na época (Recurso Especial nº 1.398.260/PR – Tema 694/STJ).
A conversão do tempo de trabalho deve seguir a legislação vigente no momento do requerimento administrativo (Tese Repetitiva 546, REsp 1310034/PR).
Nos termos do artigo 57, §5°, da Lei 8.213/91, admite-se a conversão de tempo de atividade especial para comum, devendo-se observar a tabela dos multiplicadores prevista no artigo 70, do Decreto 3.048/99.
A EC 103/2019, por sua vez, proibiu a conversão do tempo especial em comum para atividades após 13/11/2019, não sendo o art. 57, § 5º, da lei 8.213/91, recepcionado pela reforma constitucional (art. 201, §14, da CF e art. 25, caput, e §2º da referida Emenda).
No tocante ao uso de Equipamento de Proteção Individual - EPI, o E. STF assentou a tese de que não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, situação que não se aplica ao agente nocivo ruído (ARE 664335).
DO AGENTE NOCIVO RUÍDO
A regulamentação sobre a nocividade do ruído sofreu algumas alterações.
Até a edição do Decreto nº 2.171/1997 (06/03/1997), considerava-se especial a atividade exercida com exposição a ruído superior a 80 decibéis. A partir de então, passou-se a considerar como especial o trabalho realizado em ambiente em que o nível de ruído fosse superior a 90 decibéis. Por fim, com a entrada em vigor do Decreto nº 4.882, em 18/11/2003, o limite de tolerância a esse agente físico foi reduzido para 85 decibéis.
Considerando tal evolução normativa e o princípio tempus regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido como especial de acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -, reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB (até 05/03/1997); superior a 90 dB (de 06/03/1997 a 18/11/2003); e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
O C. STJ, quando do julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do artigo 543-C do CPC/73, firmou a tese de que não se pode aplicar retroativamente o Decreto nº 4.882/2003: "O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).
O E. STF, de seu turno, no julgamento do ARE 664335, assentou a tese segundo a qual "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
A Corte Suprema assim decidiu, pois o EPI não elimina o agente nocivo, mas apenas reduz os seus efeitos, de sorte que o trabalhador permanece sujeito à nocividade, existindo estudos científicos que demonstram inexistir meios de se afastar completamente a pressão sonora exercida sobre o trabalhador, mesmo nos casos em que haja utilização de protetores auriculares.
Logo, no caso de ruído, ainda que haja registro no PPP de que o segurado fazia uso de EPI ou EPC, reconhece-se a especialidade do labor quando os níveis de ruído forem superiores ao tolerado, não havendo como se sonegar tal direito do segurado sob o argumento de ausência de prévia fonte de custeio (195, §§ 5° e 6°, da CF/88 e artigo 57, §§ 6° e 7°, da Lei nº 8.213/91), até porque o não recolhimento da respectiva contribuição não pode ser atribuída ao trabalhador, mas sim à inércia estatal no exercício do seu poder de polícia.
NO CASO CONCRETO
Insurge-se o INSS em face da sentença que reconheceu o exercício de atividade especial nos períodos de 01/03/1971 a 20/11/1973, 18/08/1975 a 27/06/1978, 02/05/1979 a 03/01/1984, 12/02/1986 a 30/11/1988, 09/01/1989 a 13/06/1990, 10/07/1990 a 01/10/1992, 01/02/1993 a 17/11/1999 e de 03/05/2001 a 02/08/2003 e concedeu o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição à parte autora, desde a data do requerimento administrativo.
Para comprovar o exercício de atividade especial nos períodos de 18/08/1975 a 27/06/1978, 02/05/1979 a 03/01/1984, 12/02/1986 a 30/11/1988 e de 09/01/1989 a 13/06/1990, foram juntados formulários e laudos técnicos periciais (ID. 89937147 - Pág. 33/43), devidamente preenchidos, revelando que a parte autora trabalhava, de forma habitual e permanente, exposta a ruído superior a 85dB, o que impõe a manutenção da sentença que reconheceu a especialidade, já que ultrapassado o limite de tolerância então vigente.
Quanto ao fornecimento de EPI, já foi pacificado pelo STF que o seu uso não neutraliza a nocividade causada pelo agente ruído.
Extrai-se dos elementos dos autos que a exposição da parte autora a agentes nocivos era inerente à atividade que ela desenvolvia, donde se conclui que tal exposição deve ser considerada permanente, nos termos do artigo 65, do RPS, o qual, consoante já destacado, reputa trabalho permanente "aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço".
Não se exige, portanto, que o trabalhador se exponha durante todo o período da sua jornada ao agente nocivo, o que interdita o acolhimento da alegação autárquica em sentido contrário.
Observo que o fato de o laudo pericial não ser contemporâneo não invalida suas conclusões a respeito do reconhecimento de tempo de trabalho dedicado em atividade de natureza especial, primeiro, porque não existe tal previsão decorrente da legislação e, segundo, porque a evolução da tecnologia aponta para o avanço das condições ambientais em relação àquelas experimentadas pelo trabalhador à época da execução dos serviços.
Todavia, merece reforma a sentença no tocante ao reconhecimento do exercício de atividade especial nos períodos de 10/07/1990 a 01/10/1992 e de 01/02/1993 a 17/11/1999, eis que os formulários e o laudo técnico pericial não apontam a quais agentes agressivos e a qual nível de ruído a parte autora esteve exposta no exercício da função de “encarregado de manutenção” junto à empresa Fabrilar Ind. e Com. de Móveis Ltda.
Ressalte-se que a precariedade da digitalização dos formulários de ID. 89937147 - Pág. 45/46 não impediu a análise dos documentos, que foram acessados por meio de consulta ao site do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e que, diversamente do que alega a parte autora, limitou-se a mencionar exposição a “agentes agressivos existentes no local”, insuficiente para se concluir que laborava sujeito a agentes de risco que merecessem o tratamento diferenciado da legislação previdenciária.
Assim, considerando que a atividade exercida (encarregado de manutenção), por si só, não pode ser considerada de natureza especial, pois não se encontra listada nos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, não há como se concluir que a parte autora estivesse exposta a agentes nocivos, de modo que inviável o reconhecimento do labor especial nos intervalos de 10/07/1990 a 01/10/1992 e de 01/02/1993 a 17/11/1999.
Igualmente, não restou comprovada a especialidade do período de 01/03/1971 a 20/11/1973, em que a parte autora trabalhou como “aprendiz de marceneiro”, junto à Indústria Squisvetto e Cia Ltda, conforme anotação de vínculo empregatício em CTPS (ID. 89937147 - Pág. 13), pois as funções exercidas como marceneiro ou carpinteiro, mais especificamente no trato com madeira, em regra, não estão entre as categorias profissionais elencadas pelos Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79. Apenas se enquadra como especial a atividade desenvolvida por carpinteiros e marceneiros quando comprovado nos autos o labor em grandes obras de construção civil, tais como edifícios, pontes e barragens.
Nesse sentido, precedentes desta Corte:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. PROVA PERICIAL. NÃO CONFIGURADO. ATIVIDADE ESPECIAL. ENQUADRAMENTO PROFISSIONAL. AJUDANTE DE CAMINHÃO. RUÍDO. RECONHECIMENTO PARCIAL. TEMPO INSUFICIENTE. BENEFÍCIO NÃO DEFERIDO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA.
1 - Cabe à parte autora indicar na inicial os meios de prova com que pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados (art. 319, VI, do CPC/15) e, no caso, o autor não especificou que pretendia a produção da prova técnica, limitou-se que formular pedido genérico “por todos os meios de prova admitidos em direito, notadamente a documental”. Vale ressaltar que não é imposto ao juízo instrutório determinar, de ofício, a produção das provas aptas a comprovar o direito do autor, tratando-se de mera faculdade, notoriamente porque o ônus é da parte demandante (art. 373, I, do CPC/15). No caso, o autor sequer chegou a pleitear explicita e inequivocamente a produção da prova técnica, apenas discorrendo na resposta à contestação: “Outrossim, a parte autora trouxe um inicio de prova satisfatório a propositura da ação, sendo certo que o painel probatório ainda a ser produzido no bojo dos autos (OFÍCIOS ÀS EMPREGADORAS E EVENTUAL PERÍCIA PARA DEMONSTRAR ESPECIALIDADE) demonstrará claramente o líquido Direito que circunda a parte autora, o que culminara na procedência total do feito”. (ID 122811107). Assim, considerando que não houve pedido expresso de produção da prova pericial na instrução, não resta configurado o cerceamento de defesa alegado.
(...)
16 - No tocante ao lapso de 01/08/1976 a 14/07/1977, em que o autor desempenhou a função de aprendiz de marceneiro (CTPS – ID 122811085 - Pág. 3), não se autoriza o reconhecimento da especialidade, não apenas porque tal tarefa não se encontra inserida nos róis dos Decretos pertinentes à matéria, como também porque inexiste nos autos documentação referindo a exposição a qualquer agente agressivo.
17 - No intervalo de 02/08/1978 a 09/11/1978, trabalhado para o “Indústria de Móveis 3D”, como auxiliar de marceneiro, o requerente coligiu aos autos laudo técnico, que, no entanto, encontra-se incompleto, não sendo possível extrair a que fatores de risco ele se encontrava exposto (ID 122811090 - Págs. 1/2). Vale ressaltar que a mera percepção do adicional de insalubridade não garante o enquadramento da atividade como especial, uma vez que a legislação trabalhista tem critérios que diferem daqueles exigidos pela lei previdenciária.
(...)
24 - Apelação do INSS desprovida. Apelação da parte autora parcialmente provida.
(TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5146674-12.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 23/09/2022, DJEN DATA: 29/09/2022) destaquei
PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. EXPOSIÇÃO AO AGENTE AGRESSIVO RUÍDO. CATEGORIA PROFISSIONAL. MOTORISTA DE CAMINHÃO. LABOR ESPECIAL RECONHECIDO EM PARTE. REAFIRMAÇÃO DA DER. POSSIBILIDADE. REQUISITOS PREENCHIDOS PARA A CONCESSÃO DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. BENEFÍCIO DEVIDO. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. SUCUMBÊNCIA. APELO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDO. APELAÇÃO DO INSS NÃO PROVIDA.
- No tocante ao agente agressivo ruído, tem-se que os níveis legais de pressão sonora, tidos como insalubres, são os seguintes: acima de 80 dB, até 05/03/1997, na vigência do Decreto n.º 53.831/64, superior a 90 dB, de 06/03/1997 a 18/11/2003,conforme Decreto n.º 2.172/97 e acima de 85 dB, a contar de 19/11/2003, quando foi publicado o Decreto n.º 4.882/2003, o qual não se aplica retroativamente, consoante assentado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, em recurso submetido ao regime do art. 543-C do CPC/1973, precisamente o REsp 1398260/PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 05/12/2014.
- Configurado o trabalho com exposição a ruído excessivo nos lapsos de 08/10/1985 a 15/12/1987 e de 02/09/1996 a 05/03/1997.
- Cabível o enquadramento do lapso de 03/01/1994 a 04/11/1994 em razão da categoria profissional, de transporte rodoviário de carga, no código 2.4.4 do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64, que classifica como penosa a atividade de motorista de caminhão.
- Com relação aos intervalos de 01/06/1980 a 12/04/1981 e de 01/08/1982 a 14/03/1985, os Perfis Profissiográficos Previdenciários apresentados (Id 80343778 – p. 142/143 e Id 83775128 – p. 60/61) não apontam a existência de qualquer fator de risco em suas seções de registros ambientais. Já o Laudo Técnico Id 83775129 p. 02/08 informa as condições ambientais em setor diverso daquele em que o obreiro prestou serviços. Além do que, não é possível o enquadramento pela categoria profissional, tendo em vista que as atividades de “Aprendiz de Marceneiro” e “Serviços Gerais” em indústria de móveis não se encontram elencadas nos Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79.
- No que tange ao interregno de 06/03/1997 a 03/04/2002, impossível o reconhecimento como atividade especial, tendo em vista que o PPP Id 83775128 p. 56/58 indica exposição a ruído abaixo do limite considerado agressivo à época [90 dB (A)].
- No que se refere ao intervalo de 01/09/2003 a 21/03/2007, em que a parte autora alega o contato com agentes químicos - Óleo Diesel e Graxa - no exercício da função de “Motorista”, tem-se que o Laudo Técnico Id 83775129 p. 39/48, fornecido pela empregadora, atesta que a exposição era eventual - quando havia necessidade de reparos a serem feitos em lugares distantes à empresa, o que impede o reconhecimento da atividade como especial, nos termos da legislação previdenciária.
- Quanto ao período de 03/03/2008 a 16/01/2014 (data do ajuizamento da demanda), em que pese a parte autora tenha apresentado o PPP Id 83475128 p. 45/47 e o Laudo Técnico Id 80343778 p. 08/10, indicando o labor como “Motorista” e a exposição a agentes químicos (Óleo Mineral, Cimento, Ácido Clorídrico, Ácido Fluorídrico e Hidróxido de Sódio) e umidade, há informação minuciosa no documento técnico de neutralização dos agentes nocivos pelo uso de Equipamentos de Proteção Individual. Presentes nos autos elementos de prova capazes de convencer o Juízo acerca da salubridade do labor pelo uso de EPI eficaz. Destaque-se, por fim, que os documentos citados indicam também níveis de ruído e calor abaixo do limite de tolerância.
- Presentes os requisitos, o termo inicial do benefício deve ser fixado em 01/07/2019, dia em que implementados os requisitos para concessão da aposentadoria, conforme pedido formulado pela parte autora e em consonância com o decidido no julgamento do Recurso Especial nº 1.727.064-SP (Tema nº 995) do C. Superior Tribunal de Justiça.
- Juros de mora e correção monetária fixados na forma explicitada.
- Honorários advocatícios a cargo do INSS em percentual mínimo a ser definido na fase de liquidação, considerando-se as parcelas vencidas até a data da decisão concessiva do benefício (Súmula nº 111 do c. Superior Tribunal de Justiça).
- Isenção da autarquia previdenciária do pagamento de custas processuais, com exceção das custas e despesas comprovadamente realizadas pela parte autora.
- Apelo da parte autora provido em parte.
- Apelação do INSS não provida.
(TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0013524-88.2018.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal JOAO BATISTA GONCALVES, julgado em 19/08/2021, DJEN DATA: 25/08/2021) destaquei
Sendo assim, considerando que, no caso dos autos, não há comprovação de que a parte autora tenha laborado em grandes obras, de rigor a reforma da sentença apelada, a qual enquadrou como especial o período em que o demandante laborou como aprendiz de marceneiro.
No tocante ao período de 03/05/2001 a 02/08/2003 inexiste nos autos quaisquer documentos que indiquem a exposição a agente agressivo durante o desempenho de labor no exercício das funções, mas tão somente a CTPS, portanto, não há como manter a sentença que reconheceu a especialidade das condições de trabalho no aludido intervalo.
Assim, confrontando-se todos os dados e elementos trazidos, deve ser mantida a sentença no tocante ao reconhecimento da atividade especial nos períodos de 18/08/1975 a 27/06/1978, 02/05/1979 a 03/01/1984, 12/02/1986 a 30/11/1988, 09/01/1989 a 13/06/1990, merecendo reforma quanto aos períodos de 01/03/1971 a 20/11/1973, 10/07/1990 a 01/10/1992, 01/02/1993 a 17/11/1999 e de 03/05/2001 a 02/08/2003, que devem ser considerados como tempo de serviço comum.
DA AUSÊNCIA DA PRÉVIA FONTE DE CUSTEIO
Não há como se sonegar o direito do segurado de averbação do labor em condições especiais sob o argumento de ausência de prévia fonte de custeio (195, §§ 5° e 6°, da CF/88 e artigo 57, §§ 6° e 7°, da Lei 8.213/91), até porque o não recolhimento da respectiva contribuição não pode ser atribuído ao trabalhador, mas sim à inércia estatal no exercício do seu poder de polícia.
Ademais, nesse particular, restou consignado no Recurso Extraordinário com Agravo nº 664.335/SC, de Relatoria do Ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, em sede de Repercussão Geral, que a ausência de prévia fonte de custeio não prejudica o direito dos segurados à aposentadoria especial, em razão de não haver ofensa ao princípio da preservação do equilíbrio financeiro e atuarial, eis que o art. 195, § 5º, da Constituição Federal (que veda a criação, majoração ou a extensão de benefícios previdenciários sem a correspondente fonte de custeio), contém norma dirigida ao legislador ordinário, disposição inexigível quando se trata de benefício criado diretamente pela própria constituição, como é o caso da aposentadoria especial.
DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
Diante deste cenário, somados os períodos urbanos comuns constantes da CTPS e do CNIS, aos reconhecidos como atividade especial nesta demanda, convertidos em tempo comum pelo fator de conversão 1,40 (para homem), resulta até a data da DER (19/06/2015) num total de tempo de serviço de 31 anos, 4 meses e 26 dias, nos termos da planilha em anexo, fazendo jus ao benefício de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição.
OPÇÃO DO BENEFÍCO MAIS VANTAJOSO
Em pesquisa ao sistema CNIS, observa-se que a parte autora está em gozo do benefício de aposentadoria por idade, deferido em 24/02/2021 (NB 190.705.255-8), razão pela qual ela poderá optar pela percepção do benefício que se lhe afigurar mais vantajoso, nos termos do TEMA 1.018/STJ.
No caso de opção pelo benefício judicial, os valores devidos por força da presente condenação deverão ser compensados com aqueles já pagos administrativamente no período concomitante.
No caso de opção pelo benefício administrativo, a parte autora poderá executar os atrasados do benefício judicial, até a DER do benefício concedido administrativamente.
DO TERMO INICIAL
Considerando que a documentação necessária ao reconhecimento do direito ao benefício não foi apresentada no âmbito administrativo, mas apenas nesta demanda judicial, o termo inicial dos efeitos financeiros do benefício deverá ser fixado na fase de cumprimento de sentença, conforme entendimento que vier a ser consolidado pelo C. STJ no exame do tema 1.124.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, mantidos em 10% do valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ), até porque moderadamente arbitrados pela decisão apelada.
JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, revendo posicionamento adotado anteriormente, devem ser aplicados os índices e critérios adotados pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, vigente na data da execução.
Vale ressaltar que o referido manual foi instituído pelo Conselho da Justiça Federal com o objetivo de unificar os critérios de cálculo a serem aplicados a todos os processos sob sua jurisdição, na fase de execução, e seus parâmetros são estabelecidos com base na legislação vigente e na jurisprudência dominante, por meio de Resolução, devendo ser observado, sem ofensa à coisa julgada, a versão mais atualizada do manual.
Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos Tribunais Superiores.
HONORÁRIOS RECURSAIS
Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, § 11, como um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os limites estabelecidos na lei.
Assim, provido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, ainda que parcialmente, descabida, no caso, a sua condenação em honorários recursais.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, NÃO CONHEÇO DO REEXAME NECESSÁRIO, REJEITO A MATÉRIA PRELIMINAR, DOU PARCIAL PROVIMENTO à Apelação do INSS para afastar o enquadramento especial dos períodos 01/03/1971 a 20/11/1973, 10/07/1990 a 01/10/1992, 01/02/1993 a 17/11/1999 e de 03/05/2001 a 02/08/2003 e conceder o benefício de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, com termo inicial do benefício a ser fixado na fase de cumprimento de sentença, observando-se o que vier a ser consolidado pelo C. STJ no exame do tema 1.124, NEGO PROVIMENTO ao Recurso Adesivo da parte autora e determino, DE OFÍCIO, a alteração dos juros de mora e da correção monetária, nos termos expendidos na decisão.
É COMO VOTO.
/gabiv/asato/jpborges
CONTAGEM DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
TEMPO DE SERVIÇO COMUM (com conversões)
| Data de Nascimento | 24/02/1956 |
| Sexo | Masculino |
| DER | 19/06/2015 |
| Nº | Nome / Anotações | Início | Fim | Fator | Tempo | Carência |
| 1 | SQUIAVETTO E CIA LTDA | 01/03/1971 | 20/11/1973 | 1.00 | 2 anos, 8 meses e 20 dias | 33 |
| 2 | INDUSTRIA DE MOVEIS 3D LTDA | 18/08/1975 | 27/06/1978 | 1.40 Especial | 2 anos, 10 meses e 10 dias + 1 anos, 1 meses e 22 dias = 4 anos, 0 meses e 2 dias | 35 |
| 3 | HENKEL SURFACE TECHNOLOGIES BRASIL LTDA. | 01/09/1978 | 15/04/1979 | 1.00 | 0 anos, 7 meses e 15 dias | 8 |
| 4 | INDUSTRIA DE MOVEIS 3D LTDA | 02/05/1979 | 03/01/1984 | 1.40 Especial | 4 anos, 8 meses e 2 dias + 1 anos, 10 meses e 12 dias = 6 anos, 6 meses e 14 dias | 57 |
| 5 | FAFA MOVEIS LTDA | 12/02/1986 | 30/11/1988 | 1.40 Especial | 2 anos, 9 meses e 19 dias + 1 anos, 1 meses e 13 dias = 3 anos, 11 meses e 2 dias | 34 |
| 6 | FAFA MOVEIS LTDA | 09/01/1989 | 13/06/1990 | 1.40 Especial | 1 anos, 5 meses e 5 dias + 0 anos, 6 meses e 26 dias = 2 anos, 0 meses e 1 dias | 18 |
| 7 | INDUSTRIA E COMERCIO DE ROUPAS VERA CRUZ LTDA | 08/06/1990 | 31/12/1992 | 1.00 | 2 anos, 6 meses e 17 dias (Ajustada concomitância) | 30 |
| 8 | FABRILAR INDUSTRIA E COMERCIO DE MOVEIS LTDA | 10/07/1990 | 01/10/1992 | 1.00 | 0 anos, 0 meses e 0 dias (Ajustada concomitância) | 0 |
| 9 | FABRILAR INDUSTRIA E COMERCIO DE MOVEIS LTDA | 01/02/1993 | 17/11/1999 | 1.00 | 6 anos, 9 meses e 17 dias | 82 |
| 10 | G. MINAS S/A - INDUSTRIA DE MOVEIS | 03/05/2001 | 31/07/2003 | 1.00 | 2 anos, 2 meses e 28 dias | 27 |
| Marco Temporal | Tempo de contribuição | Carência | Idade | Pontos (Lei 13.183/2015) |
| Até a data da EC nº 20/98 (16/12/1998) | 28 anos, 2 meses e 27 dias | 286 | 42 anos, 9 meses e 22 dias | inaplicável |
| Pedágio (EC 20/98) | 0 anos, 8 meses e 13 dias | |||
| Até a data da Lei 9.876/99 (28/11/1999) | 29 anos, 1 meses e 28 dias | 297 | 43 anos, 9 meses e 4 dias | inaplicável |
| Até a DER (19/06/2015) | 31 anos, 4 meses e 26 dias | 324 | 59 anos, 3 meses e 25 dias | 90.7250 |
- Aposentadoria por tempo de serviço / contribuição
Nessas condições, em 16/12/1998, a parte autora não tem direito à aposentadoria por tempo de serviço, ainda que proporcional (regras anteriores à EC 20/98), porque não cumpre o tempo mínimo de serviço de 30 anos.
Em 28/11/1999, a parte autora não tem direito à aposentadoria por tempo de contribuição, ainda que proporcional (regras de transição da EC 20/98), porque não preenche o tempo mínimo de contribuição de 30 anos, o pedágio de 0 anos, 8 meses e 13 dias (EC 20/98, art. 9°, § 1°, inc. I) e nem a idade mínima de 53 anos.
Em 19/06/2015 (DER), a parte autora tem direito à aposentadoria proporcional por tempo de contribuição (regras de transição da EC 20/98), com o coeficiente de 70% (EC 20/98, art. 9º, §1º, inc. II). O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei 9.876/99 e com incidência do fator previdenciário, uma vez que não foi observado o tempo mínimo de contribuição de 35 anos (Lei 8.213/91, art. 29-C, inc. I, incluído pela Lei 13.183/2015).
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. REEXAME NECESSÁRIO NÃO CONHECIDO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. PROVA DA ATIVIDADE ESPECIAL A POSTERIORI. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. ESPECIALIDADE PARCIALMENTE RECONHECIDA. RUÍDO. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO PROPORCIONAL. TERMO INICIAL DOS EFEITOS FINANCEIROS. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. HONORÁRIOS RECURSAIS. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. RECURSO ADESIVO DA PARTE AUTORA NÃO PROVIDO.
- Recursos recebidos nos termos do Código de Processo Civil/2015.
- A sentença recorrida foi proferida sob a égide do Novo Código de Processo Civil, o qual afasta a submissão da sentença proferida contra a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público ao reexame necessário quando a condenação imposta for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos (art. 496, I c.c. § 3º, I, do CPC/2015).
- Reexame necessário não conhecido. Considerando os elementos dos autos - o INSS foi condenado a averbar períodos considerados especiais e comum, por conseguinte, implantar e pagar a aposentadoria por tempo de contribuição desde o requerimento administrativo (19/06/2015) até o deferimento do benefício, ocorrido em (21/10/2016) na r. sentença, o montante da condenação não excederá a 1.000 (mil) salários mínimos, ainda que o valor da aposentadoria seja igual ao teto previdenciário.
- A aposentadoria por tempo de contribuição integral, antes ou depois da EC/98, necessita da comprovação de 35 anos de serviço, se homem, e 30 anos, se mulher, além do cumprimento da carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos já filiados quando do advento da mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de meses de contribuição inferior aos 180 exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II. O art. 4º, por sua vez, estabeleceu que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente deve ser considerado como tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no regime geral da previdência social (art. 55 da Lei 8213/91).
- Sobre o tempo de atividade especial, o artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180 contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei". Considerando a evolução da legislação de regência pode-se concluir que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
- A regulamentação sobre a nocividade do ruído sofreu algumas alterações. Considerando tal evolução normativa e o princípio tempus regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido como especial de acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -, reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB (até 05/03/1997); superior a 90 dB (de 06/03/1997 a 18/11/2003); e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
- Mantido o reconhecimento da atividade especial nos períodos de 18/08/1975 a 27/06/1978, 02/05/1979 a 03/01/1984, 12/02/1986 a 30/11/1988 e de 09/01/1989 a 13/06/1990, vez que formulários e laudos técnicos periciais, devidamente preenchidos, revelam que a parte autora trabalhava, de forma habitual e permanente, exposta a ruído superior a 85dB, portanto, acima do limite de tolerância então vigente (80dB).
- O laudo técnico não contemporâneo não invalida suas conclusões a respeito do reconhecimento de tempo de trabalho dedicado em atividade de natureza especial, primeiro, porque não existe tal previsão decorrente da legislação e, segundo, porque a evolução da tecnologia aponta para o avanço das condições ambientais em relação àquelas experimentadas pelo trabalhador à época da execução dos serviços (Súmula nº 68, da Turma de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais, publicada no dia Diário Oficial da União aos 24/09/2012: "O laudo pericial não contemporâneo ao período trabalhado é apto à comprovação da atividade especial do segurado.").
- Inexistente nos autos quaisquer documentos que indiquem, de forma objetiva, a exposição a agente agressivo não há como reconhecer a especialidade das condições de trabalho nos períodos em que a parte autora exerceu as funções de aprendiz de marceneiro e encarregado de manutenção. O fato de constar em laudo pericial que em alguns ambientes da empresa o ruído superava o limite de tolerância vigente à época, não altera a solução da lide, pois o reconhecimento da especialidade demanda prova efetiva, não bastando a mera presunção.
- Somados os períodos urbanos comuns constantes da CTPS e do CNIS, aos reconhecidos como atividade especial nesta demanda, convertidos em tempo comum pelo fator de conversão 1,40 (para homem), resulta até a data da DER (19/06/2015) num total de tempo de serviço de 31 anos, 4 meses e 26 dias, fazendo jus ao benefício de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição.
- Considerando que a documentação necessária ao reconhecimento do direito ao benefício não foi apresentada no âmbito administrativo, mas apenas nesta demanda judicial, o termo inicial dos efeitos financeiros do benefício deverá ser fixado na fase de cumprimento de sentença, conforme entendimento que vier a ser consolidado pelo C. STJ no exame do tema 1.124.
- Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, revendo posicionamento adotado anteriormente, devem ser aplicados os índices e critérios adotados pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, vigente na data da execução.
- Reexame necessário não conhecido, apelação do INSS parcialmente provida e recurso adesivo da parte autora não provido. Juros de mora e correção monetária alterados de ofício.
ACÓRDÃO
JUÍZA FEDERAL
