
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5013643-87.2024.4.03.6301
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: FRANCISCO BENTO DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: HERBERT PIRES ANCHIETA - SP353317-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5013643-87.2024.4.03.6301
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: FRANCISCO BENTO DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: HERBERT PIRES ANCHIETA - SP353317-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de tempo de serviço especial, com vistas à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido para apenas enquadrar como atividade especial os intervalos de 6/1/1986 a 1º/8/1989 e de 15/8/2000 a 18/11/2003. Por fim, condenou as partes nos honorários advocatícios.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação, no qual requer o enquadramento do período afastado na decisão a quo, trabalhado na empresa "Alfacleaner Indústria e Comércio Ltda." e a obtenção do benefício em foco, com Data de Início de Benefício (DIB) fixada na Data de Entrada do Requerimento (DER) reafirmada para 10/4/2024 (ajuizamento da ação). Prequestiona a matéria para fins recursais.
Sem contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5013643-87.2024.4.03.6301
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: FRANCISCO BENTO DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: HERBERT PIRES ANCHIETA - SP353317-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O recurso preenche os pressupostos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido.
Na espécie, não incide a norma prevista no artigo 496, § 3º, inciso I, do CPC (remessa necessária), pois o valor da condenação ou o proveito econômico estimado não ultrapassa mil salários mínimos. Prevalece, nesse ponto, a certeza matemática em detrimento da aplicação automática da Súmula n. 490 do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Nos termos do princípio tantum devolutum quantum appellatum, passo à análise das questões efetivamente impugnadas pela parte em recurso.
Do Tempo de Serviço Especial
A caracterização da atividade especial deve observar a legislação vigente à época da prestação do serviço. A conversão de tempo especial em comum, por sua vez, é regulada pela norma vigente na data em que o segurado reúne os requisitos para a aposentadoria, conforme entendimento consolidado nos Temas Repetitivos 422 e 546 do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A Emenda Constitucional (EC) n. 103/2019 vedou a conversão de tempo especial para comum a partir de sua vigência (13/11/2019), conforme artigo 25, § 2º, mantendo-se, contudo, o direito à conversão dos períodos anteriores, bem como a possibilidade de concessão de aposentadoria especial com base no artigo 19, § 1º, I.
A evolução normativa sobre a matéria pode ser resumida assim:
a) até 28/4/1995: admissível o enquadramento por categoria profissional (Decretos n. 53.831/1964 e 83.080/1979) ou exposição a agentes nocivos, com exceção de ruído e calor, que exigem prova técnica.
b) de 29/4/1995 a 5/3/1997: necessária comprovação da exposição habitual e permanente a agentes nocivos, sendo suficiente o formulário-padrão (SB-40 ou DSS-8030), salvo para ruído e calor.
c) de 6/3/1997 em diante: exigência de formulário fundado em laudo técnico ou produção de perícia (Decreto n. 2.172/1997).
d) a partir de 1º/1/2004: o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) torna-se documento essencial e substitui os antigos formulários, dispensando o laudo técnico se preenchido corretamente.
Da Fonte de Custeio
A ausência de recolhimento de contribuições adicionais pelo empregador não impede o reconhecimento da atividade especial pelo segurado, conforme os princípios da solidariedade e automaticidade (art. 30, I, da Lei n. 8.212/1991).
Segundo o Supremo Tribunal Federal (STF), os benefícios previstos diretamente na Constituição, como a aposentadoria especial, não estão condicionados à prévia fonte de custeio (art. 195, § 5º, da CF).
Do Agente Nocivo Ruído
Os limites legais de tolerância ao ruído são:
(i) até 5/3/1997: acima de 80 dB;
(ii) de 6/3/1997 a 18/11/2003: acima de 90 dB;
(iii) a partir de 19/11/2003: acima de 85 dB.
Nos termos do Tema Repetitivo 694 do STJ, é inviável a aplicação retroativa do novo limite (85 dB). A comprovação da exposição pode ser feita por PPP ou laudo técnico, sendo válida a metodologia diversa quando constatada a insalubridade.
Dos Agentes Químicos - Óleos e Graxas
Ainda que a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU), ao julgar o Tema 298, tenha firmado entendimento pela insuficiência da exposição genérica a óleos e graxas para fins de reconhecimento de atividade especial, esta Corte admite o enquadramento da exposição a tais agentes quando forem derivados de petróleo, especialmente os hidrocarbonetos aromáticos, os quais são classificados como potencialmente cancerígenos, conforme disposto na Portaria Interministerial MTE/MS/MPS n. 9/2014.
A jurisprudência predominante tem assentado o entendimento de que a exposição a hidrocarbonetos aromáticos dispensa a mensuração quantitativa, sendo possível o reconhecimento da especialidade da atividade com base na periculosidade intrínseca à natureza do agente, nos termos da legislação previdenciária e da regulamentação vigente.
Do Equipamento de Proteção Individual - EPI
Segundo deliberação do Supremo Tribunal Federal (STF), no Tema 555 da repercussão geral (ARE n. 664.335), o uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI) somente afasta o reconhecimento da especialidade da atividade quando comprovadamente eficaz na neutralização da nocividade. Havendo dúvida quanto à eficácia do equipamento ou em caso de exposição a níveis de ruído superiores aos limites de tolerância, deve-se reconhecer a especialidade da atividade, ainda que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) indique o fornecimento de EPI tido como eficaz.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o Tema Repetitivo n. 1.090, firmou as seguintes teses jurídicas sobre a matéria:
I – A informação constante do PPP acerca da utilização de EPI descaracteriza, em princípio, o tempo especial, ressalvadas as hipóteses excepcionais em que, mesmo diante de proteção comprovada, é reconhecido o direito à contagem diferenciada.
II – Compete à parte autora da ação previdenciária demonstrar:
(i) a inadequação do EPI ao risco da atividade exercida;
(ii) a inexistência ou irregularidade do respectivo certificado de conformidade;
(iii) o descumprimento das normas relativas à manutenção, substituição e higienização do EPI;
(iv) a ausência ou insuficiência de orientação e treinamento quanto ao uso correto, guarda e conservação do equipamento;
(v) ou qualquer outro fator que permita concluir pela ineficácia do EPI.
III – Se a análise probatória revelar dúvida razoável ou divergência quanto à real eficácia do EPI, a conclusão deve ser favorável ao segurado.
Conforme disposto no artigo 291 da Instrução Normativa INSS n. 128/2022, a eficácia do EPI não obsta o reconhecimento de atividade especial exercida até 3/12/1998, data da vigência da Medida Provisória n. 1.729/1998, posteriormente convertida na Lei n. 9.732/1998, para qualquer agente nocivo.
À luz dos desdobramentos dos Temas 555 do STF e 1.090 do STJ, verifica-se que, em determinadas hipóteses de exposição a agentes nocivos, o uso de EPI não afasta o reconhecimento da especialidade da atividade, seja pela inexistência de equipamento eficaz, seja por sua ineficácia prática (inocuidade).
As principais hipóteses em que se presume a ineficácia prática do EPI são:
(i) Agentes Biológicos:
Não há EPI capaz de neutralizar integralmente o risco de contaminação, em razão da natureza invisível e difusa dos agentes, da possibilidade de falhas humanas ou técnicas no uso dos equipamentos e do fato de a exposição ser inerente à função. Por isso, há presunção de ineficácia prática nesse caso.
(ii) Agentes Cancerígenos (até 2020):
Até a edição da IN INSS n. 128/2022, era reconhecida a inexistência de EPI eficaz para agentes reconhecidamente cancerígenos, conforme a Lista Nacional de Doenças Relacionadas ao Trabalho – LINACH (Portaria GM/MS n. 2.309/2022). A jurisprudência, até então, reconhecia a impossibilidade de neutralização total do risco cancerígeno.
(iii) Periculosidade:
O risco decorre da possibilidade de acidente de grandes proporções, de natureza acidental e imprevisível. O EPI, nesse caso, não elimina o perigo, apenas atenua os danos, razão pela qual não se reconhece eficácia plena do equipamento.
(iv) Ruído acima dos limites legais:
Conforme deliberação nos Temas 555 do STF e 1.090 do STJ, o fornecimento de EPI, ainda que considerado eficaz, não descaracteriza a especialidade da atividade, pois não é possível assegurar a neutralização integral dos efeitos agressivos do ruído sobre o organismo do trabalhador, os quais vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas.
Do Caso Concreto
Analisados os autos, é possível reconhecer a especialidade do único período controvertido de 19/11/2003 a 17/4/2023 (emissão do documento - com conversão de tempo de serviço em especial até 13/11/2019 - EC n. 103/2019), pois consta Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP (ID 331834722, p. 28/30), que revela exposição habitual e permanente a agentes químicos deletérios (tais como: butoxietanol, propanol, ácido nítrico, ácido sulfúrico, cloreto de hidrogênio, formaldeído, etc.), o que possibilita o reconhecimento da atividade insalutífera em conformidade com os códigos 1.0.0, 1.0.17 e 1.0.19 dos anexos dos Decretos n. 2.172/1997 e 3.048/1999.
O formaldeído é substância amplamente reconhecida por seus efeitos danosos à saúde, sobretudo por sua ação irritante às mucosas, toxicidade sistêmica e, mais recentemente, por seu potencial cancerígeno, conforme classificação da Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos (LINACH), elaborada pelo Ministério da Saúde por meio da Fundacentro, com base em critérios da IARC/OMS (Grupo 1).
Desse modo, para agentes cancerígenos, como o formaldeído, a simples presença do agente no ambiente de trabalho é suficiente para caracterizar a exposição nociva, ainda que haja fornecimento de EPI.
Isso se deve ao fato de que o EPI pode, no máximo, atenuar a exposição, mas não é capaz de neutralizar o potencial cancerígeno, dada a possibilidade de absorção dérmica e inalação de vapores.
Em outras palavras, demonstrada nos autos a sujeição ao formaldeído, mesmo com a utilização de EPI, deve ser reconhecida a especialidade da atividade, com fulcro nos Decretos acima mencionados e na proteção constitucional à saúde do trabalhador (art. 7º, XXII, da CF).
Por outro lado, não é possível reconhecer a especialidade do interregno de 18/4/2023 a 30/4/2023, por não estar respaldado em PPP ou laudo técnico.
O mencionado Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) referente ao lapso de 15/8/2000 a 17/4/2023 (data de emissão do documento) não indica exposição a agentes nocivos no intervalo posterior a essa última data.
De fato, não foram juntados documentos hábeis a demonstrar a pretendida especialidade ou o alegado trabalho nos moldes previstos nos instrumentos normativos supramencionados no tocante ao interstício em debate.
Em síntese, o intervalo de 19/11/2003 a 17/4/2023 deve ser enquadrado como especial, juntamente com os períodos reconhecidos como especiais na sentença (de 6/1/1986 a 1º/8/1989 e de 15/8/2000 a 18/11/2003) e não impugnados pela autarquia que, inclusive, nem apresentou recurso de apelação.
Da Aposentadoria por Tempo de Serviço/Contribuição e Programada
Somados os períodos reconhecidos nestes autos aos lapsos incontroversos, conclui-se que a parte autora faz jus à aposentadoria conforme o artigo 17 das regras de transição da EC n. 103/2019, na data requerida (10/4/2024 - ajuizamento da ação), conforme a seguinte apuração:
Com efeito, depreende-se do sistema cadastral do INSS (Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS), que a parte autora continuou trabalhando em período posterior à data do requerimento administrativo (DER 25/5/2023).
Em razão do cômputo de tempo de serviço comum entre a DER (25/5/2023) e o ajuizamento da ação (10/4/2024), o termo inicial do benefício deve ser fixado na data da citação (TNU, Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei n. 0002863-91.2015.4.01.3506, Relator Juiz Federal Sérgio de Abreu Brito, publicado em 31/10/2018).
Ademais, importante frisar que não são contemplados pela hipótese de reafirmação da DER (Tema n. 995 do STJ) os casos nos quais o preenchimento dos requisitos ocorre até a data do ajuizamento da ação (STJ; Primeira Seção; EDcl nos EDcl do Resp n. 1.727.063/SP, Relator Ministro Mauro Campbell Marques; DJ 26/8/2020; DJe 4/9/2020).
Demais Questões
Sobre atualização do débito e compensação da mora, até o mês anterior à promulgação da Emenda Constitucional n. 113, de 8/12/2021, há de ser adotado o seguinte:
(i) a correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal;
(ii) os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês, até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.
Contudo, desde o mês de promulgação da Emenda Constitucional n. 113, de 8/12/2021, a apuração do débito se dará unicamente pela Taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da Taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária.
Em virtude de sucumbência recíproca e da vedação à compensação (art. 85, § 14, da Lei n. 13.105/2015), os honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre as prestações vencidas até a data deste acórdão (Súmula n. 111 do STJ), serão distribuídos igualmente entre os litigantes (art. 86 do CPC), ficando, porém, em relação à parte autora, suspensa a exigibilidade, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita (art. 98, § 3º, do CPC).
Sobre as custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/1974, 8.620/1993 e 9.289/1996, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/1985 e 11.608/2003. Contudo, essa isenção não a exime do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Possíveis valores não cumulativos com o benefício deferido ou recebidos a mais em razão de tutela provisória deverão ser compensados na fase de cumprimento do julgado.
No que concerne ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade alguma à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Dispositivo
Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação da parte autora para, nos termos da fundamentação supra: (i) também enquadrar como atividade especial o intervalo de 19/11/2003 a 17/4/2023 (com conversão de tempo de serviço comum em especial até 13/11/2019 - EC n. 103/2019); (ii) reconhecer o direito do autor e determinar a concessão da aposentadoria conforme o artigo 17 das regras de transição da EC n. 103/2019, desde a data da citação; (iii) estabelecer os critérios de incidência dos consectários legais.
É o voto.
| Autos: | APELAÇÃO CÍVEL - 5013643-87.2024.4.03.6301 |
| Requerente: | FRANCISCO BENTO DA SILVA |
| Requerido: | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Ementa: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES QUÍMICOS CANCERÍGENOS. ENQUADRAMENTO. APOSENTADORIA CONFORME O ARTIGO 17 DAS REGRAS DE TRANSIÇÃO DA EC N. 103/2019. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
I. CASO EM EXAME
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Ação previdenciária ajuizada em face do INSS visando ao reconhecimento de tempo de serviço especial, com fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição. A sentença julgou parcialmente procedente o pedido, reconhecendo como especial parte dos períodos requeridos. A parte autora apelou, pleiteando o reconhecimento da especialidade do intervalo afastado na decisão a quo, com a reafirmação da Data de Entrada do Requerimento (DER) para a concessão de benefício mais vantajoso.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
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As questões em discussão são: (i) reconhecer se determinado período deve ser enquadrado como tempo de serviço especial, em razão da exposição habitual a agentes químicos nocivos, incluindo formaldeído; (ii) verificar se a parte autora faz jus à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, com reafirmação da DER.
III. RAZÕES DE DECIDIR
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A legislação aplicável à caracterização de tempo especial é a vigente à época da prestação do serviço, sendo admitida a conversão de tempo especial em comum até 13/11/2019, data da entrada em vigor da EC n. 103/2019.
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A exposição habitual e permanente a agentes químicos nocivos (como formaldeído), devidamente comprovada em PPP, enseja o reconhecimento da especialidade da atividade, conforme os Decretos n. 2.172/1997 e 3.048/1999.
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O formaldeído é classificado como agente cancerígeno pela LINACH e pela IARC, sendo inaplicável a descaracterização da atividade especial com base no uso de EPI, nos termos do Tema 555 do STF.
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Mesmo havendo indicação de fornecimento de EPI no PPP, sua eficácia é presumida inócua em se tratando de agente cancerígeno, não afastando o direito à contagem diferenciada.
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Reconhecida a especialidade do intervalo controvertido, somado aos demais períodos reconhecidos, a parte autora implementa os requisitos para aposentadoria pelas regras de transição do artigo 17 da EC n. 103/2019, na data de reafirmação da DER requerida.
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O termo inicial do benefício deve ser fixado na data da citação, nos termos da jurisprudência da TNU, quando o implemento dos requisitos ocorre entre a DER e o ajuizamento da ação.
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A correção monetária e os juros moratórios devem observar o RE 870.947 (STF) e a EC n. 113/2021, aplicando-se a Taxa SELIC de forma exclusiva a partir de sua promulgação.
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A verba honorária deve ser rateada entre as partes, observada a sucumbência recíproca e a suspensão da exigibilidade quanto à parte autora, beneficiária da justiça gratuita.
IV. DISPOSITIVO E TESE
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Recurso parcialmente provido.
Tese de julgamento:
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A exposição habitual e permanente a formaldeído, agente químico reconhecidamente cancerígeno, permite o enquadramento do tempo de serviço como especial, independentemente da indicação de EPI eficaz.
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O reconhecimento de atividade especial com base em exposição a agentes nocivos pode ser feito com base em PPP que demonstre a presença contínua dos agentes, nos termos da legislação previdenciária e dos Decretos vigentes.
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É devida a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição com base no artigo 17 da EC n. 103/2019, quando os requisitos são implementados até a data do ajuizamento da ação, devendo o benefício ter como termo inicial a data da citação.
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 7º, XXII; 195, § 5º; EC n. 103/2019, arts. 17 e 25, § 2º; Lei n. 8.212/1991, art. 30, I; Lei n. 13.105/2015 (CPC), arts. 85, § 14, e 86; Decreto n. 2.172/1997; Decreto n. 3.048/1999; IN INSS n. 128/2022, art. 291.
Jurisprudência relevante citada: STF, ARE 664.335 (Tema 555, Repercussão Geral); STJ, REsp 1.727.063/SP; STJ, Tema 1090; STJ, Tema 995; STJ, Temas 422, 546 e 694; TNU, PEDILEF 0002863-91.2015.4.01.3506; STF, RE 870.947 (Repercussão Geral).
ACÓRDÃO
Desembargadora Federal
