Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0016805-52.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
29/07/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 03/08/2021
Ementa
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL:PREVIDENCIÁRIO. LOAS. IDADE/DEFICIÊNCIA. MISERABILIDADE.
REQUISITOS PREENCHIDOS.
1. Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 2015 e, em razão
de sua regularidade formal, conforme certificado nos autos, a apelação interposta deve ser
recebida e apreciada em conformidade com as normas ali inscritas.
2.O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.A concessão do benefício assistencial (LOAS) requer o preenchimento
concomitante do requisito de deficiência/idade e de miserabilidade. Requisitos legais preenchidos.
3. Do cotejo do estudo social, da deficiênciada parte autora e suadependência econômica, bem
como a insuficiência de recursos da família, é forçoso reconhecer o quadro de pobreza e extrema
necessidade que se apresenta.
4.Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de
2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial -
IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do
julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de
Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração
opostos pelo INSS.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
5.Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, mantidos em 10% do
valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ), até porque
moderadamente arbitrados pela decisão apelada.
6.Desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados na
sentença devem, no caso, ser majorados em 2%, nos termos do art. 85, § 11, do CPC/2015.
7. Recurso desprovido.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0016805-52.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA APARECIDA SUDARIO
Advogado do(a) APELADO: EDMAR ROBSON DE SOUZA - SP303715-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0016805-52.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA APARECIDA SUDARIO
Advogado do(a) APELADO: EDMAR ROBSON DE SOUZA - SP303715-N
R E L A T Ó R I O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de
apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS contra
sentença quejulgou procedente o pedido de concessão do benefício assistencial, previsto no
artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, condenando o INSS a pagar o benefício a partir da
data da citação, no valor de um salário mínimo mensal, com aplicação de correção monetária e
juros de mora,e ao pagamento de honorários advocatícios.
Em suas razões de apelação o INSS pugna pela reforma da sentença, alegando, em síntese:
-quepara se ter o direito ao benefício assistencial em questão, dois são os requisitos a serem
preenchidos cumulativamente, quais sejam: que a renda familiar per capita seja inferior à 1/4 do
salário mínimo e que o autor seja pessoa portadora de deficiência física stricto sensu, não
sendo devido caso o requerente seja apenas portador de doença que o incapacite para o
trabalho;
- que o termo inicial do benefício deve ser fixado àdatada juntada do laudo pericial;
- que os juros de mora e correção monetária devem observar a Lei nº 11.960/2009, com
aplicação da TR;
- que os honorários advocatícios foram fixados em valor exagerado.
Por fim, pré-questiona, para efeito de recurso especial ou extraordinário, ofensa a dispositivos
de lei federal e de preceitos constitucionais.
Com contrarrazões, subiram os autos a este Eg. Tribunal.
Oficiando nesta instância, a representante do Ministério Público Federal opinou pelo não
provimento do recurso.
É O RELATÓRIO.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0016805-52.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA APARECIDA SUDARIO
Advogado do(a) APELADO: EDMAR ROBSON DE SOUZA - SP303715-N
V O T O
A EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora):Recebo a apelação
interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de sua regularidade
formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
MÉRITO
O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.
O Benefício da Prestação Continuada (BPC) consiste na garantia de um salário mínimo mensal
ao idoso com 65 anos ou mais ou pessoa com deficiência de qualquer idade com impedimentos
de natureza física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo (que produza efeitos pelo
prazo mínimo de 2 anos), que o impossibilite de participar, em igualdade de condições, com as
demais pessoas da vida em sociedade de forma plena e efetiva. Tratando-se de benefício
assistencial, não há período de carência, tampouco é necessário que o requerente seja
segurado do INSS ou desenvolva alguma atividade laboral, sendo imprescindível, porém, a
comprovação da hipossuficiência própria e/ou familiar.
O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal garante o benefício em comento às pessoas
com deficiência que não possuam meios de prover à sua própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família.
A previsão deste benefício guarda perfeita harmonia com a Constituição de 1988, que
hospedou em seu texto princípios que incorporam exigências de justiça e valores éticos, com
previsão de tarefas para que o Estado proceda à reparação de injustiças.
A dignidade humana permeia todas as matérias constitucionais, sendo um valor supremo. E a
cidadania não se restringe ao seu conteúdo formal, sendo a legitimidade do exercício político
pelos indivíduos apenas uma das vertentes da cidadania, que é muito mais ampla e tem em seu
conteúdo constitucional a legitimidade do exercício dos direitos sociais, culturais e econômicos.
Os Princípios Fundamentais previstos no artigo 3º da Constituição Federal de 1988, voltados
para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, objetivando a erradicação da
pobreza e a redução das desigualdades sociais e regionais, dão suporte às normas públicas
voltadas ao amparo de pessoas em situação de miséria.
No mais, destaco que o julgamentos dos casos de LOAS, pela análise do cabimento ou não da
percepção do Benefício de Prestação Continuada (BPC) contribui para o cumprimento da Meta
9 do CNJ,que prevê a integração da Agenda 2030 da ONU pelo Poder Judiciário, guardando
especial consonância os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável de número 1 e 2 (ODS 1 e
2) desta Agenda, qual sejam: "erradicação da pobreza; e fome zero”, especialmente com as
metas1.3“Implementar, em nível nacional, medidas e sistemas de proteção social adequados,
para todos, incluindo pisos, e até 2030 atingir a cobertura substancial dos pobres e vulneráveis
(...)”; e 2.1“Até 2030, acabar com a fome e garantir o acesso de todas as pessoas, em particular
os pobres e pessoas em situações vulneráveis, incluindo crianças, a alimentos seguros,
nutritivos e suficientes durante todo o ano.”
É com esse espírito que o benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V, da Carta deve
ser compreendido.
O § 2º do artigo 20 da Lei 8.742/1993, define pessoa com deficiência como aquela que tem
impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em
interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
O conceito adotado pela ONU (Organização das Nações Unidas), na Convenção Sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência, ingressou formalmente no ordenamento pátrio com a
ratificação desta Convenção e promulgado pelo Decreto nº 6.949/2009. Em 2015, com a Lei
13.146/2015, o conceito de pessoa com deficiência foi ampliado. A norma preceitua que as
barreiras limitadoras não precisam ser "diversas", não precisam se "somar", bastando a
presença de única limitação. Ao mesmo tempo, verifica-se que as limitações de que trata a Lei
atual ampliam a noção de incapacidade pura e simples para o trabalho e para a vida
independente, para a análise da situação de vulnerabilidade do requerente pelo conjunto de
circunstâncias capazes de impedir a integração justa, plena e igualitária na sociedade daquele
que necessita de proteção social.
Nesse sentido, as avaliações de que trata o § 6º do artigo 20, que sujeita a concessão do
benefício às avaliações médica e social, devendo a primeira considerar as deficiências nas
funções e nas estruturas do corpo do requerente, e, a segunda, os fatores ambientais, sociais e
pessoais a que está sujeito.
Insta salientar, ainda, que o fato de a incapacidade ser temporária não impede a concessão do
benefício, nos termos da Súmula 48 da TNU:
"A incapacidade não precisa ser permanente para fins de concessão do benefício assistencial
de prestação continuada".
No que diz respeito ao requisito socioeconômico, o § 3º do artigo 20 da Lei 8.742/1993, com
redação dada pela recente Lei 13.981/2020, considera como hipossuficiente para consecução
deste benefício pessoa incapaz de prover a sua manutenção por integrar famíliacuja renda
mensal per capita seja inferior a 1/2 (meio) salário-mínimo.
O § 11 do artigo 20, incluído pela Lei 13.146/2015, normatizou que a comprovação da
miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade do requerente podem ser
aferidos por outros elementos probatórios, além da limitação da renda per capita familiar.
Com efeito, cabe ao julgador avaliar o estado de necessidade daquele que pleiteia o benefício,
consideradas suas especificidades, não devendo se ater à presunção absoluta de
miserabilidade que a renda per capita sugere: Precedentes do C. STJ: AgRg no AREsp
319.888/PR, 1ª Turma, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJE 03/02/2017; AgRg no
REsp 1.514.461/SP, 2ª Turma, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJE 24/05/2016; REsp
1.025.181/RS, 6ª Turma, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJE 29/09/2008).
Assim sendo, o inconformismo da autarquia não procede, devendo ser mantida a r. sentença
monocrática por seus próprios fundamentos, os quais seguem reproduzidos (ID 102336037 -PG
138/143):
"Presente um dos requisitos, imprescindível à análise das demais exigências legais.
Depreende-se do relatório socioeconômico elaborado pela Sra. Assistente Social, que a autora
e seu marido fazem uso contínuo de medicamentos e que, em virtude dos problemas de saúde,
vez que apresenta quadro de depressão, hemorragia ocular e catarata, além de ser portadora
de diabetes desde os dezessete anos. Apontou que reside com o marido, único provedor
econômico da família, e duas filhas que não trabalham, sendo que os gastos mensais são
bancados pelo esposo na sua totalidade, Ainda, convém salientar que residem em casa própria,
com construção em alvenaria, forro de PVC, três quartos, sala, cozinha e banheiro, com
atendimento dos serviços públicos, em bom estado de higiene e organização, equipada com
móveis conservados. (...) Assim, não se justifica que, para fins de concessão do beneficio
assistencial - LOAS, o qual possui a mesma natureza distributiva de renda dos demais
benefícios mencionados, seja considerado hipossuficiente apenas aquele cuja renda por
familiar não exceda a ¼ (um quarto) do salário mínimo. A isso se acresce o fato de que, para a
percepção dos benefícios de Cartão - Alimentação e renda mínima, basta a hipossuficiência,
enquanto que, no beneficio assistencial (LOAS), exige-se, além da hipossuficiência, a idade
avançada ou a incapacidade, o que torna mais severo o risco social da autora. (...)No mais, o
estudo social realizado, às fls.110/114, constatou que a autora provêm deuma família de 04
(quatro) pessoas e sobrevive somente com o salário de seu marido. Há de se considerar, ainda,
que a autora não se encontra apta ao exercício de atividade laborativas devido aos problemas
de saúde que lhe acometem, incapacitando-a totalmente para o trabalho de forma permanente,
pois teve sua perna amputada e ainda apresenta outras moléstias, fato que lhe obriga a tomar
diversos remédios de uso continuo, conforme constatado em laudo pericial judicial (fls.100/106).
Em que pese a renda per capita ser superior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo,não há
impedimento para a concessão do beneficio do amparo assistencial à autora, ante a
comprovação do estado de miserabilidade e da deficiência que lhe atinge."
Assim, da análise dos autos verifica-se que a renda donúcleo familiar é insuficiente para o
pagamento das despesas básicas da casa.
O termo inicial do benefício, em regra, deve ser fixado à data do requerimento administrativo ou,
na sua ausência, à data da citação (Súmula nº 576/STJ) ou, ainda, na hipótese de benefício
cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício.
No caso, o termo inicial do benefício fica mantido à data da citação, ante à míngua de recurso
da parte autora.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho
de 2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo
Especial - IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal,
quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na
sistemática de Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos
de declaração opostos pelo INSS.
Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta
Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento
pacificado nos Tribunais Superiores.
Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, mantidos em 10% do
valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ), até porque
moderadamente arbitrados pela decisão apelada.
Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11, como
um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos
honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte
contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os
limites estabelecidos na lei.
Assim, desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados na
sentença devem, no caso, ser majorados em 2%, nos termos do artigo 85, parágrafo 11, do
CPC/2015.
Relativamente ao pré-questionamento de matéria ofensiva a dispositivos de lei federal e de
preceitos constitucionais, tendo sido o recurso apreciado em todos os seus termos, nada há que
ser discutido ou acrescentado aos autos.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso, condenando o INSS ao pagamento dos honorários
recursais.
É COMO VOTO.
/gabiv/jb
DECLARAÇÃO DE VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO:
Cuida-se, aqui, de demanda objetivando a concessão de benefício assistencial previsto no art.
203, V, da Constituição Federal.
A despeito de cumprido o requisito do impedimento de longo prazo, tenho por não demonstrada
a hipossuficiência econômica.
Conforme se verifica do estudo social, a autora reside em imóvel próprio, com boas condições
de uso e conservação, em companhia do marido e dois filhos, com 13 e 24 anos de idade, à
época.
A renda familiar deriva do salário auferido pelo cônjuge da requerente, decorrente de seu labor
na condição de motorista de basculante, no montante informado de R$1.513,00. As despesas
declaradas totalizam R$1.678,33 e, como se vê, praticamente equalizam-se com a receita.
Registro, por oportuno, que, sob o mesmo teto, reside um filho de 24 anos de idade, sobre o
qual inexistem informações acerca de eventual desempenho de atividade laborativa, ou mesmo
a impossibilidade de fazê-lo.
Nesse particular, não há que se perder de vista o princípio da solidariedade familiar, que impõe
aos integrantes da entidade familiar, aqui entendida na forma protegida pela Constituição em
seu artigo 226, o dever da mútua assistência material. Segundo o disposto nos artigos 399 do
CC/1916 e 1.695 do Código Civil de 2002, são devidos alimentos pelos parentes, inclusive
irmãos (artigos 398 e 1.697, respectivamente), que possam fornecê-los sem desfalque do
necessário ao seu próprio sustento, quando quem os pretende não tiver bens suficientes, nem
puder prover, pelo seu trabalho, à própria mantença. Evidencia-se, assim, o caráter supletivo da
atuação estatal, haja vista que o amparo assistencial, como previsto na Constituição, é devido
àquele que não possui meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua
família.
Por todo o exposto, em minuciosa análise do conjunto fático probatório, verifico que o núcleo
familiar não se enquadra na concepção legal de hipossuficiência econômica, não fazendo,
portanto, a autora, jus ao benefício assistencial.
É preciso que reste claro ao jurisdicionado que o benefício assistencial da prestação continuada
é auxílio que deve ser prestado pelo Estado, portanto, por toda a sociedade, in extremis, ou
seja, nas específicas situações que preencham os requisitos legais estritos, bem como se e
quando a situação de quem o pleiteia efetivamente o recomende, no que se refere ao pouco
deixado pelo legislador para a livre interpretação do Poder Judiciário.
Ainda que o magistrado sensibilize-se com a situação apresentada pela parte autora e
compadeça-se com a horripilante realidade a que são submetidos os trabalhadores em geral,
não pode determinar à Seguridade a obrigação de pagamento de benefício, que independe de
contribuição, ou seja, cujo custeio sairá da receita do órgão pagador - contribuições
previdenciárias e sociais - e cujos requisitos mínimos não foram preenchidos, sob pena de criar
perigoso precedente que poderia causar de vez a falência do já cambaleado Instituto
Securitário.
O legislador não criou programa de renda mínima. Até porque a realidade econômico-
orçamentária nacional não suportaria o ônus financeiro disto. As Leis nº 8.742/93 e 10.741/03
vão além e exigem que o demandante se encontre em situação de risco. Frisa-se que o dever
de prestar a assistência social, por meio do pagamento pelo Estado de benefício no valor de um
salário mínimo, encontra-se circunspecto àqueles que se encontram em situação de
miserabilidade, ou seja, de absoluta carência, situação essa que evidencia que a sobrevivência
de quem o requer, mesmo com o auxílio de outros programas sociais, como fornecimento
gratuito de medicamentos e tratamentos de saúde pela rede pública, não são suficientes a
garantir o mínimo existencial.
Repito que o benefício em questão, que independe de custeio, não se destina à
complementação da renda familiar baixa e a sua concessão exige do julgador exerça a ingrata
tarefa de distinguir faticamente entre as situações de pobreza e de miserabilidade, eis que tem
por finalidade precípua prover a subsistência daquele que o requer.
Inverto, por conseguinte, o ônus sucumbencial, condenando a parte autora no ressarcimento
das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como no
pagamento dos honorários advocatícios, os quais arbitro no percentual mínimo do §3º do artigo
85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor atribuído à causa, devidamente
atualizado (art. 85, §2º, do CPC).
Havendo a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no §3º
do artigo 98 do CPC, ficará a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a
situação de insuficiência de recursos que a fundamentou.
Ante o exposto, divirjo da e. Relatora e, pelo meu voto, dou provimento à apelação interposta
pelo INSS, a fim de reformar a r. sentença de primeiro grau de jurisdição e julgar improcedente
o pedido inicial.
É como voto.
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL:PREVIDENCIÁRIO. LOAS. IDADE/DEFICIÊNCIA. MISERABILIDADE.
REQUISITOS PREENCHIDOS.
1. Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 2015 e, em
razão de sua regularidade formal, conforme certificado nos autos, a apelação interposta deve
ser recebida e apreciada em conformidade com as normas ali inscritas.
2.O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.A concessão do benefício assistencial (LOAS) requer o preenchimento
concomitante do requisito de deficiência/idade e de miserabilidade. Requisitos legais
preenchidos.
3. Do cotejo do estudo social, da deficiênciada parte autora e suadependência econômica, bem
como a insuficiência de recursos da família, é forçoso reconhecer o quadro de pobreza e
extrema necessidade que se apresenta.
4.Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho
de 2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo
Especial - IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal,
quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na
sistemática de Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos
de declaração opostos pelo INSS.
5.Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, mantidos em 10%
do valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ), até porque
moderadamente arbitrados pela decisão apelada.
6.Desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados na
sentença devem, no caso, ser majorados em 2%, nos termos do art. 85, § 11, do CPC/2015.
7. Recurso desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo NO
JULGAMENTO, A SÉTIMA TURMA, POR MAIORIA, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO
RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DA RELATORA, COM QUEM VOTARAM O DES.
FEDERAL TORU YAMAMOTO E O DES. FEDERAL NEWTON DE LUCCA, VENCIDOS O
DES. FEDERAL CARLOS DELGADO E O DES. FEDERAL PAULO DOMINGUES QUE DAVAM
PROVIMENTO À APELAÇÃO INTERPOSTA PELO INSS. LAVRARÁ O ACÓRDÃO A
RELATORA, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
