Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5238796-44.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
13/08/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 17/08/2021
Ementa
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. LOAS. IDADE E MISERABILIDADE. APELAÇÃO DO
INSS IMPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA.
1 - Apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de sua
regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo
Civil.
2- O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.
3- Sentença monocrática mantida por seus próprios fundamentos.
4-Passando à verificação da existência desses elementos, observa-se que a parte autora tem,
atualmente, 70 anos de idade, podendo ser considerada pessoa idosa, nos moldes da Lei nº
10.741/03. Em razão disso, considero o primeiro requisito preenchido. No tocante à
impossibilidade de prover o próprio sustento, não há nos autos nada que comprove ter a parte
autora uma fonte de renda, nem que receba outro benefício previdenciário. Por fim, passo à
análise do requisito relativo à impossibilidade da família arcar com seu sustento. A Assistente
Social constatou que o autor reside na companhia da mulher, também pessoa idosaque os filhos
contribuem apenas para o custeio das despesas mais necessárias, sendo certo que nem sempre
conseguem ajudar; que a família não possui outra fonte de renda, sobrevivendo com muita
dificuldade; que o requerente não possui condições de desenvolver atividades laborativas (idade
avançada, acometido por diversas enfermidades, sofreu AVC em 2018, do qual sobreveio
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
sequela); que sua mulher também possui problemas de saúde (tem safena desde 2017), fazendo
uso contínuo de medicamentos.No caso, a situação de miserabilidade foi constatada no estudo
social, sendo de rigor a procedência da ação."
5- O termo inicial do benefício, em regra, deve ser fixado à data do requerimento administrativo
negado, requisito indispensável para a propositura da ação em face do INSS, consoante a
decisão do E. STF com repercussão geral, no RE 631.240 - ou, ainda, na hipótese de benefício
cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício.
6- Apelação desprovida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5238796-44.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CEZAR FRANCISCO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: PATRICIA MAGALHAES PORFIRIO - SP196090-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5238796-44.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CEZAR FRANCISCO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: PATRICIA MAGALHAES PORFIRIO - SP196090-A
R E L A T Ó R I O
A EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora): Trata-se de apelação
interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS contra a r. sentença (Id.:130957268,
págs. 1/3) que julgou procedente o pedido de restabelecimentodeBenefício de Prestação
Continuada ao idoso, condenando o requerido a conceder ao requerente o benefício de amparo
assistencial, no valor de um salário mínimo, a partir da data de seu cancelamento (20/10/2016),
abatendo-se os valores pagos a título de tutela antecipada. Extinguindo o processo, com
análise do mérito, nos termos do art. 487, inc. I, do Código de Processo Civil. As verbas
atrasadas, observadas a prescrição quinquenal, serão corrigidas monetariamente a partir dos
respectivos vencimentos e acrescidas de juros moratórios a partir da citação, sendo que os
índices serão discutidos em cumprimento de sentença, considerando a pendência em relação
ao Tema 810 do STF. Condenandoa autarquia ré, também, ao pagamento de custas e
honorários, fixadosem 10% do valor da liquidação, consideradas as parcelas vencidas até a
data da sentença, conforme orientação jurisprudencial do STJ. Dispensado o reexame
necessário, tendo em vista que o valor da condenação dificilmente ultrapassará o teto de 1000
salários mínimos do art. 496, §3º, I, CPC. PRIC. .
Em suas razões de apelação, sustenta o INSS "Requer seja conhecido e provido o presente
recurso, com a reforma da sentença a quo nos termos dafundamentação supra. No entanto,
caso não seja este o entendimento deste E. Tribunal, requer a Autarquia seja a DIB fixada na
data da citação da ré."
Prequestiona, para efeito de recurso especial ou extraordinário, ofensa a dispositivos de lei
federal e de preceitos constitucionais.
Com contrarrazões, os autos foram remetidos a esta E. Corte Regional.
Parecer do Ministério Público Federal pelo desprovimento da apelação (Id.:135336375).
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5238796-44.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CEZAR FRANCISCO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: PATRICIA MAGALHAES PORFIRIO - SP196090-A
V O T O
A EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora):
Recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de
sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de
Processo Civil.
MÉRITO
O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.
O Benefício da Prestação Continuada (BPC) consiste na garantia de um salário mínimo mensal
ao idoso com 65 anos ou mais ou pessoa com deficiência de qualquer idade com impedimentos
de natureza física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo (que produza efeitos pelo
prazo mínimo de 2 anos), que o impossibilite de participar, em igualdade de condições, com as
demais pessoas da vida em sociedade de forma plena e efetiva. Tratando-se de benefício
assistencial, não há período de carência, tampouco é necessário que o requerente seja
segurado do INSS ou desenvolva alguma atividade laboral, sendo imprescindível, porém, a
comprovação da hipossuficiência própria e/ou familiar.
O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal garante o benefício em comento às pessoas
com deficiência que não possuam meios de prover à sua própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família.
A previsão deste benefício guarda perfeita harmonia com a Constituição de 1988, que
hospedou em seu texto princípios que incorporam exigências de justiça e valores éticos, com
previsão de tarefas para que o Estado proceda à reparação de injustiças.
A dignidade humana permeia todas as matérias constitucionais, sendo um valor supremo. E a
cidadania não se restringe ao seu conteúdo formal, sendo a legitimidade do exercício político
pelos indivíduos apenas uma das vertentes da cidadania, que é muito mais ampla e tem em seu
conteúdo constitucional a legitimidade do exercício dos direitos sociais, culturais e econômicos.
Os Princípios Fundamentais previstos no artigo 3º da Constituição Federal de 1988, voltados
para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, objetivando a erradicação da
pobreza e a redução das desigualdades sociais e regionais, dão suporte às normas públicas
voltadas ao amparo de pessoas em situação de miséria.
No mais, destaco que o julgamentos dos casos de LOAS, pela análise do cabimento ou não da
percepção do Benefício de Prestação Continuada (BPC) contribui para o cumprimento da Meta
9 do CNJ,que prevê a integração da Agenda 2030 da ONU pelo Poder Judiciário, guardando
especial consonância os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável de número 1 e 2 (ODS 1 e
2) desta Agenda, qual sejam: "erradicação da pobreza; e fome zero”, especialmente com as
metas1.3“Implementar, em nível nacional, medidas e sistemas de proteção social adequados,
para todos, incluindo pisos, e até 2030 atingir a cobertura substancial dos pobres e vulneráveis
(...)”; e 2.1“Até 2030, acabar com a fome e garantir o acesso de todas as pessoas, em particular
os pobres e pessoas em situações vulneráveis, incluindo crianças, a alimentos seguros,
nutritivos e suficientes durante todo o ano.”
É com esse espírito que o benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V da Carta deve
ser compreendido.
O §2º do artigo 20 da Lei 8742/1993, define pessoa com deficiência como aquela que tem
impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em
interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
O conceito adotado pela ONU (Organização das Nações Unidas), na Convenção Sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência, ingressou formalmente no ordenamento pátrio com a
ratificação desta Convenção e promulgado pelo Decreto nº 6.949/2009. Em 2015, com a Lei
13.146/2015, o conceito de pessoa com deficiência foi ampliado. A norma preceitua que as
barreiras limitadoras não precisam ser "diversas", não precisam se "somar", bastando a
presença de única limitação. Ao mesmo tempo, verifica-se que as limitações de que trata a Lei
atual ampliam a noção de incapacidade pura e simples para o trabalho e para a vida
independente, para a análise da situação de vulnerabilidade do requerente pelo conjunto de
circunstâncias capazes de impedir a integração justa, plena e igualitária na sociedade daquele
que necessita de proteção social.
Nesse sentido, as avaliações de que trata o §6º do artigo 20, que sujeita a concessão do
benefício às avaliações médica e social, devendo a primeira considerar as deficiências nas
funções e nas estruturas do corpo do requerente, e, a segunda, os fatores ambientais, sociais e
pessoais a que está sujeito.
Insta salientar, ainda, que o fato de a incapacidade ser temporária não impede a concessão do
benefício, nos termos da Súmula 48 da TNU:
"A incapacidade não precisa ser permanente para fins de concessão do benefício assistencial
de prestação continuada".
No que diz respeito ao requisito socioeconômico, o § 3º do artigo 20 da Lei 8.742/1993, com
redação dada pela recente Lei 13.981/2020, considera como hipossuficiente para consecução
deste benefício pessoa incapaz de prover a sua manutenção por integrar famíliacuja renda
mensal per capita seja inferior a 1/2 (meio) salário-mínimo.
O §11 do artigo 20, incluído pela Lei 13.146/2015, normatizou que a comprovação da
miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade do requerente podem ser
aferidos por outros elementos probatórios, além da limitação da renda per capita familiar.
Com efeito, cabe ao julgador avaliar o estado de necessidade daquele que pleiteia o benefício,
consideradas suas especificidades, não devendo se ater à presunção absoluta de
miserabilidade que a renda per capita sugere: Precedentes do C. STJ: AgRg no AREsp
319.888/PR, 1ª Turma, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJE 03/02/2017; AgRg no
REsp 1.514.461/SP, 2ª Turma, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJE 24/05/2016; REsp
1.025.181/RS, 6ª Turma, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJE 29/09/2008).
Assim sendo, o inconformismo da autarquia não procede, devendo ser mantida a r. sentença
monocrática (Id.:130957268), por seus próprios fundamentos, os quais seguem reproduzidos:
"Passando à verificação da existência desses elementos, observa-se que a parte autora tem,
atualmente, 70 anos de idade, podendo ser considerada pessoa idosa, nos moldes da Lei nº
10.741/03. Em razão disso, considero o primeiro requisito preenchido.
No tocante à impossibilidade de prover o próprio sustento, não há nos autos nada que
comprove ter a parte autora uma fonte de renda, nem que receba outro benefício previdenciário
. Por fim, passo à análise do requisito relativo à impossibilidade da família arcar com seu
sustento.
A Assistente Social constatou que o autor reside na companhia da mulher, também pessoa
idosa (66 anos – fls. 18); que os filhos contribuem apenas para o custeio das despesas mais
necessárias, sendo certo que nem sempre conseguem ajudar; que a família não possui outra
fonte de renda, sobrevivendo com muita dificuldade; que o requerente não possui condições de
desenvolver atividades laborativas (idade avançada, acometido por diversas enfermidades,
sofreu AVC em 2018, do qual sobreveio sequela); que sua mulher também possui problemas de
saúde (tem safena desde 2017), fazendo uso contínuo de medicamentos.
No caso, a situação de miserabilidade foi constatada no estudo social, sendo de rigor a
procedência da ação."
O termo inicial do benefício, em regra, deve ser fixado à data do requerimento administrativo
negado, requisito indispensável para a propositura da ação em face do INSS, consoante a
decisão do E. STF com repercussão geral, no RE 631.240 - ou, ainda, na hipótese de benefício
cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício.
Cumpre ressaltar que a Suprema Cortecriouuma regra de transição para as ações ajuizadas
antes da conclusão do julgamento do referido recurso extraordinário, em 03/09/2014:
"Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que
tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado
o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de
anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha
apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à
pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas,
observando-se a sistemática a seguir."(RE 631.240 MG)
No caso, o termo inicial do benefício deve ser mantido conforme fixado na sentença, a partir de
20/10/2016 – fls. 03 e 77, data seguinte ao cancelamento do benefício.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho
de 2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo
Especial - IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal,
quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na
sistemática de Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos
de declaração opostos pelo INSS.
Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta
Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento
pacificado nos Tribunais Superiores.
Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, mantidos em 10% do
valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ), até porque
moderadamente arbitrados pela decisão apelada.
Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11, como
um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos
honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte
contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os
limites estabelecidos na lei.
Assim, desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados na
sentença devem, no caso, ser majorados em 2%, nos termos do artigo 85, parágrafo 11, do
CPC/2015.
No que se refere às custas processuais, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, tanto no
âmbito da Justiça Federal (Lei nº 9.289/96, art. 4º, I) como da Justiça Estadual de São Paulo
(Lei 9.289/96, art. 1º, § 1º, e Leis Estaduais nºs 4.952/85 e 11.608/2003).
Tal isenção, decorrente de lei, não exime o INSS do reembolso das custas recolhidas pela parte
autora (artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no caso, tendo em conta a
gratuidade processual que foi concedida à parte autora.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação do INSS, condenando-o ao pagamento dos
honorários recursais, na forma antes delineada e mantenho, quanto ao mais, a sentença
recorrida.
É COMO VOTO.
/gabiv/thgomes
DECLARAÇÃO DE VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO:
Cuida-se, aqui, de demanda objetivando a concessão de benefício assistencial previsto no art.
203, V, da Constituição Federal.
A despeito de cumprido o requisito etário, tenho por não demonstrada a hipossuficiência
econômica.
Conforme se verifica do estudo social, o autor reside com o cônjuge em imóvel próprio,
composto de quatro cômodos cobertos com telha e forro de PVC, pintura interna, sendo o lado
externo apenas rebocado. Dentre os móveis que guarnecem a residência, há uma TV de 50
polegadas.
Inexiste renda familiar.
O casal possui oito filhos, alguns casados, outros separados. São os filhos que auxiliam nas
despesas diárias dos genitores, mas não com regularidade.
Nesse particular, não há que se perder de vista o princípio da solidariedade familiar, que impõe
aos integrantes da entidade familiar, aqui entendida na forma protegida pela Constituição em
seu artigo 226, o dever da mútua assistência material. Segundo o disposto nos artigos 399 do
CC/1916 e 1.695 do Código Civil de 2002, são devidos alimentos pelos parentes, inclusive
irmãos (artigos 398 e 1.697, respectivamente), que possam fornecê-los sem desfalque do
necessário ao seu próprio sustento, quando quem os pretende não tiver bens suficientes, nem
puder prover, pelo seu trabalho, à própria mantença. Evidencia-se, assim, o caráter supletivo da
atuação estatal, haja vista que o amparo assistencial, como previsto na Constituição, é devido
àquele que não possui meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua
família.
Dessa forma, ainda que não se saiba, detalhadamente, a situação financeira dos filhos, extrai-
se, de forma inequívoca, que o sustento dos pais é por eles provido.
Por todo o exposto, em minuciosa análise do conjunto fático probatório, verifico que o núcleo
familiar não se enquadra na concepção legal de hipossuficiência econômica, não fazendo,
portanto, a autora, jus ao benefício assistencial, na forma como pretendida.
É preciso que reste claro ao jurisdicionado que o benefício assistencial da prestação continuada
é auxílio que deve ser prestado pelo Estado, portanto, por toda a sociedade, in extremis, ou
seja, nas específicas situações que preencham os requisitos legais estritos, bem como se e
quando a situação de quem o pleiteia efetivamente o recomende, no que se refere ao pouco
deixado pelo legislador para a livre interpretação do Poder Judiciário.
Ainda que o magistrado sensibilize-se com a situação apresentada pela parte autora e
compadeça-se com a horripilante realidade a que são submetidos os trabalhadores em geral,
não pode determinar à Seguridade a obrigação de pagamento de benefício, que independe de
contribuição, ou seja, cujo custeio sairá da receita do órgão pagador - contribuições
previdenciárias e sociais - e cujos requisitos mínimos não foram preenchidos, sob pena de criar
perigoso precedente que poderia causar de vez a falência do já cambaleado Instituto
Securitário.
O legislador não criou programa de renda mínima. Até porque a realidade econômico-
orçamentária nacional não suportaria o ônus financeiro disto. As Leis nº 8.742/93 e 10.741/03
vão além e exigem que o demandante se encontre em situação de risco. Frisa-se que o dever
de prestar a assistência social, por meio do pagamento pelo Estado de benefício no valor de um
salário mínimo, encontra-se circunspecto àqueles que se encontram em situação de
miserabilidade, ou seja, de absoluta carência, situação essa que evidencia que a sobrevivência
de quem o requer, mesmo com o auxílio de outros programas sociais, como fornecimento
gratuito de medicamentos e tratamentos de saúde pela rede pública, não são suficientes a
garantir o mínimo existencial.
Repito que o benefício em questão, que independe de custeio, não se destina à
complementação da renda familiar baixa e a sua concessão exige do julgador exerça a ingrata
tarefa de distinguir faticamente entre as situações de pobreza e de miserabilidade, eis que tem
por finalidade precípua prover a subsistência daquele que o requer.
Inverto, por conseguinte, o ônus sucumbencial, condenando a parte autora no ressarcimento
das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como no
pagamento dos honorários advocatícios, os quais arbitro no percentual mínimo do §3º do artigo
85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor atribuído à causa, devidamente
atualizado (art. 85, §2º, do CPC).
Havendo a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no §3º
do artigo 98 do CPC, ficará a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a
situação de insuficiência de recursos que a fundamentou.
Ante o exposto, divirjo da e. Relatora e, pelo meu voto, dou provimento à apelação interposta
pelo INSS, a fim de reformar a r. sentença de primeiro grau de jurisdição e julgar improcedente
o pedido inicial. Revogo os efeitos da tutela antecipada concedida.
É como voto.
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. LOAS. IDADE E MISERABILIDADE. APELAÇÃO DO
INSS IMPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA.
1 - Apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de sua
regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de
Processo Civil.
2- O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.
3- Sentença monocrática mantida por seus próprios fundamentos.
4-Passando à verificação da existência desses elementos, observa-se que a parte autora tem,
atualmente, 70 anos de idade, podendo ser considerada pessoa idosa, nos moldes da Lei nº
10.741/03. Em razão disso, considero o primeiro requisito preenchido. No tocante à
impossibilidade de prover o próprio sustento, não há nos autos nada que comprove ter a parte
autora uma fonte de renda, nem que receba outro benefício previdenciário. Por fim, passo à
análise do requisito relativo à impossibilidade da família arcar com seu sustento. A Assistente
Social constatou que o autor reside na companhia da mulher, também pessoa idosaque os
filhos contribuem apenas para o custeio das despesas mais necessárias, sendo certo que nem
sempre conseguem ajudar; que a família não possui outra fonte de renda, sobrevivendo com
muita dificuldade; que o requerente não possui condições de desenvolver atividades laborativas
(idade avançada, acometido por diversas enfermidades, sofreu AVC em 2018, do qual
sobreveio sequela); que sua mulher também possui problemas de saúde (tem safena desde
2017), fazendo uso contínuo de medicamentos.No caso, a situação de miserabilidade foi
constatada no estudo social, sendo de rigor a procedência da ação."
5- O termo inicial do benefício, em regra, deve ser fixado à data do requerimento administrativo
negado, requisito indispensável para a propositura da ação em face do INSS, consoante a
decisão do E. STF com repercussão geral, no RE 631.240 - ou, ainda, na hipótese de benefício
cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício.
6- Apelação desprovida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo NO
JULGAMENTO, A SÉTIMA TURMA, POR MAIORIA, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À
APELAÇÃO DO INSS, NOS TERMOS DO VOTO DA RELATORA, COM QUEM VOTARAM O
DES. FEDERAL TORU YAMAMOTO E O DES. FEDERAL DAVID DANTAS, VENCIDOS O
DES. FEDERAL CARLOS DELGADO E O DES. FEDERAL PAULO DOMINGUES QUE DAVAM
PROVIMENTO À APELAÇÃO INTERPOSTA PELO INSS
LAVRARÁ O ACÓRDÃO A RELATORA
, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
