Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5062664-06.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
12/03/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 13/03/2020
Ementa
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. LOAS.IDADE E MISERABILIDADE.VERBA
HONORÁRIA. DIB. JUROS DE MORA. CORREÇÃO MONETÁRIA. APELAÇÃO DA PARTE
AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA.
1- O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.
2 - A concessão do benefício assistencial (LOAS) requer o preenchimento concomitante do
requisito de deficiência / idade e de miserabilidade. Requisitos legais preenchidos
3 - Do cotejo do estudo social, daidade avançada da parte autora e sua dependência
econômica,bem como sua insuficiência de recursos, é forçoso reconhecer o quadro de pobreza e
extrema necessidade que se apresenta.
4 - No caso, o termo inicial do benefício é fixado em 03/07/2018, data do segundo estudo
social,uma vez que foi neste momento que a parte autora fez jus à concessão do benefício,
comprovando sua miserabilidade,já tendo preenchido o requisito etário necessário.
5- Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de
2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial -
IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do
julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração
opostos pelo INSS.
6- Invertido o ônus da sucumbência, ao INSSincumbe o pagamento de honorários advocatícios,
fixados em 10% do valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ).
7 -Apelação da parte autora parcialmente provida. Sentençareformada.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5062664-06.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: GENI DA SILVA BORGES
Advogado do(a) APELANTE: EDSON GRILLO DE ASSIS - SP262621-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5062664-06.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: GENI DA SILVA BORGES
Advogado do(a) APELANTE: EDSON GRILLO DE ASSIS - SP262621-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
R E L A T Ó R I O
A EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora): Trata-se de
apelaçãointerposta pela parte autora GENI DA SILVA BORGES contra a r. sentença (ID7323668)
que julgou improcedente o pedido de concessão do Benefício de Prestação Continuada,
condenando-a ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios arbitrados
em R$500,00 (quinhentos reais), suspensa a execução, conforme o disposto no artigo 12 da Lei
1.060/50.
Em suas razões de apelação (ID7323673), sustenta a parte autora preencher os requisitos
necessários à concessão do benefício, notadamente à incapacidade laborativa e hipossuficiência
econômica.
Pugna pela reforma da sentença.
Com contrarrazões, os autos foram remetidos a esta E. Corte Regional.
Parecer do Ministério Público Federal pelo parcial provimento da apelação (ID90183613).
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5062664-06.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: GENI DA SILVA BORGES
Advogado do(a) APELANTE: EDSON GRILLO DE ASSIS - SP262621-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
V O T O
A EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora):Recebo a apelação
interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de sua regularidade formal,
possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal,
e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da Lei
8.742/1993.
O Benefício da Prestação Continuada (BPC) consiste na garantia de um salário mínimo mensal
ao idoso com 65 anos ou mais ou pessoa com deficiência de qualquer idade com impedimentos
de natureza física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo (que produza efeitos pelo prazo
mínimo de 2 anos), que o impossibilite de participar, em igualdade de condições, com as demais
pessoas da vida em sociedade de forma plena e efetiva. Tratando-se de benefício assistencial,
não há período de carência, tampouco é necessário que o requerente seja segurado do INSS ou
desenvolva alguma atividade laboral, sendo imprescindível, porém, a comprovação da
hipossuficiência própria e/ou familiar.
O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal garante o benefício em comento às pessoas com
deficiência que não possuam meios de prover à sua própria manutenção ou de tê-la provida por
sua família.
A previsão deste benefício guarda perfeita harmonia com a Constituição de 1988, que hospedou
em seu texto princípios que incorporam exigências de justiça e valores éticos, com previsão de
tarefas para que o Estado proceda à reparação de injustiças.
Concebida dentro de uma perspectiva do Estado Social de Direito, a Constituição valoriza e
protege os direitos sociais básicos, estabelece normas pragmáticas, enfim, apresenta conteúdo
contrário ao de uma Constituição do Estado Liberal, afastando-se do repouso, do formalismo e do
divórcio entre Estado e Sociedade.
A dignidade humana permeia todas as matérias constitucionais, sendo um valor supremo. E a
cidadania não se restringe ao seu conteúdo formal, sendo a legitimidade do exercício político
pelos indivíduos apenas uma das vertentes da cidadania, que é muito mais ampla e tem em seu
conteúdo constitucional a legitimidade do exercício dos direitos sociais, culturais e econômicos.
Os Princípios Fundamentais previstos no artigo 3º da Constituição Federal de 1988, voltados para
a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, objetivando a erradicação da pobreza e a
redução das desigualdades sociais e regionais, dão suporte às normas públicas voltadas ao
amparo de pessoas em situação de miséria.
A estrutura do Estado brasileiro insculpida no texto constitucional está informada pelos direitos e
valores nela declarados, que necessitam de permanente conformação com às demandas sociais.
Como destaca Paulo Bonavides, seguindo o norte das constituições democráticas, a Constituição
brasileira carrega traços do conflito, dos conteúdos dinâmicos, do pluralismo, da tensão sempre
renovada entre igualdade e a liberdade.
É com esse espírito que o benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V da Carta deve ser
compreendido.
O §2º do artigo 20 da Lei 8742/1993, define pessoa com deficiência como aquela que tem
impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em
interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade
em igualdade de condições com as demais pessoas.
O conceito adotado pela ONU (Organização das Nações Unidas), na Convenção Sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência, ingressou formalmente no ordenamento pátrio com a
ratificação desta Convenção e promulgado pelo Decreto nº 6.949/2009. Em 2015, com a Lei
13.146/2015, o conceito de pessoa com deficiência foi ampliado. A norma preceitua que as
barreiras limitadoras não precisam ser "diversas", não precisam se "somar", bastando a presença
de única limitação. Ao mesmo tempo, verifica-se que as limitações de que trata a Lei atual
ampliam a noção de incapacidade pura e simples para o trabalho e para a vida independente, eis
que devem ser considerados, também, para a perfeita análise da situação de vulnerabilidade do
requerente, fatores sociais e o meio em que a pessoa com deficiência vive, isto é, um conjunto de
circunstâncias capazes de impedir a integração justa, plena e igualitária na sociedade daquele
que necessita de proteção social.
Nesse sentido, as avaliações de que trata o §6º do artigo 20, que sujeita a concessão do
benefício às avaliações médica e social, devendo a primeira considerar as deficiências nas
funções e nas estruturas do corpo do requerente, e, a segunda, os fatores ambientais, sociais e
pessoais a que está sujeito.
Insta salientar, ainda, que o fato de a incapacidade ser temporária não impede a concessão do
benefício, nos termos da Súmula 48 da TNU:
"A incapacidade não precisa ser permanente para fins de concessão do benefício assistencial de
prestação continuada".
No que diz respeito ao requisito socioeconômico, o § 3º do artigo 20 da Lei 8.742/1993, em linhas
gerais, considera como hipossuficiente para consecução deste benefício pessoa cuja renda por
pessoa do grupo familiar seja inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo.
A renda per capita a ser considerada para a concessão do benefício passou a ser inferior a 1/2
salário mínimo, pois o STF reconheceu a existência de repercussão geral da questão
constitucional suscitada no RE 567985 RG / MT assim ementado:
REPERCUSSÃO GERAL - BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA -
IDOSO - RENDA PER CAPITA FAMILIAR INFERIOR A MEIO SALÁRIO MÍNIMO - ARTIGO 203,
INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Admissão pelo Colegiado Maior.
(Relator: Ministro Marco Aurélio, Publicação: DJe-065, DIVULG. 10-04-2008, PUBLIC. 11-04-
2008).
Andou bem o legislador, ao incluir o § 11 no artigo 20, com a publicação da Lei 13.146/2015,
normatizando expressamente que a comprovação da miserabilidade do grupo familiar e da
situação de vulnerabilidade do requerente possam ser comprovadas por outros elementos
probatórios, além da limitação da renda per capita familiar.
Com efeito, cabe ao julgador avaliar o estado de necessidade daquele que pleiteia o benefício,
consideradas suas especificidades, não devendo se ater à presunção absoluta de miserabilidade
que a renda per capita sugere: Precedentes do C. STJ: AgRg no AREsp 319.888/PR, 1ª Turma,
Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJE 03/02/2017; AgRg no REsp 1.514.461/SP, 2ª
Turma, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJE 24/05/2016; REsp 1.025.181/RS, 6ª Turma, Rel.
Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJE 29/09/2008)
Para efeito da mensuração da renda per capita, o Regulamento do Benefício de Prestação
Continuada, instituído pelo Decreto nº 6.214/2007, definiu Grupo Familiar em seu artigo 4º, assim
dispondo:
Art. 4º. Para os fins do reconhecimento do direito ao benefício, considera-se:
(...)
V- família para cálculo da renda per capita: conjunto de pessoas composto pelo requerente, o
cônjuge, o companheiro, a companheira, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o
padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que
vivam sob o mesmo teto;
(...)
Mencionado artigo também normatizou, em seu inciso VI e §2º, as rendas que poderão ser
excluídas no cômputo da renda familiar, bem como as que devem ser consideradas nesse
cálculo, vejamos:
(...)
VI - renda mensal bruta familiar: a soma dos rendimentos brutos auferidos mensalmente pelos
membros da família composta por salários, proventos, pensões, pensões alimentícias, benefícios
de previdência pública ou privada, seguro-desemprego, comissões, pro-labore, outros
rendimentos do trabalho não assalariado, rendimentos do mercado informal ou autônomo,
rendimentos auferidos do patrimônio, Renda Mensal Vitalícia e Benefício de Prestação
Continuada, ressalvado o disposto no parágrafo único do artigo 19.
(...)
§ 2º - Para fins do disposto no inciso VI do caput, não serão computados como renda mensal
bruta familiar:
I - benefícios e auxílios assistenciais de natureza eventual e temporária;
II - valores oriundos de programas sociais de transferência de renda;
III - bolsas de estágio supervisionado;
IV - pensão especial de natureza indenizatória e benefício de assistência médica, conforme
disposto no art. 5º;
V - rendas de natureza eventual ou sazonal, a serem regulamentadas em ato conjunto do
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e do INSS; e
VI - rendimentos decorrentes de contrato de aprendizagem.
(...)
Por fim, cabe uma última ponderação, que é a consideração feita ao artigo 19, mencionado no
inciso VI do artigo supracitado:
Art. 19. O Benefício de Prestação Continuada será devido a mais de um membro da mesma
família enquanto atendidos os requisitos exigidos neste Regulamento.
Parágrafo único. O valor do Benefício de Prestação Continuada concedido a idoso não será
computado no cálculo da renda mensal bruta familiar a que se refere o inciso VI do art. 4º, para
fins de concessão do Benefício de Prestação Continuada a outro idoso da mesma família.
De acordo com esse artigo, se algum dos membros do Grupo Familiar receber igual benefício
assistencial, referido benefício deve ser excluído da renda per capita familiar.
O STJ, em sede de Recurso Repetitivo, já sedimentou o entendimento de que a mesma regra
deve ser aplicada, por analogia, também para quando houver benefício previdenciário recebido
por idoso, no valor de um salário mínimo.
Vejamos:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA.
AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA .
IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NO
VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO.
1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no valor
de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do benefício
de prestação mensal continuada a pessoa deficiente.
2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito
do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso
(Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com
deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário
mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n.
8.742/93.
3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código de
Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008.
(STJ, REsp nº 1.355.052/SP, Primeira Seção, Ministro Relator BENEDITO GONÇALVES, DJe
05/11/2015 )
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. RENDA PER CAPITA FAMILIAR.
EXCLUSÃO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO
RECEBIDO POR IDOSO QUE FAÇA PARTE DO NÚCLEO FAMILIAR. APLICAÇÃO, POR
ANALOGIA, DO ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI N. 10.741/03 (ESTATUTO DO IDOSO).
ENTENDIMENTO ASSENTADO NO JULGAMENTO DO RESP N. 1.355.052/SP, JULGADO SOB
O RITO DO ART. 543-C DO CPC. 1. A Primeira Seção, no julgamento do REsp n. 1.355.052/SP,
sob o regime dos recursos repetitivos do artigo 543-C do Código de Processo Civil, firmou o
entendimento de que: "Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n.
10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim
de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja
computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93". 2.
Agravo regimental não provido.
(STJ, AgRg no AResp 332.275/RS, 1ª Turma, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, 07/12/2015 )
Nesse sentido, os julgados desta C. Corte Regional (7ª Turma, Ap 2015.03.99.030993-0, Rel.
Des. Fed. Carlos Delgado, DJ 24/10/2016; 7ª Turma, Ap 2014.03.00.013459-1, Rel. Des. Fed.
Toru Yamamoto, DJ 27/04/2017; 8ª Turma, ApReeNec2013.61.39.001566-7, Rel. Des. Fed. Tania
Marangoni, e-DJF3 04/09/2017)
Dito isso, no caso dos autos, a autora,nascida em 18/03/1951 (ID7322097), implementou o
requisito etáriono curso ação, em 18/03/2016.
Sendo assim, a controvérsia cinge-se à condição de miserabilidade da parte autora e seu grupo
familiar, já que a idade não foi questionada, restando incontroversa.
Foram realizados dois estudos sociais. O primeiro, datado de 23/01/2017, revela que a autora
residia com seu filho, Samuel da Silva Borges, calheiro, tendo como fonte de renda unicamente a
remuneração dele, no valor de R$1.400,00 (mil e quatrocentos reais). Alegou problemas de
saúde, assim como o recebimento de auxílio municipal em cestas básicas, bem como por parte
da igreja.Em virtude de alteração no núcleo familiar, foi realizado novo estudo social em
03/07/2018, o qual indica que aautora passou a residir sozinha, precisando doamparode terceiros
para suprir suas necessidades.
Sendo onúcleo familiar compostoexclusivamente pela requerente, esta é acompanhada pelo
Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), recebendo cestas básicas através do
programa de complementação alimentar, além de receber benefício social do Programa Bolsa
Família no valor de R$87,00 (oitenta e sete reais). A parte autora não exerce atividade
remunerada, apenas realiza trabalhos domésticos na própria residência.
É de se destacar o fato de ser a requerente idosa, analfabeta e doente, bem como sua situação
econômica extremamente fragilizada, tendo em vista sua renda serzero, poisressaltoque os
recursos provenientes de Programas de Transferências de Renda, como o Programa Bolsa
Família, não entram no cálculo da renda mensal familiarpara fins de concessão do BPC.
Os cinco filhos da requerente com elanão residem, razão pela qual não compõem o núcleo
familiar para aferição de renda. Ainda que haja o dever moral de auxílio aos pais necessitados, na
prática, os filhos casados, com seu próprio núcleo a prover, nem sempre cumprem com sua
obrigação, vezes pela impossibilidade financeira, vezes por absoluta desídia.
Desse modo, conforme se verifica do laudo socioeconômico, é evidente o risco e vulnerabilidade
socialdademandante, porquanto o valor recebido não é suficiente para garantir suasubsistência
digna.
Dentro desse cenário, entendo que aautora demonstrou preencher os requisitos
legais,comprovando estar em situação de vulnerabilidade, fazendo jus ao benefício assistencial
requerido.
O termo inicial do benefício, em regra, deve ser fixado à data do requerimento administrativo ou,
na sua ausência, à data da citação (Súmula nº 576/STJ) ou, ainda, na hipótese de auxílio-doença
cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício.
Tal entendimento, pacificado no Egrégio Superior Tribunal de Justiça, está embasado no fato de
que "o laudo pericial norteia somente o livre convencimento do juiz quanto aos fatos alegados
pelas partes, mas não serve como parâmetro para fixar termo inicial de aquisição de direitos"
(AgRg no AREsp 95.471/MG, 5ª Turma, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe 09/05/2012).
Entretanto, no caso, revela-se descabidaa fixação do termo inicial do benefício àdata do
requerimento administrativo, vez que, à época do primeiro estudo social, a requerente não fazia
jus à concessão, tendo em vista a não comprovação da incapacidade, bem como de sua
hipossuficiência econômica, dado que residia com seu filho, obtendo uma renda per capita de
R$700,00 (setecentos reais), o queultrapassava em muito o teto adotado para análise do
benefício.
Sendo assim,o termo inicial do benefício é fixado em 03/07/2018, data do segundo laudo social,
pois somente nestea parte autora comprovou sua miserabilidade, já tendo, na ocasião,
implementadoo requisito etário necessário.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices previstos
no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo
Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de 2009, período
em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-e, critério
estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso
Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, e
confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração opostos pelo INSS.
Inverto o ônus da sucumbência e condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios,
fixados em 10% do valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ).
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação da parte autora, julgando procedente
a ação, para condenar o INSS à concessão do LOAS, fixando a data de início do benefício a
partir do segundo estudo social, 03/07/2018.Condeno, ainda, a autarquia ao pagamento dos
honorários advocatíciosna forma antes delineada, e especifico, de ofício, os critérios dejuros e
correção monetária, nos termos expendidos no voto.
É COMO VOTO.
/gabiv/gvillela
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. LOAS.IDADE E MISERABILIDADE.VERBA
HONORÁRIA. DIB. JUROS DE MORA. CORREÇÃO MONETÁRIA. APELAÇÃO DA PARTE
AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA.
1- O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.
2 - A concessão do benefício assistencial (LOAS) requer o preenchimento concomitante do
requisito de deficiência / idade e de miserabilidade. Requisitos legais preenchidos
3 - Do cotejo do estudo social, daidade avançada da parte autora e sua dependência
econômica,bem como sua insuficiência de recursos, é forçoso reconhecer o quadro de pobreza e
extrema necessidade que se apresenta.
4 - No caso, o termo inicial do benefício é fixado em 03/07/2018, data do segundo estudo
social,uma vez que foi neste momento que a parte autora fez jus à concessão do benefício,
comprovando sua miserabilidade,já tendo preenchido o requisito etário necessário.
5- Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de
2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial -
IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do
julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de
Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração
opostos pelo INSS.
6- Invertido o ônus da sucumbência, ao INSSincumbe o pagamento de honorários advocatícios,
fixados em 10% do valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ).
7 -Apelação da parte autora parcialmente provida. Sentençareformada. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu DAR PARCIAL PROVIMENTO à apelação da parte autora, julgando
procedente a ação, para condenar o INSS à concessão do LOAS, fixando a data de início do
benefício a partir do segundo estudo social, 03/07/2018. Condenar, ainda, a autarquia ao
pagamento dos honorários advocatícios na forma antes delineada, e especificar, de ofício, os
critérios de juros e correção monetária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
