
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5371710-72.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: SIDNEIA PEREIRA ROSA
Advogado do(a) APELANTE: ROSANA SALES QUESADA - SP155617-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5371710-72.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: SIDNEIA PEREIRA ROSA
Advogado do(a) APELANTE: ROSANA SALES QUESADA - SP155617-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do benefício assistencial, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, deixando de condenar a parte autora em custas e despesas processuais, ante à natureza da causa.
Em suas razões de apelação a parte autora pugna pela reforma da sentença, nos seguintes termos:
- a necessidade de anulação da r. sentença para complementação do laudo pericial ou submissão à nova perícia;
- que comprovou os requisitos estabelecidos pelo artigo 20, §§ 2º e 3º, da Lei 8.472/93.
Sem contrarrazões, subiram os autos a este Eg. Tribunal.
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso.
É O RELATÓRIO.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5371710-72.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: SIDNEIA PEREIRA ROSA
Advogado do(a) APELANTE: ROSANA SALES QUESADA - SP155617-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
A EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora): Recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
MÉRITO
O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da Lei 8.742/1993.
O Benefício da Prestação Continuada (BPC) consiste na garantia de um salário mínimo mensal ao idoso com 65 anos ou mais ou pessoa com deficiência de qualquer idade com impedimentos de natureza física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo (que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 anos), que o impossibilite de participar, em igualdade de condições, com as demais pessoas da vida em sociedade de forma plena e efetiva. Tratando-se de benefício assistencial, não há período de carência, tampouco é necessário que o requerente seja segurado do INSS ou desenvolva alguma atividade laboral, sendo imprescindível, porém, a comprovação da hipossuficiência própria e/ou familiar.
O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal garante o benefício em comento às pessoas com deficiência que não possuam meios de prover à sua própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
A previsão deste benefício guarda perfeita harmonia com a Constituição de 1988, que hospedou em seu texto princípios que incorporam exigências de justiça e valores éticos, com previsão de tarefas para que o Estado proceda à reparação de injustiças.
A dignidade humana permeia todas as matérias constitucionais, sendo um valor supremo. E a cidadania não se restringe ao seu conteúdo formal, sendo a legitimidade do exercício político pelos indivíduos apenas uma das vertentes da cidadania, que é muito mais ampla e tem em seu conteúdo constitucional a legitimidade do exercício dos direitos sociais, culturais e econômicos.
Os Princípios Fundamentais previstos no artigo 3º da Constituição Federal de 1988, voltados para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, objetivando a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais e regionais, dão suporte às normas públicas voltadas ao amparo de pessoas em situação de miséria.
No mais, destaco que o julgamentos dos casos de LOAS, pela análise do cabimento ou não da percepção do Benefício de Prestação Continuada (BPC) contribui para o cumprimento da Meta 9 do CNJ, que prevê a integração da Agenda 2030 da ONU pelo Poder Judiciário, guardando especial consonância os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável de número 1 e 2 (ODS 1 e 2) desta Agenda, qual sejam: "erradicação da pobreza; e fome zero”
, especialmente com as metas 1.3
“Implementar, em nível nacional, medidas e sistemas de proteção social adequados, para todos, incluindo pisos, e até 2030 atingir a cobertura substancial dos pobres e vulneráveis (...)”; e2.1 “
Até 2030, acabar com a fome e garantir o acesso de todas as pessoas, em particular os pobres e pessoas em situações vulneráveis, incluindo crianças, a alimentos seguros, nutritivos e suficientes durante todo o ano.”É com esse espírito que o benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V, da Carta deve ser compreendido.
O § 2º do artigo 20 da Lei 8.742/1993, define pessoa com deficiência como aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
O conceito adotado pela ONU (Organização das Nações Unidas), na Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, ingressou formalmente no ordenamento pátrio com a ratificação desta Convenção e promulgado pelo Decreto nº 6.949/2009. Em 2015, com a Lei 13.146/2015, o conceito de pessoa com deficiência foi ampliado. A norma preceitua que as barreiras limitadoras não precisam ser "diversas", não precisam se "somar", bastando a presença de única limitação. Ao mesmo tempo, verifica-se que as limitações de que trata a Lei atual ampliam a noção de incapacidade pura e simples para o trabalho e para a vida independente, para a análise da situação de vulnerabilidade do requerente pelo conjunto de circunstâncias capazes de impedir a integração justa, plena e igualitária na sociedade daquele que necessita de proteção social.
Nesse sentido, as avaliações de que trata o § 6º do artigo 20, que sujeita a concessão do benefício às avaliações médica e social, devendo a primeira considerar as deficiências nas funções e nas estruturas do corpo do requerente, e, a segunda, os fatores ambientais, sociais e pessoais a que está sujeito.
Insta salientar, ainda, que o fato de a incapacidade ser temporária não impede a concessão do benefício, nos termos da Súmula 48 da TNU:
"A incapacidade não precisa ser permanente para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada".
No caso dos autos, o exame médico realizado pelo perito judicial constatou que a parte autora não está incapacitada para exercer atividades laborais, como se vê do laudo pericial (ID 148796809):
“Examinada comprovou com laudos de especialistas que apresenta os diagnósticos de ceratocone e baixa visão em um olho. Está em acompanhamento médico e apresenta acuidade com melhor correção óptica (0,8), normal, em seu melhor olho (direito) e baixa visão em olho esquerdo. Tais diagnósticos no momento não são suficientes para se adequar à definição atual da OMS e CID 10 de deficiência visual. Isso porque ela possui com correção óptica um olho com visão normal (olho direito, acuidade 0,8) e outro com baixa visão (olho esquerdo)”. (...)
“M. Na hipótese de incapacidade parcial e permanente reúne o(a) autor(a) condições de exercer outra atividade profissional ou de reabilitação? R: Sim. Capaz de ser habilitada para atividades braçais ou intelectuais compatíveis com suas dificuldades visuais."
Assim, ainda que o magistrado não esteja adstrito às conclusões do laudo pericial, conforme dispõem o artigo 436 do CPC/1973 e o artigo 479 do CPC/2015, estas devem ser consideradas, por se tratar de prova técnica, elaborada por profissional da confiança do Juízo e equidistante das partes.
O laudo em questão foi realizado por profissional habilitado, equidistante das partes, capacitado, especializado em perícia médica, e de confiança do r. Juízo, cuja conclusão encontra-se lançada de forma objetiva e fundamentada, não havendo que se falar em realização de nova perícia judicial.
Outrossim, o laudo pericial atendeu às necessidades do caso concreto, possibilitando concluir que o perito realizou minucioso exame clínico, respondendo aos quesitos formulados. Além disso, levou em consideração, para formação de seu convencimento, a documentação médica colacionada aos autos.
Ressalte-se que a parte autora, ao impugnar o laudo oficial, não apresentou qualquer documento técnico idôneo capaz de infirmar as suas conclusões.
Deveras, meras alegações não têm o condão de afastar as conclusões do expert.
Assim sendo, o inconformismo da parte autora não procede, devendo ser mantida a r. sentença monocrática por seus próprios fundamentos, os quais seguem reproduzidos (ID 148796863):
"Conforme preconiza o artigo 20, § 2º. “Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho”. Com efeito, o laudo apresentado pelo perito do juízo constatou que não há incapacidade laborativa, tampouco dependência de terceiros para as atividades diárias. Para que fizesse jus ao recebimento do benefício pretendido, a requerente deveria não apenas estar totalmente incapacitada para o trabalho, mas deveria também necessitar da ajuda de terceiros para suas atividades diárias, o que de fato não se verificou."
Ante o exposto, nego provimento ao recurso.
É COMO VOTO.
/gabiv/jb
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL: PREVIDENCIÁRIO. LOAS. IDADE/INCAPACIDADE. MISERABILIDADE. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
1. Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 2015 e, em razão de sua regularidade formal, conforme certificado nos autos, a apelação interposta deve ser recebida e apreciada em conformidade com as normas ali inscritas.
2. O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da Lei 8.742/1993. A concessão do benefício assistencial (LOAS) requer o preenchimento concomitante do requisito de deficiência/idade e de miserabilidade. Requisitos legais preenchidos.
3. Da análise do conjunto probatório é forçoso reconhecer a ausência dos requisitos necessários ao deferimento do pedido.
4. Recurso desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
