Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5254501-19.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
24/06/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 29/06/2021
Ementa
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL:PREVIDENCIÁRIO. LOAS. IDADE/INCAPACIDADE. MISERABILIDADE.
REQUISITOS PREENCHIDOS.
1.Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 2015 e, em razão
de sua regularidade formal, conforme certificado nos autos, a apelação interposta deve ser
recebida e apreciada em conformidade com as normas ali inscritas.
2.O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.A concessão do benefício assistencial (LOAS) requer o preenchimento
concomitante do requisito de deficiência/idade e de miserabilidade. Requisitos legais preenchidos.
3. Do cotejo do estudo social, da incapacidade da parte autora e de suadependência econômica,
bem como a insuficiência de recursos da família, é forçoso reconhecer o quadro de pobreza e
extrema necessidade que se apresenta.
4.O termo inicial do benefício, em regra, deve ser fixado à data do requerimento administrativo ou,
na sua ausência, à data da citação (Súmula nº 576/STJ) ou, ainda, na hipótese de benefício
cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício.No caso, o termo
inicial do benefício fica mantido à data da citação, ante à ausência derequerimento administrativo.
5. Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de
2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial -
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do
julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de
Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração
opostos pelo INSS.
6.Desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados na
sentença devem, no caso, ser majorados em 2%, nos termos do artigo 85, parágrafo 11, do
CPC/2015,ficandoa sua exigibilidade condicionada à futura deliberação sobre o Tema nº
1.059/STJ, o que será examinado oportunamente peloJuízo da execução.
7. Recurso desprovido.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5254501-19.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA PEREIRA PINTO
Advogados do(a) APELADO: JAMES MARLOS CAMPANHA - SP167418-N, GUSTAVO MILANI
BOMBARDA - SP239690-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5254501-19.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA PEREIRA PINTO
Advogados do(a) APELADO: JAMES MARLOS CAMPANHA - SP167418-N, GUSTAVO MILANI
BOMBARDA - SP239690-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de
apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS contra
sentença quejulgou procedente o pedido de concessão do benefício assistencial, previsto no
artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, condenando o INSS a pagar o benefício no valor
de um salário mínimo mensal, a contar dadata da citação, com aplicação de correção monetária
e juros de mora,e ao pagamento de honorários advocatícios, antecipando, ainda, os efeitos da
tutela para implantação imediata do benefício.
Em suas razões de apelação o INSS pugna pela reforma da sentença, alegando, em síntese:
-que deixou de comprovar os requisitosestabelecidos pelo artigo20, §§ 2º e 3º, da Lei 8.472/93;
- que o termo inicial do benefício deve ser fixado àdatada juntada do laudo pericial;
- que os juros de mora e correção monetária devem observar a Lei nº 11.960/2009.
Por fim, pré-questiona, para efeito de recurso especial ou extraordinário, ofensa a dispositivos
de lei federal e de preceitos constitucionais.
Com contrarrazões, subiram os autos a este Eg. Tribunal.
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso.
É O RELATÓRIO.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5254501-19.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA PEREIRA PINTO
Advogados do(a) APELADO: JAMES MARLOS CAMPANHA - SP167418-N, GUSTAVO MILANI
BOMBARDA - SP239690-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora):Recebo a apelação
interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de sua regularidade
formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
MÉRITO
O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.
O Benefício da Prestação Continuada (BPC) consiste na garantia de um salário mínimo mensal
ao idoso com 65 anos ou mais ou pessoa com deficiência de qualquer idade com impedimentos
de natureza física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo (que produza efeitos pelo
prazo mínimo de 2 anos), que o impossibilite de participar, em igualdade de condições, com as
demais pessoas da vida em sociedade de forma plena e efetiva. Tratando-se de benefício
assistencial, não há período de carência, tampouco é necessário que o requerente seja
segurado do INSS ou desenvolva alguma atividade laboral, sendo imprescindível, porém, a
comprovação da hipossuficiência própria e/ou familiar.
O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal garante o benefício em comento às pessoas
com deficiência que não possuam meios de prover à sua própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família.
A previsão deste benefício guarda perfeita harmonia com a Constituição de 1988, que
hospedou em seu texto princípios que incorporam exigências de justiça e valores éticos, com
previsão de tarefas para que o Estado proceda à reparação de injustiças.
A dignidade humana permeia todas as matérias constitucionais, sendo um valor supremo. E a
cidadania não se restringe ao seu conteúdo formal, sendo a legitimidade do exercício político
pelos indivíduos apenas uma das vertentes da cidadania, que é muito mais ampla e tem em seu
conteúdo constitucional a legitimidade do exercício dos direitos sociais, culturais e econômicos.
Os Princípios Fundamentais previstos no artigo 3º da Constituição Federal de 1988, voltados
para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, objetivando a erradicação da
pobreza e a redução das desigualdades sociais e regionais, dão suporte às normas públicas
voltadas ao amparo de pessoas em situação de miséria.
No mais, destaco que o julgamentos dos casos de LOAS, pela análise do cabimento ou não da
percepção do Benefício de Prestação Continuada (BPC) contribui para o cumprimento da Meta
9 do CNJ,que prevê a integração da Agenda 2030 da ONU pelo Poder Judiciário, guardando
especial consonância os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável de número 1 e 2 (ODS 1 e
2) desta Agenda, qual sejam: "erradicação da pobreza; e fome zero”, especialmente com as
metas1.3“Implementar, em nível nacional, medidas e sistemas de proteção social adequados,
para todos, incluindo pisos, e até 2030 atingir a cobertura substancial dos pobres e vulneráveis
(...)”; e 2.1“Até 2030, acabar com a fome e garantir o acesso de todas as pessoas, em particular
os pobres e pessoas em situações vulneráveis, incluindo crianças, a alimentos seguros,
nutritivos e suficientes durante todo o ano.”
É com esse espírito que o benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V, da Carta deve
ser compreendido.
O § 2º do artigo 20 da Lei 8.742/1993, define pessoa com deficiência como aquela que tem
impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em
interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
O conceito adotado pela ONU (Organização das Nações Unidas), na Convenção Sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência, ingressou formalmente no ordenamento pátrio com a
ratificação desta Convenção e promulgado pelo Decreto nº 6.949/2009. Em 2015, com a Lei
13.146/2015, o conceito de pessoa com deficiência foi ampliado. A norma preceitua que as
barreiras limitadoras não precisam ser "diversas", não precisam se "somar", bastando a
presença de única limitação. Ao mesmo tempo, verifica-se que as limitações de que trata a Lei
atual ampliam a noção de incapacidade pura e simples para o trabalho e para a vida
independente, para a análise da situação de vulnerabilidade do requerente pelo conjunto de
circunstâncias capazes de impedir a integração justa, plena e igualitária na sociedade daquele
que necessita de proteção social.
Nesse sentido, as avaliações de que trata o § 6º do artigo 20, que sujeita a concessão do
benefício às avaliações médica e social, devendo a primeira considerar as deficiências nas
funções e nas estruturas do corpo do requerente, e, a segunda, os fatores ambientais, sociais e
pessoais a que está sujeito.
Insta salientar, ainda, que o fato de a incapacidade ser temporária não impede a concessão do
benefício, nos termos da Súmula 48 da TNU:
"A incapacidade não precisa ser permanente para fins de concessão do benefício assistencial
de prestação continuada".
No que diz respeito ao requisito socioeconômico, ainda que o § 3º do artigo 20 da Lei
8.742/1993, com redação dada pela recente Lei 13.982/2020, considere como hipossuficiente
para consecução deste benefício, pessoa incapaz de prover a sua manutenção por integrar
famíliacuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo (critério
fixado até 31.12.2020), fato é que a jurisprudência entende bastante razoável a adoção de ½
(meio) salário mínimo como parâmetro, eis que os programas de assistência social no Brasil
utilizam atualmente o valor demeio saláriomínimo como referencial econômico para a
concessão dos respectivos benefícios, tendo referido o Programa Nacional de Acesso à
Alimentação - Cartão Alimentação (Lei n.º 10.689/03), o Programa Bolsa Família - PBF (Lei n.º
10.836/04), o Programa Nacional de Renda Mínima Vinculado à Educação - Bolsa Escola (Lei
10.219/2001), Programa Nacional de Renda Mínima Vinculado à Saúde - Bolsa Alimentação
(MP 2.206-1/2001) Programa Auxílio-Gás (Decreto n.º 4.102/2002), Cadastramento Único do
Governo Federal (Decreto 3.811/2001).
Neste sentido, o E. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 567985/MT (18-04-13),
com repercussão geral reconhecida, revendo o seu posicionamento anterior (ADI nº 1.232/DF e
Reclamações nº 2303/RS e 2298/SP), reconheceu e declarou,incidenter tantum, a
inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93, que
estabelecia a renda familiar mensalper capitainferior a ¼ do salário mínimo para a concessão
de benefício a idosos ou deficientes, em razão da defasagem do critério caracterizador da
miserabilidade contido na mencionada norma. Segundo o Relator do acórdão, Min. Gilmar
Mendes, os programas de assistência social no Brasil utilizam atualmente o valor demeio
saláriomínimo como referencial econômico.
Por sua vez, o § 11 do artigo 20, incluído pela Lei 13.146/2015, dispôs que a comprovação da
miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade do requerente podem ser
aferidos por outros elementos probatórios, além da limitação da renda per capita familiar.
Com efeito, cabe ao julgador avaliar o estado de necessidade daquele que pleiteia o benefício,
consideradas suas especificidades, não devendo se ater à presunção absoluta de
miserabilidade que a renda per capita sugere: Precedentes do C. STJ: AgRg no AREsp
319.888/PR, 1ª Turma, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJE 03/02/2017; AgRg no
REsp 1.514.461/SP, 2ª Turma, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJE 24/05/2016; REsp
1.025.181/RS, 6ª Turma, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJE 29/09/2008).
Outrossim, os filhos e enteados e os menores tuteladossomente integramo grupo familiar e,
consequentemente, arenda mensal bruta familiar, quando foram solteiros e viverem sob o
mesmo teto do requerente(artigo 4º, incisos V e VI, Decreto 6.214/2017), eo benefício já
concedido a qualquer membro da família não será computado para os fins do cálculo da renda
familiar per capita a que se refere a LOAS (artigo 34, §único, da Lei 10.741/2003 (Estatuto do
Idoso).
Assim sendo, o inconformismo da autarquia não procede, devendo ser mantida a r. sentença
monocrática por seus próprios fundamentos, os quais seguem reproduzidos (ID 33262878):
"O pedido é procedente. A renda mensal vitalícia, também denominada amparo social, tem
caráter assistencial e decorre de previsão constitucional (artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal), sendo normatizada pela Lei 8.742/93. Cumpre relembrar que o artigo 20 da Lei
8.742/93 determina que o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário mínimo
mensal à pessoa idosa ou portadora de deficiência que comprove não possuir meios de prover
a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família. Assim verifica-se pelo dispositivo
que, em regra, é necessário que aquele que pleiteia o benefício demonstre que é idoso ou
deficiente, não é capaz de prover a sua manutenção e nem pode tê-la provida por sua família.
O estudo social de fls. 115/121, informou que a requerente mora sozinha. Recebe R$ 87,00
reais de bolsa família e vive com ajuda de terceiros. Vive totalmente com a ajuda dos filhos.
Consta, ainda, do estudo que o imóvel em que reside a autora é alugado, no valor de R$ 300,00
mensais, pagos por seu filho. A casa possui rede de água, esgoto e energia elétrica, não possui
forro, possui um quarto, uma sala, uma cozinha e uma varanda, no quarto possui duas camas
de solteiro e um guarda roupa, na sala uma televisão, uma estante e um jogo de sofá, na
cozinha um armário de aço, um fogão de quatro bocas e uma geladeira. (...)Assim, a
insuficiência de recursos da parte autora para prover a própria subsistência ou de tê-la provida
por sua família restou provada, fazendo jus ao amparo assistencial, uma vez demonstrada à
implementação dos requisitos legais. Ressalte-se que a renda de filho que não vive sob o
mesmo teto da autora não deve ser computado para fins de cálculo da renda per carpita. O
benefício é devido desde a data da citação ante a ausência de prova do indeferimento do
benefício na via administrativa."
Destaco que o estudo social evidencia a insuficiência de recursos da parte autora, sendo
forçoso reconhecer o quadro de pobreza e extrema necessidade que se apresenta (ID
33262812):
"Discussão e Conclusão. Diante do que foi encontrado durante a entrevista e relatado pela a
requerente, constatouse que a situação da mesma é de extrema vulnerabilidade. Sendo assim,
Concluo como real a condição de hipossuficiência econômica da periciada. Submeto a análise
supra à consideração superior, colocando-me à disposição para quaisquer esclarecimentos que
se fizerem necessários."
Assim, da análise dos autos verifica-se que a renda donúcleo familiar é insuficiente para a
manutenção da parte autora, devendo ser mantida a r. sentença que concedeu o benefício
postulado.
O termo inicial do benefício, em regra, deve ser fixado à data do requerimento administrativo
negado, requisito indispensável para a propositura da ação em face do INSS, consoante a
decisão do E. STF com repercussão geral, no RE 631.240 - ou, ainda, na hipótese de benefício
cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício.
No caso, o termo inicial do benefício deve ser mantido conforme fixado na sentença, à data da
citação, ante à ausência derequerimento administrativo.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho
de 2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo
Especial - IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal,
quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na
sistemática de Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos
de declaração opostos pelo INSS.
Presentes os requisitos - verossimilhança das alegações, conforme exposto na sentença,e o
perigo da demora, o qual decorre da natureza alimentar do benefício -, confirmo a tutela
anteriormente concedida.
Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11, como
um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos
honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte
contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os
limites estabelecidos na lei.
Não obstante a matéria que trata dos honorários recursais tenha sido afetada pelo Temanº
1.059 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, que determinou a suspensão do processamento
dos feitos pendentes que versem sobre essa temática, é possível, na atual fase processual,
tendo em conta o princípio da duração razoável do processo, que a matéria não constitui objeto
principal do processo e que a questão pode ser reexaminada na fase de liquidação,a fixação do
montante devido a título de honorários recursais, porém, deixando a sua exigibilidade
condicionada à futura deliberação sobre o referido tema, o que será examinado oportunamente
peloJuízo da execução.
Assim, desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados na
sentença devem, no caso, ser majorados em 2%, nos termos do artigo 85, parágrafo 11, do
CPC/2015.
Relativamente ao pré-questionamento de matéria ofensiva a dispositivos de lei federal e de
preceitos constitucionais, tendo sido o recurso apreciado em todos os seus termos, nada há que
ser discutido ou acrescentado aos autos.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso, condenando o INSS ao pagamento dos honorários
recursais, e, de ofício, determino a alteração dos juros de mora e da correção monetária.
É COMO VOTO.
O Juiz Federal Convocado Fernando Mendes:
Trata-se de ação destinada a viabilizar a implantação de benefício de prestação continuada
previsto no artigo 203, V, da Constituição, e na Lei Federal nº. 8.742/93.
A r. sentença julgou o pedido inicial procedente e condenou o INSS ao pagamento de
honorários advocatícios.
A Relatora apresentou voto no sentido de negar provimento à apelação do INSS.
Divirjo, respeitosamente, pelas razões que passo a expor:
O artigo 3º, da Constituição, elenca os objetivos da República Federativa do Brasil, quais sejam:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação.
Em vista de tais objetivos, a Constituição determinou, no âmbito da Assistência Social, a
implantação de benefício destinado a garantir uma subsistência mínima para os cidadãos
efetivamente necessitados. “Verbis”:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: (...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
O benefício, de caráter não contributivo, foi regulamentado pela Lei Federal nº 8.742/93, que
traz os requisitos necessários à implantação.
Quanto ao idoso, a partir da vigência das alterações da Lei Federal nº. 10.741, de 1º de outubro
de 2003, exige-se a idade mínima de 65 anos (artigo 20, “caput”, da Lei Federal nº 8.742/93).
Por sua vez, o artigo 20, § 2º, da Lei Federal nº 8.742/93 esclarece que “considera-se pessoa
com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental,
intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua
participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”
– sendo que impedimento de longo prazo é aquele que produz seus efeitos pelo prazo mínimo
de 2 (dois) anos (§ 10).
Em ambos os casos, exige-se prova da impossibilidade de prover a própria subsistência ou de
tê-la provida pela família.
A hipossuficiência econômica é analisada no contexto familiar, sendo que, nos termos do artigo
20, § 1º, da Lei Federal nº 8.742/93, a “família é composta pelo requerente, o cônjuge ou
companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos
solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo
teto”.
A interpretação do dispositivo, no entanto, deve ser realizada à luz da Constituição Federal, que
estabelece, no artigo 203, V, que “a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à
pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à
própria manutenção ou de tê-la provida por sua família”, e, no artigo 229, que “os filhos maiores
têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”.
O dever de assistência do Estado é, portanto, subsidiário, e não afasta a obrigação de amparo
mútuo familiar. Nesse sentido, a jurisprudência específica da Sétima Turma: (ApCiv 0003058-
98.2019.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES, julgado em
22/10/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 03/11/2020).
Quanto ao critério econômico objetivo, anota-se que o C. Supremo Tribunal Federal declarou a
inconstitucionalidade parcial do artigo 20, § 3º, da Lei Federal nº 8.742/93, no ponto em que
estabelece que a renda per capita familiar deve ser inferior a ¼ do salário mínimo (ADI 1232,
Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. NELSON JOBIM, Tribunal Pleno,
julgado em 27/08/1998, DJ 01-06-2001 PP-00075 EMENT VOL-02033-01 PP-00095).
Por consequência, conclui-se que a referência quantitativa do § 3º, do artigo 20, da LOAS, pode
ser considerada como um dos critérios para a aferição de miserabilidade, sem a exclusão de
outros.
Essa é, também, a orientação do Superior Tribunal de Justiça, no regime de julgamentos
repetitivos REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA
SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009.
Outrossim, não deve ser considerado, no cálculo da renda familiar, o benefício no valor de um
salário mínimo recebido por deficiente (artigo 34, parágrafo único, da Lei Federal nº. 10.741/03)
ou idoso, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, em regime de julgamentos
repetitivos(REsp nº 1.355.052/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, 1ª Seção, j. 25/02/2015,
DJe 05/11/2015).
A exclusão do rendimento de deficiente ou idoso, no entanto, não importa na automática
concessão do benefício, devendo ser considerados os demais aspectos socioeconômicos e
familiar do requerente.
No caso concreto, a autora tinha 63 anos na data da perícia médica, realizada em 2017.
O laudo pericial (ID 33262822):
"A Pericianda relata ser portadora e apresenta documentação com CID10 M05.8 – Outras
artrites reumatóides soro-positivas e M81.5 - Osteoporose idiopática.
Pericianda vem para avaliação médica pericial. Quanto às atividades laborais relata ter como
profissão oficial “Rural”, porém está desempregada desde 1999 e atualmente é “Do Lar”.
Comenta que trabalhou desde a infância na “Roça” e teve seu primeiro registro em carteira em
1988 na função de “Doméstica”.
Na avaliação médica pericial, apresenta-se calma. Pressão Arterial 120 x 80 mmHg, Frequência
Cardíaca 80 Bat. por min.; Saturação de O2 97%.
Considerando-se que, a Pericianda é portadora de patologias que acometem se maneira
significativa articulações importantes para a realização de atividades tanto de cunho laboral
como diárias da vida comum; Considerando que seu processo patológico e sequelar resultantes
dos inúmeros processos inflamatórios já apresentados pela Pericianda encontram-se em
estágio ativo e avançado; Considerando que as limitações que a Pericianda apresenta não são
possíveis de cura e/ou reversão, o que a impossibilita totalmente de realização de suas
atividades laborais e de grande parte das atividades habituais; Considerando ainda que as
patologias em questão tendem a agravar mesmo diante dos recursos médicos atualmente
disponíveis e que a Pericianda mesmo com todas as dificuldades esforça-se para manter o
seguimento médico regular; Por fim correlacionando fatos, relatos e exame físico geral e
específico realizado na presente avaliação médica pericial, constata-se hoje quadro compatível
com Incapacidade Laboral Total e Permanente”.
O estudo social (ID 33262807), por sua vez, consignou que a autora reside sozinha em imóvel
alugado, no valor de R$ 300,00, com quarto, sala, cozinha e varanda.
A renda da autora consiste em R$ 87,00 de Bolsa Família. Recebe, ainda, cesta básica do
Serviço Social do município.
Os gastos mensais, consistentes em alimentação (R$ 150,00), água e luz (R$ 111,00), aluguel
(R$ 300,00), gás (R$ 60,00) e remédios (R$ 139,00), perfazem o total de R$ 760,00.
A autora tem dois filhos maiores, à época com 32 e 39 anos, ambos empregados. A renda dos
filhos não foi informada.
Informou, ainda, que recebe ajuda dos filhos, que, inclusive, custeiam o aluguel.
O requisito socioeconômico não foi preenchido.
Da análise do estudo social, é possível concluir que a autora reside em imóvel alugado, em
ótimo estado de conservação, e está amparada pelos filhos.
O benefício assistencial não se presta à complementação da renda familiar, mas, sim, ao
socorro daqueles que não possuem condições de manter ou ver mantidos pelo grupo familiar os
padrões mínimos necessários à subsistência.
Ante o exposto, dou provimento à apelação.
Inverto o ônus sucumbencial. Condeno a autora ao ressarcimento das despesas processuais
desembolsadas pela autarquia e fixo honorários advocatícios em 10% (dez por cento) do valor
atualizado da causa, suspensa, contudo, a exigibilidade, nos termos dos artigos 11, §2º, e 12,
da Lei nº 1.060/50, e parágrafo §3º do art. 98 do Código de Processo Civil.
A eventual devolução dos valores recebidos deverá ser analisada em sede de execução, nos
termos do artigo 302, I, e parágrafo único, do Código de Processo Civil, e de acordo com o que
restar decidido no julgamento do Tema nº 692, pelo Superior Tribunal de Justiça.
Oficie-se ao INSS.
É o voto.
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL:PREVIDENCIÁRIO. LOAS. IDADE/INCAPACIDADE. MISERABILIDADE.
REQUISITOS PREENCHIDOS.
1.Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 2015 e, em
razão de sua regularidade formal, conforme certificado nos autos, a apelação interposta deve
ser recebida e apreciada em conformidade com as normas ali inscritas.
2.O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.A concessão do benefício assistencial (LOAS) requer o preenchimento
concomitante do requisito de deficiência/idade e de miserabilidade. Requisitos legais
preenchidos.
3. Do cotejo do estudo social, da incapacidade da parte autora e de suadependência
econômica, bem como a insuficiência de recursos da família, é forçoso reconhecer o quadro de
pobreza e extrema necessidade que se apresenta.
4.O termo inicial do benefício, em regra, deve ser fixado à data do requerimento administrativo
ou, na sua ausência, à data da citação (Súmula nº 576/STJ) ou, ainda, na hipótese de benefício
cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício.No caso, o termo
inicial do benefício fica mantido à data da citação, ante à ausência derequerimento
administrativo.
5. Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho
de 2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo
Especial - IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal,
quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na
sistemática de Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos
de declaração opostos pelo INSS.
6.Desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados na
sentença devem, no caso, ser majorados em 2%, nos termos do artigo 85, parágrafo 11, do
CPC/2015,ficandoa sua exigibilidade condicionada à futura deliberação sobre o Tema nº
1.059/STJ, o que será examinado oportunamente peloJuízo da execução.
7. Recurso desprovido. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo NO
JULGAMENTO, A SÉTIMA TURMA, POR MAIORIA, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO
RECURSO, E, DE OFÍCIO, DETERMINAR A ALTERAÇÃO DOS JUROS DE MORA E DA
CORREÇÃO MONETÁRIA, NOS TERMOS DO VOTO DA RELATORA, COM QUEM
VOTARAM O DES. FEDERAL PAULO DOMINGUES E O DES. FEDERAL LUIZ STEFANINI,
VENCIDOS O JUIZ CONVOCADO FERNANDO MENDES E O DES. FEDERAL CARLOS
DELGADO QUE DAVAM PROVIMENTO À APELAÇÃO. LAVRARÁ O ACÓRDÃO A
RELATORA
, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
