
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001120-07.2024.4.03.6119
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ANISIO RODRIGUES COELHO
Advogado do(a) APELANTE: CONCEICAO APARECIDA PINHEIRO FERREIRA - SP170578-A
APELADO: ANISIO RODRIGUES COELHO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: CONCEICAO APARECIDA PINHEIRO FERREIRA - SP170578-A
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001120-07.2024.4.03.6119
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ANISIO RODRIGUES COELHO
Advogado do(a) APELANTE: CONCEICAO APARECIDA PINHEIRO FERREIRA - SP170578-A
APELADO: ANISIO RODRIGUES COELHO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: CONCEICAO APARECIDA PINHEIRO FERREIRA - SP170578-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de atividade comum e especial, com vistas à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
A sentença julgou parcialmente procedentes os pedidos para: (i) reconhecer como tempo de serviço comum o período de 14/3/2019 a 14/4/2019; (ii) enquadrar como atividade especial os intervalos de 19/9/1994 a 5/3/1997, de 17/11/2014 a 7/9/2017 e de 1º/9/2017 a 13/3/2019. Condenou a parte autora ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios fixados no percentual legal mínimo, incidente sobre o valor atualizado da causa, observada a suspensão por ser a parte beneficiária da justiça gratuita.
Inconformado, o INSS interpôs apelação, no qual sustenta a impossibilidade dos enquadramentos efetuados e requer a reforma da decisão a quo, com a improcedência dos pedidos.
Também não resignada, a parte autora interpôs recurso de apelação, no qual pugna pelo cômputo das competências de 1º/2/2014 a 31/10/2014 e de 1º/8/2020 a 6/8/2021, recolhidas na condição de contribuinte individual. Por fim, pleiteia a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante a reafirmação da data do requerimento administrativo.
Sem contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001120-07.2024.4.03.6119
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ANISIO RODRIGUES COELHO
Advogado do(a) APELANTE: CONCEICAO APARECIDA PINHEIRO FERREIRA - SP170578-A
APELADO: ANISIO RODRIGUES COELHO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: CONCEICAO APARECIDA PINHEIRO FERREIRA - SP170578-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Os recursos preenchem os pressupostos de admissibilidade, razão pela qual devem ser conhecidos.
Do Tempo de Serviço Especial
A caracterização da atividade especial deve observar a legislação vigente à época da prestação do serviço. A conversão de tempo especial em comum, por sua vez, é regulada pela norma vigente na data em que o segurado reúne os requisitos para a aposentadoria, conforme entendimento consolidado nos Temas Repetitivos 422 e 546 do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A Emenda Constitucional (EC) n. 103/2019 vedou a conversão de tempo especial para comum a partir de sua vigência (13/11/2019), conforme artigo 25, § 2º, mantendo-se, contudo, o direito à conversão dos períodos anteriores, bem como a possibilidade de concessão de aposentadoria especial com base no artigo 19, § 1º, I.
A evolução normativa sobre a matéria pode ser resumida assim:
a) até 28/4/1995: admissível o enquadramento por categoria profissional (Decretos n. 53.831/1964 e 83.080/1979) ou exposição a agentes nocivos, com exceção de ruído e calor, que exigem prova técnica.
b) de 29/4/1995 a 5/3/1997: necessária comprovação da exposição habitual e permanente a agentes nocivos, sendo suficiente o formulário-padrão (SB-40 ou DSS-8030), salvo para ruído e calor.
c) de 6/3/1997 em diante: exigência de formulário fundado em laudo técnico ou produção de perícia (Decreto n. 2.172/1997).
d) a partir de 1º/1/2004: o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) torna-se documento essencial e substitui os antigos formulários, dispensando o laudo técnico se preenchido corretamente.
Da Fonte de Custeio
A ausência de recolhimento de contribuições adicionais pelo empregador não impede o reconhecimento da atividade especial pelo segurado, conforme os princípios da solidariedade e automaticidade (art. 30, I, da Lei n. 8.212/1991).
Segundo o Supremo Tribunal Federal (STF), os benefícios previstos diretamente na Constituição, como a aposentadoria especial, não estão condicionados à prévia fonte de custeio (art. 195, § 5º, da CF).
Do Agente Nocivo Ruído
Os limites legais de tolerância ao ruído são:
(i) até 5/3/1997: acima de 80 dB;
(ii) de 6/3/1997 a 18/11/2003: acima de 90 dB;
(iii) a partir de 19/11/2003: acima de 85 dB.
Nos termos do Tema Repetitivo 694 do STJ, é inviável a aplicação retroativa do novo limite (85 dB). A comprovação da exposição pode ser feita por PPP ou laudo técnico, sendo válida a metodologia diversa quando constatada a insalubridade.
Dos Agentes Químicos - Óleos e Graxas
Ainda que a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU), ao julgar o Tema 298, tenha firmado entendimento pela insuficiência da exposição genérica a óleos e graxas para fins de reconhecimento de atividade especial, esta Corte admite o enquadramento da exposição a tais agentes quando forem derivados de petróleo, especialmente os hidrocarbonetos aromáticos, os quais são classificados como potencialmente cancerígenos, conforme disposto na Portaria Interministerial MTE/MS/MPS n. 9/2014.
A jurisprudência predominante tem assentado o entendimento de que a exposição a hidrocarbonetos aromáticos dispensa a mensuração quantitativa, sendo possível o reconhecimento da especialidade da atividade com base na periculosidade intrínseca à natureza do agente, nos termos da legislação previdenciária e da regulamentação vigente.
Do Equipamento de Proteção Individual - EPI
Segundo deliberação do Supremo Tribunal Federal (STF), no Tema 555 da repercussão geral (ARE n. 664.335), o uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI) somente afasta o reconhecimento da especialidade da atividade quando comprovadamente eficaz na neutralização da nocividade. Havendo dúvida quanto à eficácia do equipamento ou em caso de exposição a níveis de ruído superiores aos limites de tolerância, deve-se reconhecer a especialidade da atividade, ainda que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) indique o fornecimento de EPI tido como eficaz.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o Tema Repetitivo n. 1.090, firmou as seguintes teses jurídicas sobre a matéria:
I – A informação constante do PPP acerca da utilização de EPI descaracteriza, em princípio, o tempo especial, ressalvadas as hipóteses excepcionais em que, mesmo diante de proteção comprovada, é reconhecido o direito à contagem diferenciada.
II – Compete à parte autora da ação previdenciária demonstrar:
(i) a inadequação do EPI ao risco da atividade exercida;
(ii) a inexistência ou irregularidade do respectivo certificado de conformidade;
(iii) o descumprimento das normas relativas à manutenção, substituição e higienização do EPI;
(iv) a ausência ou insuficiência de orientação e treinamento quanto ao uso correto, guarda e conservação do equipamento;
(v) ou qualquer outro fator que permita concluir pela ineficácia do EPI.
III – Se a análise probatória revelar dúvida razoável ou divergência quanto à real eficácia do EPI, a conclusão deve ser favorável ao segurado.
Conforme disposto no artigo 291 da Instrução Normativa INSS n. 128/2022, a eficácia do EPI não obsta o reconhecimento de atividade especial exercida até 3/12/1998, data da vigência da Medida Provisória n. 1.729/1998, posteriormente convertida na Lei n. 9.732/1998, para qualquer agente nocivo.
À luz dos desdobramentos dos Temas 555 do STF e 1.090 do STJ, verifica-se que, em determinadas hipóteses de exposição a agentes nocivos, o uso de EPI não afasta o reconhecimento da especialidade da atividade, seja pela inexistência de equipamento eficaz, seja por sua ineficácia prática (inocuidade).
As principais hipóteses em que se presume a ineficácia prática do EPI são:
(i) Agentes Biológicos:
Não há EPI capaz de neutralizar integralmente o risco de contaminação, em razão da natureza invisível e difusa dos agentes, da possibilidade de falhas humanas ou técnicas no uso dos equipamentos e do fato de a exposição ser inerente à função. Por isso, há presunção de ineficácia prática nesse caso.
(ii) Agentes Cancerígenos (até 2020):
Até a edição da IN INSS n. 128/2022, era reconhecida a inexistência de EPI eficaz para agentes reconhecidamente cancerígenos, conforme a Lista Nacional de Doenças Relacionadas ao Trabalho – LINACH (Portaria GM/MS n. 2.309/2022). A jurisprudência, até então, reconhecia a impossibilidade de neutralização total do risco cancerígeno.
(iii) Periculosidade:
O risco decorre da possibilidade de acidente de grandes proporções, de natureza acidental e imprevisível. O EPI, nesse caso, não elimina o perigo, apenas atenua os danos, razão pela qual não se reconhece eficácia plena do equipamento.
(iv) Ruído acima dos limites legais:
Conforme deliberação nos Temas 555 do STF e 1.090 do STJ, o fornecimento de EPI, ainda que considerado eficaz, não descaracteriza a especialidade da atividade, pois não é possível assegurar a neutralização integral dos efeitos agressivos do ruído sobre o organismo do trabalhador, os quais vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas.
Do Caso Concreto
Analisados os autos, é possível reconhecer a especialidade dos lapsos controvertidos de 19/9/1994 a 5/3/1997, de 17/11/2014 a 7/9/2017 e de 1º/9/2017 a 13/3/2019, pois depreende-se da documentação trazida (formulários, laudo técnico pericial e Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP) a exposição habitual à tensão elétrica superior a 250 volts, bem como à periculosidade decorrente do risco à integridade física do segurado.
Sobre a periculosidade, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao apreciar o REsp n. 1.306.113, sob o regime do artigo 543-C do CPC/1973, concluiu, ao analisar questão relativa à tensão elétrica superior a 250 volts, pela possibilidade do enquadramento especial, mesmo para período posterior a 5/3/1997, desde que amparado em laudo pericial, por ser meramente exemplificativo o rol de agentes nocivos constante do Decreto n. 2.172/1997 (STJ, REsp n. 1.306.113/SC, Rel. Herman Benjamin, Primeira Seção, J: 14/11/2012, DJe: 7/3/2013).
Cumpre observar, ainda, que a exposição de forma intermitente à tensão elétrica não descaracteriza o risco produzido pela eletricidade, uma vez que o perigo existe tanto para aquele que está exposto de forma contínua como para aquele que, durante a jornada, por diversas vezes, ainda que não de forma permanente, tem contato com a eletricidade. (STJ, 6º Turma, REsp 658016, Rel. Hamilton Carvalhido, DJU 21/11/2005).
É relevante destacar, ainda, que o reconhecimento da especialidade em relação a somente um agente nocivo (ou periculosidade) já é suficiente para a sua caracterização.
Em síntese, prospera o pleito de enquadramento da atividade desempenhada nos períodos supracitados, restando mantida a sentença nesse aspecto.
Do cômputo dos períodos recolhidos na condição de contribuinte individual
No tocante aos períodos de 1º/2/2014 a 31/10/2014 e de 1º/8/2020 a 31/7/2021, os recolhimentos foram efetuados em 30/11/2023, durante a tramitação do processo administrativo, por meio de Guias da Previdência Social (GPS) emitidas para a indenização dos respectivos períodos de contribuição, conforme ID 334948619.
Recolhidas as contribuições, mesmo em atraso, é permitido ao segurado computar o período pretérito em que houve o exercício da atividade sujeita à filiação obrigatória ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS).
Nesse aspecto, a lei não veda a utilização como tempo de contribuição dos períodos recolhidos em atraso ou indenizados, tampouco restringe a sua utilização, após a devida indenização.
Inclusive, dispõe o artigo 45-A da Lei n. 8.212/1991:
“Art. 45-A. O contribuinte individual que pretenda contar como tempo de contribuição, para fins de obtenção de benefício no Regime Geral de Previdência Social ou de contagem recíproca do tempo de contribuição, período de atividade remunerada alcançada pela decadência deverá indenizar o INSS.“
Sobre o tema, colaciono precedente desta Corte Regional:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REGRAS DE TRANSIÇÃO. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. RECOLHIMENTOS EM ATRASO. OMISSÃO E OBSCURIDADE. INOCORRÊNCIA.
I - Os embargos declaratórios servem apenas para esclarecer o obscuro, corrigir a contradição ou integrar o julgado. De regra, não se prestam para modificar o mérito do julgamento em favor da parte.
II - Não há previsão legal para a vedação ao cômputo do período indenizado como tempo de contribuição ou carência, de maneira que a orientação administrativa veiculada no comunicado DIRBEN o n.º 02/2021 e na Portaria n.º 1.382/2021 extrapola os limites da lei.
III - A única vedação legal ao cômputo para fins de carência é para aquelas contribuições pagas anteriormente à primeira recolhida em dia, na forma do art. 27, II, da Lei 8.213/91, o que não é o caso dos autos.
IV - Inexiste óbice à pretensão do impetrante de computar os períodos pleiteados, cujas contribuições foram devidamente vertidas aos cofres do INSS, para fins de aposentadoria por tempo de contribuição, inclusive pelas regras anteriores à Emenda Constitucional nº 103/2019, e ainda que os recolhimentos tenham sido efetivados em data posterior.
V – Embargos declaratórios do INSS rejeitados. (TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5017366-51.2022.4.03.6183, Rel. Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO, julgado em 13/12/2023, Intimação via sistema DATA: 14/12/2023)
No mesmo sentido: TRF 3ª Região, 8ª Turma, RemNecCiv - REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL - 5012972-35.2021.4.03.6183, Rel. Desembargador Federal TORU YAMAMOTO, julgado em 23/07/2024, Intimação via sistema DATA: 24/07/2024.
Destarte, quanto aos períodos de 1º/2/2014 a 31/10/2014 e de 1º/8/2020 a 31/7/2021, estes merecem integrar a contagem de tempo de contribuição até a data do requerimento administrativo (DER).
Da Aposentadoria por Tempo de Serviço/Contribuição e Programada
Nessas circunstâncias, contudo, somados os períodos reconhecidos judicialmente aos lapsos incontroversos, a parte autora não tem direito à aposentadoria por tempo de contribuição, pois não se faz presente o requisito temporal na data da EC n. 20/1998, consoante o artigo 52 da Lei n. 8.213/1991, no último dia de vigência das regras pré-reforma da Previdência - artigo 3º da EC 103/2019 e nem na data do requerimento administrativo (DER: 4/11/2021), nos termos do artigo 201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal, com a redação dada pela EC n. 103/2019 ou pelas regras de transição nela previstas.
Consoante consta do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) da parte autora, em relação ao interregno de 1º/8/2021 a 30/9/2023, foram vertidos recolhimentos como contribuinte individual, na condição de microempreendedor individual (MEI), com alíquota reduzida, nos termos da Lei Complementar n. 123/2006.
Nos termos da legislação de regência, essa competência não pode ser considerada para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição e, consequentemente, não pode ser computada para fins de reafirmação da DER, conforme tese firmada no Tema Repetitivo n. 995 do STJ (REsp n. 1.727.063/SP, 1.727.064/SP e 1.727.069/SP).
Em síntese, não é o caso de deferimento do benefício postulado, porquanto não preenchido o requisito temporal em momento posterior.
Em virtude de sucumbência recíproca e da vedação à compensação (art. 85, § 14, da Lei n. 13.105/2015), os honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, serão distribuídos entre os litigantes (art. 86 do CPC) na proporção de 30% (trinta por cento) em desfavor do INSS e 70% (setenta por cento) em desfavor da parte autora, ficando, porém, em relação a esta, suspensa a exigibilidade, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita (art. 98, § 3º, do CPC).
Dispositivo
Diante do exposto, nego provimento à apelação do INSS e dou parcial provimento à apelação autoral para, nos termos da fundamentação supra: (i) computar, para fins de tempo de contribuição, as competências de 1º/2/2014 a 31/10/2014 e de 1º/8/2020 a 31/7/2021; (ii) fixar a sucumbência recíproca desproporcional.
É o voto.
| Autos: | APELAÇÃO CÍVEL - 5001120-07.2024.4.03.6119 |
| Requerente: | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e outros |
| Requerido: | ANISIO RODRIGUES COELHO e outros |
Ementa: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÕES CÍVEIS. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. PERICULOSIDADE POR ELETRICIDADE. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. RECOLHIMENTOS EM ATRASO. TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO COMPUTADO. BENEFÍCIO NÃO CONCEDIDO. RECURSO DO INSS DESPROVIDO. RECURSO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDO.
I. CASO EM EXAME
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Ação previdenciária ajuizada em face do INSS visando ao reconhecimento de período comum e intervalos especiais, com a consequente concessão de aposentadoria por tempo de contribuição. Sentença parcialmente procedente reconheceu parte dos intervalos, mas não concedeu o benefício. Ambas as partes apelaram: o INSS contra o reconhecimento da especialidade e a parte autora pelo cômputo de períodos recolhidos na condição contribuinte individual e concessão do benefício.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
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Há duas questões em discussão:
(i) definir se os períodos laborados sob exposição à eletricidade devem ser reconhecidos como tempo especial;
(ii) estabelecer se os períodos de contribuição individual recolhidos em atraso podem ser computados para fins de aposentadoria.
III. RAZÕES DE DECIDIR
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A caracterização da atividade especial observa a legislação vigente à época da prestação do serviço, sendo válida a conversão do tempo especial em comum até a vigência da Emenda Constitucional n. 103.
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A jurisprudência do STJ reconhece a eletricidade como agente perigoso, admitindo a especialidade mesmo após a alteração normativa de 1997, desde que amparada em laudo técnico.
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A intermitência da exposição à eletricidade não descaracteriza a periculosidade, conforme precedentes do STJ.
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O uso de EPI não afasta a periculosidade da eletricidade, pois não elimina o risco de acidentes.
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O artigo 45-A da Lei n. 8.212/1991 permite o cômputo de períodos recolhidos em atraso pelo contribuinte individual, desde que indenizados.
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Apesar do reconhecimento de períodos especiais e de contribuições indenizadas, o autor não preencheu os requisitos temporais para a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, seja pelas regras anteriores à Emenda Constitucional n. 103, seja pelas regras de transição ou pela aposentadoria programada.
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Constatada sucumbência recíproca, os honorários são repartidos em 30% em desfavor do INSS e 70% em desfavor da parte autora, com suspensão da exigibilidade em relação a esta por ser beneficiária da justiça gratuita (CPC, artigo 98, § 3º).
IV. DISPOSITIVO E TESE
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Recurso do INSS desprovido. Recurso da parte autora parcialmente provido.
Tese de julgamento:
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A atividade com exposição à eletricidade em tensão superior a 250 volts caracteriza tempo especial mesmo após a alteração normativa de 1997, desde que comprovada por laudo técnico.
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A intermitência da exposição à eletricidade não descaracteriza a periculosidade.
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O uso de EPI não afasta a especialidade da atividade em caso de periculosidade decorrente da eletricidade.
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O período de contribuinte individual indenizado pode ser computado como tempo de contribuição, ainda que recolhido em atraso.
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, artigo 195, § 5º; EC n. 103/2019, artigos 19, § 1º, inciso I, e 25, § 2º; Lei n. 8.212/1991, artigos 30, inciso I, e 45-A; Lei n. 8.213/1991, artigos 27, inciso II, e 52; CPC, artigos 85, § 14, 86 e 98, § 3º.
Jurisprudência relevante citada: STF, ARE n. 664.335, Tema 555, Plenário; STJ, REsp n. 1.306.113/SC; STJ, REsp n. 658.016; STJ, Tema 694; STJ, Tema 1.090; STJ, Tema 995; TRF 3ª Região, ApCiv n. 5017366-51.2022.4.03.6183; TRF 3ª Região, RemNecCiv n. 5012972-35.2021.4.03.6183.
ACÓRDÃO
Desembargadora Federal
