Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5004765-50.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
29/07/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 31/07/2020
Ementa
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. JULGAMENTO CITRA PETITA. NULIDADE DA
SENTENÇA. APLICAÇÃO DO ART. 1.013, §3º, III, do CPC/2015. AUXILIO DOENÇA.
INCAPACIDADE LABORAL DEMONSTRADA. AUXILIO ACIDENTE. NEXO CAUSAL NÃO
DEMONSTRADO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA
FEDERAL. INVERSÃO DO ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA.
1. Trata-se de pedido de concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez ou auxílio
acidente.
2. Laudo médico pericial indica a existência de incapacidade laboral total e permanente, com
restrição para a atividade habitual.
3. Qualidade de segurado e carência demonstrados. Auxílio doença concedido.
4. Juros e correção monetária de acordo com os critérios do Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, naquilo que não conflitar como o disposto na
Lei nº 11.960/2009.
5. Inversão do ônus da sucumbência.
6. Sentença citra petita. Anulação. Aplicação do artigo 1.013, §3º, III do CPC/15. Pedido
procedente em parte. Apelação da parte autora prejudicada.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5004765-50.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ELDER JUNIOR FERREIRA
Advogados do(a) APELANTE: PAULO DE TARSO AZEVEDO PEGOLO - MS10789-A,
GUILHERME FERREIRA DE BRITO - MS9982-A, HENRIQUE DA SILVA LIMA - MS9979-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5004765-50.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ELDER JUNIOR FERREIRA
Advogados do(a) APELANTE: PAULO DE TARSO AZEVEDO PEGOLO - MS10789-A,
GUILHERME FERREIRA DE BRITO - MS9982-A, HENRIQUE DA SILVA LIMA - MS9979-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando o restabelecimento do auxílio-doença ou aposentadoria por
invalidez ou auxílio acidente.
A sentença prolatada em 27/01/2017 (fls.164/166) julgou improcedente o pedido de auxílio
acidente. Honorários advocatícios fixados em R$600,00, observada a gratuidade da justiça.
Apela a parte autora sustenta, em síntese, que preenche os requisitos para a concessão do
benefício de auxílio acidente. Subsidiariamente, requer a remessa dos autos ao Juizado Especial
Federal de Campo Grande.
Sem contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, que declinou
a competência, por não se tratar de ação acidentária e determinou a remessa dos autos a esta
Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5004765-50.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ELDER JUNIOR FERREIRA
Advogados do(a) APELANTE: PAULO DE TARSO AZEVEDO PEGOLO - MS10789-A,
GUILHERME FERREIRA DE BRITO - MS9982-A, HENRIQUE DA SILVA LIMA - MS9979-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, verifico que a sentença proferida às fls. 164/166 decidiu pretensão aquém daquela
pleiteada nos presentes autos. Verifica-se, da leitura da petição inicial, que o autor formulou
pedido objetivando o restabelecimento do auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez ou
auxílio acidente.
Ocorre que, o Magistrado a quo cuidou tão somente de apreciar a questão da concessão do
auxílio acidente, alegando que não restou demonstrada a existência de lesão consolidada
resultante de acidente que implique incapacidade laborativa definitiva, deixando de apreciar os
pedidos relativos ao restabelecimento do auxílio doença ou aposentadoria por invalidez.
Dessa forma, reconheço a ocorrência de julgamento citra petita e, de ofício, diante da afronta ao
artigo 492 do Código de Processo Civil/2015, declaro nula a sentença.
Entretanto, estando o processo em condições de imediato julgamento, aplico a regra do artigo
1.013, § 3º, III, da norma processual e passo ao exame do mérito.
A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do
benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da
carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade
que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos
nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
É dizer: a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a
subsistência enseja a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez; a incapacidade
total e temporária para o exercício de atividade que garanta a subsistência justifica a concessão
do benefício de auxílio-doença e a incapacidade parcial e temporária somente legitima a
concessão do benefício de auxílio-doença se impossibilitar o exercício do labor ou da atividade
habitual por mais de 15 (quinze) dias pelo segurado.
O auxílio-acidente, por sua vez, será concedido, como indenização, ao segurado quando, após as
consolidações das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem de sequelas
que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia (art. 86 da Lei
nº 8.213/91).
A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência
pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes.
O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de
segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça,
durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Também é considerado
segurado aquele que trabalhava, mas ficou impossibilitado de recolher contribuições
previdenciárias em razão de doença incapacitante.
Nesse passo, acresça-se que no que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador
desempregado, não obstante a redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a
necessidade de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o
Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei
Federal (Pet. 7.115), firmou entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser
suprida quando outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas
a comprovar a situação de desemprego.
A perda da qualidade de segurado está disciplinada no §4º desse dispositivo legal, ocorrendo no
dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de
competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de
segurado.
Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o
término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus
dependentes o direito aos benefícios previdenciários.
Anote-se que a eventual inadimplência das obrigações trabalhistas e previdenciárias acerca do
tempo trabalhado como empregado deve ser imputada ao empregador, responsável tributário,
conforme preconizado na alínea a do inciso I do artigo 30 da Lei nº 8.213/91, não sendo cabível a
punição do empregado urbano pela ausência de recolhimentos, computando-se, assim, o período
laborado para fins de verificação da qualidade de segurado.
Por fim, quanto à carência, exige-se o cumprimento de 12 (doze) contribuições mensais para a
concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, conforme prescreve a Lei n.º
8.213/91, em seu artigo 25, inciso I, in verbis: "Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias
do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado
o disposto no art. 26:I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições
mensais;".
No caso concreto.
O autor, motorista borracheiro, 25 anos na data do laudo pericial, afirma ser portador de doenças
ortopédicas, condição que lhe traz incapacidade laboral.
O extrato do sistema Dataprev (fls.42 e 108) indica que a parte autora ingressou no RGPS em
2009, mantendo vínculos empregatícios, no período descontínuo de 09/06/2009 a 03/09/2014; de
01/04/2015 a 08/05/2015 e 15/05/2015 a 12/09/2015; recebeu auxílio doença no período de
27/04/2014 a 12/07/2014; restando demonstrada a qualidade de segurado e o cumprimento da
carência.
O laudo médico pericial elaborado em 03/06/2016 (fls.141/150) atesta que a parte autora é
portadora de lumbago com ciática decorrente de protrusão discal lombar. A atividade
desempenhada pelo autor, motorista/borracheiro, não atuou como causa e/ou concausa de sua
patologia. Trata-se de patologia degenerativa/congênita. Conclui pela incapacidade total e
definitiva para função habitual (motorista/borracheiro), suscetível de reabilitação para outra
função. Estabelece o início da doença em 03/2014 e o início da incapacidade em 04/2014.
O restante do conjunto probatório trazidos aos autos (exames e atestados médicos – ID3922037)
corrobora a conclusão da perícia médica judicial no sentido da existência de incapacidade da
parte autora.
Por sua vez, o INSS não logrou trazer quaisquer elementos aptos a ilidir a prova produzida pelo
autor e a conclusão da perícia judicial, limitando-se a reafirmar a inexistência de incapacidade
com base no laudo médico produzido na esfera administrativa, cuja presunção de veracidade não
é absoluta.
Nesse caso, restou evidenciado não existir acidente de qualquer natureza, já que a perícia judicial
atesta que o autor é portador de patologia de natureza ortopédica degenerativa/congênita, sem
comprovação de nexo causal entre o trabalho e a patologia.
Portanto, ausente o nexo de causalidade entre as lesões e o trabalho da parte autora, não há se
falar em concessão de auxílio-acidente.
Pois bem, em que pesem as divergências entre os laudos periciais e administrativo, é certo que a
parte autora, atualmente com 29 anos, apresenta doenças ortopédicas, gerando incapacidade
para funções que exercia habitualmente. Os documentos médicos apresentados, corroborados
pelo benefício concedido administrativamente, são indícios de que o requerente apresentava
dificuldade para o desempenho de suas atividades laborais habituais, porém, pode ser reabilitado
para outras funções.
Na hipótese em que se vislumbra a possibilidade readaptação/reabilitação, é de se priorizar a
busca pela sua efetivação, com vistas a restituir-lhe, tanto quanto possível, a capacidade de
trabalho e a realização profissional, e com isso garantir-lhe uma vida digna e plena em todos os
seus aspectos. Nesse sentido, de sua vez, cabe à parte autora aderir ao tratamento médico
adequado e ao processo de recuperação e/ou reabilitação profissional, com seriedade e
constância, favorecendo o seu êxito.
Comprovados os requisitos de incapacidade (para a atividade habitual), qualidade de segurado e
carência, a parte autora faz jus ao benefício de auxílio-doença, a partir da data da cessação
ocorrida em 12/07/2014 até o final do processo de reabilitação a que deve ser submetido o autor,
nos termos da legislação vigente.
O E. Superior Tribunal de Justiça, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo
Civil no REsp nº 1.369.165/SP, de relatoria do Ministro Benedito Gonçalves, assentou
entendimento no sentido de que a citação válida é o marco inicial correto para a fixação do termo
"a quo" de implantação de benefício de aposentadoria por invalidez/auxílio-doença concedido
judicialmente, quando ausente prévio requerimento administrativo.
Desta feita, havendo requerimento administrativo e cessação indevida do respectivo benefício,
mantenho o termo inicial do auxílio-doença na data da cessação administrativa (12/07/2014 -
fls.42), pois comprovado que havia incapacidade naquela data.
Para o cálculo dos juros de mora, aplicam-se os critérios estabelecidos no Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta
de liquidação. Quanto à correção monetária, acompanho o entendimento firmado pela Sétima
Turma no sentido da aplicação do Manual de Cálculos, naquilo que não conflitar como o disposto
na Lei nº 11.960/2009, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de
29/06/2009.
Inverto o ônus da sucumbência e condeno o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS ao
pagamento de honorários de advogado fixados em 10% do valor da condenação, consoante o
entendimento desta Turma e o disposto §§ 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015,
considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do
Superior Tribunal de Justiça.
Ante o exposto, com fulcro no caput do artigo 492 do CPC/2015, de ofício, declaro nula a
sentença e, de acordo com o seu artigo 1.013, § 3º, III, julgo parcialmente procedente o pedido
formulado na inicial para restabelecer o auxílio doença a partir da cessação. Prejudicado o apelo
da parte autora no mérito.
É o voto.
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. JULGAMENTO CITRA PETITA. NULIDADE DA
SENTENÇA. APLICAÇÃO DO ART. 1.013, §3º, III, do CPC/2015. AUXILIO DOENÇA.
INCAPACIDADE LABORAL DEMONSTRADA. AUXILIO ACIDENTE. NEXO CAUSAL NÃO
DEMONSTRADO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA
FEDERAL. INVERSÃO DO ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA.
1. Trata-se de pedido de concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez ou auxílio
acidente.
2. Laudo médico pericial indica a existência de incapacidade laboral total e permanente, com
restrição para a atividade habitual.
3. Qualidade de segurado e carência demonstrados. Auxílio doença concedido.
4. Juros e correção monetária de acordo com os critérios do Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, naquilo que não conflitar como o disposto na
Lei nº 11.960/2009.
5. Inversão do ônus da sucumbência.
6. Sentença citra petita. Anulação. Aplicação do artigo 1.013, §3º, III do CPC/15. Pedido
procedente em parte. Apelação da parte autora prejudicada. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu de ofício, declarar nula a sentença e, de acordo com o seu artigo 1.013, §
3º, III, julgar parcialmente procedente o pedido, dando por prejudicado o apelo da parte autora no
mérito, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
