
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002154-09.2023.4.03.6133
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: MARIA CLAUDIA SOUTO LEITE
Advogados do(a) APELANTE: RAQUEL MELLO ARRAES - SP451336-A, THOMAZ JEFFERSON CARDOSO ALVES - SP324069-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002154-09.2023.4.03.6133
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: MARIA CLAUDIA SOUTO LEITE
Advogados do(a) APELANTE: RAQUEL MELLO ARRAES - SP451336-A, THOMAZ JEFFERSON CARDOSO ALVES - SP324069-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de pedido de aposentadoria por tempo de contribuição (melhor hipótese financeira) ajuizado por Maria Claudia Souto Leite em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Contestação do INSS na qual sustenta o não enquadramento das atividades exercidas pela parte autora como sendo de natureza especial, requerendo, ao final, a improcedência total do pedido (ID 333884937).
Réplica (ID 333884965).
Sentença pela improcedência do pedido, fixando a sucumbência (ID 333884971).
Constam embargos de declaração pela parte autora (ID 333884972 e 333884976), os quais foram rejeitados (ID 333884975 e 333885032).
Apelação da parte autora pelo cômputo como tempo contributivo do período de 16.02.1987 a 18.08.1989, alegadamente considerado incontroverso, bem como pela concessão do benefício pleiteado mediante a reafirmação da D.E.R. (ID 333884980 e 333885034).
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002154-09.2023.4.03.6133
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: MARIA CLAUDIA SOUTO LEITE
Advogados do(a) APELANTE: RAQUEL MELLO ARRAES - SP451336-A, THOMAZ JEFFERSON CARDOSO ALVES - SP324069-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende a parte autora, nascida em 21.02.1970, a averbação como tempo comum dos períodos de 29.10.1993 a 15.07.1998 e 16.07.1998 a 18.10.2019, nos quais permaneceu afastada em razão da percepção dos benefícios de auxílio por incapacidade temporária e aposentadoria por incapacidade permanente, e, por conseguinte, a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (melhor hipótese financeira), a partir do requerimento administrativo (D.E.R. 26.08.2019).
Para elucidação da controvérsia, cumpre distinguir a aposentadoria especial, prevista no art. 57 da Lei nº 8.213/91, da aposentadoria por tempo de contribuição, prevista no art. 52 do mesmo diploma legal, pois a primeira pressupõe o exercício de atividade laboral considerada especial, pelo tempo de 15, 20 ou 25 anos, sendo que, cumprido esse requisito, o segurado tem direito à aposentadoria com valor equivalente a 100% do salário-de-benefício (§ 1º do art. 57), não estando submetido à inovação legislativa da EC 20/98, ou seja, inexiste pedágio ou exigência de idade mínima, nem submissão ao fator previdenciário, conforme art. 29, II, da Lei nº 8.213/91. Diferentemente, na aposentadoria por tempo de contribuição pode haver tanto o exercício de atividades especiais como o exercício de atividades comuns, sendo que os períodos de atividade especial sofrem conversão em atividade comum, aumentando assim o tempo de serviço do trabalhador, e, conforme a data em que o segurado preenche os requisitos, deverá se submeter às regras da EC 20/98.
Para elucidação da controvérsia, cumpre distinguir a aposentadoria especial, prevista no art. 57 da Lei nº 8.213/91, da aposentadoria por tempo de contribuição, prevista no art. 52 do mesmo diploma legal, pois a primeira pressupõe o exercício de atividade laboral considerada especial, pelo tempo de 15, 20 ou 25 anos, sendo que, cumprido esse requisito, o segurado tem direito à aposentadoria com valor equivalente a 100% do salário-de-benefício (§ 1º do art. 57), não estando submetido à inovação legislativa da EC 20/98, ou seja, inexiste pedágio ou exigência de idade mínima, nem submissão ao fator previdenciário, conforme art. 29, II, da Lei nº 8.213/91. Diferentemente, na aposentadoria por tempo de contribuição pode haver tanto o exercício de atividades especiais como o exercício de atividades comuns, sendo que os períodos de atividade especial sofrem conversão em atividade comum, aumentando assim o tempo de serviço do trabalhador, e, conforme a data em que o segurado preenche os requisitos, deverá se submeter às regras da EC 20/98.
Com relação à carência, nos termos do art. 25, II, da Lei nº 8.213/91, são exigidas 180 contribuições mensais. Todavia, aos segurados que ingressaram na Previdência Social até 24.07.1991, deve-se observar a tabela progressiva delineada no art. 142 da aludida norma.
No caso dos autos, o INSS indeferiu o requerimento administrativo formulado pela parte autora em 26.08.2019, porquanto entendeu pelo não preenchimento do período necessário de carência, excluindo período constante no CNIS (16.02.1987 a 18.08.1987), bem como aqueles em que esteve em gozo dos benefícios de auxílio por incapacidade temporária e aposentadoria por incapacidade permanente.
De acordo com decisões reiteradas desta 10ª Turma, o intervalo de tempo em que a requerente gozou de benefício por incapacidade, quando compreendido entre períodos contributivos - como no caso vertente -, deve ser reconhecido para efeito de carência. Nessa direção: STJ - AgRg no REsp: 1271928 RS 2011/0191760-1, Relator: Ministro Rogerio Schietti Cruz, Data de Julgamento: 16/10/2014, T6 - Sexta Turma, Data de Publicação: DJe 03/11/2014.
Observo que tal entendimento foi sedimentado pelo Supremo Tribunal Federal, no RE 583835, com repercussão geral reconhecida, no sentido de que o art. 29, §5º, da Lei nº 8.213/91, constitui uma exceção à vedação da contagem de tempo ficto de contribuição, e que somente é aplicável nos casos em que os benefícios por incapacidade são entremeados por períodos contributivos, a saber:
"CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. CARÁTER CONTRIBUTIVO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. COMPETÊNCIA REGULAMENTAR. LIMITES.
1. O caráter contributivo do regime geral da previdência social (caput do art. 201 da CF) a princípio impede a contagem de tempo ficto de contribuição.
2. O § 5º do art. 29 da Lei nº 8.213/1991 (Lei de Benefícios da Previdência Social - LBPS) é exceção razoável à regra proibitiva de tempo de contribuição ficto com apoio no inciso II do art. 55 da mesma Lei. E é aplicável somente às situações em que a aposentadoria por invalidez seja precedida do recebimento de auxílio-doença durante período de afastamento intercalado com atividade laborativa, em que há recolhimento da contribuição previdenciária. Entendimento, esse, que não foi modificado pela Lei nº 9.876/99.
3. O § 7º do art. 36 do Decreto nº 3.048/1999 não ultrapassou os limites da competência regulamentar porque apenas explicitou a adequada interpretação do inciso II e do § 5º do art. 29 em combinação com o inciso II do art. 55 e com os arts. 44 e 61, todos da Lei nº 8.213/1991.
4. A extensão de efeitos financeiros de lei nova a benefício previdenciário anterior à respectiva vigência ofende tanto o inciso XXXVI do art. 5º quanto o § 5º do art. 195 da Constituição Federal. Precedentes: REs 416.827 e 415.454, ambos da relatoria do Ministro Gilmar Mendes.
5. Recurso extraordinário com repercussão geral a que se dá provimento". (STF, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO, RELATOR MIN. AYRES BRITTO DJe-032 DIVULG 13.02.2012 PUBLIC 14-02-2012).
Observando o CNIS acostado aos autos (ID 333884966), nota-se que a parte autora contribuiu nos períodos de 16.02.1987 a 18.08.1987 e 15.05.1989 a 30.03.1993, tendo se afastado com percepção de auxílio por incapacidade temporária a partir de 15.07.1998, convertido em aposentadoria por incapacidade permanente em 16.07.1998, com cessação em 18.10.2019. Por sua vez, o segurado efetuou recolhimento contributivos nos períodos de 01.03.2019 a 31.03.2019 e 01.08.2020 a 31.10.2020, bem como a partir de 18.07.2022, o que satisfaz a exigência de benefício de incapacidade intercalado por períodos contributivos.
No tocante ao período comum de 16.02.1987 a 18.08.1987, embora desconsiderado pela autarquia previdenciária no exame do requerimento administrativo formulado em 26.08.2019 (ID 333884628 – fl. 86), foi computado nos requerimentos administrativos posteriores de 25.10.2020 (ID 333884628 – fls. 126/128) e de 20.07.2023 (ID 333884830 – fl. 53), tratando-se, portanto, de período incontroverso.
Sendo assim, somados todos os períodos comuns, totaliza a parte autora 30 (trinta) anos, 02 (dois) meses e 17 (dezessete) dias de tempo de contribuição até a data do requerimento administrativo (D.E.R. 26.08.2019), observado o conjunto probatório produzido nos autos e os fundamentos jurídicos explicitados na presente decisão.
Restaram cumpridos pela parte autora, ainda, os requisitos da qualidade de segurado (art. 15 e seguintes da Lei nº 8.213/91) e a carência para a concessão do benefício almejado (art. 24 e seguintes da Lei nº 8.213/91).
Destarte, a parte autora faz jus à aposentadoria por tempo de contribuição, com valor calculado na forma prevista no art. 29, I, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.876/99.
Na eventualidade do tempo de contribuição ora reconhecido possibilitar a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição segundo as regras da EC nº 20/98, deverá o INSS implantar a melhor hipótese financeira.
A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 963/2022, de 22 de julho de 2025 (que já contempla a aplicação da Selic, nos termos do artigo 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021), do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a devida expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.
Com relação aos honorários advocatícios, arcará o INSS com o pagamento da verba honorária fixada no percentual mínimo, na forma do disposto no art. 85, § 3º e § 4º, II, e no art. 86, todos do CPC, e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão que reconheceu o direito ao benefício (Súmula 111 do STJ).
Embora o INSS seja isento do pagamento de custas processuais, deverá reembolsar as despesas judiciais feitas pela parte vencedora e que estejam devidamente comprovadas nos autos (Lei nº 9.289/96, artigo 4º, inciso I e parágrafo único).
Caso a parte autora já esteja recebendo benefício previdenciário concedido administrativamente, deverá optar, à época da liquidação de sentença, pelo benefício que entenda ser-lhe mais vantajoso. Se a opção recair no benefício judicial, deverão ser compensadas as parcelas já recebidas em sede administrativa, face à vedação da cumulação de benefícios.
As verbas acessórias e as prestações em atraso também deverão ser calculadas na forma acima estabelecida, em fase de liquidação de sentença.
Diante de todo o exposto, dou provimento à apelação para julgar procedente o pedido e condenar o réu a conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a partir do requerimento administrativo (D.E.R. 26.08.2019), tudo na forma acima explicitada.
Determino que, independentemente do trânsito em julgado, comunique-se ao INSS (Gerência Executiva / Unidade Administrativa) a fim de serem adotadas as providências cabíveis para que seja implantado o benefício da parte autora, MARIA CLAUDIA SOUTO LEITE, de APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO, com D.I.B. em 26.08.2019 e R.M.I. a ser calculada pelo INSS, nos termos da presente decisão, tendo em vista os arts. 497 e seguintes do novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/15).
É como voto.
| Autos: | APELAÇÃO CÍVEL - 5002154-09.2023.4.03.6133 |
| Requerente: | MARIA CLAUDIA SOUTO LEITE |
| Requerido: | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Ementa: PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA E APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE INTERCALADOS COM PERÍODOS CONTRIBUTIVOS. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO DEVIDO. RECURSO PROVIDO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação da parte autora em face da sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. (i) Possibilidade de cômputo para fins de aposentadoria por tempo de contribuição de períodos nos quais o segurado permaneceu afastado com percepção dos benefícios de auxílio por incapacidade temporária e aposentadoria por incapacidade permanente. (ii) preenchimento dos requisitos para a obtenção da aposentadoria por tempo de contribuição.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. De acordo com decisões reiteradas desta 10ª Turma, o intervalo de tempo em que a requerente gozou de benefício por incapacidade, quando compreendido entre períodos contributivos deve ser reconhecido para efeito de carência. Observando o CNIS acostado aos autos, nota-se que a parte autora contribuiu nos períodos de 16.02.1987 a 18.08.1987 e 15.05.1989 a 30.03.1993, tendo se afastado com percepção de auxílio por incapacidade temporária a partir de 15.07.1998, convertido em aposentadoria por incapacidade permanente em 16.07.1998, com cessação em 18.10.2019. Por sua vez, o segurado efetuou recolhimento contributivos nos períodos de 01.03.2019 a 31.03.2019 e 01.08.2020 a 31.10.2020, bem como a partir de 18.07.2022, o que satisfaz a exigência de benefício de incapacidade intercalado por períodos contributivos.
4. Somados todos os períodos comuns e especiais, estes devidamente convertidos, totaliza a parte autora 30 (trinta) anos, 02 (dois) meses e 17 (dezessete) dias de tempo de contribuição até a data do requerimento administrativo (D.E.R. 26.08.2019). O benefício é devido a partir da data do requerimento administrativo (D.E.R.).
IV. DISPOSITIVO
5. Apelação provida para reconhecer o direito da parte autora à aposentadoria por tempo de contribuição, a partir do requerimento administrativo (D.E.R. 26.08.2019), ante a comprovação de todos os requisitos legais.
_________
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 201, § 7º; Art. 25, II, da Lei nº 8.213/91.
Jurisprudência relevante citada: STJ - AgRg no REsp: 1271928 RS 2011/0191760-1, Relator: Ministro Rogerio Schietti Cruz, Data de Julgamento: 16/10/2014, T6 - Sexta Turma, Data de Publicação: DJe 03/11/2014; STF, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO, RELATOR MIN. AYRES BRITTO DJe-032 DIVULG 13.02.2012 PUBLIC 14-02-2012.
ACÓRDÃO
Desembargador Federal
