
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004633-59.2014.4.03.6106
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
APELANTE: MARIA JOSE MACHADO DOS SANTOS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: VICENTE PIMENTEL - SP124882-A
APELADO: MARIA JOSE MACHADO DOS SANTOS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: VICENTE PIMENTEL - SP124882-A
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004633-59.2014.4.03.6106
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
APELANTE: MARIA JOSE MACHADO DOS SANTOS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: VICENTE PIMENTEL - SP124882-A
APELADO: MARIA JOSE MACHADO DOS SANTOS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: VICENTE PIMENTEL - SP124882-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A EXCELENTÍSSIMA DESEMBARGADORA FEDERAL CRISTINA MELO: Com fundamento no artigo 33, III, do Regimento Interno desta Corte, proponho questão de ordem para anulação do v. acórdão (ID 332869302), que julgou os embargos de declaração sem observância do quórum ampliado, nos termos do artigo 260, § 4º, do Regimento Interno deste E. Tribunal.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004633-59.2014.4.03.6106
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
APELANTE: MARIA JOSE MACHADO DOS SANTOS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: VICENTE PIMENTEL - SP124882-A
APELADO: MARIA JOSE MACHADO DOS SANTOS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: VICENTE PIMENTEL - SP124882-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A EXCELENTÍSSIMA DESEMBARGADORA FEDERAL CRISTINA MELO: Na sessão realizada em 07 de fevereiro de 2024, esta E. Nona Turma, por maioria, decidiu dar provimento à apelação da parte autora e negar provimento à apelação do INSS, nos termos do voto por mim apresentado, na condição de Relatora, acompanhada pelo Juiz Federal Convocado Denilson Branco e pelo Desembargador Federal Gilberto Jordan (4º voto), vencida a Desembargadora Federal Daldice Santana, no que foi acompanhada pelo Desembargador Federal Fonseca Gonçalves (5º voto), em julgamento processado conforme disposto no artigo 942, caput, e § 1º, do CPC.
Foram opostos embargos de declaração pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, levados a julgamento na sessão realizada em 10 de agosto de 2025 (ID 332869302).
No entanto, o referido julgado não observou o preceituado no artigo 260, § 4º, do Regimento Interno deste Tribunal:
“Os embargos de declaração opostos contra acórdão proferido com a composição ampliada serão julgados também de modo ampliado, não se exigindo a identidade física dos julgadores.”
Por tais razões, evidente o equívoco e com fundamento nos artigos 33, III e 80, II do RITRF, proponho a presente questão de ordem a fim de que seja anulado o julgamento dos embargos de declaração, proferido em 10/08/2025.
Diante da anulação do julgamento e com fundamento no princípio da celeridade processual, passo à análise do mérito dos embargos de declaração.
Sabido não se prestarem os embargos de declaração à alteração do pronunciamento judicial quando ausentes omissão, obscuridade, contradição ou erro material a ser sanado (art. 1.022 do NCPC), competindo à parte inconformada lançar mão dos recursos cabíveis para alcançar a reforma do ato judicial (STJ, ED no AG Rg no Ag em REsp n. 2015.03.17112-0/RS, Segunda Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJE de 21/06/2016)
A via integrativa é efetivamente estreita e os embargos de declaração não se vocacionam ao debate em torno do acerto da decisão impugnada, sendo a concessão de efeito infringente providência excepcional e cabível, apenas, quando corolário natural da própria regularização do vício que embalou a oposição daquele remédio processual, o que não é o caso dos autos.
De fato, procedendo-se à leitura do voto condutor do julgado, vê-se que a ratio decidendi é clara ao dispor sobre a temática:
Do caso dos autos – benefício requerido em 2003 – incidência do CPC/73
Quanto ao direito à aposentadoria por idade, com o advento da Lei nº 8.213/91, restou assegurado aos trabalhadores e empregados rurais cobertos pela antiga Previdência Social Rural (Lei Complementar nº 11, de 25 de maio de 1971), ora enquadrados como segurados obrigatórios do Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do artigo 11 do aludido diploma legal, ou aos seus Superior Tribunal de Justiça dependentes, a percepção dos seguintes benefícios:
"Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório do Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea a do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta lei, ou os seus dependentes, podem requerer, conforme o caso:
I - auxílio-doença, aposentadoria por invalidez, auxílio-reclusão ou pensão por morte, no valor de 1 (um) salário mínimo, durante 1 (um) ano, contado a partir da data da vigência desta lei, desde que seja comprovado o exercício de atividade rural com relação aos meses, imediatamente anteriores ao requerimento do benefício, mesmo que de forma descontínua, durante período igual ao da carência do benefício; e
II - aposentadoria por idade, no valor de 1 (um) salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados a partir da data da vigência desta lei, desde que seja comprovado o exercício de atividade rural nos últimos 5 (cinco) anos anteriores à data do requerimento, mesmo de forma descontínua, não se aplicando, nesse período, para o segurado especial, o disposto no inciso I do art. 39." (artigo 143 da Lei nº 8.213/91, na sua redação original – nossos os grifos).
Assim sendo, levando-se em consideração a lei vigente à época da decisão, o benefício, in casu, será devido, desde que comprovado o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício (artigo 143 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.063, de 14 de junho de 1995), não sendo admitida a prova exclusivamente testemunhal.
Registre-se, nesse passo, que é prescindível que o início de prova material abranja necessariamente o número de meses idêntico à carência do benefício no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, dede que a prova testemunhal amplie a sua eficácia probatória ao tempo da carência, vale dizer, desde que a prova oral permita a sua vinculação ao tempo de carência.
Como bem ilustra a C. Corte do Superior Tribunal de Justiça, a exigência do início razoável de prova não “leva ao convencimento de que o trabalhador rural deve obrigatoriamente provar, através de documentos escritos, todo o período exigido para a concessão do benefício; basta apresentar indício de sua condição de rurícola que, corroborada com os depoimentos testemunhais feitos em juízo, inclusive quanto ao tempo de atividade, forneça ao julgador condições hábeis para a concessão do benefício, nos termos da lei”.
No caso dos autos, os registros no CNIS do autor não afastam, por si só, o direito ao benefício, uma vez que a lei exige o exercício de atividade rural em período integral ou descontínuo, conforme preceituam os arts. 48, §§ 1o. e 2o. da Lei 8.213/91 (AgRg no AREsp 274.881/PB, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/02/2016, DJe 02/03/2016)
Cite-se ainda, que não há exigência de que o início de prova material, se refira, precisamente, ao período de carência, visto que serve apenas para corroborar a prova testemunhal:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. BENEFÍCIO RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. CERTIDÃO DE CASAMENTO. I - Estando o acórdão recorrido do Tribunal a quo fincado apenas na falta de início de prova material, a corroborar a prova testemunhal, mostra-se o acórdão desta Eg. Corte carente da apontada omissão de referência ao requisito do art. 143 da Lei 8.213/91. II - Não há exigência legal de que o início de prova material se refira, precisamente, ao período de carência do art. 143 da referida lei, visto que serve apenas para corroborar a prova testemunhal. III - Embargos rejeitados." (EDclREsp 321.703/SP, Relator Ministro Gilson Dipp, in DJ 8/4/2002 - nossos os grifos).
Quanto à alegação de que a apelada não comprovou que exercia atividade rural no período imediatamente anterior a data em que completou 55 anos, não assiste razão o INSS, visto que, de acordo com o STJ, estabeleceu-se o critério de no máximo, o período de graça previsto na legislação:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. DESCARACTERIZAÇÃO DO LABOR EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR EM RAZÃO DE VÍNCULO DE TRABALHO URBANO. DECISÃO RECORRIDA ESTÁ EM DESCONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL.
I - Na origem, trata-se de ação ajuizada contra o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, visando, em síntese, à concessão de aposentadoria por idade rural mediante o reconhecimento de tempo de serviço rural em regime de economia, com efeitos financeiros a contar do requerimento administrativo.Na sentença, julgaram-se improcedentes os pedidos. No Tribunal a quo, a sentença foi reformada para conceder o benefício de aposentadoria por idade rural, a contar da data do requerimento administrativo, observada a prescrição quinquenal.
II - No tocante à descaracterização do labor em regime de economia familiar em razão de vínculo de trabalho urbano, o art. 143 da Lei n. 8.213/1991, ao estabelecer que o tempo de labor rural seria computado, "ainda que de forma descontínua", afasta o entendimento de que esse tempo deveria ser ininterrupto, sem definir, entretanto, qualquer limite temporal para as possíveis interrupções, lacuna normativa que somente foi preenchida por ocasião da alteração promovida pela Lei n. 11.708/2008.
III - Diante dessa lacuna na lei, o Superior Tribunal de Justiça considerou adequado o uso, por meio da analogia, do prazo previsto para o período de graça, conforme pode ser verificado de acordo com os seguintes julgados: AgInt no REsp n. 1.550.757/PR, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 14/8/2018, DJe 20/8/2018; AgInt no REsp n. 1.572.229/PR, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 20/4/2017, DJe 24/5/2017; AgRg no REsp n. 1.354.939/CE, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, julgado em 16/6/2014, DJe 1º/7/2014.
IV - Sendo assim, observa-se, compulsando os autos, que a decisão recorrida está em desconformidade com a jurisprudência do Superior Tribunal, uma vez que considerou períodos laborados com lapso temporal de aproximadamente 20 anos – entre dois dos períodos – para a comprovação do requisito carência.V - Correta, portanto, a decisão que deu provimento ao recurso especial para afastar o reconhecimento da qualidade de segurada especial da parte recorrida.VI - Agravo interno improvido. AgInt no RECURSO ESPECIAL Nº 1.793.424 - RS (2019/0026347-5).
Nesse sentido, a Jurisprudência desta Corte:
“PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. DECISÃO FUNDAMENTADA.
(...)
III - Não há que se considerar o registro em trabalho urbano do cônjuge, para descaracterizar a atividade rurícola alegada, porque se deu por período curto e muito provavelmente em época de entressafra, em que o trabalhador rural necessita buscar outra atividade que lhe garanta a subsistência.
IV - Vínculos empregatícios em atividade urbana, se deram de forma descontínua, por pequenos lapsos temporais.
V - A interpretação da regra contida no artigo 143 possibilita a adoção da orientação imprimida nos autos. É que a expressão "atividade rural, ainda que descontínua", inserta na norma, permite concluir que tal descontinuidade possa corresponder a tantos períodos quantos forem aqueles em que o trabalhador exerceu a atividade no campo. Mesmo que essa interrupção, ou descontinuidade se refira ao último período.
VI - Autor(a) trabalhou no campo por mais de 13 (treze) anos. É o que mostra o exame da prova produzida. Completou 60 anos em 2006, tendo, portanto, atendido às exigências legais quanto à carência, segundo o artigo 142 da Lei nº 8.213/91, por prazo superior a 150 meses.
VII - Não se exige, para efeito de aposentadoria por idade, que o trabalhador rural contribua para os cofres da Previdência, segundo preceito inserto nos referidos arts. 26, III, 39, I e 143, c.c.art. 55 § 2º.
VIII - Matéria dispensa maior digressão, estando comprovado o exercício da atividade no campo, com razoável início de prova documental.
IX - Agravo não provido.”
(TRF 3ªR, AC 200761230003146, Relatora JUIZA MARIANINA GALANTE, OITAVA TURMA, DJF3 CJ1 DATA:27/07/2010 PÁGINA: 849)
Aliás, mui elucidativo o trecho do REsp 1531534, onde a constar: "...o fato de não estar desempenhando atividade rural por ocasião do requerimento administrativo não pode servir de obstáculo à concessão do benefício. A se entender assim, o trabalhador seria prejudicado por passar contribuir, o que seria um contrassenso.
A condição de trabalhador rural, ademais, poderia ser readquirida com o desempenho de apenas um mês nesta atividade. Não teria sentido se exigir o retorno do trabalhador às lides rurais por apenas um período para fazer jus à aposentadoria por idade. O que a modificação legislativa permitiu foi, em rigor, o aproveitamento do tempo rural para fins de carência, com a consideração de salários-de-contribuição pelo valor mínimo, no caso específico da aposentadoria por idade aos 60 (sessenta) ou 65 (sessenta e cinco) anos (mulher ou homem)".
Desse modo, a parte autora, ao tempo da ação possuía 68 anos, e no presente caso, a idade exigida à época para aposentadoria era reduzida para 55 anos.
Além da ampla prova testemunhal, a parte autora comprovou ter laborado em regime de economia familiar, no período de 1963 a 1988, vindo a se aposentar em 2004, tendo em seguida, o INSS caçado sua aposentadoria, alegando ausência de testemunhas.
No entanto, constato que no presente caso, os documentos juntados pela autora, aliados à prova testemunhal colhida (fls. 224/225/226), comprovam que ela laborou como rurícola em período muito superior ao mínimo exigido como carência para concessão do benefício.
O simples fato, como já demonstrado, de a autora não ter trabalhado nos anos imediatamente anteriores à propositura da ação não afasta a possibilidade de concessão do benefício, visto que a jurisprudência do STJ é firme no sentido de que a contribuição no período imediatamente anterior ao pedido não é condição para o deferimento do pedido (à época), inclusive há julgados das Turmas desta Corte o sentido de não ser necessária a simultaneidade no preenchimento dos requisitos para a concessão de aposentadoria por velhice.
Além disso, a promulgação da Lei 10.666/2003, já afirmava à época que a perda da condição de segurado não é óbice para o acolhimento de aposentadoria por idade, se configurados os pressupostos para a concessão do benefício.
Em relação ao pedido de restituição dos valores pagos pelo INSS, não há que se falar em devolução, visto que a autora preencheu devidamente todos os requisitos para a concessão da benesse, e não foi demonstrado pela autarquia a irregularidade na concessão.
Os pequenos lapsos de tempo que a autora possui de atividade urbana não são incompatíveis com a concessão da aposentadoria. Conforme o art. 143 da Lei n° 8213/91 e jurisprudência do STJ, o exercício da atividade rural pode ser descontínuo e o trabalho urbano intercalado ou concomitante ao trabalho campesino, não retira a condição de segurado especial.
Veja-se, in casu, que o período em que permaneceu registrada anteriormente a concessão do benefício é inferior a 1 (um) mês.
Assim, apenas quando se identifica que não se trata de propriamente um regresso ao meio campesino, mas uma mudança do trabalhador, da cidade para o campo, estrategicamente provocada para fins de obtenção de benefício previdenciário, é que se torna inviável o manejo da cláusula de descontinuidade prevista no art. 143 da Lei de Benefícios.
A disposição contida no art. 143 da Lei n.º 8.213, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
A alegação de ausência de provas da lide campesina não merece acolhida, tendo em vista a juntada aos autos de prova material idônea, como certidão de casamento da autora de 1966 constando a profissão do marido como lavrador, declaração de atividade (fls. 21), documentos da propriedade (fls. 22/34), e colheita de depoimento pessoal e prova testemunhal de 3 testemunhas que corroboraram o exercício de atividade rural por mais de 20 anos.
Assim, forçoso reconhecer que autora trabalhou no meio rural por longo período, de 1963 a 1988/1990, inclusive superior à carência necessária para o benefício postulado.
No caso, admitida a descontinuidade, e tendo o autora comprovado o efetivo desempenho do labor rural anos antes do requerimento administrativo, não é possível que se adote entendimento restritivo quanto ao conceito de descontinuidade, o que acabaria por deixar ao desamparo segurados que desempenharam longos períodos de atividade rural, mas por terem intercalado períodos significativos de atividade urbana ou mesmo de inatividade, restam excluídos da proteção previdenciária.
Nesse sentido, menciona-se julgado do Superior Tribunal de Justiça, Relatoria do Min. Napoleão Nunes Maia Filho, no REsp 1.788.404/PR:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. RECURSO ESPECIAL SUBMETIDO AO RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. OBSERVÂNCIA DO ARTIGO 1.036, § 5o. DO CÓDIGO FUX E DOS ARTS. 256-E, II, E 256-I DO RISTJ. ART. 48, §§ 3o. E 4o. DA LEI 8.213⁄1991. PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO DE ISONOMIA A TRABALHADORES RURAIS E URBANOS. MESCLA DOS PERÍODOS DE TRABALHO URBANO E RURAL. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL, REMOTO E DESCONTÍNUO, ANTERIOR À LEI 8.213⁄1991 A DESPEITO DO NÃO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO PARA FINS DE CARÊNCIA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DO LABOR CAMPESINO POR OCASIÃO DO IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO OU DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. TESE FIXADA EM HARMONIA COM O PARECER MINISTERIAL. RECURSO ESPECIAL DO INSS PARCIALMENTE PROVIDO, TÃO SOMENTE, PARA AFASTAR A MULTA FIXADA NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
7. A teste defendida pela Autarquia Previdenciária, de que o Segurado deve comprovar o exercício de período de atividade rural nos últimos quinze anos que antecedem o implemento etário, criaria uma nova regra que não encontra qualquer previsão legal. Se revela, assim, não só contrária à orientação jurisprudencial desta Corte Superior, como também contraria o objetivo da legislação previdenciária.
8. Não admitir o cômputo do trabalho rural exercido em período remoto, ainda que o Segurado não tenha retornado à atividade campesina, tornaria a norma do art. 48, § 3o. da Lei 8.213⁄1991 praticamente sem efeito, vez que a realidade demonstra que a tendência desses Trabalhadores é o exercício de atividade rural quando mais jovens, migrando para o atividade urbana com o avançar da idade. Na verdade, o entendimento contrário, expressa, sobretudo, a velha posição preconceituosa contra o Trabalhador Rural, máxime se do sexo feminino.
9. É a partir dessa realidade social experimentada pelos Trabalhadores Rurais que o texto legal deve ser interpretado, não se podendo admitir que a justiça fique retida entre o rochedo que o legalismo impõe e o vento que o pensamento renovador sopra. A justiça pode ser cega, mas os juízes não são. O juiz guia a justiça de forma surpreendente, nos meandros do processo, e ela sai desse labirinto com a venda retirada dos seus olhos.
10. Nestes termos, se propõe a fixação da seguinte tese: o tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213⁄1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213⁄1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.
11. É firme a orientação desta Corte ao afirmar que os Embargos de Declaração opostos com notório propósito de prequestionamento não têm caráter protelatório, não havendo que se falar, assim, em majoração da verba honorária.
12. Recurso Especial do INSS provido, tão somente, para afastar a majoração de honorários fixada no julgamento dos Embargos de Declaração.
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, "por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Og Fernandes, Mauro Campbell Marques, Assusete Magalhães, Sérgio Kukina, Regina Helena Costa, Gurgel de Faria, Francisco Falcão e Herman Benjamin votaram com o Sr. Ministro Relator. (26/06/2019)
Ainda, não vislumbro caracterizado qualquer comportamento fraudulento pela parte, à luz dos elementos colhidos nos autos. Não se afigura plausível deduzir que a parte autora saberia sobre requisitos legais como carência e idade exigidos, tendo em vista que apenas exerceu seu direito de pleitear administrativamente o benefício.
Conquanto relevantes as teses de dever de autotutela e vedação ao enriquecimento sem causa, devem ser consideradas as peculiaridades do caso concreto, o qual não traz elementos aptos a caracterizar a má-fé. Diferentemente de casos em que demonstrada a efetiva participação do segurado na obtenção do benefício em fraude, na hipótese, não se tem a comprovação da má-fé do beneficiário, sendo indevida a restituição dos valores porquanto legal a concessão do benefício rural.
Desse modo, não há qualquer omissão na decisão recorrida. O embargante, em verdade, pretende rediscutir o mérito, o que não é cabível por via de embargos declaratórios.
A inconformidade com a decisão proferida é matéria que deve ser veiculada em recurso próprio. Isso porque, nova apreciação de fatos e argumentos deduzidos, já analisados ou implicitamente afastados por ocasião do julgamento do recurso, consiste em objetivo que destoa da finalidade a que se destinam os embargos declaratórios.
Em suas razões de recorrer, o embargante alega que a decisão foi omissa, porque deixou de se manifestar acerca de eventual ofensa aos diversos dispositivos de ordem constitucional ou legal referidos no relatório.
No caso dos autos, porém, foram examinados todos os pedidos formulados no(s) recurso(s), de maneira fundamentada e à luz do direito material e processual aplicáveis e à vista dos argumentos capazes de influenciar no resultado do julgamento.
Em relação ao prequestionamento, a jurisprudência vinha gradativamente assentando o entendimento de que é desnecessária a individualização numérica dos artigos em que se funda o decisório para fins de prequestionamento. É que a só referência a normas legais ou constitucionais, dando-as por prequestionadas, não significa que tenha havido decisão a respeito dos temas propostos; o que importa é que elas tenham sido debatidas e dissecadas no julgamento, com posição clara e expressa acerca da pretensão deduzida (STF, RE n. 128.519/DF, rel. Min. MARCO AURÉLIO, Pleno, DJ 08.03.91; STJ, Res. 434129/SC, Rel. Ministro JORGE SCARTEZZINI, QUINTA TURMA, julgado em 17.10.2002, DJ 17.02.2003).
O Código de Processo Civil é explícito ao estabelecer que é insuficiente, para que se considere fundamentada a decisão, a mera indicação, reprodução ou paráfrase de ato normativo. Trata-se, evidentemente, de norma de mão dupla. Se ao juiz não é dado limitar-se à invocação de dispositivo de norma, para justificar sua decisão, também à parte não se dispensa a necessária justificativa, em concreto, para a invocação de preceito legal (CPC, art. 489, §1º, I).
De uma forma ou de outra, o exame pelo órgão julgador sobre a incidência de norma, para fins de motivação da decisão, apenas se justifica se estiver relacionado aos fatos e questões jurídicas capazes de determinar ou infirmar a conclusão que vier a ser adotada (CPC, art. 489, §1º, IV).
Nesse sentido, voto por acolher a questão de ordem suscitada para anular o acórdão ID 332869302 e, ato contínuo, rejeitar os embargos de declaração opostos pelo INSS, nos termos da fundamentação.
É o voto.
| Autos: | APELAÇÃO CÍVEL - 0004633-59.2014.4.03.6106 |
| Requerente: | MARIA JOSE MACHADO DOS SANTOS e outros |
| Requerido: | MARIA JOSE MACHADO DOS SANTOS e outros |
Ementa: Direito previdenciário. Questão de ordem. Embargos de declaração. Necessidade de votação em ampliação de quórum. Apelação cível. Aposentadoria por idade rural. Comprovação de atividade campesina. Interpretação do art. 143 da Lei nº 8.213/91. Prova material e testemunhal. Descontinuidade da atividade rural. Exercício remoto e alternado com vínculo urbano. Devolução de valores indevida. Embargos de declaração rejeitados.
I. Caso em exame
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Cuida-se de apelação interposta em ação previdenciária objetivando a concessão de aposentadoria por idade rural, com o reconhecimento de labor em regime de economia familiar. A sentença julgou improcedente o pedido, mas o acórdão recorrido, reformando a decisão de origem, reconheceu o direito ao benefício. O INSS interpôs embargos de declaração, julgados em composição não ampliada, em desacordo com o art. 260, §4º, do RITRF3, razão pela qual foi suscitada questão de ordem para anulação do julgamento e subsequente reanálise do mérito dos embargos.
II. Questão em discussão
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A controvérsia envolve duas questões principais:
i. (a) saber se o acórdão embargado incorreu em omissão, obscuridade, contradição ou erro material que justificasse o acolhimento dos embargos de declaração opostos pelo INSS; e
ii. (b) saber se a parte autora preencheu os requisitos legais para a concessão da aposentadoria por idade rural, à luz da comprovação do labor campesino descontínuo e remoto, em conformidade com o art. 143 da Lei nº 8.213/91 e jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.
III. Razões de decidir
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Questão de ordem acolhida. Verificado que os embargos de declaração foram julgados sem a composição ampliada exigida pelo art. 260, §4º, do RITRF3, impõe-se a anulação do julgamento anterior.
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Da análise do mérito dos embargos. A ausência de vícios no acórdão recorrido afasta a pretensão recursal. Os embargos de declaração não se prestam à rediscussão do mérito, salvo quando indispensáveis à correção de erro material, omissão, obscuridade ou contradição, hipóteses não configuradas.
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Do mérito da causa originária. Constatou-se que a parte autora comprovou o exercício de atividade rural em regime de economia familiar, ainda que de forma descontínua, mediante início de prova material corroborada por robusta prova testemunhal. A jurisprudência do STJ admite o cômputo do tempo rural remoto e descontínuo para fins de carência, inclusive com alternância de vínculos urbanos, sem descaracterizar a condição de segurado especial (REsp 1.788.404/PR, Min. Napoleão Nunes Maia Filho).
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Da inexistência de má-fé e devolução de valores. Ausente prova de comportamento doloso, inaplicável a restituição dos valores recebidos, sendo indevida a repetição, à luz dos princípios da boa-fé objetiva e da confiança legítima.
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Do prequestionamento. Foram examinadas todas as matérias relevantes à solução da lide, não sendo necessária a menção numérica dos dispositivos legais invocados, conforme jurisprudência consolidada do STF e do STJ.
IV. Dispositivo e tese
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Questão de ordem acolhida para anular o acórdão proferido nos embargos de declaração e, ato contínuo, rejeitar os embargos de declaração do INSS, mantendo-se íntegro o acórdão anterior que reconheceu o direito da autora à aposentadoria por idade rural.
Tese de julgamento:
“1. A ausência de composição ampliada no julgamento dos embargos de declaração impõe a anulação do acórdão respectivo, nos termos do art. 260, §4º, do RITRF3.”
“2. Os embargos de declaração não constituem via adequada para rediscussão do mérito do acórdão, salvo para sanar omissão, obscuridade, contradição ou erro material.”
“3. O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, pode ser computado para fins de carência, desde que comprovado por início de prova material corroborado por prova testemunhal idônea, sem descaracterização por vínculos urbanos esporádicos.”
“4. Inexistente má-fé do segurado, é indevida a devolução dos valores recebidos de boa-fé.”
Dispositivos relevantes citados:
CF/1988, art. 5º, XXXV; art. 201, §7º, II.
Lei nº 8.213/91, arts. 48, §§1º e 2º; 55, §2º; 143.
CPC/2015, arts. 1.022, 489, §1º, IV.
RITRF3, art. 260, §4º; arts. 33, III, e 80, II.
Jurisprudência relevante citada:
STJ, REsp 1.788.404/PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 26/06/2019.
STJ, EDcl no REsp 321.703/SP, Rel. Min. Gilson Dipp, DJ 08/04/2002.
STF, RE 128.519/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 08/03/1991.
TRF3, AC 2007.61.23.000314-6, Rel. Juíza Marianina Galante, Oitava Turma, DJF3 27/07/2010.
ACÓRDÃO
Desembargadora Federal
