
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001845-93.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA DE FATIMA MACENA DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: THIEGO MATHEUS DIONISIO DE ANDRADE - MS27146-A
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001845-93.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA DE FATIMA MACENA DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: THIEGO MATHEUS DIONISIO DE ANDRADE - MS27146-A
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R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Trata-se de ação objetivando a concessão de aposentadoria por idade a trabalhador rural, com pedido de antecipação de tutela.
A sentença julgou procedente o pedido para condenar o requerido ao pagamento da aposentadoria rural por idade, a partir da data do requerimento administrativo (24/04/2023). Determinou que a correção monetária e os juros de mora incidirão conforme manual de cálculos da Justiça Federal, observados os parâmetros definidos no julgamento do Recurso Extraordinário 870.947 (tema 810 do STF) até a data de 08/12/2021, após deverá ser observada a disposição contida na EC n. 113/20211. Condenou o Instituto requerido ao pagamento de custas, despesas processuais e honorários advocatícios, arbitrados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas e não pagas até a implantação do benefício, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC. Concedeu a tutela de urgência, haja vista o caráter alimentar do benefício (art. 300 do CPC).
Dispensado o reexame necessário, nos termos do §3º do artigo 496 do CPC/15.
O INSS apelou, sustentando, preliminarmente, a nulidade da sentença por não ter especificado os períodos reconhecidos judicialmente. No mérito, sustenta que não restou comprovada a carência exigida e tampouco o exercício de atividade rural em regime de economia familiar, em período imediatamente anterior ao requerimento. Caso mantida a sentença, requer: A) em relação à correção monetária e os juros: a fixação dos juros moratórios nos termos do art. 1º-F da Lei 9.494/97, alterado pela Lei 11.960/09, bem como a fixação dos índices de correção monetária conforme Tema 905/STJ, sem prejuízo da aplicação imediata da Emenda Constitucional nº 113 , de 8 de dezembro de 2021, segundo a qual nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente; B) Data de início da condenação: que a condenação da autarquia retroaja à data da citação; C) Prequestionamento da matéria; D) Prescrição: o reconhecimento da prescrição das parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio que precede o ajuizamento da ação, nos termos do art. 103, parágrafo único, da Lei n. 8.213/91; E) Honorários: que o percentual arbitrado para pagamento dos honorários advocatícios se limite a 10% e incida apenas sobre as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula 111 do STJ. F) Multa: afastada a previsão de incidência de multa diária ou, ainda, seja ela arbitrada em 1/30 do valor do benefício, a incidir caso decorrido o prazo de 25 (vinte e cinco) dias úteis contados da remessa dos autos (em diligência) ao setor administrativo do INSS, e seja limitada a 30 dias-multa, a fim de evitar-se enriquecimento sem causa; G) Vedação à desaposentação.
Com contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001845-93.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA DE FATIMA MACENA DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: THIEGO MATHEUS DIONISIO DE ANDRADE - MS27146-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
A preliminar de nulidade deve ser rejeitada, tendo em vista que não houve pedido de reconhecimento de tempo de serviço rural, mas apenas de aposentadoria rural.
Ausente o interesse recursal em relação ao pedido de isenção ou diminuição da multa.
Considerando que a prescrição não corre durante o curso do processo administrativo e que a ação foi ajuizada dentro do prazo de 5 anos contado do seu término, não se pode falar em prescrição quinquenal.
Com efeito, consoante o disposto no artigo 48, § 1º da Lei n.º 8213, de 24 de julho de 1991, para a obtenção da aposentadoria rural por idade, é necessário que o homem tenha completado 60 anos e a mulher, 55 anos.
No artigo 142 da mencionada lei consta uma tabela relativa à carência, considerando-se o ano em que o rurícola implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício.
Por sua vez, o artigo 143 do mesmo diploma legal, com redação determinada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, estabelece que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
A Lei nº 11.718/2008 prorrogou o termo final do prazo para 31 de dezembro de 2010, aplicando-se esta disposição, inclusive, para o trabalhador rural enquadrado na categoria de segurado contribuinte individual que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego (art. 2º, caput e parágrafo único).
Observe-se que após o período a que se referem esses dispositivos, além do requisito etário, será necessário o cumprimento da carência de 180 meses, a teor do que dispõe o artigo 25, inciso II, da Lei n.º 8.213/1991.
O legislador, para promover esta transição ao sistema contributivo, possibilitou ao empregado rural e contribuinte individual, na concessão da aposentadoria por idade, para efeito de carência, que cada mês comprovado de emprego, de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, seja multiplicado por 3, limitado a 12 dentro do mesmo ano e no período de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, que cada mês de emprego seja multiplicado por 2, limitado a 12 meses dentro do mesmo ano.
Assim, para os empregados rurais (boias-frias/volantes), o exercício de atividade rural será computado para efeito de carência nos moldes do art. 143 da Lei de Benefícios, até 31/12/2010. Após esta data, se não atingido o número de meses necessário, deverá atender ao art. 3º, incisos II e III, da Lei nº 11.718/2008.
Em relação aos segurados especiais, não incidem as limitações acima.
O artigo 39 da Lei n.º 8.213/91 prevê os benefícios devidos ao segurado especial. Estabelece, ainda, que para a obtenção da aposentadoria por idade, o segurado especial deverá comprovar o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência, conforme preceitua o artigo 39, inciso I, da lei mencionada. Em outras palavras, não é exigido o cumprimento de carência do segurado especial, mas o efetivo exercício de atividade rural, na forma especificada no dispositivo em comento.
O conceito de segurado especial é dado pelo artigo 11, inciso VII, da Lei n.º 8.213/91. A Lei n.º 11.718, de 20 de junho de 2008, estendeu ao seringueiro ou extrativista vegetal (que labore na forma do art. 2º, caput, inciso XII da Lei n.º 9.985/2000), bem como ao pescador artesanal ou a este assemelhado a condição de segurado especial.
O §1º do artigo 11 da Lei n.º 8.213/91 define o regime de economia familiar. É possível ao segurado especial valer-se de empregados contratados, em épocas de safra, por no máximo 120 (cento e vinte) dias, nos termos do §7º do artigo acima referido. Por outro laudo, o §8º descreve determinadas atividades que não descaracterizam a condição de segurado especial, enquanto os incisos do §9º trazem um rol dos rendimentos que podem ser auferidos por membro do grupo familiar, sem que este perca sua condição de segurado especial.
Ressalte-se que o entendimento atual do STJ, expresso no Recurso Especial n. 1.354.908/SP, processado sob o rito dos recursos repetitivos, é no sentido de exigir que o segurado especial esteja laborando no campo quando completar a idade mínima para se aposentar, ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, tenha preenchido de forma concomitante os requisitos no passado.
Confira-se:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO.REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil."
(REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016)
Conclui-se, portanto, que para a concessão da aposentadoria por idade rural são necessários os requisitos: idade mínima e prova do exercício da atividade laborativa pelo período previsto em lei, no período imediatamente anterior ao que o segurado completa a idade mínima para se aposentar.
Nos termos da Súmula de nº 149 do STJ, é necessário que a prova testemunhal venha acompanhada de início razoável de prova documental: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Não se exige que a prova material se estenda por todo o período de carência, mas é imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em que foi constituído o documento (AR 4.094/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 26/09/2012, DJe 08/10/2012).
A idade mínima exigida para a obtenção do benefício restou comprovada pela documentação pessoal da autora (nascida em 10/01/68):
Para comprovar as suas alegações, a autora apresentou os seguintes documentos, dentre outros:
- carteiras de filiação a sindicato rural, datadas de 2006, 2007 e 2018;
- guias de recolhimento de contribuição sindical do agricultor em regime de economia familiar, datadas de 2009 e 2012;
- notas fiscais de saída, datadas de 2021 e 2022.
Os documentos relacionados servem como início de prova material da atividade rural.
Na audiência realizada em 12/03/2024, as testemunhas declararam que a autora exerce atividade rural em regime familiar há mais de 15 anos
Portanto, os depoimentos são harmônicos e suficientes para comprovar a atividade rural do autor pelo período exigido em lei.
Considerando-se que o conjunto probatório comprovou a atividade rural, deve ser mantida a concessão do benefício, bem como a antecipação da tutela, tendo em vista o caráter alimentar da aposentadoria rural.
O termo inicial do benefício deve ser mantido na data do requerimento administrativo (24/04/2023 - ID 293742252 - Pág. 14), uma vez que a parte autora demonstrou que já havia preenchido os requisitos necessários à concessão do benefício desde então.
As parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora na forma estabelecida e pelos índices previstos no capítulo 4.2, do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, alterado pela Resolução CJF nº 784/2022, de 08 de agosto de 2022, ou daquele que estiver em vigor na data da liquidação do título executivo judicial, conforme determinou a sentença recorrida.
Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de advogado arbitrados na sentença em 2%.
Diante do exposto, rejeito a preliminar, conheço de parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, nego-lhe provimento.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. NULIDADE DA SENTENÇA. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL EM RELAÇÃO AO PEDIDO DE ISENÇÃO OU REDUÇÃO DO VALOR DA MULTA. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. SUCUMBÊNCIA RECURSAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO MAJORADOS.
1. Não houve pedido de reconhecimento de tempo de serviço rural, mas apenas de aposentadoria rural por idade. Preliminar rejeitada.
2. Ausente o interesse recursal em relação ao pedido de isenção ou redução do valor da multa.
3. Considerando que a prescrição não corre durante o curso do processo administrativo e que a ação foi ajuizada dentro do prazo de 5 anos contado do seu término, não se pode falar em prescrição quinquenal.
4. Suficiente o conjunto probatório a demonstrar o exercício da atividade rural.
5. Juros e correção monetária de acordo com os critérios do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, conforme a sentença recorrida.
6. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015.
7. Preliminar rejeitada. Apelação do INSS parcialmente conhecida e não provida.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
