Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5001208-68.2016.4.03.6105
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
29/10/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 06/11/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR. SUSPENSÃO DE ANTECIPAÇÃO DE
TUTELA. CONFUNDE-SE COM O MÉRITO. AUXÍLIO ACIDENTE INDEVIDO. REDUÇÃO DA
CAPACIDADE LABORATIVA NÃO DECORRENTE DE ACIDENTE DE QUALQUER NATUREZA.
INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA. DEVOLUÇÃO
DOS VALORES A SER DECIDIDA PELO JUÍZO DA EXECUÇÃO.
1.Suspensão da antecipação da tutela. Confunde-se com o mérito.
2.Requisito legal “ocorrência de acidente de qualquer natureza” não comprovado. Redução da
capacidade laboral decorrente de doença.
3.Inversão do ônus da sucumbência. Honorários de advogado fixados em 10% (dez por cento) do
valor da causa atualizado. Artigo 85, §6°, Código de Processo Civil/2015. Observância do § 3º do
artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
4.Tutela antecipada revogada. Devolução dos valores recebidos indevidamente a ser decidida
pelo juízo da execução. Julgamento do Tema 692, pelo C. STJ.
5.Apelação do INSS provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001208-68.2016.4.03.6105
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PAULO ROGERIO CANTANHEDE PORTO
Advogados do(a) APELADO: FELIPE PENTEADO BALERA - SP291503-A, MARTA MARIA
RUFFINI PENTEADO GUELLER - SP97980-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001208-68.2016.4.03.6105
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PAULO ROGERIO CANTANHEDE PORTO
Advogados do(a) APELADO: FELIPE PENTEADO BALERA - SP291503-A, MARTA MARIA
RUFFINI PENTEADO GUELLER - SP97980-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando o restabelecimento do benefício previdenciário de auxílio acidente,
previsto no artigo 86 da Lei n° 8.213/1991.
A sentença, prolatada em 28.08.2018, julgou procedente o pedido para condenar a autarquia a
restabelecer o benefício de auxílio acidente, a partir da data da cessação administrativa, referente
ao NB n° 36/603.216.760-0. Determinou que nos valores em atraso, a partir das respectivas
competências, incidirá correção monetária, e serão acrescidos de juros de mora, de acordo com o
disposto na Resolução n° 267 do Conselho da Justiça Federal. Condenou o réu, também, ao
pagamento de honorários de advogado, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da
condenação, nos termos da Súmula 111 do STJ. Dispensada a remessa necessária, nos termos
do art. 496, §3°, I, do CPC/2015.
Deferida a antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional (Id. 7777941). Implantado o benefício de
auxílio acidente com DIB em 28.11.2012 e RMI de R$ 2.846,22 (Id. 7777945 e Plenus).
Apela o INSS, requerendo, preliminarmente, a suspensão dos efeitos da tutela antecipada. No
mérito, pleiteia a reforma da sentença, sob alegação de que a parte autora não preenche os
requisitos legais para a concessão do benefício de auxílio acidente, em razão da redução da
capacidade laboral não decorrer de acidente de qualquer natureza. Eventualmente, requer a
aplicação do disposto no art. 1º-F da Lei n° 9.494/1997, com a redação dada pela Lei n°
11.960/2009, no tocante aos juros e correção monetária.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001208-68.2016.4.03.6105
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PAULO ROGERIO CANTANHEDE PORTO
Advogados do(a) APELADO: FELIPE PENTEADO BALERA - SP291503-A, MARTA MARIA
RUFFINI PENTEADO GUELLER - SP97980-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Inicialmente, observo que a preliminar suscitada pelo INSS se confunde com o mérito, e com este
será analisado.
Passo ao exame do mérito.
A Lei nº 8.213/91 estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de auxílio-
acidente, previsto no seu artigo 86, que assim disciplina:
"Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após
consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas que
impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia."
Da leitura deste dispositivo, pode-se extrair que quatro são os requisitos para a concessão do
benefício em tela: (a) qualidade de segurado; (b) a superveniência de acidente de qualquer
natureza; (c) a redução parcial da capacidade para o trabalho habitual decorrente de sequela
consolidada, e (d) o nexo causal entre o acidente e a redução da capacidade laboral.
A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência
pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes.
O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de
segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça,
durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Também é considerado
segurado aquele que trabalhava, mas ficou impossibilitado de recolher contribuições
previdenciárias em razão de doença incapacitante.
Nesse passo, acresça-se que no que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador
desempregado, não obstante a redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a
necessidade de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o
Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei
Federal (Pet. 7.115), firmou entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser
suprida quando outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas
a comprovar a situação de desemprego.
A perda da qualidade de segurado está disciplinada no §4º desse dispositivo legal, ocorrendo no
dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de
competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de
segurado.
Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o
término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus
dependentes o direito aos benefícios previdenciários.
Anote-se que a eventual inadimplência das obrigações trabalhistas e previdenciárias acerca do
tempo trabalhado como empregado deve ser imputada ao empregador, responsável tributário,
conforme preconizado na alínea a do inciso I do artigo 30 da Lei nº 8.213/91, não sendo cabível a
punição do empregado urbano pela ausência de recolhimentos, computando-se, assim, o período
laborado para fins de verificação da qualidade de segurado.
Por fim, observo que o art. 26, I, da Lei n° 8.213/91 afasta a necessidade do cumprimento da
carência para a concessão do benefício de auxílio acidente.
No caso concreto, a perícia judicial (24.08.2017 - Id. 7776981) atesta que o autor, médico, com 57
anos, é portador de sequelas de paralisia do MSE - espástica, e do MIE, com perda significativa
de força e mobilidade, prejuízo notável na marcha, hiperestesia cutânea, consequentes a uma
isquemia no território da artéria cerebral média direita. Afirma, ainda, que apesar de todas as
tentativas de fisioterapias, aplicações, botox, não recuperou a parte motora, tendo retornado ao
seu trabalho em atividade como docente, sem poder operar, ou mesmo examinar pacientes de
forma correta. Conclui pela existência de incapacidade parcial e permanente para sua atividade
habitual, enquadrável no Anexo III do Decreto 3.048/1999, fixando o termo inicial da incapacidade
laborativa em 28.11.2012.
Depreende-se do conjunto probatório que o autor apresentou sequelas consolidadas, com
redução da capacidade laborativa para o exercício da atividade habitual, decorrente de doença,
de natureza neurológica, conforme atestado no laudo pericial (quesito da parte requerida 03 - Id.
7776981 / pág. 03).
Nesse contexto, observo que o parágrafo único do art. 30 do Decreto 3.048/1999 estabelece a
definição de acidente de qualquer natureza, um dos requisitos legais exigidos para a concessão
do benefício de auxílio acidente, in verbis:
“Parágrafo único. Entende-se como acidente de qualquer natureza ou causa aquele de origem
traumática e por exposição a agentes exógenos (físicos, químicos e biológicos), que acarrete
lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte, a perda, ou a redução permanente ou
temporária da capacidade laborativa”.
Nota-se, portanto, que para a configuração do acidente de qualquer natureza, há que ocorrer um
evento súbito, traumático, imprevisível, involuntário e diretamente externo. Apesar dessa
denominação, o Acidente Vascular Cerebralé uma patologia, ou seja, não decorre de causa
externa, mas de fatores internos e de risco da saúde da própria pessoa, que levam à sua
ocorrência, não estando o juízo adstrito ao laudo pericial.
Desta feita, considerando que a legislação de regência do benefício previdenciário de auxílio
acidente exige a ocorrência de acidente de qualquer natureza para sua concessão, nota-se não
preenchido um dos requisitos legais.
Nesse sentido, cito julgados desta E. Corte: TRF3, AC 2004.03.99.013873-5/SP, 7ª Turma, Rel.
Des. Fed. Eva Regina, D.E. 18/01/2010; TRF3, AC 00053476320124036114, Relato JUIZ
CONVOCADO DAVID DINIZ, OITAVA TURMA, Decisão: 29/07/2013, v.u., e-DJF3 Judicial 1:
09/08/2013; TRF3, AC 0005039-76.2012.4.03.6130/SP, 9ª Turma, Rel. Juiz. Fed. Convocado
Rodrigo Zacharias, D.E. 27/09/2016.
Ausente o requisito legal “ocorrência de acidente de qualquer natureza”, que é pressuposto
indispensável ao deferimento do benefício pleiteado, torna-se despicienda a análise dos demais
requisitos, na medida em que a falta de apenas um deles é suficiente para obstar a concessão do
benefício de auxílio acidente.
Inverto o ônus da sucumbência e condeno a parte autora ao pagamento de honorários de
advogado, que ora fixo em 10% (dez por cento) do valor da causa atualizado, de acordo com o
§6º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, cuja exigibilidade, diante da assistência
judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98
do Código de Processo Civil/2015.
Revogo a antecipação de tutela anteriormente concedida. A questão referente à eventual
devolução dos valores recebidos a este título deverá ser analisada e decidida em sede de
execução, nos termos do artigo 302, I, e parágrafo único, do CPC/2015, e de acordo com o que
restar decidido no julgamento do Tema 692, pelo C. Superior Tribunal de Justiça.
Desse modo, acolho a preliminar do INSS.
Diante do exposto, DOU PROVIMENTO à apelação do INSS, para julgar improcedente o pedido
formulado na inicial. Em consequência, revogo a tutela antecipada concedida, com a devolução
dos valores recebidos indevidamente a ser decidida pelo juízo da execução, nos termos da
fundamentação exposta.
Oficie-se ao INSS para que proceda ao imediato cancelamento do benefício de auxilio acidente.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR. SUSPENSÃO DE ANTECIPAÇÃO DE
TUTELA. CONFUNDE-SE COM O MÉRITO. AUXÍLIO ACIDENTE INDEVIDO. REDUÇÃO DA
CAPACIDADE LABORATIVA NÃO DECORRENTE DE ACIDENTE DE QUALQUER NATUREZA.
INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA. DEVOLUÇÃO
DOS VALORES A SER DECIDIDA PELO JUÍZO DA EXECUÇÃO.
1.Suspensão da antecipação da tutela. Confunde-se com o mérito.
2.Requisito legal “ocorrência de acidente de qualquer natureza” não comprovado. Redução da
capacidade laboral decorrente de doença.
3.Inversão do ônus da sucumbência. Honorários de advogado fixados em 10% (dez por cento) do
valor da causa atualizado. Artigo 85, §6°, Código de Processo Civil/2015. Observância do § 3º do
artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
4.Tutela antecipada revogada. Devolução dos valores recebidos indevidamente a ser decidida
pelo juízo da execução. Julgamento do Tema 692, pelo C. STJ.
5.Apelação do INSS provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu, DAR PROVIMENTO à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
