
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001653-65.2021.4.03.6120
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: PAULO ALBERTO MATTOS FACEIRO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANE AGUIAR DA CUNHA BELTRAME - SP103039-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, PAULO ALBERTO MATTOS FACEIRO
Advogado do(a) APELADO: CRISTIANE AGUIAR DA CUNHA BELTRAME - SP103039-A
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001653-65.2021.4.03.6120
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: PAULO ALBERTO MATTOS FACEIRO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANE AGUIAR DA CUNHA BELTRAME - SP103039-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, PAULO ALBERTO MATTOS FACEIRO
Advogado do(a) APELADO: CRISTIANE AGUIAR DA CUNHA BELTRAME - SP103039-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Trata-se de ação em que se pleiteia a revisão da RMI de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante a averbação de valores de salário de contribuição reconhecidos em ação trabalhista, bem como o reconhecimento de períodos laborados em atividades especiais (02/04/2007 a 15/02/2008, 18/02/2008 a 06/06/2008 e 20/06/2008 a 17/10/2008 e 20/09/2008 a 03/05/2012).
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido, conforme dispositivo que ora transcrevo: “Ante o exposto, julgo parcialmente procedente o pedido para condenar o INSS a (a) averbar o tempo de serviço especial nos períodos 18.02.2008 a 06.06.2008 e 20.06.2008 a 17.10.2008, (b) converter o tempo de serviço especial em tempo de serviço comum, com acréscimo de 40% e (c) revisar a renda mensal da aposentadoria por tempo de contribuição NB 42/159.438.511-1, a partir da DER em 03.05.2012, computando-se o tempo especial convertido em tempo de serviço comum; (d) revisar a renda mensal inicial do benefício NB 42/159.438.511-1, a partir da DER em 03.05.2012, de acordo com a majoração dos salários-de-contribuição nas competências respectivas, em decorrência do direito reconhecido na reclamação trabalhista nº 0153100-61.1998.5.15.0079, respeitada a limitação ao teto em cada competência. As prestações vencidas, observada a prescrição quinquenal, serão atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora de acordo com os critérios previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, descontando-se eventuais valores já recebidos administrativamente no período. Diante da sucumbência mínima da parte autora, nos termos do art. 85, §2º e 3º, I do CPC, condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios no importe de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, observada a Súmula 111 do STJ. Custas pelo INSS, que é isento. Porém, a isenção não desobriga a autarquia de ressarcir eventuais custas adiantadas pela parte autora quando do ajuizamento da ação. Sentença não se sujeita à remessa necessária, em razão do valor da condenação não ultrapassar mil salários-mínimos (art. 496, § 3º, I, do CPC). Caso interposto recurso, abra-se vista à contraparte. Apresentadas contrarrazões ou decorrido o prazo sem manifestação, encaminhem-se os autos ao TRF da 3ª Região. Publique-se. Sentença registrada eletronicamente. Intimem-se.”
Apela a parte autora requerendo o reconhecimento da ocorrência do cerceamento de defesa e, consequentemente da nulidade da sentença. Alega que “O PPP não está correto e a produção de prova pericial é direito e é imprescindível para que o apelante possa ser compensado pela exposição a agentes agressivos a saúde.”
Apela o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS requerendo, preliminarmente, a submissão da sentença ao reexame necessário. No mérito, sustenta a impossibilidade do enquadramento das atividades exercidas pela parte autora como especiais, notadamente em razão da metodologia adotada para aferição do agente nocivo. No tocante ao pedido de averbação dos novos valores de salários de contribuição reconhecidos perante a Justiça do Trabalho, aponta a falta de interesse de agir, ante a ausência de prévio requerimento administrativo. Subsidiariamente, pleiteia pela reforma da sentença no tocante ao termo inicial dos efeitos financeiros, que entende, deve ser fixado na data da citação. Pede ainda o afastamento da condenação ao pagamento de verba honorária, por não ter dado causa ao ajuizamento da demanda.
Com contrarrazões da parte autora vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001653-65.2021.4.03.6120
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: PAULO ALBERTO MATTOS FACEIRO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANE AGUIAR DA CUNHA BELTRAME - SP103039-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, PAULO ALBERTO MATTOS FACEIRO
Advogado do(a) APELADO: CRISTIANE AGUIAR DA CUNHA BELTRAME - SP103039-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos de apelação.
Das preliminares.
Da remessa necessária. Sentença não submetida.
Embora a sentença tenha sido desfavorável ao INSS, descabe a submissão da sentença ao reexame necessário, tendo em vista que possui natureza meramente declaratória, cujo proveito econômico não alcançará o valor de alçada estabelecido no inciso I do §3º do artigo 496 do Código de Processo Civil de 2015.
Assim, é nítida a inadmissibilidade, na hipótese em tela, da remessa necessária.
Da falta de interesse de agir.
A tese firmada no julgamento do RE 631.240, de Relatoria do E. Ministro Luís Roberto Barroso, Tema 350 do STF, decidiu que:
I - A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas;
II – A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado;
III – Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo – salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração –, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão;
IV – Nas ações ajuizadas antes da conclusão do julgamento do RE 631.240/MG (03/09/2014) que não tenham sido instruídas por prova do prévio requerimento administrativo, nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (a) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (b) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; e (c) as demais ações que não se enquadrem nos itens (a) e (b) serão sobrestadas e baixadas ao juiz de primeiro grau, que deverá intimar o autor a dar entrada no pedido administrativo em até 30 dias, sob pena de extinção do processo por falta de interesse em agir. Comprovada a postulação administrativa, o juiz intimará o INSS para se manifestar acerca do pedido em até 90 dias. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir;
V – Em todos os casos acima – itens (a), (b) e (c) –, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.
Tendo sido a ação ajuizada após o julgamento do RE 631.240, exigível o prévio requerimento administrativo.
Detidamente analisando os autos verifica-se que, já em sede de contestação, a autarquia apontou a falta de interesse de agir quanto ao pedido de averbação dos valores de salário de contribuição reconhecidos na Justiça do Trabalho, ante a falta do prévio requerimento administrativo.
De fato, nota-se que o autor não demonstrou a recusa administrativa quanto ao pedido em comento, pelo que, considerando a ausência de contestação de mérito quanto à questão e, não se tratando de matéria de notória negativa administrativa, não se vislumbra a resistência à pretensão por parte da autarquia, restando afastado o interesse de agir.
Desta feita, no que se refere ao pedido de averbação dos valores de salário de contribuição reconhecidos na Justiça do Trabalho, julgo extinto o feito sem julgamento do mérito, nos termos do art. 485, inciso VI do CPC/2015.
Do cerceamento de defesa. Inocorrência.
Em que pesem as alegações da parte autora, afasto a alegação de cerceamento de defesa, posto que à parte autora foi oportunizada a juntada de prova documental, que reputasse hábil à comprovação da especialidade alegada.
A propósito, registre-se que a especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico previdenciário (a partir de 11/12/97).
Consoante dispõe o art. 373, I, do CPC/2015, o ônus probatório quanto aos fatos alegados cabe à parte autora, de modo que no caso, cabe ao autor diligenciar visando à obtenção dos documentos necessários, comprobatórios da especialidade alegada, ante a negativa da empresa no seu fornecimento, valendo-se, inclusive, se considerar necessário/conveniente, de ação autônoma para tanto.
Verificando o autor incongruências nos documentos fornecidos, deverá ajuizar ação própria para retificação dessas informações, no âmbito trabalhista (TRF 3ª Região, AC nº 2018.03.99.000832-2, Rel. Des. Fed. Inês Virgínia, j. 30/01/2019, v.u., p. DE 11/02/2019).
A realização da perícia direta somente se justifica na hipótese da empresa empregadora, mesmo regularmente notificada, negar o fornecimento do documento comprobatório (formulário, PPP ou laudo técnico) e a perícia indireta por similaridade, da mesma forma, somente se justifica, na hipótese da empresa empregadora estar comprovadamente inativa.
Passo ao exame das demais questões.
Aposentadoria por tempo de serviço/contribuição
A aposentadoria por tempo de serviço, atualmente denominada aposentadoria por tempo de contribuição, admitia a forma proporcional e a integral antes do advento da Emenda Constitucional 20/98, fazendo jus à sua percepção aqueles que comprovem tempo de serviço (25 anos para a mulher e 30 anos para o homem na forma proporcional, 30 anos para a mulher e 35 anos para o homem na forma integral) desenvolvido totalmente sob a égide do ordenamento anterior, respeitando-se, assim, o direito adquirido.
Aqueles segurados que já estavam no sistema e não preencheram o requisito temporal à época da Emenda Constitucional 20 de 15 de dezembro de 1998, fazem jus à aposentadoria por tempo de serviço proporcional desde que atendam às regras de transição expressas em seu art. 9º, caso em que se conjugam o requisito etário (48 anos de idade para a mulher e 53 anos de idade para o homem) e o requisito contributivo (pedágio de 40% de contribuições faltantes para completar 25 anos, no caso da mulher e para completar 30 anos, no caso do homem).
Assim, até a edição da EC 103/2019, eram requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições (30 anos para a mulher e 35 anos para o homem), ressaltando-se que o tempo de serviço prestado anteriormente à referida Emenda equivale a tempo de contribuição, a teor do art. 4º da Emenda Constitucional 20/98.
Aposentadoria Especial
A aposentadoria por tempo de serviço especial teve assento primeiro no artigo 31 da Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960, Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS, que estabeleceu que seria concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinquenta) anos de idade e 15 (quinze) anos de contribuições, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, em serviços que, para esse efeito, fossem considerados penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo.
Prevê ainda, o mencionado diploma legal, no art. 162, o reconhecimento de atividade especial prestada em data anterior à sua edição, na hipótese de seu cômputo ser mais benéfico ao segurado.
Como assentado pelas Cortes Superiores "tal hipótese, apesar de similar, não se confunde com a questão da legislação aplicável ao caso de concessão de aposentadoria, tampouco com aquela que diz respeito à possibilidade de aplicação retroativa da lei nova que estabeleça restrição ao cômputo do tempo de serviço. (...) Interpretação diversa levaria à conclusão de que o segurado, sujeito a condições insalubres de trabalho, só teria direito à aposentadoria especial após 15, 20 e 25 anos de trabalho exercida depois da Lei nº 3.807/60, desconsiderando, portanto, todo o período de labor, também exercido em tal situação, porém em data anterior à lei de regência." (Ag Rg no REsp nº 1015694, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza Assis de Moura, DJe 01/02/2011)
Essa norma foi expressamente revogada pela Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973, que passou a discipliná-la no artigo 9º, alterando, em efeitos práticos, apenas o período de carência de 15 (quinze) anos para 5 (cinco) anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
Sobreveio, então, o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, reclassificando as atividades profissionais segundo os agentes nocivos e os grupos profissionais tidos por perigosos, insalubres ou penosos, com os respectivos tempos mínimos de trabalho.
Importante ressaltar que os Decretos nºs. 53.831/64 e 83.080/79 tiveram vigências simultâneas, de modo que, conforme reiteradamente decidido pelo C. STJ, havendo colisão entre as mencionadas normas, prevalece a mais favorável ao segurado. (REsp nº 412351, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, pág. 355).
As atividades insalubres previstas nas aludidas normas são meramente exemplificativas, podendo outras funções ser assim reconhecidas, desde que haja similitude em relação àquelas legalmente estatuídas ou, ainda, mediante laudo técnico-pericial demonstrativo da nocividade da ocupação exercida. Nesse sentido, o verbete 198 da Súmula do TFR.
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, a matéria passou a ser prevista no inciso II do artigo 202 e disciplinada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação original previa que o benefício de aposentadoria especial seria devido ao segurado que, após cumprir a carência exigida, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade física, restando assegurada, ainda, a conversão do período trabalhado no exercício de atividades danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em seguida, foi editada a Lei nº 9.032/95, alterando o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, dispondo que a partir desse momento não basta mais o mero enquadramento da atividade exercida pelo segurado na categoria profissional considerada especial, passando a ser exigida a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, que poderá se dar por meio da apresentação de informativos e formulários, tais como o SB-40 ou o DSS-8030.
Posteriormente, com a edição do Decreto n.º 2.172, de 05/03/1997, que estabeleceu requisitos mais rigorosos para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, passou-se a exigir-se a apresentação de laudo técnico para a caracterização da condição especial da atividade exercida. Todavia, por se tratar de matéria reservada à lei, tal exigência apenas tem eficácia a partir da edição da Lei n.º 9.528, de 10/12/1997.
Cumpre observar que a Lei nº 9528/97 também passou a aceitar o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, documento que busca retratar as características de cada emprego do segurado, de forma a facilitar a futura concessão de aposentadoria especial. Assim, identificado no documento o perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, é possível a sua utilização para comprovação da atividade especial em substituição ao laudo pericial.
Ressalto que no tocante ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e à forma da sua demonstração, deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho, conforme jurisprudência pacificada da matéria (STJ - Pet 9.194/PR, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
Nos termos da Súmula nº 68 da TNU, “o laudo pericial não contemporâneo ao período trabalhado é apto à comprovação da atividade especial do segurado”. A extemporaneidade do documento comprobatório das condições especiais de trabalho não prejudica o seu reconhecimento como tal, "pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual a constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica." (Des. Fed. Fausto De Sanctis, AC nº 2012.61.04.004291-4, j. 07/05/2014); “inexiste exigência legal de contemporaneidade dos documentos técnicos que comprovam o exercício de labor especial” (8ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5008647-15.2021.4.03.6119, Rel. Desembargador Federal DAVID DINIZ DANTAS, julgado em 09/08/2022, DJEN DATA: 12/08/2022).
Ruído
O Decreto nº 53.831/64 considerava insalubre o labor desempenhado com exposição permanente a ruído acima de 80 dB; já o Decreto nº 83.080/79 fixava a pressão sonora em 90 dB. Na medida em que as normas tiveram vigência simultânea, prevalece disposição mais favorável ao segurado (80 dB).
Com a edição do Decreto nº 2.172/97, a intensidade de ruído considerada para fins de reconhecimento de insalubridade foi elevada para 90 dB, mas, em 2003, essa medida foi reduzida para 85 dB, por meio do Decreto nº 4.882, de 18 de novembro de 2003.
Até 09 de outubro de 2013, os Tribunais adotavam o enunciado pela Súmula nº 32 da TNU. Contudo, esta Súmula foi cancelada em decorrência do julgamento da PET 9059 pelo Superior Tribunal de Justiça (Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJe 09/09/2013) cujo entendimento foi sufragado no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), sob a sistemática dos recursos repetitivos.
Em relação ao agente ruído, vigora o princípio do tempus regit actum. Considera-se especial a atividade desenvolvida acima do limite de 80dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº 2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90dB até 18/11/2003, quando foi editado o Decreto nº 4882/2003. A partir de 19/11/2003 o limite passou a ser de 85 dB.
Saliente-se que a especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico previdenciário (a partir de 11/12/97).
É corrente em nossos tribunais a tese de que sempre se exigiu laudo técnico para comprovar a exposição do trabalhador aos agentes físicos ruído e calor em níveis superiores aos limites máximos de tolerância. Entretanto, no tocante às atividades profissionais exercidas até 10/12/97 - quando ainda não havia a exigência legal de laudo técnico -, essa afirmação deve ser compreendida, não na literalidade, mas no sentido de ser necessário o atesto efetivo e seguro dos níveis de intensidade dos agentes nocivos a que o trabalhador esteve exposto durante sua jornada laboral.
Logo, para as atividades profissionais exercidas até 10/12/97, é suficiente que os documentos apresentados façam expressa menção aos níveis de intensidade dos agentes nocivos.
A legislação de regência não exige que a nocividade do ambiente de trabalho seja aferida a partir de uma determinada metodologia. O artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91, exige que a comprovação do tempo especial seja feita por formulário, ancorado em laudo técnico elaborado por engenheiro ou médico do trabalho, o qual, portanto, pode se basear em qualquer metodologia científica. Não tendo a lei determinado que a aferição só poderia ser feita por meio de uma metodologia específica, não se pode deixar de reconhecer o labor especial pelo fato de o empregador ter utilizado uma técnica diversa daquela indicada na Instrução Normativa do INSS, pois isso representaria uma extrapolação do poder regulamentar da autarquia.
Na sessão de julgamento de 08/02/2017, sob a sistemática dos recursos especiais repetitivos (Tema 1083), o STJ estabeleceu a tese de que o exercício de atividades sob condições especiais pela exposição a ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido através do Nível de Exposição Normalizado (NEN), que indica a média ponderada de ruído. Na ausência deste, deverá ser adotado o critério de nível máximo (pico) de ruído, desde que comprovada a habitualidade e permanência da exposição, através de perícia judicial.
Contudo, acerca da habitualidade e permanência da exposição ao agente ruído, entendo aplicável à hipótese a norma prevista no artigo 375 do CPC/2015, considerando que o cotejo das provas carreadas aos autos, em especial as descrições das atividades desenvolvidas pelo segurado, permite concluir que o segurado ficava habitual e permanentemente exposto ao agente nocivo indicado nos formulários previdenciários/PPP durante a jornada de trabalho, não se fazendo necessário, portanto, a conversão do feito em diligência para a produção de laudo pericial, em observância aos princípios da celeridade e economia processuais.
Saliente-se que de acordo com o definido pelo C. STJ a informação de inserção do NEN, no PPP ou LTCAT, somente tornou-se exigível a partir da edição do Decreto 4.882/2003.
Uso de equipamento de proteção individual - EPI, como fator de descaracterização do tempo de serviço especial
A questão foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do ARE nº 664335, da relatoria do E. Ministro Luiz Fux, com reconhecimento de repercussão geral, na data de 04.12.2014, em que restou decidido que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional ao reconhecimento das atividades especiais.
Restou assentado também que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
O fato de a empresa fornecer equipamento de proteção individual - EPI para neutralização dos agentes agressivos não afasta, por si só, a contagem do tempo especial, pois cada caso deve ser examinado em suas peculiaridades, comprovando-se a real efetividade do aparelho e o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça (AgInt no AREsp n. 1.889.768/MG, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 22/11/2021, DJe de 10/12/2021; REsp n. 1.800.908/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 11/4/2019, DJe de 22/5/2019; REsp 1428183/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 25/02/2014, DJe 06/03/2014).
Ainda, conforme a jurisprudência citada, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído, desde que em níveis acima dos limites legais, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas.
Fonte de custeio
Quanto à alegação de necessidade de prévio custeio, cumpre ressaltar inexistir vinculação do ato de reconhecimento de tempo de atividade perigosa/nociva ao eventual pagamento de encargos tributários com alíquotas diferenciadas, eis que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 não demandam tal exigência, que constituiria encargo para o empregador, não podendo o empregado ser por isso prejudicado. Assim já definiu o C. STF, ao apreciar o tema em repercussão geral ARE nº 664.335/SC, Rel. Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 09/12/2014, DJE 27/03/2015.
Caso concreto.
Da atividade especial.
Os períodos de 18.02.2008 a 06.06.2008 e 20.06.2008 a 17.10.2008, laborados junto às empresas Itapê Ferrovias Ltda. e Ferrornorte Ferrovias Norte Brasil, nas funções de analista mecânico e de operações, devem ser reconhecidos como especiais, à vista da comprovação da exposição habitual e permanente a ruído acima do limite permitido, conforme os PPPs - Perfil Profissiográfico Previdenciário (ID 276249493 - Pág. 37/40), enquadrando-se no código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 e no item 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79, bem como no item 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e no item 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99 c/c Decreto n.º 4.882/03.
Ressalte-se que, embora o Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP não contemple campo específico para a anotação sobre a caracterização da "exposição aos agentes nocivos, de forma habitual e permanente, não ocasional nem intermitente", tal qual ocorria nos formulários anteriores, certo é que a formatação do documento é de responsabilidade do INSS, de modo ser desproporcional admitir que a autarquia transfira ao segurado o ônus decorrente da ausência desta informação. Além disso, em geral, é possível extrair o "caráter habitual e permanente, não ocasional nem intermitente" a partir da descrição das atividades desempenhadas pelo segurado.
Ademais, observo que a exigência legal de comprovação de exposição a agente insalubre de forma permanente, introduzida pela Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao § 3º do art. 57 da Lei nº 8.213, deve ser interpretada como o labor continuado, não eventual ou intermitente, de modo que não significa a exposição ininterrupta a agente insalubre durante toda a jornada de trabalho.
Conclusão.
Destarte, deve o INSS proceder ao recálculo da renda mensal inicial (RMI) do benefício da parte autora (NB nº 42/ 159.438.511-1), reconhecendo-se a especialidade das atividades trabalhadas nos períodos de 18.02.2008 a 06.06.2008 e 20.06.2008 a 03.05.2012.
Dos efeitos financeiros.
Considerando que os documentos comprobatórios da especialidade do trabalho já constavam no procedimento administrativo, são devidas as diferenças decorrentes da especialidade do trabalho a partir da concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, ocorrida em 03.05.2012, observando-se a prescrição quinquenal.
Dos honorários de advogado.
Mantida a condenação ao pagamento de honorários advocatícios, nos termos da sentença, considerando que os documentos que ensejam o reconhecimento da especialidade do labor constam no procedimento administrativo.
Da sucumbência recursal.
Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que, a título de sucumbência recursal condeno a parte autora ao pagamento de honorários de advogado ao INSS, arbitrados em 2% do valor da condenação, observados os termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
Ante o exposto, REJEITO a questão preliminar referente ao reexame necessário, ACOLHO a preliminar de falta de interesse de agir, julgando extinto sem julgamento do mérito o pedido de averbação dos valores de salário de contribuição, reconhecidos na Justiça do Trabalho, ante a falta de prévio requerimento administrativo e no mérito, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação do INSS para reformar parcialmente a sentença no tocante ao termo inicial dos efeitos financeiros para que seja respeitada a prescrição quinquenal e NEGO PROVIMENTO à apelação da parte, nos termos da fundamentação supra.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINARES. REMESSA NECESSÁRIA. SENTENÇA NÃO SUBMETIDA. FALTA DE INTERESSE DE AGIR DE PARTE DO PEDIDO. CONFIGURADO, AUSÊNCIA DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. TEMA 350 DO STF. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. REVISÃO DA RMI DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. RUÍDO. USO DE EPI. EFEITOS FINANCEIROS. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
1. Sentença declaratória. O proveito econômico não alcançará o valor de alçada estabelecido no inciso I do §3º do artigo 496 do Código de Processo Civil de 2015. Nítida a inadmissibilidade da remessa necessária. Preliminar rejeitada.
2. Ação ajuizada após o julgamento do RE 631.240 (Tema 350). Exigível o prévio requerimento administrativo. Falta de interesse de agir configurado. Ausência de pedido administrativo quanto ao pedido de averbação dos valores de salário de contribuição reconhecidos na Justiça do Trabalho. Ausência de contestação de mérito. Extinção do feito sem julgamento do mérito quanto ao pedido. Preliminar acolhida.
3. Cerceamento de defesa não caracterizado. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico previdenciário (a partir de 11/12/97). Consoante dispõe o art. 373, I, do CPC/2015, o ônus probatório quanto aos fatos alegados cabe à parte autora.
4. Trata-se de ação em que se pleiteia a revisão da RMI de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante a averbação de valores de salário de contribuição reconhecidos ema ação trabalhista, bem como o reconhecimento de períodos laborados em atividades especiais (02/04/2007 a 15/02/2008, 18/02/2008 a 06/06/2008 e 20/06/2008 a 17/10/2008 e 20/09/2008 a 03/05/2012).
5. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua demonstração.
6. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário (a partir de 11/12/97).
7. Para o agente ruído, considera-se especial a atividade desenvolvida acima do limite de 80dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº 2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90dB. A partir da edição do Decreto nº 4882 em 18/11/2003, o limite passou a ser de 85Db. Comprovada a exposição em patamar acima dos limites estabelecidos.
8. O uso de Equipamento de Proteção Individual – EPI para o agente nocivo ruído, desde que em níveis acima dos limites legais, não descaracteriza o tempo de serviço especial.
9. O Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP não contempla campo específico para a anotação sobre a caraterização da "exposição aos agentes nocivos, de forma habitual e permanente, não ocasional nem intermitente", tal qual ocorria nos formulários anteriores. Entretanto, a formatação do documento é de responsabilidade do INSS, de modo ser desproporcional admitir que a autarquia transfira ao segurado o ônus decorrente da ausência desta informação.
10. A exigência legal de comprovação de exposição a agente insalubre de forma permanente, introduzida pela Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao § 3º do artigo 57 da Lei nº 8.213, deve ser interpretada como o labor continuado, não eventual ou intermitente, de modo que não significa a exposição ininterrupta a agente insalubre durante toda a jornada de trabalho.
11. Mantida a sentença no que concerne ao reconhecimento da especialidade do labor do autor. Deve o INSS proceder ao recálculo da renda mensal inicial (RMI) do benefício da parte autora.
12. Termo inicial dos efeitos financeiros. Considerando que os documentos comprobatórios da especialidade do trabalho já constavam no procedimento administrativo, são devidas as diferenças decorrentes da especialidade do trabalho a partir da concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, ocorrida em 03.05.2012, observando-se a prescrição quinquenal.
13. Honorários de advogado fixados em desfavor do INSS mantidos nos termos da sentença. Documentos comprobatórios da especialidade do trabalho já constavam no procedimento administrativo de concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
14. Sucumbência recursal da parte autora. Sucumbência recursal. Honorários de advogado arbitrados em 2% do valor da condenação arbitrado na sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015. Exigibilidade condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
15. Reexame necessário rejeitado. Preliminar de falta de interesse de agir acolhida para extinguir em parte o feito. Apelação do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS parcialmente provida e apelação da parte autora não provida.
