Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5019823-53.2018.4.03.6100
Relator(a)
Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
30/03/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 03/04/2020
Ementa
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. LOAS. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. JUROS E
CORREÇÃO MONETÁRIA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. RESSARCIMENTO AO
ERÁRIO.
1 - O Benefício de Prestação Continuada não se presta àcomplementação derenda, pelo
contrário, só é devido àqueles que não têm outros meios de subsistência, desde que preenchidos
os requisitos subjetivos, ou seja, ser idoso com idade igual ou superior à 65 anos ou deficiente;
2 - Comprovada a fraude contra a Previdência Social, impõe-se a devolução dos valores pagos,
evitando o enriquecimento ilícito em detrimento do interesse público, sendo que, o procedimento
administrativo para aferição do créditoprevidenciáriooude possível ilegalidadesuspende a
prescrição do direito da Administraçãorequerê-lo.
3 - Apelação parcialmente provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5019823-53.2018.4.03.6100
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELADO: ROGERIO GALVAO PERES
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5019823-53.2018.4.03.6100
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ROGERIO GALVAO PERES
R E L A T Ó R I O
A EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora): Trata-se de apelação
interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social, contra a r.sentença (ID.: 7699599, págs.
69/78), complementada pelos embargos de declaração de págs. 81/82, do mesmo ID, que julgou
parcialmente procedente o pedido para condenar o réu a ressarcir o INSS, pelo recebimento
deBenefício de Prestação Continuada (NB 87/131.925.6435-7),a partir de 24 de outubro de 2011
até a data da cessação do benefício, em 30 de junho de 2012, atualizados e corrigidos segundo a
Resolução CJF – 267/13 (manual de cálculos da Justiça Federal).
Em suas razões de apelação (Id.:7699599, págs 90/94), sustenta o INSS que, conforme o
entendimento em sede de recurso repetitivo, no REsp n° 1.112.577/SP, enquanto não se encerrar
o processo administrativo não corre o prazo prescricional, pois o crédito carece de constituição
definitiva, não podendo por essa razão ser cobrado pela Administração, não estando, portanto, o
crédito prescrito.
Também, recorre a autarquia dos índices de juros e multa estabelecidos, defendendo que devem
ser utilizados os mesmo aplicáveis aos tributos federais, conforme o art. 37-A, da Lei n°
10.555/02.
Prequestiona, para efeito de recurso especial ou extraordinário, ofensa a dispositivos de lei
federal e de preceitos constitucionais.
Pugna pela reforma da sentença.
Sem contrarrazões, àrevelia, os autos foram remetidos a esta E. Corte Regional.
Parecer do Ministério Público Federal pelo parcial provimento da apelação (Id.: 90417245).
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5019823-53.2018.4.03.6100
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ROGERIO GALVAO PERES
V O T O
A EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora):
Recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de sua
regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo
Civil.
MÉRITO
O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal,
e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da Lei
8.742/1993.
O Benefício da Prestação Continuada (BPC) consiste na garantia de um salário mínimo mensal
ao idoso com 65 anos ou mais ou pessoa com deficiência de qualquer idade com impedimentos
de natureza física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo (que produza efeitos pelo prazo
mínimo de 2 anos), que o impossibilite de participar, em igualdade de condições, com as demais
pessoas da vida em sociedade de forma plena e efetiva. Tratando-se de benefício assistencial,
não há período de carência, tampouco é necessário que o requerente seja segurado do INSS ou
desenvolva alguma atividade laboral, sendo imprescindível, porém, a comprovação da
hipossuficiência própria e/ou familiar.
O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal garante o benefício em comento às pessoas com
deficiência que não possuam meios de prover à sua própria manutenção ou de tê-la provida por
sua família.
A previsão deste benefício guarda perfeita harmonia com a Constituição de 1988, que hospedou
em seu texto princípios que incorporam exigências de justiça e valores éticos, com previsão de
tarefas para que o Estado proceda à reparação de injustiças.
Concebida dentro de uma perspectiva do Estado Social de Direito, a Constituição valoriza e
protege os direitos sociais básicos, estabelece normas pragmáticas, enfim, apresenta conteúdo
contrário ao de uma Constituição do Estado Liberal, afastando-se do repouso, do formalismo e do
divórcio entre Estado e Sociedade.
A dignidade humana permeia todas as matérias constitucionais, sendo um valor supremo. E a
cidadania não se restringe ao seu conteúdo formal, sendo a legitimidade do exercício político
pelos indivíduos apenas uma das vertentes da cidadania, que é muito mais ampla e tem em seu
conteúdo constitucional a legitimidade do exercício dos direitos sociais, culturais e econômicos.
Os Princípios Fundamentais previstos no artigo 3º da Constituição Federal de 1988, voltados para
a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, objetivando a erradicação da pobreza e a
redução das desigualdades sociais e regionais, dão suporte às normas públicas voltadas ao
amparo de pessoas em situação de miséria.
A estrutura do Estado brasileiro insculpida no texto constitucional está informada pelos direitos e
valores nela declarados, que necessitam de permanente conformação com às demandas sociais.
Como destaca Paulo Bonavides, seguindo o norte das constituições democráticas, a Constituição
brasileira carrega traços do conflito, dos conteúdos dinâmicos, do pluralismo, da tensão sempre
renovada entre igualdade e a liberdade.
É com esse espírito que o benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V da Carta deve ser
compreendido.
No caso em questão, o réu recebia o Benefício de Prestação Continuada, com DIB em 11 de
novembro de 2003, quando, por meio de revisão periódica realizada pelo INSS, constatou-se que
aquele exercia atividade laborativa, com vínculo empregatício, desde 27 de abril de2006, fato
confirmado pelos extratos do CNIS, o que, pela falta de esclarecimentos do réu,levou à
suspensão da benesse em 25/06/2012. Também, conforme os salários declarados no extrato
CNIS, não se pode afirmar que o réu continuasse a preencher os requisitos legais para a
subsistência do benefício, ou seja, a condição de miserabilidade, uma vez que recebeu durante o
período salários de até R$ 1.875,08, passando o benefício a ser um complemento de renda.
Assim, o réu deve ser responsabilizado, ressarcindo ao erário os valores indevidamente
recebidos, desde que não estejam prescritos.
Embora o INSS tenha ajuizado a presente ação apenas em 24 outubro de 2016, não se deve
computar o prazo que durouo trâmite processual administrativo, que se deu entre fevereiro de
2012 e agosto de 2012, nesse sentido, outro julgado deste mesmo Tribunal.
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO.
AUXÍLIO-RECLUSÃO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO DE COBRANÇA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. I - Segundo entendimento consolidado na jurisprudência do STJ, em se
tratando de ação que vise ao ressarcimento do erário por dano não decorrente de ato de
improbidade administrativa, não se cogita de imprescritibilidade. II - Quanto ao prazo
prescricional, a jurisprudência deste Tribunal tem ser orientado no sentido de que, ante a
inexistência de prazo geral expressamente fixado para as ações movidas pela Fazenda Pública
contra o particular, em se tratando de benefícios previdenciários, há que se aplicar por simetria o
disposto no parágrafo único do artigo 103 da Lei 8.213/91, sendo, portanto, de cinco anos. III -
Em caso de concessão indevida de benefício previdenciário, ocorrendo a notificação do segurado
em relação à instauração do processo revisional, não se pode cogitar de curso do prazo
prescricional, pois devendo ser aplicado, por isonomia, o artigo 4º do Decreto 20.910/1932. A
fluência do prazo prescricional, dessa forma, se inicia com o pagamento indevido, mas não tem
curso durante a tramitação do processo administrativo instaurado para apuração da ilegalidade
cogitada. IV - Se a execução fiscal foi extinta por não ser o meio adequado de promover a
cobrança, tal ato (propositura de ação executiva) não gera efeitos para fins de interrupção da
prescrição e consequente recontagem do prazo prescricional. V - Resta evidente que a pretensão
do autor foi atingida pela prescrição, considerando que os valores cobrados se referem ao
período de abril de 2003 a junho de 2006 e que a presente demanda foi ajuizada em 03.11.2016,
ainda que se considere a suspensão do prazo prescricional durante o curso do procedimento
administrativo. VI - A verba honorária estabelecida na sentença revela-se excessiva, razão pela
qual reduzo-a para R$ 2.000,00. VII - Apelação do INSS parcialmente provida. (TRF 3ª Região,
10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5010206-54.2018.4.03.6105, Rel. Desembargador
Federal SERGIO DO NASCIMENTO, julgado em 02/05/2019, Intimação via sistema DATA:
03/05/2019)"
Assim, conforme bem colocou o membro do Órgão Ministerial, apenas as prestações percebidas
anteriormente à março de 2011 estão prescritas.
Portanto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao apelo, determinando a restituição das parcelas
percebidas entre março de 2011 e junho de 2012.Para o cálculo dos juros de mora e correção
monetária, devem ser aplicados os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos
para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da
correção monetária a partir de julho de 2009, período em que deve ser observado o Índice de
Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio
Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE,
realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019,
com a rejeição dos embargos de declaração opostos pelo INSS.
Quanto ao prequestionamento de matéria ofensiva a dispositivos de lei federal e de preceitos
constitucionais, tendo sido o recurso apreciado em todos os seus termos, nada há que ser
discutido ou acrescentado aos autos.
OFICIE-SE.
É COMO VOTO.
/gabiv/wgmagalh
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. LOAS. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. JUROS E
CORREÇÃO MONETÁRIA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. RESSARCIMENTO AO
ERÁRIO.
1 - O Benefício de Prestação Continuada não se presta àcomplementação derenda, pelo
contrário, só é devido àqueles que não têm outros meios de subsistência, desde que preenchidos
os requisitos subjetivos, ou seja, ser idoso com idade igual ou superior à 65 anos ou deficiente;
2 - Comprovada a fraude contra a Previdência Social, impõe-se a devolução dos valores pagos,
evitando o enriquecimento ilícito em detrimento do interesse público, sendo que, o procedimento
administrativo para aferição do créditoprevidenciáriooude possível ilegalidadesuspende a
prescrição do direito da Administraçãorequerê-lo.
3 - Apelação parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu DAR PARCIAL PROVIMENTO ao apelo, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
