
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003267-61.2015.4.03.6134
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DIVALDO DIAS DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: FERNANDA LIMA DA SILVA - SP242782-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003267-61.2015.4.03.6134
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DIVALDO DIAS DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: FERNANDA LIMA DA SILVA - SP242782-A
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R E L A T Ó R I O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de
apelação
interposta contra sentença que julgou procedente o pedido deduzido na inicial, nos seguintes termos (ID 89983685, págs. 4/11):“Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido do autor, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC, para reconhecer como tempo especial os períodos de 07/06/1976 a 20/07/1981, de 12/11/1984 a 15/03/1988 e de 02/08/1988 a 29/01/1990, condenando o 1NSS à obrigação de fazer consistente em averbá-los e convertê-los, e a revisar desde citação nesses autos a RMI do beneficio 157.357.507-8, titularizado pelo autor.
Condeno o INSS, ainda, ao pagamento dos valores em atraso desde a citação, que deverão ser pagos com a incidência dos índices de correção monetária e juros previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, vigente na data de elaboração dos cálculos.
Condeno o requerido ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo no percentual mínimo do §3° do art. 85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação obtido pela parte autora, de modo a possibilitar sua eventual majoração, nos termos do §11 do mesmo dispositivo, e observado, ainda, seu §5°, por ocasião da apuração do montante a ser pago. O valor da condenação fica limitado ao valor das parcelas vencidas até a data da prolação de sentença (Súmula n° 111 do STJ).
Sentença não sujeita ao duplo grau de jurisdição obrigatório, a teor do art. 496, §3°, inciso 1, do Código de Processo Civil.”
Em suas razões de apelação, aduz o INSS que (ID 89983685, págs. 15/27):
- o feito deve ser extinto sem resolução do mérito, por falta de interesse de agir, uma vez que não houve o necessário prévio requerimento administrativo. Em realidade, os documentos que sustentam o pedido de reconhecimento de trabalho especial foram emitidos após a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição que se pretende revisar, e foram apresentados somente em Juízo, não tenho sido formulado pedido de revisão perante a Administração;
- subsidiariamente, sustenta que a correção monetária e os juros de mora das dívidas da Fazenda Pública devem respeitar o disposto no art. 1º-F, da Lei nº 9.494/97, com observação da redação dada pela Lei nº 11.960/09.
Prequestiona, para efeito de recurso especial ou extraordinário, ofensa a dispositivos de lei federal e de preceitos constitucionais.
Intimado, o autor deixou de apresentar contrarrazões (ID 89983685, pág. 29), vindo os autos a esta E. Corte Regional.
Justiça gratuita deferida (ID 89983541, pág. 131).
É O RELATÓRIO.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003267-61.2015.4.03.6134
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DIVALDO DIAS DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: FERNANDA LIMA DA SILVA - SP242782-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA):
Recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.O interesse de agir se caracteriza pela materialização da utilidade-necessidade do provimento jurisdicional. Assim, para o exercício do direito de ação, faz-se necessária a afirmação de lesão a um direito. É a existência de um conflito de interesses que justifica a intervenção do Poder Judiciário, sem o qual não há solução possível.
E, nos pleitos de benefício previdenciário, é imprescindível, em regra, o prévio requerimento na esfera administrativa, sem o qual não há resistência da Autarquia à pretensão, tampouco lesão a um direito, nem interesse de agir.
Para reclamar a atividade jurisdicional do Estado, é necessário, antes, a postulação do seu pedido na via administrativa, o que não se confunde com o seu prévio exaurimento, este, sim, representando um injustificado obstáculo de acesso ao Judiciário.
Nesse sentido, é o entendimento expresso na Súmula nº 9 desta Egrégia Corte ("Em matéria previdenciária, torna-se desnecessário o prévio exaurimento da via administrativa") e na Súmula nº 213 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça ("O exaurimento da via administrativa não é condição para a propositura de ação de natureza previdenciária").
A exigência de prévia postulação na via administrativa não constitui, ademais, afronta ao princípio da inafastabilidade da jurisdição, previsto no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal ("A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito"), pois o direito de ação tem como limite as condições da ação, e a ausência de uma delas configura a carência de ação, dispensando o Juízo de se manifestar sobre o mérito da pretensão.
Sobre o tema, já há entendimento consolidado tanto no Egrégio Supremo Tribunal Federal, em repercussão geral, como no Egrégio Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR.
1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo.
2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.
3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.
4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão.
5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos.
6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir.
7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir.
8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.
9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir.
(RE nº 631.240/MG, Tribunal Pleno, Relator Ministro Roberto Barroso, DJe 10/11/2014)
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. NECESSIDADE. CONFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE SUPERIOR AO QUE DECIDIDO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO JULGAMENTO DO RE 631.240/MG, JULGADO SOB A SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL.
1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 631.240/MG, sob rito do artigo 543-B do CPC, decidiu que a concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento administrativo, evidenciando situações de ressalva e fórmula de transição a ser aplicada nas ações já ajuizadas até a conclusão do aludido julgamento (03/9/2014).
2. Recurso especial do INSS parcialmente provido a fim de que o Juízo de origem aplique as regras de modulação estipuladas no RE 631.240/MG. Julgamento submetido ao rito do artigo 543-C do CPC.
(REsp nº 1.369.834/SP, 1ª Seção, Relator Ministro Benedito Gonçalves, DJe 02/12/2014)
A partir de 04/09/2014, dia seguinte à conclusão do julgamento do referido recurso extraordinário, não mais se admite o ajuizamento da ação de benefício previdenciário sem o prévio requerimento administrativo, salvo algumas exceções, nas quais não se inclui o caso concreto.
Segundo consta dos autos, em 27/12/2011, o autor formulou requerimento administrativo para obter aposentadoria por tempo de contribuição, o que lhe foi deferido em 19/01/2012.
Em 2015, ajuizou a presente ação com o objetivo de que fossem enquadrados períodos de trabalho como especiais, apresentando, para tanto, PPPs emitidos entre os anos de 2013 e 2014.
Anoto que referidos formulários não foram previamente submetidos à apreciação da Administração, sendo certo, ainda, que, no momento do requerimento administrativo, não foram juntados quaisquer outros documentos que indicassem labor especial, ou a pretensão do autor de que fossem reconhecidos períodos especiais.
A não apresentação da documentação pertinente perante o INSS para a obtenção do pleito vindicado, circunstância reconhecida pela própria parte autora em sua inicial, torna inviável a configuração de pretensão resistida pela autarquia.
A situação se amolda à exceção prevista no item 4 da ementa do precedente de repercussão geral antes mencionado, que exige o requerimento prévio inclusive para os casos de pedido de revisão, quando “depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração”, verbis:
4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração
Conforme acima exposto, ausente a postulação do seu pedido na via administrativa e consequente resistência da Autarquia em concedê-lo, não configurando um conflito de interesses que justifique a intervenção do Poder Judiciário para uma solução, não há que se falar em lesão a um direito e, portanto, interesse de agir.
Não se olvida que a apresentação de contestação de mérito configura pretensão resistida. No entanto, in casu, citado, o INSS invocou a preliminar de ausência de interesse de agir, requerendo a extinção do feito nos termos do art. 485, inciso VI, do CPC/15, tratando do mérito apenas quanto a correção monetária, subsidiariamente.
O mesmo se deu em sede de apelação, oportunidade em que a autarquia reiterou a matéria preliminar, omitindo-se quanto à questão de mérito.
Saliento que não se trata de exigir o exaurimento da via administrativa, mas sim, de que ao menos seja apresentado o requerimento perante o INSS, instruído com a documentação mínima que indique existência de períodos em que potencialmente exercido o trabalho especial, o que não ocorreu no caso em exame.
Dessa maneira, entendo ausente o interesse de agir da parte autora, de modo que o feito deve ser extinto sem resolução do mérito.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Provido o apelo do INSS, o ônus da sucumbência deve ser invertido, condenando-se o autor ao pagamento de honorários advocatícios em favor do apelante, fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, considerando que não se trata de causa de grande complexidade, mas sim repetitiva, o que facilita o trabalho realizado pelo advogado, diminuindo o tempo exigido para o seu serviço.
Suspendo, no entanto, a sua execução, nos termos do artigo 98, § 3º, do CPC/2015, por ser a parte autora beneficiária da Justiça Gratuita.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação do INSS para extinguir o feito sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, inciso VI, do CPC.
É O VOTO.
/gabiv/ka
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL/0003267-61. PROCESSUAL CÍVEL. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE LABOR EXERCIDO SOB CONDIÇÕES ESPECIAIS. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. DOCUMENTAÇÃO NECESSÁRIA NÃO APRESENTADA ANTERIORMENTE. PRETENSÃO NÃO RESISTIDA. FALTA DE INTERESSE DE AGIR.
- O interesse de agir se caracteriza pela materialização da utilidade-necessidade do provimento jurisdicional, assim, para o exercício do direito de ação, faz-se necessária a afirmação de lesão a um direito, a existência de um conflito de interesses que justifica a intervenção do Poder Judiciário, sem o qual não há solução possível.
- Nos pleitos de benefício previdenciário é imprescindível, em regra, o prévio requerimento na esfera administrativa, sem o qual não há resistência à pretensão, tampouco lesão a um direito, nem interesse de agir, o que não se confunde com o seu prévio exaurimento, este sim representando um injustificado obstáculo de acesso ao Judiciário, conforme o disposto na Súmula nº 9 desta Egrégia Corte, e na Súmula nº 213 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça.
- A exigência de prévia postulação na via administrativa não constitui afronta ao princípio da inafastabilidade da jurisdição, previsto no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, pois o direito de ação tem como limite as condições da ação, e a ausência de uma delas configura a carência de ação, dispensando o Juízo de se manifestar sobre o mérito da pretensão.
- O tema restou consolidado, em repercussão geral, pelo E. STF (RE nº 631.240/MG, Tribunal Pleno, Relator Ministro Roberto Barroso, DJe 10/11/2014), e pelo C. STJ em sede de repetitivo (REsp nº 1.369.834/SP, 1ª Seção, Relator Ministro Benedito Gonçalves, DJe 02/12/2014).
- A não apresentação da documentação pertinente perante o INSS para a obtenção do pleito vindicado, circunstância reconhecida pela própria parte autora em sua inicial, torna inviável a configuração de pretensão resistida pela autarquia.
- A situação se amolda à exceção prevista no item 4 da ementa do precedente de repercussão geral antes mencionado, que exige o requerimento prévio inclusive para os casos de pedido de revisão, quando “depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração”.
- Pretensão resistida não configurada igualmente porque não foi apresentada contestação quanto ao mérito.
- Provido o apelo do INSS, o ônus da sucumbência deve ser invertido, condenando-se o autor ao pagamento de honorários advocatícios em favor do apelante, fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, observada a suspensão da exeução, nos termos do artigo 98, § 3º, do CPC/2015, por ser a parte autora beneficiária da Justiça Gratuita.
- Apelação do INSS provida para extinguir o feito nos termos do art. 485, inciso VI, do CPC.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação do INSS, para extinguir o feito sem resolução de mérito, nos termos do artigo 485, inciso VI, do CPC/15, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
