
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004512-84.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ELISETE CANDIDO FERREIRA
Advogado do(a) APELANTE: MARIA CLAUDIA LOPES MILANI ZANGRANDO - SP286255-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004512-84.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ELISETE CANDIDO FERREIRA
Advogado do(a) APELANTE: MARIA CLAUDIA LOPES MILANI ZANGRANDO - SP286255-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada (LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal.
A sentença, prolatada em 19.09.2016, julgou improcedente o pedido ante o não preenchimento por parte da autora do requisito de miserabilidade imprescindível para a concessão do benefício. Condenou-a ao pagamento de honorários de advogado fixados em R$ 800,00, respeitada a gratuidade concedida.
Apela a parte autora alegando para tanto que restou preenchido o requisito de miserabilidade, não tendo condições de prover a sua própria subsistência ou tê-la provida pela sua família.
Com contrarrazões, os autos vieram a este Tribunal.
O Ministério Público Federal opinou pelo provimento do recurso da parte autora.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004512-84.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ELISETE CANDIDO FERREIRA
Advogado do(a) APELANTE: MARIA CLAUDIA LOPES MILANI ZANGRANDO - SP286255-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
O artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
A constitucionalidade dessa norma foi questionada na ADI 1.232-1/DF, tendo o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria, decidido pela improcedência do pedido, ao fundamento que a fixação da renda per capita no patamar de ¼ do salário mínimo sugere a presunção absoluta de pobreza. Concluiu, contudo, que não é a única forma suscetível de se aferir a situação econômica da família do idoso ou portador de deficiência.
Posteriormente, a Corte Suprema enfrentou novamente a questão no âmbito da Reclamação 4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconhecendo a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993, decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).
Restou decidido que a norma é inconstitucional naquilo que não disciplinou, não tendo sido reconhecida a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência, cabendo ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial a fim de suprimir o vício apontado.
Desta forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência, é através da própria natureza de seus males, de seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.
Não há como enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar, nem tampouco entender que aqueles que contam com menos de ¼ do salário-mínimo fazem jus obrigatoriamente ao benefício assistencial ou que aqueles que tenham renda superior não o façam.
Com relação ao cálculo da renda per capita em si, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo REsp 1.355.052/SP, em conformidade com a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no RE 580.963/PR, definiu que a se aplica, por analogia, a regra do parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), a pedido de benefício assistencial formulado por pessoa com deficiência, a fim de que qualquer benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado na sua aferição.
Por fim, entende-se por família, para fins de verificação da renda per capita, nos termos do §1º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.435/2011, o conjunto de pessoas composto pelo requerente, o cônjuge, o companheiro, a companheira, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Contudo, em que pese a princípio os filhos casados ou que não coabitam sob o mesmo teto não integrarem o núcleo familiar para fins de aferição de renda per capita, nos termos da legislação específica, não se pode perder de vista que o artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece que o benefício é devido quando o idoso ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-lo provido pela família. Por sua vez, a regra do artigo 229 da Lei Maior dispõe que os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, premissa também assentada nos artigos 1694 a 1697 da lei Civil.
Depreende-se assim que o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação da família de prestar a assistência, pelo que, como já dito, o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode ser interpretado de forma isolada na apuração da miserabilidade.
Tecidas tais considerações, no caso dos autos a sentença de primeiro grau julgou improcedente o pedido com base nos elementos contidos no estudo social, tendo se convencido não restar configurada a condição de hipossuficiência financeira ou miserabilidade necessárias para a concessão do benefício. Confira-se:
“Em atenção aos documentos coligidos pelo instituto requerido, percebo que o companheiro da requerente auferia renda em torno de R$ 900,00 (8.269), diferente do que fora alegado no estudo social. Sendo assim, não restou caracterizado o estado de miserabilidade da requerente, pois a renda per capta de sua família é de R$ 356,00 em média. Destarte, inviável se torna a concessão do benefício, posto que o estado de miserabilidade não restou comprovado.”
O estudo social (ID 87777130 – pág. 74/76), elaborado em 19.05.2016, revela que a parte autora reside com seu companheiro, uma filha menor de idade, uma tia, um tio e um primo menor de idade em imóvel que pertence à tia. Trata-se de construção de alvenaria, com dois cômodos (quarto/cozinha e banheiro) em mal estado de conservação. O imóvel fica situado em um bairro carente e distante do centro da cidade, porém, com toda infraestrutura como: água, energia elétrica, esgoto, pavimentação e PAS. A mobília é humilde/escassa e encontra-se em mal estado de conservação
Quanto a renda familiar, consta que o grupo aufere cerca de R$ 1.412,00 conforme segue:
- O companheiro da autora trabalha como jardineiro auferindo R$ 350,00/mês;
- O tio da autora trabalha exercendo atividade de serviços gerais e aufere R$ 880,00/mês;
- A parte autora recebe Bolsa Família no valor de R$ 70,00;
- O primo recebe Bolsa Família no valor de R$ 112,00;
Informaram despesas em torno de R$ 1.250,00.
A perita social emitiu parecer nos termos que segue: “6- Parecer Social: De posse das informações colhidas através de visita/entrevista, verificamos que a requerente em questão faz uso de medicamentos contínuos, todavia, não é pessoa dependente físico-psicológica, pois, efetua suas necessidades fisiológicas, higiene pessoal e locomove-se sem a necessidade de auxilio de terceiros, efetua os afazeres domésticos cotidianos, é pessoa apta para atos da vida civil, é orientada no tempo/espaço e situação e apresenta aspecto físico/mental saudável e perfeito.”
Cabe observar que embora tenham informado que o companheiro da autora auferia cerca de R$ 350,00 ao mês, o extrato do sistema CNIS ID 87777130 – pág. 91/92 indica que no momento da perícia social ele mantinha vínculo de trabalho formal com salário de contribuição entre R$ 900,00 a R$ 1.000,00.
Nota-se ainda que apresenta vida laborativa ativa com vínculo de trabalho formal desde 2008.
Depreende-se da leitura do estudo social que, apesar de não se negar a existência de dificuldades financeiras, não há indícios de que as necessidades básicas da parte autora não estejam sendo supridas e, nesse sentido, ressalto que o benefício assistencial não se destina a complementar o orçamento doméstico, mas sim prover aqueles que se encontram em efetivo estado de necessidade.
Verifica-se, assim, que o MM. Juiz sentenciante julgou de acordo com as provas carreadas aos autos e não comprovada a condição de miserabilidade, pressuposto indispensável para a concessão do benefício, de rigor a manutenção da sentença de improcedência do pedido por seus próprios fundamentos.
Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de advogado arbitrados na sentença em 2%, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação da parte autora e, com fulcro no §11º do artigo 85 do Código de Processo Civil, majoro os honorários de advogado em 2% sobre o valor arbitrado na sentença, nos termos da fundamentação exposta.
É o voto.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004512-84.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
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Advogado do(a) APELANTE: MARIA CLAUDIA LOPES MILANI ZANGRANDO - SP286255-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. HIPOSSUFICIÊNCIA/MISERABILIDADE NÃO DEMONSTRADA. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
1. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
2. Requisito de miserabilidade/hipossuficiência não preenchido. Laudo social indica que a parte autora encontra-se amparada pela família e não há evidência de que suas necessidades básicas não estejam sendo supridas. O benefício assistencial não se presta a complementação de renda.
3. Benefício assistencial indevido.
4. Sucumbência recursal. Aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015. Exigibilidade condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
5. Apelação da parte autora não provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
