Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5001809-32.2016.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
28/04/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 30/04/2020
Ementa
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001809-32.2016.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARINA TORRES
Advogado do(a) APELADO: KARLA JUVENCIO MORAIS SALAZAR - MS12192-A
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. MISERABILIDADE/HIPOSSUFICIÊNCIA.
REQUISITO NÃO PREENCHIDO. INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. TUTELA
REVOGADA.
1. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da
Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da
Lei nº 8.742/93.
2. Requisito de miserabilidade/hipossuficiência não preenchido. Laudo social indica que a parte
autora encontra-se amparada pela família que vive em aldeia com boa infraestrutura. Não
demonstrada a impossibilidade do sustento. O benefício assistencial não se presta a
complementação de renda.
3. Benefício assistencial indevido.
4. Inversão do ônus da sucumbência.
5. Tutela antecipada revogada. Desnecessária a devolução dos valores. Inaplicabilidade do
decidido no REsp nº 1401560/MT aos benefícios assistenciais.
6. Apelação do INSS provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001809-32.2016.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARINA TORRES
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OUTROS PARTICIPANTES:
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada
(LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal à pessoa portadora de
deficiência.
A sentença, prolatada em 02.03.2016, julgou o pedido procedente conforme dispositivo que ora
transcrevo: “Diante do exposto, e por tudo mais que os autos consta, JULGO PROCEDENTE o
pedido formulado nestes autos de Ação Previdenciária promovida por Marina Torres em face de
Instituto Nacional do Seguro Social INSS e, por consequência, CONDENO o requerido a pagar à
autora o benefício previdenciário de assistência social, no valor equivalente a 01 (um) salário
mínimo mensal, a partir da data da citação (11/06/2014 fl. 31), devendo as prestações vencidas
no período serem adimplidas de uma só vez, corrigidas monetariamente a partir do vencimento
de cada prestação do benefício (Súmula 08 do TRF da 3ª Região) e incidindo juros moratórios a
partir da citação. Os juros moratórios devem ser calculados com base no índice oficial de
remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, segundo artigo 1º-F da Lei
9.494, com redação da Lei 11.960/2009. Já a correção monetária, por força da declaração de
inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei 11.960, deverá ser calculada com base no IPCA,
índice que melhor reflete a inflação acumulada do período. Estando presentes os requisitos do
Art. 273 do Código de Processo Civil, tanto que a ação foi julgada procedente, ANTECIPO OS
EFEITOS DA TUTELA nesta sentença, determinando a implantação do benefício no prazo
máximo de 10 dias, sob pena de incorrer o INSS em multa de um salário mínimo por dia de
atraso. Condeno o INSS a pagar os honorários periciais do Assistente Social já arbitrados em fls.
24-25, devendo a importância ser corrigida monetariamente e acrescida de juros moratórios a
contar do prazo de 15 dias posteriores ao trânsito em julgado da sentença, bem como ao
pagamento dos honorários advocatícios fixados em R$ 3.000,00 (três mil reais), na forma do art.
20, § 4.º do CPC, já considerando o grau de zelo do profissional, a importância e a complexidade
da causa, o tempo e o lugar da prestação do serviço. Expeçam-se os oficios requisitórios. Sem
custas nos termos da Lei. Declaro extinto o processo, com resolução de mérito, o que faço com
fundamento no inciso I do artigo 269 do Código de Processo Civil. Publique-se. Registre-se.
Intimem-se. Às providências necessárias."
Apela o INSS alegando para tanto que não restou comprovada a condição de miserabilidade da
parte autora. Subsidiariamente, pede a reforma da sentença no tocante ao termo inicial do
benefício, honorários advocatícios e correção monetária.
Com a apresentação de contrarrazões da parte autora, os autos vieram a este Tribunal.
O Ministério Público Federal opinou provimento do recurso de apelação interposto pelo Instituto
Nacional do Seguro Social - INSS.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001809-32.2016.4.03.9999
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Considerando que a sentença se enquadra entre as hipóteses de exceção de submissão ao
reexame necessário previstas no § 2º do artigo 475 do CPC/1973, restrinjo o julgamento apenas
à insurgência recursal.
O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei
nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
O artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com
deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do
salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
A constitucionalidade dessa norma foi questionada na ADI 1.232-1/DF, tendo o Plenário do
Supremo Tribunal Federal, por maioria, decidido pela improcedência do pedido, ao fundamento
que a fixação da renda per capita no patamar de ¼ do salário mínimo sugere a presunção
absoluta de pobreza. Concluiu, contudo, que não é a única forma suscetível de se aferir a
situação econômica da família do idoso ou portador de deficiência.
Posteriormente, a Corte Suprema enfrentou novamente a questão no âmbito da Reclamação
4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconhecendo a inconstitucionalidade parcial, sem
pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993, decorrente de notórias mudanças
fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais
por parte do Estado brasileiro).
Restou decidido que a norma é inconstitucional naquilo que não disciplinou, não tendo sido
reconhecida a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência, cabendo
ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial a fim de
suprimir o vício apontado.
Desta forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de
pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em
se tratando de pessoa idosa ou com deficiência, é através da própria natureza de seus males, de
seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.
Não há como enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar, nem tampouco entender
que aqueles que contam com menos de ¼ do salário-mínimo fazem jus obrigatoriamente ao
benefício assistencial ou que aqueles que tenham renda superior não o façam.
Com relação ao cálculo da renda per capita em si, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de
recurso repetitivo REsp 1.355.052/SP, em conformidade com a decisão proferida pelo Supremo
Tribunal Federal no RE 580.963/PR, definiu que a se aplica, por analogia, a regra do parágrafo
único do artigo 34 do Estatuto do Idos0 (Lei 10.741/03), a pedido de benefício assistencial
formulado por pessoa com deficiência, a fim de que qualquer benefício previdenciário recebido
por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado na sua aferição.
Por fim, entende-se por família, para fins de verificação da renda per capita, nos termos do §1º do
artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.435/2011, o conjunto de pessoas
composto pelo requerente, o cônjuge, o companheiro, a companheira, os pais e, na ausência de
um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os
menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Contudo, em que pese a princípio os filhos casados ou que não coabitam sob o mesmo teto não
integrarem o núcleo familiar para fins de aferição de renda per capita, nos termos da legislação
específica, não se pode perder de vista que o artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece
que o benefício é devido quando o idoso ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-
lo provido pela família. Por sua vez, a regra do artigo 229 da Lei Maior dispõe que os filhos
maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, premissa
também assentada nos artigos 1694 a 1697 da lei Civil.
Depreende-se assim que o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação
da família de prestar a assistência, pelo que, como já dito, o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode
ser interpretado de forma isolada na apuração da miserabilidade.
Tecidas tais considerações, no caso dos autos a sentença de primeiro grau julgou procedente o
pedido com base no laudo social apresentado, tendo se convencido restar configurada a condição
de hipossuficiência financeira ou miserabilidade necessária para a concessão do benefício.
Confira-se:
“De outro lado, o segundo requisito para a concessão do benefício assistencial, no meu entender,
também está evidente nos autos. Isto porque o relatório externado pelo Assistente Social às fls.
57-61 atesta a precária situação financeira vivida pela autora e sua família, na medida em que
residem na casa 03 pessoas (a autora, o companheiro e um filho de 15 anos de idade)que
sobrevivem apenas do salário que o companheiro da autora, o Sr. Élido Vilhalva, recebe, no valor
de um salário mínimo (R$ 724,00), que é utilizado para o pagamento de gastos domésticos, como
água, energia, alimentos e medicamentos. Pelo que se nota, a renda da autora resulta na renda
per capita de R$240,00 (duzentos e quarenta reais). É bem verdade que uma interpretação
meramente literal do art. 20, § 3.º, da Lei n.º 8.472/93, pode levar à conclusão de que somente
aqueles que demonstrarem ter renda mensal per capita de até ¼ do salário mínimo podem ser
agraciados com o benefício assistencial. Todavia, sabe-se que em tema de hermenêutica jurídica,
a interpretação literal é apenas o primeiro passo a ser observado, devendo o intérprete lançar
mão de outros métodos, a exemplo do sistemático e teleológico, para alcançar o melhor resultado
da reflexão. Isso porque, ao juiz não cabe exclusivamente exercer o papel de aplicador da letra
fria da lei, ao revés, é inerente à sua função o mister de valorar os interesses individuais e sociais
que circundam o caso, buscando, dentro de sua inteligência, aplicar a justiça ao fato que lhe foi
submetido a julgamento. (...). Nessa esteira de raciocínio, o requisito exigido pelo § 3.º do art. 20,
da Lei 8.742/93, a despeito da manifestação do STF pela sua constitucionalidade (ADI
n.º1232/DF), não contém caráter absoluto e intransponível, pois impõe restrição absolutamente
dissociada da realidade social de nosso País, afrontando os próprios princípios do sistema de
assistência social, entre eles o de respeito à dignidade do cidadão, à sua autonomia e ao seu
direito a benefícios e serviços de qualidade. O que se está a dizer, em outras palavras, é que
apesar do entendimento sufragado pelo STF, reconhecendo a constitucionalidade dessa
exigência, há casos em que a miserabilidade deve ser aferida de outro modo, de acordo com a
realidade de cada situação examinada pelo Poder Judiciário. In casu, além de haver prova da
fragilidade financeira da requerente, não há razoabilidade em impedi-la de auferir o benefício
assistencial que tanto necessita, apenas porque aufere renda pouco além de 1/4 do salário
mínimo. Ora, a quantia exigida por lei, que atualmente representa algo em torno de R$ 181,00
(cento e oitenta e um reais), é deveras insuficiente para garantir uma sobrevivência digna a uma
família, considerando os gastos com educação, alimentação, vestuário, moradia, água, luz, etc.
Aliás, esse quadro se agrava quando recordamos da ineficácia do Estado em seu sentido lato, em
propiciar para a população um atendimento à saúde adequado, uma educação de qualidade, um
serviço de segurança eficaz, entre outras obrigações que lhe são impostas pela Constituição
Cidadã, na medida em que a sua falta impõe ao administrado a necessidade de prover esses
serviços com os próprios recursos. Acrescento, por relevante e com base em uma interpretação
sistemática do ordenamento jurídico, que algumas legislações supervenientes vêm demonstrando
critérios diversos para se aferir a miserabilidade do cidadão, conforme se vê da Lei
n.º10.836/2004, que criou a Bolsa Família, da Lei n.º 10.689/2003, que instituiu o Programa
Nacional de Acesso à Alimentação, da Lei n.º 10.219/2001, que criou o Programa Bolsa Escola,
entre outros diplomas normativos, o que reforça a ideia de que o critério exigido pela Lei n.º
8.742/93 não é absoluto e, dependendo das condições específicas de cada caso concreto, pode
ser suplantado. Veja-se que o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de
flexibilizar a exigência feita pela lei, consoante se vê dos seguintes arestos (...) Na espécie, como
já dito, as peculiaridades que envolvem o caso posto a julgamento a exemplo da necessidade de
medicamentos, exames e consultas médicas especializadas, e da baixa renda auferida pela
família da autora, estão a revelar a sua miserabilidade, de modo a permitir o afastamento da
exigência feita pelo art. 20, § 3.ºda Lei n.º 8.742/93, sem adentrar no mérito de sua
constitucionalidade. Anoto que não há nos autos qualquer notícia de que a requerente receba
algum outro benefício previdenciário, o que comprova que ela reúne os três requisitos
necessários ao acolhimento de sua pretensão manifestada nessa demanda.”
Por sua vez, o estudo social (ID 171935), elaborado em 15.07.2014, revela que a parte autora
vive com seu companheiro de um filho de quinze anos de idade na aldeia indígena Teyi Kauê –
Missões Caraapó/MS.
Quanto às condições socioeconômicas consta que: “No que tange a renda, a autora declara que
atualmente seu amásio está prestando serviços em uma escola no polo indígena e percebe um
salário mínimo, que é o único valor que garante o sustento familiar. Em relação a habitação, a
família dispõe na aldeia de uma área em que contém três casas, onde uma delas é no estilo oca
e outras duas de alvenaria, todas de porte pequeno. Ademais, a família dispõe neste espaço de
água encanada e energia elétrica, cujo valor declarado em relação a taxas pagas pelos serviços,
fica em torno de R$ 70,00 reais mensais. Em entrevista com a sra. Marina, informou que sofre de
diversos problemas de saúde que a impossibilita de desenvolver atividades das mais simples.
Soma-se a estas dificuldades físicas, aquelas que estão relacionadas a problemas de convulsões,
necessitando de medicação permanente. Explorando com a autora o acesso a medicação,
informa que em sua maioria tem acesso a tais remédios na unidade de saúde que fica localizada
no polo da aldeia onde o serviço é prestado pela Secretaria Especializada da Saúde do Índio -
SESAI. Contudo, a requerente reitera que precisa passar por outros exames mais especializados
e que aguarda na fila o chamamento.”
A perita social emitiu parecer social conforme segue: “V – PARECER SOCIAL Este setor de
Serviço Social compreende que a partir desta abordagem social realizada com a família em tela,
tendo por base os elementos apresentados na síntese e outros observados durante o contato
com os sujeitos envolvidos nesta ação, é possível apontar alguns elementos direcionadores para
a melhor compreensão do contexto sócio familiar e as determinações que impactam diretamente
no cotidiano dos membros envolvidos nesta demanda. Tratando das condições objetivas desta
realidade no que tange ao aspecto material, nota-se que a família dispõe de renda fixa mínima
para o atendimento das necessidades mais básicas. Pois, como ficou constatado via declaração
da autora, o seu companheiro atualmente está desenvolvendo atividades com remuneração em
uma escola localizada na aldeia. Não diferente em relação ao aspecto habitacional, onde se nota
que a família conquistou dentro da reserva indígena uma condição atípica de muitas realidades
da Teyi Kuê, qual seja, água encanada, energia elétrica e uma estrutura organizacional que
contribui para uma vivência em patamares mínimos de dignidade. Diante do exposto,
compreendemos que o fator problema em tela, pauta-se mais pela lentidão da oferta de serviços
públicos de qualidade e célere - como é o caso da autora que aguarda a chamada para realizar
exames especializados - do que por uma situação de insuficiência para garantir necessidades
básicas - alimentação e vestuário. É o que tínhamos a relatar e que levamos a apreciação e
deliberação de Vossa Excelência”
Em que pese a existência de eventuais dificuldades, não se vislumbra a existência de
miserabilidade.
Depreende-se da leitura do estudo social que a família vive em aldeia com boa infraestrutura, e o
marido da autora trabalha como professor auferindo um salário mínimo mensalmente. Observa-se
ainda que a aldeia recebe serviço de saúde prestado pela Secretaria Especializada da Saúde do
Índio – SESAI, e da entidade a autora recebe a maioria de seus medicamentos, estando no
aguardo para realização de exames especializados.
Conclui-se, portanto, que apesar da existência eventuais dificuldades, a família possui rendimento
de um salário mínimo e encontra abrigo adequado na aldeia, não havendo que se falar em
miserabilidade, posto que suas necessidades básicas estão sendo supridas.
Ressalto que o benefício assistencial não se destina a complementar o orçamento doméstico,
mas sim prover aqueles que se encontram em efetivo estado de necessidade.
Conclui-se, desta forma, que as provas trazidas aos autos não foram hábeis à demonstração da
impossibilidade de sustento, como exige o art. 20 da Lei 8.742/1993, e, portanto, ausente o
requisito de miserabilidade, inviável a concessão do benefício assistencial.
Inverto o ônus da sucumbência e condeno a parte autora ao pagamento de honorários de
advogado que ora fixo em R$ 1.000,00 (um mil reais), de acordo com o §4º do artigo 20 do
Código de Processo Civil/1973, considerando que o recurso foi interposto na sua vigência, não se
aplicando as normas dos §§1º a 11º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, cuja
exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à
hipótese prevista no artigo 12 da Lei nº 1.060/50.
Por fim, revogo a tutela antecipada. Esclareço, todavia, que se tratando de benefício assistencial,
entendo indevida a devolução dos valores indevidamente pagos a esse título, não se aplicando
ao caso o entendimento firmado pelo STJ no REsp nº 1401560/MT, referente apenas aos
benefícios previdenciários.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação do INSS reformando a sentença para julgar
improcedente o pedido inicial e, consequentemente, revogo a tutela antecipada concedida na
sentença, nos termos da fundamentação exposta.
É o voto.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001809-32.2016.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARINA TORRES
Advogado do(a) APELADO: KARLA JUVENCIO MORAIS SALAZAR - MS12192-A
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. MISERABILIDADE/HIPOSSUFICIÊNCIA.
REQUISITO NÃO PREENCHIDO. INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. TUTELA
REVOGADA.
1. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da
Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da
Lei nº 8.742/93.
2. Requisito de miserabilidade/hipossuficiência não preenchido. Laudo social indica que a parte
autora encontra-se amparada pela família que vive em aldeia com boa infraestrutura. Não
demonstrada a impossibilidade do sustento. O benefício assistencial não se presta a
complementação de renda.
3. Benefício assistencial indevido.
4. Inversão do ônus da sucumbência.
5. Tutela antecipada revogada. Desnecessária a devolução dos valores. Inaplicabilidade do
decidido no REsp nº 1401560/MT aos benefícios assistenciais.
6. Apelação do INSS provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
