
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0021283-74.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: VALERIA DE FATIMA IZAR DOMINGUES DA COSTA - SP117546-N
APELADO: JOAQUIM OLIVEIRA DE LIMA
Advogado do(a) APELADO: EDNEIA MARIA MATURANO GIACOMELLI - SP135424-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0021283-74.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: VALERIA DE FATIMA IZAR DOMINGUES DA COSTA - SP117546-N
APELADO: JOAQUIM OLIVEIRA DE LIMA
Advogado do(a) APELADO: EDNEIA MARIA MATURANO GIACOMELLI - SP135424-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou benefício previdenciário de auxílio doença, previstos nos artigos 42 e 59/63 da Lei 8213/91.
A sentença prolatada em 12.04.2016 julgou procedente o pedido, para condenar o INSS ao pagamento do auxílio doença conforme dispositivo que ora transcrevo: “DISPOSITIVO Posto isso, JULGO PROCEDENTE o pedido. CONDENO o requerido a conceder ao requerente o benefício do auxílio-doença, a partir da data do requerimento no âmbito administrativo, ou seja, 04 de dezembro de 2013, com juros legais e corrigidos monetariamente de acordo com a legislação em vigor. JULGO EXTINTO o processo, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Por força da sucumbência, arcará o réu com a verba honorária que fixo em R$ 200,00 (duzentos reais), ficando isento das custas e despesas processuais, conforme dispõe o artigo 8º, § 1º da Lei 8.620/93. Em razão da concessão da tutela antecipada ao autor, oficie-se com urgência ao INSS, para que implante o benefício previdenciário ora concedido, no prazo de 30 dias, sob pena de incidir em multa diária no valor de R$ 100,00 (cem reais) até o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais). Diante da reforma no Código de Processo Civil, na hipótese de não advir recurso de apelação por parte do INSS, não há que se falar em reexame necessário por parte da Instância Superior. Em cumprimento aos Provimentos Conjuntos nºs 69 e 71, respectivamente, de 08.11.2006 e 11.12.2006, da Corregedoria Geral da Justiça Federal da 3ª Região e da Coordenadora dos Juizados Especiais Federal da 3ª Região, faço inserir no tópico final os seguintes dados: 1) Número do benefício 604.338.071-8, espécie 31; 2) Nome do Segurado: JOAQUIM OLIVEIRA DE LIMA; 3) Benefício concedido: CONCESSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA; 4) Renda mensal atual: n/c; 5) Data do início do benefício (04.12.2013); 6) Renda Mensal Inicial - (n/c) e 7) Data do início do pagamento: (n/c).”
Apela a autarquia pleiteando a reforma da sentença, eis que não preenchido o requisito de qualidade de segurado a amparar a concessão do auxílio doença. Aduz que não há início de prova material que comprove o exercício de atividade rural pelo período de 12 meses imediatamente anterior ao requerimento do benefício. Subsidiariamente, requer a reforma da sentença no tocante aos critérios de juros e correção monetária e termo inicial do benefício, que entende ser devido a partir da juntada do laudo pericial.
Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0021283-74.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: VALERIA DE FATIMA IZAR DOMINGUES DA COSTA - SP117546-N
APELADO: JOAQUIM OLIVEIRA DE LIMA
Advogado do(a) APELADO: EDNEIA MARIA MATURANO GIACOMELLI - SP135424-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Considerando que a sentença se enquadra entre as hipóteses de exceção de submissão ao reexame necessário previstas no § 2º do artigo 475 do CPC/1973, restrinjo o julgamento apenas à insurgência recursal.
A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
É dizer: a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a subsistência enseja a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez; a incapacidade total e temporária para o exercício de atividade que garanta a subsistência justifica a concessão do benefício de auxílio-doença e a incapacidade parcial e temporária somente legitima a concessão do benefício de auxílio-doença se impossibilitar o exercício do labor ou da atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias pelo segurado.
A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes.
O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça, durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Também é considerado segurado aquele que trabalhava, mas ficou impossibilitado de recolher contribuições previdenciárias em razão de doença incapacitante.
Nesse passo, acresça-se que no que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador desempregado, não obstante a redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a necessidade de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei Federal (Pet. 7.115), firmou entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser suprida quando outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas a comprovar a situação de desemprego.
A perda da qualidade de segurado está disciplinada no §4º desse dispositivo legal, ocorrendo no dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de segurado.
Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus dependentes o direito aos benefícios previdenciários.
Anote-se que a eventual inadimplência das obrigações trabalhistas e previdenciárias acerca do tempo trabalhado como empregado deve ser imputada ao empregador, responsável tributário, conforme preconizado na alínea a do inciso I do artigo 30 da Lei nº 8.213/91, não sendo cabível a punição do empregado urbano pela ausência de recolhimentos, computando-se, assim, o período laborado para fins de verificação da qualidade de segurado.
Acresça-se, também, que será garantida a condição de segurado ao trabalhador rural que não tiver vínculo de emprego devidamente registrado em CTPS desde que comprovado o labor mediante ao menos início de prova documental, consoante estabelecido na Súmula nº 149 do STJ: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Não se exige que a prova material se estenda por todo o período de carência, mas é imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em que foi constituído o documento. (AR 4.094/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 26/09/2012, DJe 08/10/2012).
Também é pacífico o entendimento dos Tribunais, considerando as difíceis condições dos trabalhadores rurais, admitir a extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou companheira, bem como da filha solteira residente na casa paterna. (REsp 707.846/CE, Rel. Min. LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJ de 14/3/2005)
Por fim, quanto à carência, exige-se o cumprimento de 12 (doze) contribuições mensais para a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, conforme prescreve a Lei n.º 8.213/91, em seu artigo 25, inciso I, in verbis: "Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;".
No caso concreto.
No caso dos autos, a sentença de primeiro grau julgou procedente o pedido inicial reconhecendo a condição de trabalhador rural do autor, bem o cumprimento dos demais requisitos para a concessão do benefício de auxílio doença.
Confira-se
“Por primeiro, abordo o tema da qualidade de segurado do autor, questão indispensável para o reconhecimento de seu pedido. Juntamente com a petição inicial, Joaquim Oliveira de Lima trouxe aos autos prova documental que demonstra ser trabalhador rural, senão vejamos: A declaração emitida pelo Cartório Eleitoral desta Comarca, trazida às fls. 16, indica que o autor, por ocasião de sua inscrição eleitoral em 01 de dezembro de 1973, exercia a profissão de trabalhador rural. A mesma profissão ainda foi indicada quando de outra inscrição realizada em 29 de maio de 1992.De outra parte, as certidões de nascimento de seus filhos Rafael Chiquetto de Lima e Daiane Chiquetto de Lima, nascidos respectivamente em 19 de outubro de 1994 e 03 de setembro de 1995, também atestam a profissão de lavrador do autor (vide documentos de fls.18/19). Ainda, a cópia de sua Carteira de Trabalho e Previdência Social trazida às fls. 19/21, demonstra que o curto período em que o postulante trabalhou com registro em carteira, foi exercendo o cargo de trabalhador rural para uma Usina de Açúcar e Álcool. Por fim, a prova testemunhal colhida durante a instrução foi apta a corroborar a atividade rural exercida pelo autor, e a seu posterior adoecimento. Com efeito, as testemunhas ouvidas foram uníssonas em afirmar que a postulante sempre trabalhou na lavoura, como bóia-fria. Obtempere-se que, as testemunhas ouvidas são idôneas, de idade avançada e depuseram no sentido de informar ser o postulante trabalhador das lides rurais como volante, indicando com precisão os empregadores e as culturas nas quais trabalhou. Disseram conhecer o autor de longa data, e que este trabalhou na lavoura até ficar incapacitado pela doença há uns2 (dois) anos atrás. Portanto, não resta dúvida de que a parte autora sempre exerceu atividade rural como bóia-fria, inclusive no período anterior ao requerimento administrativo. Assim, preenche o requisito da carência, ficando, pois, afastada essa alegação. No tocante à falta de contribuições para o INSS, em casos tais, há de se aplicar por analogia o artigo 143 da Lei 8.213/91, o qual dispensa referidas contribuições. Superada a verificação da qualidade de segurado especial e período de carência do postulante perante a Previdência Social, passo a analisar o pedido de concessão do auxílio-doença.”
Da incapacidade laboral.
O laudo médico pericial elaborado em 17.10.2015 (ID 89307792 – pag. 99/106), revela que o autor, com 42 anos de idade no momento da perícia, é portador de transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool (síndrome da dependência). Informa a existência de incapacidade laboral total e temporária, fixando a data de início da incapacidade em 2013.
Da qualidade de segurado.
Para demonstrar sua condição lavrador a parte autora carreou aos autos:
- certidão emitida pela Justiça Eleitoral em 29.01.2014, na qual o autor está qualificado como trabalhador rural;
- cópia da certidão de nascimento de seu filho ocorrido em 19.10.1994 na qual está qualificado como lavrador;
- cópia da certidão de nascimento de sua filha ocorrido em 03.09.1995 na qual está qualificado como lavrador;
- a cópia de sua CTPS na qual consta vínculo de trabalho rural no período de 04.2003 a 10.09.2003;
Também foram ouvidas testemunhas que confirmaram o labor rural do autor.
Adolfo relata que conhece o autor há 20 anos e que ele exercia atividade rural por diária. Sabe que o autor trabalhava com algodão, amendoim e tomate. Menciona nome de empregadores.
Júlio relata que conhece o autor desde criança. Narra que o requerente e sua família sempre trabalharam na roça como bóia-fria, e que o autor há trabalhou para ele. Menciona outros empregadores e o labor com amendoim e algodão. Sabe que o autor trabalhou na usina.
Rosália relata que conhece o autor há mais de 30 anos e que ele trabalha na roça como diarista. Afirma que já trabalhou com ele. Acrescenta que há dois anos o autor deixou de trabalhar devido problemas de saúde. Menciona nomes de empregadores e o trabalho com algodão e amendoim.
O início de prova material, associado à harmônica e coerente prova testemunhal, demonstram a condição de trabalhador rural da parte autora.
Verifica-se, assim, que o MM. Juiz sentenciante julgou de acordo com as provas carreadas aos autos e, constatada a qualidade de segurado, o cumprimento da carência e a existência de incapacidade laboral total e temporária, de rigor a manutenção da sentença no que concerne à concessão do benefício previdenciário do auxílio doença, por seus próprios fundamentos.
Quanto ao termo inicial do benefício, a Súmula n. 576 do STJ assim firmou entendimento: “Ausente requerimento administrativo no INSS, o termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida judicialmente será a data da citação válida. (Súmula 576, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/06/2016, DJe 27/06/2016)”
Desta feita, comprovada a existência de pedido administrativo em 04.12.2013 (ID 89307792 – pag. 16), é nesta data que deve ser mantido o termo inicial da aposentadoria por invalidez.
No que tange aos critérios de atualização do débito, verifico que a sentença desborda do entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
Assim, tratando-se de matéria cognoscível de ofício (AgRg no AREsp 288026/MG, AgRg no REsp 1291244/RJ), corrijo a sentença e estabeleço que as parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial. Anoto que os embargos de declaração opostos perante o STF que objetivavam a modulação dos efeitos da decisão supra, para fins de atribuição de eficácia prospectiva, foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019.
Diante do exposto, corrijo, de ofício, a sentença para fixar os critérios de atualização do débito e NEGO PROVIMENTO à apelação do INSS, nos termos da fundamentação exposta.
É o voto.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0021283-74.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: VALERIA DE FATIMA IZAR DOMINGUES DA COSTA - SP117546-N
APELADO: JOAQUIM OLIVEIRA DE LIMA
Advogado do(a) APELADO: EDNEIA MARIA MATURANO GIACOMELLI - SP135424-N
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AUXÍLIO DOENÇA. CONCESSÃO MANTIDA. INCAPACIDADE LABORAL TOTAL E TEMPORÁRIA. QUALIDADE DE SEGURADO. LABOR RURAL DEMONSTRADO. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL.
1. Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício por incapacidade para trabalhador rural.
2. Laudo médico pericial indica a existência de incapacidade laboral total e temporária.
3. Requisitos de qualidade de segurado e carência preenchidos. Conjunto probatório evidencia o labor rural. O inicio de prova material corroborado por harmônica e coerente prova testemunhal evidencia a condição de rurícola da parte autora.
4. Havendo requerimento administrativo, é nesta data que deve ser mantido o termo inicial do benefício. Súmula 576 do Superior Tribunal de Justiça.
5. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux. Correção de ofício.
6. Sentença corrigida de ofício. Apelação do INSS não provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu de ofício corrigir a sentença para fixar os critérios de atualização do débito e negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
