
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0022206-32.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: JOAO PEDRO LUCIANO PINHEIRO
Advogado do(a) APELANTE: ALVARO AUGUSTO RODRIGUES - SP232951-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
TERCEIRO INTERESSADO: PATRICIA PEREIRA LUCIANO
ADVOGADO do(a) TERCEIRO INTERESSADO: ALVARO AUGUSTO RODRIGUES - SP232951-N
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0022206-32.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: JOAO PEDRO LUCIANO PINHEIRO
Advogado do(a) APELANTE: ALVARO AUGUSTO RODRIGUES - SP232951-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
TERCEIRO INTERESSADO: PATRICIA PEREIRA LUCIANO
ADVOGADO do(a) TERCEIRO INTERESSADO: ALVARO AUGUSTO RODRIGUES
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada (LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal à pessoa portadora de deficiência.
A sentença, prolatada em 17.08.2017, julgou o pedido improcedente sob o fundamente de que não restou preenchido o requisito de hipossuficiência, conforme dispositivo que ora transcrevo: "Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido inicial, na forma do art. 487, I do Código de Processo Civil. A vencida arcará com honorários advocatícios da parte contrária, que fixo em R$ 1.000,00, além das custas e despesas processuais, inclusive salários do perito e do assistente social, já fixado nos autos, ficando, entretanto, dispensada dos ônus da sucumbência, cuja exigibilidade ficará suspensa por cinco anos, por se tratar de beneficiária da Assistência Judiciária Gratuita. Providencie a serventia a requisição e pagamento dos honorários dos peritos que atuaram nos autos. P. R. I. C."
Apela a parte autora alegando para tanto que preenche os requisitos necessários para a concessão do benefício assistencial.
Sem contrarrazões, os autos vieram a este Tribunal.
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso da parte autora.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0022206-32.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: JOAO PEDRO LUCIANO PINHEIRO
Advogado do(a) APELANTE: ALVARO AUGUSTO RODRIGUES - SP232951-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
TERCEIRO INTERESSADO: PATRICIA PEREIRA LUCIANO
ADVOGADO do(a) TERCEIRO INTERESSADO: ALVARO AUGUSTO RODRIGUES
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
O artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
A constitucionalidade dessa norma foi questionada na ADI 1.232-1/DF, tendo o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria, decidido pela improcedência do pedido, ao fundamento que a fixação da renda per capita no patamar de ¼ do salário mínimo sugere a presunção absoluta de pobreza. Concluiu, contudo, que não é a única forma suscetível de se aferir a situação econômica da família do idoso ou portador de deficiência.
Posteriormente, a Corte Suprema enfrentou novamente a questão no âmbito da Reclamação 4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconhecendo a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993, decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).
Restou decidido que a norma é inconstitucional naquilo que não disciplinou, não tendo sido reconhecida a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência, cabendo ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial a fim de suprimir o vício apontado.
Desta forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência, é através da própria natureza de seus males, de seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.
Não há como enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar, nem tampouco entender que aqueles que contam com menos de ¼ do salário-mínimo fazem jus obrigatoriamente ao benefício assistencial ou que aqueles que tenham renda superior não o façam.
Com relação ao cálculo da renda per capita em si, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo REsp 1.355.052/SP, em conformidade com a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no RE 580.963/PR, definiu que a se aplica, por analogia, a regra do parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idos0 (Lei 10.741/03), a pedido de benefício assistencial formulado por pessoa com deficiência, a fim de que qualquer benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado na sua aferição.
Por fim, entende-se por família, para fins de verificação da renda per capita, nos termos do §1º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.435/2011, o conjunto de pessoas composto pelo requerente, o cônjuge, o companheiro, a companheira, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Contudo, em que pese a princípio os filhos casados ou que não coabitam sob o mesmo teto não integrarem o núcleo familiar para fins de aferição de renda per capita, nos termos da legislação específica, não se pode perder de vista que o artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece que o benefício é devido quando o idoso ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-lo provido pela família. Por sua vez, a regra do artigo 229 da Lei Maior dispõe que os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, premissa também assentada nos artigos 1694 a 1697 da lei Civil.
Depreende-se assim que o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação da família de prestar a assistência, pelo que, como já dito, o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode ser interpretado de forma isolada na apuração da miserabilidade.
Tecidas tais considerações, no caso dos autos a sentença de primeiro grau julgou improcedente o pedido com base nos elementos contidos no laudo social, tendo se convencido não restar configurada a condição de miserabilidade necessárias para a concessão do benefício.
Confira-se:
“Ainda que o laudo social também tenha sido favorável a pretensão da parte interessada, verifica-se deste na fl. 79/81 que:“...O genitor Eliseu Rolim Pinheiro segundo relatos da Sra. Patrícia não auxilia financeiramente o filho com frequência e regularidade... no momento a renda é de R$1.820,00... sou de parecer favorável á concessão do Benefício à João Pedro Luciano Pinheiro...”.Diante do conjunto probatório, ainda que o laudo social tenha sido favorável à pretensão da autora, como já exposto, neste pode se verificar que a renda per capita da família está acima da exigida para a concessão do benefício. Mesmo o laudo pericial comprovando a incapacidade total e permanente do autor, o estudo social aponta que a renda de sua família é superior ao exigido em lei. Além de tudo as despesas apresentadas pelo autor no Estudo Social à fl. 103, se trata de declarações unilaterais, tendo em vista serem anotações a mão em uma folha de caderno, não trazendo aos autos nenhuma prova documental satisfatória. Além disso, como foi informado pelo estudo social às fls. 93/111, o genitor do autor não auxilia financeiramente com frequência e regularidade, e como é sabido, a prestação de alimentos é dever dos pais, enquanto houver o trinômio, necessidade/possibilidade/proporcionalidade. Sendo os rendimentos da família superiores ao exigido em lei para a concessão do benefício, pois este convém para afastar pessoas da miserabilidade e vulnerabilidade, não proporcionar uma vida mais confortável. Constata-se, portanto, que o autor não preenche os requisitos indispensáveis à concessão do benefício assistencial, a julgar que não se encontra vulnerável, conforme já citado”
Por sua vez, o laudo social (ID 87572840 – pág. 109/132), elaborado em 26.07.2016, revela que a parte autora reside com seus pais em imóvel alugado, “de alvenaria, com laje piso de madeira (taco), com toda infra-estrutura; contando com 02 quartos, um banheiro, uma saia, uma cozinha e garagem. Mobiliário e eletro domésticos condizentes ao uso familiar, moradia em perfeitas condições de higiene e organização.”.
Quanto à renda familiar consta que: “Segundo a genitora, no momento a renda é de R$ 1.820,00 (um mil oitocentos e vinte reais), mas durante seu afastamento para acompanhar João Pedro na AACD onde passou por cirurgia e outros procedimentos, em um período de três meses, ficou sem os proventos integrais como consta nos extrato bancários, vem recebendo ajuda de terceiros, pois o que recebia não dava para cobrir os empréstimos realizados por ser necessário para adquirir um veículo da marca gol ano 2006, para melhor locomoção do filho.”
A genitora do autor relata ainda que “o pai não auxilia financeiramente o filho com freqüência e regularidade além de não ser presente afetivamente com o jovem João Pedro.”
Relataram despesas com água (R$ 41,68), luz (R$ 91,32), aluguel da casa (R$ 500,00), internet/celular (R$ 134,59), farmácia (R$ 30,00), alimentação e higiene (R$ 900,00), Fisio Aquática (R$250,00), Fisioterapia individual (R$ 350,00), Pilates (R$ 150,00), RPG (R$150,00), Academia Livre (R$ 80,00), empréstimos (R$ 780,64), perfazendo total de R$ 3.458,23.
A Expert apontou que “Evidenciou-se que a requerente em tela não possui condições de prover a manutenção do seu filho, para a situação de João Pedro não se agravar ainda mais necessita de cuidados especiais diariamente que possa ter uma qualidade de vida, se não participar dessas terapias vai se atrofiando e ficará sem equilíbrio.”
É fato que a renda per capita superior ao limite estabelecido na legislação em vigência não constitui óbice à concessão do benefício assistencial, todavia, da análise do conjunto probatório apresentado, não se extrai a existência de miserabilidade.
Nesse sentido consta que família encontra abrigo em imóvel que apresenta boas condições, e apresenta rendimento formal que supre as despesas básicas (água/luz/moradia/alimentação). Consta ainda a aquisição de automóvel para maior conforto do autor.
Ressalto que embora o MM. Juiz a quo tenha apontada a fragilidade das provas apresentadas (ausência de comprovação das despesas), não trouxe a parte autora, em suas razões de apelo, elementos capazes de comprovar os gastos relatados.
Também não há nos autos comprovação de que o genitor do autor esteja incapacitado para o labor, não estando o mesmo isento de suas obrigações legais para com o requerente.
O benefício assistencial não se destina a complementar o orçamento doméstico, mas sim prover aqueles que se encontram em efetivo estado de necessidade.
Verifica-se, assim, que o MM. Juiz sentenciante julgou de acordo com as provas carreadas aos autos e não comprovada a condição de miserabilidade, pressuposto indispensável para a concessão do benefício, de rigor a manutenção da sentença de improcedência do pedido por seus próprios fundamentos.
Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de advogado arbitrados na sentença em 2%, devendo ser observada, se for o caso, a suspensão da exigibilidade prevista no § 3º do artigo 98 daquele Codex.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação da parte autora e, com fulcro no § 11º do artigo 85 do Código de Processo Civil, majoro os honorários de advogado em 2% sobre o valor arbitrado na sentença, nos termos da fundamentação exposta.
É o voto.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0022206-32.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: JOAO PEDRO LUCIANO PINHEIRO
Advogado do(a) APELANTE: ALVARO AUGUSTO RODRIGUES - SP232951-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. HIPOSSUFICIÊNCIA/MISERABILIDADE NÃO DEMONSTRADA. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
1. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
2. Requisito de miserabilidade/hipossuficiência não preenchido. Laudo social indica que a parte autora encontra-se amparado pela família e não há comprovação de que suas necessidades básicas não possam ser supridas. O benefício assistencial não se presta a complementação de renda.
3. Benefício assistencial indevido.
4. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015. Exigibilidade condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
5. Apelação da parte autora não provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
