
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0023644-40.2011.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: MARCIO JOSE CARDOSO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: ADAO NOGUEIRA PAIM - SP57661-N
Advogado do(a) APELANTE: FABIO VIEIRA BLANGIS - SP213180-N
APELADO: MARCIO JOSE CARDOSO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: ADAO NOGUEIRA PAIM - SP57661-N
Advogado do(a) APELADO: FABIO VIEIRA BLANGIS - SP213180-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0023644-40.2011.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: MARCIO JOSE CARDOSO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: ADAO NOGUEIRA PAIM - SP57661-N
Advogado do(a) APELANTE: FABIO VIEIRA BLANGIS - SP213180-N
APELADO: MARCIO JOSE CARDOSO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Cuida-se de juízo de retratação previsto no inciso II do artigo 1.040 do Código de Processo Civil/2015, considerando as decisões proferidas pelo E. Superior Tribunal de Justiça nos REsp 1.355.052/SP e 1.112.557/MG, representativos de controvérsia, que assentaram o entendimento no sentido de que, na verificação dos requisitos para a concessão de benefício assistencial à pessoa com deficiência, previsto no artigo 203, V, da Constituição Federal de 1988, aplica-se, por analogia, a regra do parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso para fins de exclusão de benefício previdenciário percebido por idoso, no valor de um salário mínimo, do cálculo da renda per capita prevista no §3º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, o qual, por sua vez, não deve ser tido como único meio de prova da condição de miserabilidade do requerente.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0023644-40.2011.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: MARCIO JOSE CARDOSO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: ADAO NOGUEIRA PAIM - SP57661-N
Advogado do(a) APELANTE: FABIO VIEIRA BLANGIS - SP213180-N
APELADO: MARCIO JOSE CARDOSO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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Advogado do(a) APELADO: FABIO VIEIRA BLANGIS - SP213180-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A questão devolvida a esta Turma diz respeito ao preenchimento do requisito da miserabilidade para a concessão a obtenção do benefício assistencial previsto no artigo 203, V, da Constituição Federal.
No tocante ao requisito da miserabilidade, o artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
A constitucionalidade dessa norma foi questionada na ADI 1.232-1/DF, tendo o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria, decidido pela improcedência do pedido, ao fundamento que a fixação da renda per capita no patamar de ¼ do salário mínimo sugere a presunção absoluta de pobreza. Concluiu, contudo, que não é a única forma suscetível de se aferir a situação econômica da família do idoso ou portador de deficiência. Nesse sentido também decidiu o E. Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.112.557-MG, em sede de repercussão geral.
Posteriormente, a Corte Suprema enfrentou novamente a questão no âmbito da Reclamação 4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconhecendo a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993, decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).
Restou decidido que a norma é inconstitucional naquilo que não disciplinou, não tendo sido reconhecida a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência, cabendo ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial a fim de suprimir o vício apontado.
Desta forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência, é através da própria natureza de seus males, de seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.
Não há como enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar, nem tampouco entender que aqueles que contam com menos de ¼ do salário-mínimo fazem jus obrigatoriamente ao benefício assistencial ou que aqueles que tenham renda superior não o façam.
Com relação ao cálculo da renda per capita em si, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo REsp 1.355.052/SP, em conformidade com a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no RE 580.963/PR, definiu que a se aplica, por analogia, a regra do parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), a pedido de benefício assistencial formulado por pessoa com deficiência, a fim de que qualquer benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado na sua aferição.
Por fim, entende-se por família, para fins de verificação da renda per capita, nos termos do §1º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.435/2011, o conjunto de pessoas composto pelo requerente, o cônjuge, o companheiro, a companheira, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Contudo, em que pese a princípio os filhos casados ou que não coabitem sob o mesmo teto não integrem o núcleo familiar para fins de aferição de renda per capita, nos termos da legislação específica, não se pode perder de vista que o artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece que o benefício é devido quando o idoso ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-lo provido pela família. Por sua vez, a regra do artigo 229 da Lei Maior dispõe que os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, premissa também assentada nos artigos 1694 a 1697 da lei Civil.
Depreende-se assim que o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação da família de prestar a assistência, pelo que, como já dito, o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode ser interpretado de forma isolada na apuração da miserabilidade.
O CASO DOS AUTOS.
Insta consignar que o Recurso Especial que ensejou o presente juízo de retratação foi interposto pela parte autora contra o acórdão ID 107560634 – pag. 97/108, que, por unanimidade, deu provimento à remessa necessária e à apelação do INSS e julgou prejudicada o recurso da parte autora, reformando a sentença que julgou procedente o pedido de concessão de benefício assistencial, ante o não preenchimento do requisito de hipossuficiência/miserabilidade.
Feito esse breve relato, passo ao exame da questão da miserabilidade.
O acórdão em comento deu provimento à apelação do INSS conforme fundamento que segue:
“Tecidas tais considerações, no caso concreto o estudo social elaborado em 14.01.2013 (lis. 155/160) revela que a parte autora reside com sua família em imóvel próprio. Compõem o grupo familiar: o autor, sua mãe, uma sobrinha portadora de deficiência, dois sobrinhos de dezessete anos cursando o ensino médio, uma sobrinha de 19 anos de idade e sua filha com 10 dias de vida e uma irmã de 27 anos de idade e sua filha de 3 anos. A casa da família conta com três quartos, sala, cozinha (que foi ampliada). Trata-se de construção antiga revestida de cimento, rebocada, com chão de piso frio, coberta com telha romana e forro de madeira, guarnecida com móveis simples e deteriorados pelo uso. No tocante á renda da casa, consta que a mãe do autor recebe pensão por morte e aposentadoria por invalidez no valor de um salário-mínimo cada, e que uma das sobrinhas é beneficiária de BPC, e, assim, o rendimento do grupo é de R$ 2.034,00. Recebem ainda R$ 64,00 do programa social Bolsa Família. Relataram despesas com alimentação (R$ 500,00) e medicamentos (R$ 150,00 a 200,00). Em que pese a ausência de rendimento próprio do autor nota-se que está amparado pela família e que não restou demonstrada a existência de miserabilidade. O autor encontra abrigo em casa própria e não há notícia de que suas necessidades básicas não estejam supridas. Tem-se ainda que o grupo conta com elementos jovens e aptos ao trabalho, eis que há relato de incapacidade/deficiência somente com relação ao autor e uma de suas sobrinhas. Ressalto que o benefício assistencial não se destina a complementar o orçamento doméstico, mas sim prover àqueles que se encontram em efetivo estado de necessidade. Desta forma, diante do conjunto probatório que se apresenta, verifico que não restou preenchido o requisito de miserabilidade necessário à concessão do benefício assistencial, que resta indevido”
Por sua vez, o estudo social (ID 107556808 – pag. 170/175), elaborado em 14.01.2013, revela que a parte autora vive com sua mãe, uma irmã (maior de idade) e seis sobrinhos (uma maior de idade e dois adolescentes) em imóvel próprio, de alvenaria, com três quartos, sala, cozinha e banheiro. Consta ainda que: “A higiene do local é boa, mas o imóvel está muito desgastado devido ao tempo de uso, tem rachaduras e pintura muito ruim, Os móveis que compõem a moradia são muitos simples e deteriorados pelo tempo de uso e nada significativo de mencionar.”
Sobre a renda familiar consta que a mãe do autor recebe aposentadoria e pensão por morte no valor de um salário-mínimo cada, perfazendo R$ 1.356,00. Uma sobrinha do requerente recebe benefício assistencial no valor de um salário-mínimo (R$ 678,00). Recebem cesta básica do município e R$ 64,00 do programa social Bolsa Família.
Relata despesas com alimentação (R$ 500,00) e medicamentos (R$ 150,00/200,00).
É fato que a renda per capita superior ao limite estabelecido na legislação em vigência, por si só, não constitui óbice à concessão do benefício assistencial, todavia, da análise do conjunto probatório apresentado, não se extrai a existência de miserabilidade. Nesse sentido, consta que a família vive em imóvel próprio e conta com rendimento formal, o que, a princípio, afasta a existência de vulnerabilidade econômica.
A perita social não reporta a existência de miserabilidade, e nem insuficiência de rendimento para suprir as necessidades básicas do autor.
A mera ausência de rendimento próprio não enseja a concessão do benefício assistencial, que só deve ser concedido ante a impossibilidade de sustento pelos familiares, nos termos da legislação em vigência.
Ressalto que o benefício assistencial não se destina a complementar o orçamento doméstico, mas sim prover aqueles que se encontram em efetivo estado de necessidade.
Por fim, assento que o quadro fático apresentado neste feito não retrata a condição de miserabilidade e/ou hipossuficiência, razão pela qual resta superado o debate acerca do cálculo da renda per capita familiar, que como já firmado pela jurisprudência dominante, não é a única forma de se averiguar a condição socioeconômica da família.
Ante o exposto, em juízo de retratação negativo, mantenho o acórdão deu provimento à remessa necessária e à apelação do INSS, nos termos da fundamentação exposta.
É o voto.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0023644-40.2011.4.03.9999
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Advogado do(a) APELANTE: FABIO VIEIRA BLANGIS - SP213180-N
APELADO: MARCIO JOSE CARDOSO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: ADAO NOGUEIRA PAIM - SP57661-N
Advogado do(a) APELADO: FABIO VIEIRA BLANGIS - SP213180-N
EMENTA
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 1040, II DO CPC/2015. REsp 1.355.052/SP. Resp 1.112.557/MG. REPRESENTATIVOS DE CONTROVÉRSIA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ARTIGO 203, V, CF 1988. MISERABILIDADE. §3º DO ARTIGO 20 DA LEI Nº 8.742/93.
1. Aplicação, por analogia, do parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário-mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93. RESP 1.355.052/SP.
2. O teto de ¼ do salário-mínimo como renda per capita estabelecido no §3º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93 estabelece situação objetiva pela qual se deve presumir pobreza de forma absoluta, mas que não impede o exame de situações específicas do caso concreto a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. A verificação da renda per capita familiar é uma das formas de aferição de miserabilidade, mas não a única. RESP 1.112.557/MG.
3. Requisito de miserabilidade/hipossuficiência não preenchido. Laudo social indica que a parte autora encontra-se amparado pela família. Não comprovada a existência de miserabilidade. O benefício assistencial não se presta a complementação de renda.
4. Juízo de retratação negativo para manter o acórdão.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu, em juízo de retratação negativo, manter o v. acórdão que deu provimento à remessa necessária e à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
