Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5001763-96.2018.4.03.6111
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
28/04/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 30/04/2020
Ementa
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001763-96.2018.4.03.6111
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: NEUZA ANEQUINI DE SOUZA SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: ALESSANDRO DE MELO CAPPIA - SP199771-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IDOSO.
HIPOSSUFICIÊNCIA/MISERABILIDADE. REQUISITO NÃO PREENCHIDO. SUCUMBÊNCIA
RECURSAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MAJORADOS.
1. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da
Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da
Lei nº 8.742/93.
2. Hipossuficiência/miserabilidade da parte autora não comprovada. Mandado de constatação
indica que a autora está amparada pelo marido. O benefício assistencial não se presta a
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
complementação de renda.
4. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na
sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015. Exigibilidade condicionada à hipótese
prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
5. Apelação da parte autora não provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001763-96.2018.4.03.6111
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
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OUTROS PARTICIPANTES:
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada
(LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal à pessoa idosa.
A sentença, prolatada em 15.03.2018, julgou improcedente o pedido inicial sob o fundamento de
que não foi preenchido o requisito de miserabilidade, conforme dispositivo que ora transcrevo:
“Posto isso, julgo IMPROCEDENTE O PEDIDO, resolvendo o mérito nos termos do artigo 487,
inciso I, do Novo Código de Processo Civil. Condeno a parte autora ao pagamento de honorários
advocatícios em favor da parte ré, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à
causa, atualizado, condicionada a execução à alteração de sua situação econômica, nos termos
do artigo 98, 3º, do novo CPC. Sem custas, em virtude da gratuidade conferida à parte autora.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.”
Apela a parte autora alegando para tanto que preenche os requisitos necessários para a
concessão do benefício.
Sem contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
O Ministério Público Federal opinou pelo regular seguimento do feito.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001763-96.2018.4.03.6111
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei
nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
O artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com
deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do
salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
A constitucionalidade dessa norma foi questionada na ADI 1.232-1/DF, tendo o Plenário do
Supremo Tribunal Federal, por maioria, decidido pela improcedência do pedido, ao fundamento
que a fixação da renda per capita no patamar de ¼ do salário mínimo sugere a presunção
absoluta de pobreza. Concluiu, contudo, que não é a única forma suscetível de se aferir a
situação econômica da família do idoso ou portador de deficiência.
Posteriormente, a Corte Suprema enfrentou novamente a questão no âmbito da Reclamação
4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconhecendo a inconstitucionalidade parcial, sem
pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993, decorrente de notórias mudanças
fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais
por parte do Estado brasileiro).
Restou decidido que a norma é inconstitucional naquilo que não disciplinou, não tendo sido
reconhecida a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência, cabendo
ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial a fim de
suprimir o vício apontado.
Desta forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de
pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em
se tratando de pessoa idosa ou com deficiência, é através da própria natureza de seus males, de
seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.
Não há como enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar, nem tampouco entender
que aqueles que contam com menos de ¼ do salário-mínimo fazem jus obrigatoriamente ao
benefício assistencial ou que aqueles que tenham renda superior não o façam.
Com relação ao cálculo da renda per capita em si, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de
recurso repetitivo REsp 1.355.052/SP, em conformidade com a decisão proferida pelo Supremo
Tribunal Federal no RE 580.963/PR, definiu que a se aplica, por analogia, a regra do parágrafo
único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), a pedido de benefício assistencial
formulado por pessoa com deficiência, a fim de que qualquer benefício previdenciário recebido
por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado na sua aferição.
Por fim, entende-se por família, para fins de verificação da renda per capita, nos termos do §1º do
artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.435/2011, o conjunto de pessoas
composto pelo requerente, o cônjuge, o companheiro, a companheira, os pais e, na ausência de
um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os
menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Contudo, em que pese a princípio os filhos casados ou que não coabitam sob o mesmo teto não
integrarem o núcleo familiar para fins de aferição de renda per capita, nos termos da legislação
específica, não se pode perder de vista que o artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece
que o benefício é devido quando o idoso ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-
lo provido pela família. Por sua vez, a regra do artigo 229 da Lei Maior dispõe que os filhos
maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, premissa
também assentada nos artigos 1694 a 1697 da lei Civil.
Depreende-se assim que o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação
da família de prestar a assistência, pelo que, como já dito, o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode
ser interpretado de forma isolada na apuração da miserabilidade.
Tecidas tais considerações, no caso dos autos a sentença de primeiro grau julgou improcedente o
pedido com base nos elementos contidos no mandado de constatação, tendo se convencido não
restar configurada a condição de hipossuficiência financeira ou miserabilidade necessárias para a
concessão do benefício.
Confira-se:
“Nesse aspecto, o mandado de constatação juntado às fls. 56/78, realizado em 14/09/2017, dá
conta que o núcleo familiar da autora é composto por ela, seu marido Joaquim, com 70 anos,
aposentado, e os filhos Adilson, 29 anos, desempregado, e Angélica, 23 anos, estudante. A
família mora em imóvel de madeira, construído em terreno da prefeitura, em péssimas condições,
conforme se vê do relatório fotográfico de fls. 71/76. A família sobrevive, segundo informado,
exclusivamente da renda proveniente da aposentadoria do cônjuge varão, no valor de R$
1.400,00. Foi também relatado que a autora tem outros nove filhos, mas que nenhum deles tem
condições de prestar-lhe ajuda; esclarece, ainda, que a filha Adriana reside numa casa no mesmo
terreno com sua filha Alana, sem receber pensão alimentícia ou qualquer outra renda, pois está
desempregada, sendo a autora e seu marido que a auxiliam. Extrai-se, também, do relatório
social que o marido da autora possui um veículo Corsa ano 2002, e um veículo Brasília, em mau
estado, que diz não funcionar. Pois bem. É fato que, ao se analisar o relatório fotográfico de fls.
72/76, as más condições de moradia da autora saltam aos olhos; contudo, com um olhar mais
aprofundado sobre a situação de vida da autora, cabe tecer algumas considerações. Como
apontado pelo instituto-réu em sua peça de defesa, à fls. 81-verso, apesar das péssimas
condições do imóvel, este é guarnecido com a maioria dos eletrodomésticos necessários para
uma vida digna: tv de LCD, televisor comum, DVD, aparelho de som, microondas, geladeira, além
do automóvel; os filhos da autora que residem com ela estão em plena idade laborativa; também
é o caso da filha Adriana, que faz as refeições na casa da autora e tem as contas de água e
energia pagas pelo genitor. Outrossim, a filha Angélica, com 23 anos, é apontada como
estudante, o que denota que pode optar pelos estudos, prescindindo a família de seu trabalho
remunerado (...) De qualquer forma, a renda familiar informada ainda resulta em renda per capita
de R$370,25 (conforme extrato ora anexado), bem superior ao limite legalmente previsto, hoje
fixado em R$ 238,50. Portanto, não preenchido um dos requisitos legais exigidos para concessão
do benefício assistencial de prestação continuada, a improcedência do pedido é medida de rigor.”
De fato, o mandado de constatação (ID 3605879 – pag. 1/15), elaborado em 14.02.2017,revela
que a autora reside com seu marido e dois filhos maiores de idade em casa construída em
terreno da prefeitura,que conta com três quartos, sala, copa, cozinha e banheiro em péssimo
estado de conservação. Há dois veículos em nome do marido da autora (Corsa ano 2002 e uma
Brasília).
Informa que a renda da casa advém da aposentadoria do marido da autora ano valor de R$
1.400,00.
Relata despesas com água (R$ 40,00), energia elétrica (R$ 50,00), gás (R$ 64,00), alimentação
(R$ 700,00), fundo mútuo (R$ 28,00) e combustível (R$ 300,00), perfazendo total de R$ 1.182,00.
O mandado informa ainda que a autora possui mais nove filhos com vida independente, sendo
que uma das filhas vive no mesmo terreno, e como está desempregada recebe ajuda dos pais.
Nota-se que o grupo conta com elementos jovens (filhos com 29 e 23 anos de idade) e aptos ao
trabalho.
Em que pese a existência de eventuais dificuldades financeiras, não há nos autos evidencias de
que as necessidades básicas da parte autora não estejam sendo supridas, em verdade, é a
autora e seu marido que prestam auxílio aos filhos.
Por fim, tem-se que a autora possui mais nove filhos com vida independente, que em caso de
urgência podem e devem socorrê-la.
Ressalto que o benefício assistencial não se destina a complementar o orçamento doméstico,
mas sim prover aqueles que se encontram em efetivo estado de necessidade.
Verifica-se, assim, que o MM. Juiz sentenciante julgou de acordo com as provas carreadas aos
autos e não comprovada a condição de miserabilidade, pressuposto indispensável para a
concessão do benefício, de rigor a manutenção da sentença de improcedência do pedido por
seus próprios fundamentos.
Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do
CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a condenação ao valor de 2%
sobre o valor da causa, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi
concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo
Civil/2015.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação da parte autora e, com fulcro no §11º do artigo
85 do Código de Processo Civil, condeno-a ao pagamento de honorários de advogado arbitrados
em 2% sobre o valor da causa, nos termos da fundamentação exposta.
É o voto.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001763-96.2018.4.03.6111
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Advogado do(a) APELANTE: ALESSANDRO DE MELO CAPPIA - SP199771-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IDOSO.
HIPOSSUFICIÊNCIA/MISERABILIDADE. REQUISITO NÃO PREENCHIDO. SUCUMBÊNCIA
RECURSAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MAJORADOS.
1. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da
Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da
Lei nº 8.742/93.
2. Hipossuficiência/miserabilidade da parte autora não comprovada. Mandado de constatação
indica que a autora está amparada pelo marido. O benefício assistencial não se presta a
complementação de renda.
4. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na
sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015. Exigibilidade condicionada à hipótese
prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
5. Apelação da parte autora não provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
