Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
6083592-24.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
30/11/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 04/12/2020
Ementa
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6083592-24.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ORIZIA CARDOSO DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: ALVARO AUGUSTO RODRIGUES - SP232951-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA REJEITADA.
CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL.
HIPOSSUFICIÊNCIA/MISERABILIDADE NÃO DEMONSTRADA. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
1. Rejeito a preliminar de nulidade da sentença arguida pela parte autora. Cerceamento de defesa
não caracterizado. O laudo pericial foi elaborado com boa técnica e forneceu ao Juízo os
elementos necessários à análise da demanda. Alteração das condições socioeconômicas após a
realização da perícia social e/ou prolação da sentença enseja novo pedido perante a autarquia ré.
2.O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da
Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da
Lei nº 8.742/93.
3. Requisito de miserabilidade/hipossuficiência não preenchido. Laudo social indica que a parte
autora encontra-se amparada pela família e que não há miserabilidade. O benefício assistencial
não se presta a complementação de renda.
4. Benefício assistencial indevido.
5. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na
sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015. Exigibilidade condicionada à hipótese
prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
6. Preliminar rejeitada. Apelação da parte autora não provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6083592-24.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ORIZIA CARDOSO DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: ALVARO AUGUSTO RODRIGUES - SP232951-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6083592-24.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ORIZIA CARDOSO DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: ALVARO AUGUSTO RODRIGUES - SP232951-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada
(LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal à pessoa portadora de
deficiência.
A sentença, prolatada em 19.06.2019, julgou o pedido improcedente sob o fundamente de que
não restou preenchido o requisito de hipossuficiência/miserabilidade, conforme dispositivo que
ora transcrevo: "Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido, com resolução do mérito,
nos termos do art. 487, inc. I, do Código de Processo Civil. Diante da sucumbência, arcará a parte
demandante com custas e despesas processuais, bem como honorários advocatícios, que fixo
em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC, atualizado de acordo com a
Tabela Prática do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Observados os benefícios da
gratuidade da justiça, conforme disposto no artigo 98, do Código de Processo Civil. Nos termos
da Resolução n° 305, de 07 de outubro de 2014, do Conselho da Justiça Federal (tabela V),
atendendo ao grau de especialização do perito, à complexidade dos exames e, sobretudo, ao
local de suas realizações, fixo os honorários em R$ 200,00 (duzentos reais). EXPEÇAM-SE
ofícios requisitórios em prol dos peritos, instruindo-os com as cópias necessárias. Após o trânsito
em julgado, nada sendo requerido pelos litigantes, com os registros devidos, independentemente
de nova conclusão, arquivem-se os autos, com as cautelas legais, observadas as NSCGJ/SP.
P.I.C."
Apela a parte autora requerendo preliminarmente a nulidade da sentença ante a ocorrência do
cerceamento defesa posto que não apreciado seu pedido de realização de nova perícia social.
alegando para tanto que preenche os requisitos necessários para a concessão do benefício
assistencial.
Sem contrarrazões, os autos vieram a este Tribunal.
O Ministério Público Federal deixou de opinar.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6083592-24.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
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APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Rejeito a preliminar de nulidade da sentença.
O laudo social foi elaborado com boa técnica e forneceu ao Juízo os elementos necessários à
análise da demanda.
Verifica-se que a perita nomeada pelo Juízo "a quo" realizou a visita social e entrevistou os
moradores facultando-lhes expor e apresentar os documentos que achar pertinentes,
evidenciando conhecimento técnico e diligência.
Ademais, encerrada a instrução processual, não se mostra viável, neste grau de jurisdição, a
realização de nova perícia social. De fato, considerando a natureza do benefício assistencial, a
eventual alteração nas condições socioeconômicas da autora, após a realização da perícia social
e prolação da sentença, enseja novo pedido perante à autarquia.
Passo ao exame do mérito.
O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei
nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
O artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com
deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do
salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
A constitucionalidade dessa norma foi questionada na ADI 1.232-1/DF, tendo o Plenário do
Supremo Tribunal Federal, por maioria, decidido pela improcedência do pedido, ao fundamento
que a fixação da renda per capita no patamar de ¼ do salário mínimo sugere a presunção
absoluta de pobreza. Concluiu, contudo, que não é a única forma suscetível de se aferir a
situação econômica da família do idoso ou portador de deficiência.
Posteriormente, a Corte Suprema enfrentou novamente a questão no âmbito da Reclamação
4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconhecendo a inconstitucionalidade parcial, sem
pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993, decorrente de notórias mudanças
fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais
por parte do Estado brasileiro).
Restou decidido que a norma é inconstitucional naquilo que não disciplinou, não tendo sido
reconhecida a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência, cabendo
ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial a fim de
suprimir o vício apontado.
Desta forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de
pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em
se tratando de pessoa idosa ou com deficiência, é através da própria natureza de seus males, de
seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.
Não há como enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar, nem tampouco entender
que aqueles que contam com menos de ¼ do salário-mínimo fazem jus obrigatoriamente ao
benefício assistencial ou que aqueles que tenham renda superior não o façam.
Com relação ao cálculo da renda per capita em si, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de
recurso repetitivo REsp 1.355.052/SP, em conformidade com a decisão proferida pelo Supremo
Tribunal Federal no RE 580.963/PR, definiu que a se aplica, por analogia, a regra do parágrafo
único do artigo 34 do Estatuto do Idos0 (Lei 10.741/03), a pedido de benefício assistencial
formulado por pessoa com deficiência, a fim de que qualquer benefício previdenciário recebido
por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado na sua aferição.
Por fim, entende-se por família, para fins de verificação da renda per capita, nos termos do §1º do
artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.435/2011, o conjunto de pessoas
composto pelo requerente, o cônjuge, o companheiro, a companheira, os pais e, na ausência de
um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os
menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Contudo, em que pese a princípio os filhos casados ou que não coabitam sob o mesmo teto não
integrarem o núcleo familiar para fins de aferição de renda per capita, nos termos da legislação
específica, não se pode perder de vista que o artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece
que o benefício é devido quando o idoso ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-
lo provido pela família. Por sua vez, a regra do artigo 229 da Lei Maior dispõe que os filhos
maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, premissa
também assentada nos artigos 1694 a 1697 da lei Civil.
Depreende-se assim que o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação
da família de prestar a assistência, pelo que, como já dito, o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode
ser interpretado de forma isolada na apuração da miserabilidade.
Tecidas tais considerações, no caso dos autos a sentença de primeiro grau julgou improcedente o
pedido com base nos elementos contidos no estudo social, tendo se convencido não restar
configurada a condição de hipossuficiência financeira ou miserabilidade necessárias para a
concessão do benefício. Confira-se:
“A autora não faz jus ao benefício, senão vejamos: No caso sub judice o estudo social realizado
às fls. 120 concluiu: “Através dos instrumentos utilizados no Estudo Social fica evidente que o
requerente não está em situação de miserabilidade e desemparo, pois a manutenção da mesma
está sendo realizada satisfatoriamente por sua família que segundo a LEI 12.435 Art. 20 §1º é
composta “pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a
madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores
tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto”. A renda per capita familiar é de R$477,00
superior a ¼ do salário mínimo, requisito que desqualifica a requerente para a concessão do
benefício...” (grifo nosso). Aplicando-se, pois, as exigências legais ao caso concreto, depreende-
se que a parte autora não preenche os requisitos para a concessão do benefício, sendo de rigor a
improcedência do pedido.”
Por sua vez, o estudo social (ID 98391492), elaborado em 10.11.2018, revela que a parte autora
reside com seu irmão em imóvel cedido pela mãe, de alvenaria, localizada no centro da cidade,
de alvenaria, com dois quartos, sala, cozinha em razoáveis condições de habitação. A casa está
adequadamente guarnecida com móveis e eletrodomésticos, contando com: armários, mesa,
cadeiras, aparelhos de TV e DVD, três camas de solteiro, computador e máquina de lavar roupas
entre outros itens.
O irmão da autora exerce atividade laborativa auferindo R$ 954,00/mês.
Informaram despesas com luz (R$ 123,840, água (R$ 76,64), IPTU (R$ 11,17), gás (R$ 70,00) e
mercado (R$ 600,00), perfazendo total de R$ 881,65.
A perita social emitiu parecer informando que a requerente não está em estado de miserabilidade
e desamparo, pois tem suas necessidades básicas mantidas pela família.
Da leitura do laudo social extrai-se que, apesar de não se negar a existência de eventuais
dificuldades financeiras, não há indícios de que as necessidades básicas da parte autora não
estejam sendo supridas e, nesse sentido, observo que o grupo não apresenta despesa com
moradia econta com rendimento que supre as despesas básicas relatada.
Ressalto que o benefício assistencial não se destina a complementar o orçamento doméstico,
mas sim prover aqueles que se encontram em efetivo estado de necessidade.
Anoto que, considerando a natureza do benefício assistencial, a eventual alteração nas condições
socioeconômicas da autora, após a realização da perícia social e/ou prolação da sentença,
enseja novo pedido perante à autarquia.
Verifica-se, assim, que o MM. Juiz sentenciante julgou de acordo com as provas carreadas aos
autos e não comprovada a condição de miserabilidade, pressuposto indispensável para a
concessão do benefício, de rigor a manutenção da sentença de improcedência do pedido por
seus próprios fundamentos.
Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do
CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de
advogado arbitrados na sentença em 2%, devendo ser observada, se for o caso, a suspensão da
exigibilidade prevista no § 3º do artigo 98 daquele Codex.
Ante o exposto, rejeito a preliminar de nulidade da sentença arguida pela parte autora, no mérito,
NEGO PROVIMENTO à sua apelação e, com fulcro no §11º do artigo 85 do Código de Processo
Civil, majoro os honorários de advogado em 2% sobre o valor arbitrado na sentença, nos termos
da fundamentação exposta.
É o voto.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6083592-24.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ORIZIA CARDOSO DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: ALVARO AUGUSTO RODRIGUES - SP232951-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA REJEITADA.
CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL.
HIPOSSUFICIÊNCIA/MISERABILIDADE NÃO DEMONSTRADA. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
1. Rejeito a preliminar de nulidade da sentença arguida pela parte autora. Cerceamento de defesa
não caracterizado. O laudo pericial foi elaborado com boa técnica e forneceu ao Juízo os
elementos necessários à análise da demanda. Alteração das condições socioeconômicas após a
realização da perícia social e/ou prolação da sentença enseja novo pedido perante a autarquia ré.
2.O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da
Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da
Lei nº 8.742/93.
3. Requisito de miserabilidade/hipossuficiência não preenchido. Laudo social indica que a parte
autora encontra-se amparada pela família e que não há miserabilidade. O benefício assistencial
não se presta a complementação de renda.
4. Benefício assistencial indevido.
5. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na
sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015. Exigibilidade condicionada à hipótese
prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
6. Preliminar rejeitada. Apelação da parte autora não provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a questão preliminar arguida pela parte autora e, no mérito, negar
provimento à sua apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
