
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0017668-08.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: SEBASTIAO FERREIRA
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDA KATSUMATA NEGRAO - SP303339-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0017668-08.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: SEBASTIAO FERREIRA
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDA KATSUMATA NEGRAO - SP303339-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada (LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal à pessoa portadora de deficiência.
A sentença, prolatada em 09.08.2017, ante o falecimento do parte autora, julgou extinto o processo sem julgamento do mérito, conforme dispositivo que ora transcrevo: “Ante o exposto, indefiro o pedido de habilitação, e com base no art. 485, IX, do CPC, julgo extinto o processo sem resolução do mérito, frente a ilegitimidade ativa verificada. Condeno a Autora ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios, arbitrados em 10% do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2°, CPC, observando-se os termos da Lei n.º 1.060/50.Transitado em julgado e não havendo outras diligências a cumprir, arquivem-se, observadas as formalidades legais. P. I.C.”.
O espólio da parte autora apelou pleiteando a anulação da sentença e a concessão do benefício assistencial a partir do pedido administrativo até a data do óbito. Alternativamente, “REQUER seja realizada perícia social no domicilio da falecida autora, visando comprovar sua miserabilidade, devendo ser anulada a r. sentença, diante do comprovado cerceamento de defesa, vez que o Recorrente requereu expressamente perícia social em domicílio e, posteriormente, requer seja proferida nova sentença, condenando-se o INSS a pagar aos sucessores da autora, os valores em atraso, desde a data de entrada do requerimento . administrativo em 02/12/2015 (data da pretensão resistida) até a data do óbito em 30/11/2016.”
Sem a apresentação de contrarrazões, os autos vieram a este Tribunal.
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso dos sucessores da parte autora.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0017668-08.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: SEBASTIAO FERREIRA
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDA KATSUMATA NEGRAO - SP303339-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O benefício assistencial possui caráter personalíssimo, de modo que não pode ser transferido aos herdeiros em caso de óbito do beneficiário, e tampouco gera direto à pensão por morte aos dependentes, sendo que a morte do beneficiário estabelece o termo final em seu pagamento.
Entretanto, observo que os valores a que fazia jus o titular, e que não foram recebidos em vida integraram seu patrimônio, e são transmissíveis aos seus herdeiros.
Neste sentido dispõe o parágrafo único do art. 23 do Decreto nº 6.214, de 26.09.2007: "Art. 23. O Benefício de Prestação Continuada é intransferível, não gerando direito à pensão por morte aos herdeiros ou sucessores.
Parágrafo único. O valor do resíduo não recebido em vida pelo beneficiário será pago aos seus herdeiros ou sucessores, na forma da lei civil."
Nessa esteira confira-se:
"PROCESSUAL CIVIL. INAPLICABILIDADE DO ART. 267, IX, DO CPC. NULIDADE DA SENTENÇA. APLICAÇÃO DO DISPOSTO NO ART. 515, § 3º, DO CPC. MÉRITO. DIREITO ASSISTENCIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEI ORGÂNICA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL. MISERABILIDADE NÃO COMPROVADA. AUSÊNCIA DE UM DOS REQUISITOS ENSEJADORES DA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. - Ainda que o benefício assistencial se trate de direito personalíssimo, a habilitação de herdeiros é admitida pela jurisprudência nos casos em que, reconhecida a procedência de pedido de amparo assistencial, haja direito a prestações vencidas. Desse modo, é nula a sentença que extinguiu o processo, sem julgamento do mérito, com fulcro no art. 267, IX, do CPC. (...)- Sentença anulada de ofício. Pedido julgado improcedente com fulcro no artigo 515, § 3º, do Código de Processo Civil. Prejudicada a apelação. (AC 00329087620144039999, DESEMBARGADORA FEDERAL THEREZINHA CAZERTA, TRF3 - OITAVA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/05/2015 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL. ART. 557, § 1º, CPC. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. HABILITAÇÃO DE HERDEIROS. POSSIBILIDADE. AGRAVO DO INSS IMPROVIDO. 1. A decisão agravada está em consonância com o disposto no art. 557 do CPC, visto que supedaneada em jurisprudência consolidada do C. STJ e desta E. Corte. 2. Em que pese o caráter personalíssimo e intransferível do benefício assistencial, uma vez reconhecido o direito ao recebimento do benefício, os valores devidos e não recebidos em vida pelo beneficiário integram o patrimônio do de cujus e devem ser pagos aos sucessores. 3. As razões recursais não contrapõem tais fundamentos a ponto de demonstrar o desacerto do decisum, limitando-se a reproduzir argumento visando à rediscussão da matéria nele contida. 4. Agravo legal improvido. (AI 00133325820134030000/AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 506011, Relator(a) DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO, TRF3, SÉTIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:25/07/2014 ..FONTE_REPUBLICACAO)"
No caso concreto, todavia, nota-se que o autor faleceu em 30.11.2011 (ID 87571642 – pag. 1/16), antes da conclusão da instrução processual, eis que ainda não haviam sido realizadas as perícias médica e social, não estando caracterizado o direito do autor e nem a formação de patrimônio a ser transmitido aos seus herdeiros.
O benefício assistencial apresenta caráter personalíssimo, assistencial e não contributivo, não se transmitindo aos seus herdeiros, pelo que não há que se falar em perícia indireta.
Confira-se a jurisprudência:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO DEFICIENTE. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. ÓBITO DA PARTE AUTORA ANTES DA REALIZAÇÃO DE PROVA PERICIAL. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA IMPROVIDA. 1. O benefício de prestação continuada, de um salário mínimo mensal, previsto no art. 203, V, da Constituição Federal e regulamentado pelo art. 20 e parágrafos da Lei nº 8.742/93, é devido à pessoa portadora de deficiência (sem limite de idade) e ao idoso, com mais de 65 anos, que comprovem não ter condições econômicas de se manter e nem de ter sua subsistência mantida pela família. 2. O E.STF, na Reclamação (RCL) 4374 e sobretudo nos Recursos Extraordinários (REs) 567985 e 580963 (ambos com repercussão geral), em 17 e 18 de abril de 2013, reconheceu superado o decidido na ADI 1.232-DF, de tal modo que o critério de renda per capita de ¼ do salário mínimo não é mais aplicável, motivo pelo qual a miserabilidade deverá ser aferida pela análise das circunstâncias concretas do caso analisado (à míngua de novo critério normativo). Aliás, esse já era o entendimento que vinha sendo consagrado pela jurisprudência, como se pode notar no E. STJ, no REsp 314264/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Félix Fischer, j. 15/05/2001, v.u., DJ 18/06/2001, p. 185, afirmando que "o preceito contido no art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 não é o único critério válido para comprovar a condição de miserabilidade preceituada no artigo 203, V, da Constituição Federal. A renda familiar per capita inferior a ¼ do salário-mínimo deve ser considerada como um limite mínimo, um quantum objetivamente considerado insuficiente à subsistência do portador de deficiência e do idoso, o que não impede que o julgador faça uso de outros fatores que tenham o condão de comprovar a condição de miserabilidade da família do autor". No mesmo sentido, também no STJ, vale mencionar o decidido nos EDcl no AgRg no REsp 658705/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Felix Fischer, j. 08/03/2005, v.u., DJ 04/04/2005, p. 342, e ainda o contido no REsp 308711/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 19/09/2002, v.u., DJ 10/03/2003, p. 323. 3 - Na hipótese dos autos, a instrução processual não pode ser concluída em razão do óbito do Autor, pois, para se aferir a presença dos requisitos necessários à concessão do benefício, deveria ter sido realizado laudo pericial, não sendo possível aceitar como meio apto a comprovar tais requisitos sua realização após o óbito. 4. Apelação improvida.
(Acórdão Número 0041184-91.2017.4.03.9999 / Classe Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2283283, Relator(a) DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO, TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO, SÉTIMA TURMA, Data 18/06/2018, Data da publicação 25/06/2018, Fonte da publicação e-DJF3 Judicial 1 DATA:25/06/2018 )
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. NÃO DEMONSTRADO O PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. DECISÃO FUNDAMENTADA. I - Não demonstrado o preenchimento de um dos requisitos necessários para concessão do benefício assistencial, à luz do inciso V, do art. 203 da Constituição Federal, c.c. o art. 20 da Lei nº 8.742/93, quais sejam: 1) ser pessoa portadora de deficiência que a incapacite para o trabalho, ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais, conforme o artigo 34, do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.471/2003) e 2) não possuir meios de subsistência próprios ou de seus familiares, cuja renda mensal per capita deve ser inferior a ¼ do salário mínimo. II - Parâmetro da renda previsto no art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 já foi questionado no Egrégio Supremo Tribunal Federal, que, por ocasião do julgamento da ADI n.º 1.232/DF, Rel. Min. Ilmar Galvão, reconheceu a constitucionalidade da norma. III - Demanda ajuizada em 06.10.2010, o(a) autor(a) com 64 anos (data de nascimento: 13.05.1946). IV - Laudo médico pericial, datado 03.03.2010, informa que o requerente apresenta seqüela de fratura exposta de perna esquerda com deformidade permanente e debilidade de marcha, em razão de atropelamento sofrido em 20.04.2004. Conclui que apresenta incapacidade para atividades profissionais e/ou vida diária, devido ao uso obrigatório de muletas e dificuldade de deambulação. Informa que ficou ciente do óbito do autor, em razão das informações dos autos. V - Estudo social, datado de 15.01.2010, informa que o peticionário faleceu. A irmã do requerente relata que residia com ele até o momento de seu falecimento. Destacou que as causas da morte não estão relacionadas ao problema de saúde alegado nos autos. Disse que ele era solteiro, residiu com ela até seu óbito e, que, sobreviviam com um salário mínimo advindo do benefício de amparo assistencial auferido por ela. VI - O atestado de óbito, ocorrido em 01.01.2010, dá como desconhecida a causa morte. VII - Deferida a habilitação dos herdeiros. VIII - Não houve possibilidade de elaboração de relatório social, antes do falecimento do autor, indicando as condições em que viviam ele e as pessoas de sua família, que residiam sob o mesmo teto. Logo, não há como se aferir se cumpria o requisito da miserabilidade, essência do benefício assistencial, cuja ausência representa obstáculo à concessão de tal benefício. Além do que, a prestação tem caráter personalíssimo, não gerando aos seus sucessores o direito à pensão por morte, nos termos do art. 36 do Decreto nº 1.744/95. IX - Não merece reparos a decisão recorrida. X - É pacífico o entendimento nesta E. Corte, segundo o qual não cabe alterar decisões proferidas pelo relator, desde que bem fundamentadas e quando não se verificar qualquer ilegalidade ou abuso de poder que possa gerar dano irreparável ou de difícil reparação. XI - Agravo não provido.
(AC 00346192420114039999, DESEMBARGADORA FEDERAL MARIANINA GALANTE, TRF3 - OITAVA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/05/2012 .FONTE_REPUBLICACAO:.)
Diante do exposto nego provimento à apelação dos herdeiros da parte autora, na forma da fundamentação exposta.
É o voto.
DECLARAÇÃO DE VOTO
A EXMA. SRA. DES. FED. INÊS VIRGÍNIA: Trata-se de ação visando a concessão do benefício assistencial, julgada extinta, sem julgamento do mérito, em razão da carência superveniente de ação, eis que a requerente faleceu no curso do processo.
Apela o espólio da parte autora, requerendo o recebimento das parcelas atrasadas, entre a data do requerimento administrativo e o óbito.
O I. Relator negou provimento à apelação dos sucessores da parte autora, sob o fundamento de que o benefício tem caráter personalíssimo e por não ter havido instrução processual, não foi caracterizado o direito dos requerentes, nem a formação de patrimônio a ser transmitido aos herdeiros.
Ouso discordar, respeitosamente.
O artigo 21, §1º, da Lei Assistencial dispõe que: "O pagamento do benefício cessa no momento em que forem superadas as condições referidas no caput, ou em caso de morte do beneficiário".
Contudo, o que não pode ser transferido é o direito à percepção mensal do benefício, pois a morte do beneficiário coloca um termo final em seu pagamento.
Embora o benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição tenha caráter personalíssimo, as parcelas eventualmente devidas a esse título até a data do óbito representam crédito constituído pela autora em vida, sendo, portanto, cabível sua transmissão causa mortis.
Portanto, os sucessores têm direito ao recebimento dos valores a que o titular do benefício, eventualmente, teria direito em vida.
No caso, a parte autora faleceu durante a tramitação da ação de requerimento de benefício assistencial, razão da legitimidade ativa dos sucessores, subsistindo o direito ao recebimento de prestações pretéritas, que se incorporaram ao patrimônio jurídico da "de cujus", incidindo o disposto no art. 112 da Lei n. 8.213/199.
Para aferição dos requisitos necessários à concessão do benefício, entendo perfeitamente possível a perícia indireta.
Diante do exposto, voto por converter o julgamento em diligência, para realização das perícias indiretas necessárias para posterior julgamento do mérito.
É como voto.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0017668-08.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: SEBASTIAO FERREIRA
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDA KATSUMATA NEGRAO - SP303339-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ÓBITO DA PARTE AUTORA. INSTRUÇÃO PROCESSUAL NÃO CONCLUÍDA. HABILITAÇÃO DE HERDEIROS. IMPOSSIBILIDADE.
1. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
2. A parte autora faleceu antes da conclusão da instrução processual. Não foram realizadas as perícias médica e social. Ausente comprovação inequívoca do direito.
3. O benefício apresenta caráter personalíssimo, assistencial e não contributivo que não se transmite seus herdeiros, pelo que não há que se falar em perícia indireta.
4. Apelação dos herdeiros da parte autora não provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo NO JULGAMENTO, A SÉTIMA TURMA, POR MAIORIA, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DOS HERDEIROS DA PARTE AUTORA, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, COM QUEM VOTARAM O DES. FEDERAL CARLOS DELGADO E O DES. FEDERAL LUIZ STEFANINI, VENCIDOS A DES. FEDERAL INÊS VIRGÍNIA E O DES. FEDERAL TORU YAMAMOTO QUE VOTAVAM POR CONVERTER O JULGAMENTO EM DILIGÊNCIA.LAVRARÁ O ACÓRDÃO O RELATOR, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
