
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5010672-43.2021.4.03.6105
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOEL DE OLIVEIRA
Advogados do(a) APELADO: ARNALDO APARECIDO OLIVEIRA - SP117426-N, INES REGINA NEUMANN OLIVEIRA - SP115788-N
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5010672-43.2021.4.03.6105
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOEL DE OLIVEIRA
Advogados do(a) APELADO: ARNALDO APARECIDO OLIVEIRA - SP117426-N, INES REGINA NEUMANN OLIVEIRA - SP115788-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Trata-se de ação ordinária em que se objetiva a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento do labor rural e de períodos trabalhados em atividades especiais.
A sentença julgou procedente o pedido para reconhecer como laborado em atividade rural os períodos de 04/03/1980 a 30/12/1981 e 25/10/1983 a 30/06/1989 e como laborado em atividade especial o período de 01/09/1989 a 22/06/1991, determinando ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição integral, com DIB em 15/06/2020 (DER), condenando-o, em consequência, ao pagamento das parcelas em atraso, corrigidas monetariamente, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, conforme Resolução 658/2020 do CJF, e acrescidas de juros de mora, consoante art. 1º-F da Lei 9.494/97. A partir de 09/12/2021, deverá ser aplicada a Taxa Selic, nos termos do art. 3º da EC 113/2021. Condenou o réu também ao pagamento de honorários de advogado, arbitrados nos percentuais mínimos do art. 85, § 3º, do CPC sobre o valor da condenação, considerado como termo final desta a data da sentença. O INSS é isento do pagamento de custas, salvo as de reembolso.
Sentença não submetida à remessa necessária, nos termos do art. 496, §3º, I, do CPC.
Apela o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, alegando, preliminarmente, a necessidade de apreciação da remessa necessária. No mérito, alega que o autor não comprovou o exercício de atividade rural no período de 25/10/1983 a 30/06/1989, sendo insuficiente o conjunto probatório produzido.
Contrarrazões pela parte apelada, pugnando pela manutenção da sentença.
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5010672-43.2021.4.03.6105
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOEL DE OLIVEIRA
Advogados do(a) APELADO: ARNALDO APARECIDO OLIVEIRA - SP117426-N, INES REGINA NEUMANN OLIVEIRA - SP115788-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo termo inicial do benefício, seu valor aproximado e a data da sentença, que o valor total da condenação será inferior à importância de 1.000 (mil) salários mínimos estabelecida no inciso I do §3º do art. 496 do CPC/15.
Afinal, o valor que superaria a remessa oficial é equivalente a 14 anos de benefícios calculados no valor máximo, o que certamente não será o caso dos autos.
Assim, é nítida a inadmissibilidade, na hipótese em tela, da remessa necessária.
Passo ao exame do mérito.
Aposentadoria por tempo de serviço/contribuição – requisitos
A aposentadoria por tempo de serviço, atualmente denominada aposentadoria por tempo de contribuição, admitia a forma proporcional e a integral antes do advento da Emenda Constitucional 20/98, fazendo jus à sua percepção aqueles que comprovem tempo de serviço (25 anos para a mulher e 30 anos para o homem na forma proporcional, 30 anos para a mulher e 35 anos para o homem na forma integral) desenvolvido totalmente sob a égide do ordenamento anterior, respeitando-se, assim, o direito adquirido.
Aqueles segurados que já estavam no sistema e não preencheram o requisito temporal à época da Emenda Constitucional 20 de 15 de dezembro de 1998, fazem jus à aposentadoria por tempo de serviço proporcional desde que atendam às regras de transição expressas em seu art. 9º, caso em que se conjugam o requisito etário (48 anos de idade para a mulher e 53 anos de idade para o homem) e o requisito contributivo (pedágio de 40% de contribuições faltantes para completar 25 anos, no caso da mulher e para completar 30 anos, no caso do homem).
Assim, até a edição da EC 103/2019, eram requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições (30 anos para a mulher e 35 anos para o homem), ressaltando-se que o tempo de serviço prestado anteriormente à referida Emenda equivale a tempo de contribuição, a teor do art. 4º da Emenda Constitucional 20/98.
Após a edição da EC 103/2019 houve substancial alteração na redação do § 7.º do art. 201 da Constituição Federal, para a obtenção da aposentadoria voluntária do segurado vinculado ao Regime Geral da Previdência Social, in verbis:
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a:
I - cobertura dos eventos de incapacidade temporária ou permanente para o trabalho e idade avançada;
...........................................................................................................................................
§ 1º É vedada a adoção de requisitos ou critérios diferenciados para concessão de benefícios, ressalvada, nos termos de lei complementar, a possibilidade de previsão de idade e tempo de contribuição distintos da regra geral para concessão de aposentadoria exclusivamente em favor dos segurados:
I - com deficiência, previamente submetidos a avaliação biopsicossocial realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar;
II - cujas atividades sejam exercidas com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação.
...........................................................................................................................................
§7º ...................................................................................................................................
I - 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 62 (sessenta e dois) anos de idade, se mulher, observado tempo mínimo de contribuição;
II - 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, para os trabalhadores rurais e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal”.
No que toca à aposentadoria por tempo de contribuição, disciplinou quatro regras de transição (arts. 15 a 17 e 20) para os segurados que, na data de sua entrada em vigor (13/11/2019), já se encontravam filiados ao RGPS.
1) Transição por sistema de pontos (tempo de contribuição e idade)
“Art. 15. Ao segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, fica assegurado o direito à aposentadoria quando forem preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos:
I - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem; e
II - somatório da idade e do tempo de contribuição, incluídas as frações, equivalente a 86 (oitenta e seis) pontos, se mulher, e 96 (noventa e seis) pontos, se homem, observado o disposto nos §§ 1º e 2º.
§ 1º A partir de 1º de janeiro de 2020, a pontuação a que se refere o inciso II do caput será acrescida a cada ano de 1 (um) ponto, até atingir o limite de 100 (cem) pontos, se mulher, e de 105 (cento e cinco) pontos, se homem.
§ 2º A idade e o tempo de contribuição serão apurados em dias para o cálculo do somatório de pontos a que se referem o inciso II do caput e o § 1º.
§ 3º Para o professor que comprovar exclusivamente 25 (vinte e cinco) anos de contribuição, se mulher, e 30 (trinta) anos de contribuição, se homem, em efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio, o somatório da idade e do tempo de contribuição, incluídas as frações, será equivalente a 81 (oitenta e um) pontos, se mulher, e 91 (noventa e um) pontos, se homem, aos quais serão acrescidos, a partir de 1º de janeiro de 2020, 1 (um) ponto a cada ano para o homem e para a mulher, até atingir o limite de 92 (noventa e dois) pontos, se mulher, e 100 (cem) pontos, se homem.
§ 4º O valor da aposentadoria concedida nos termos do disposto neste artigo será apurado na forma da lei”.
2) Transição por tempo de contribuição e idade mínima
“Art. 16. Ao segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional fica assegurado o direito à aposentadoria quando preencher, cumulativamente, os seguintes requisitos:
I - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem; e
II - idade de 56 (cinquenta e seis) anos, se mulher, e 61 (sessenta e um) anos, se homem.
§ 1º A partir de 1º de janeiro de 2020, a idade a que se refere o inciso II do caput será acrescida de 6 (seis) meses a cada ano, até atingir 62 (sessenta e dois) anos de idade, se mulher, e 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem.
§ 2º Para o professor que comprovar exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio o tempo de contribuição e a idade de que tratam os incisos I e II do caput deste artigo serão reduzidos em 5 (cinco) anos, sendo, a partir de 1º de janeiro de 2020, acrescidos 6 (seis) meses, a cada ano, às idades previstas no inciso II do caput, até atingirem 57 (cinquenta e sete) anos, se mulher, e 60 (sessenta) anos, se homem.
§ 3º O valor da aposentadoria concedida nos termos do disposto neste artigo será apurado na forma da lei”.
3) Transição sem idade mínima, com pedágio (50%) e fator previdenciário
“Art. 17. Ao segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional e que na referida data contar com mais de 28 (vinte e oito) anos de contribuição, se mulher, e 33 (trinta e três) anos de contribuição, se homem, fica assegurado o direito à aposentadoria quando preencher, cumulativamente, os seguintes requisitos:
I - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem; e
II - cumprimento de período adicional correspondente a 50% (cinquenta por cento) do tempo que, na data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, faltaria para atingir 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem.
Parágrafo único. O benefício concedido nos termos deste artigo terá seu valor apurado de acordo com a média aritmética simples dos salários de contribuição e das remunerações calculada na forma da lei, multiplicada pelo fator previdenciário, calculado na forma do disposto nos §§ 7º a 9º do art. 29 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991”.
4) Transição com idade mínima e pedágio (100%)
“Art. 20. O segurado ou o servidor público federal que se tenha filiado ao Regime Geral de Previdência Social ou ingressado no serviço público em cargo efetivo até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional poderá aposentar-se voluntariamente quando preencher, cumulativamente, os seguintes requisitos:
I - 57 (cinquenta e sete) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem;
II - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem;
(...)
IV - período adicional de contribuição correspondente ao tempo que, na data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, faltaria para atingir o tempo mínimo de contribuição referido no inciso II.
§ 1º Para o professor que comprovar exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio serão reduzidos, para ambos os sexos, os requisitos de idade e de tempo de contribuição em 5 (cinco) anos.
§ 2º O valor das aposentadorias concedidas nos termos do disposto neste artigo corresponderá:
(...)
II - em relação aos demais servidores públicos e aos segurados do Regime Geral da Previdência Social, ao valor apurado na forma da lei.
§ 3º O valor das aposentadorias concedidas nos termos do disposto neste artigo não será inferior ao valor a que se refere o § 2º do art. 201 da Constituição Federal e será reajustado:
(...)
II - nos termos estabelecidos para o Regime Geral de Previdência Social, na hipótese prevista no inciso II do § 2º.
§ 4º (...)”.
Assinalo, contudo, que, nos termos do art. 3º da EC nº 103/19 é assegurada a aposentadoria por tempo de contribuição, nos moldes estabelecidos pela EC nº 20/98, ao segurado que, até a data da entrada em vigor do novo regramento, tiver vertido 35 anos de contribuição, se homem, ou 30 aos de contribuição, se mulher.
Por fim, a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição depende do cumprimento de período de carência equivalente a 180 contribuições mensais, na dicção do inciso II do art. 25 da Lei nº 8.213/91. Para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24/07/1991, entretanto, deve-se observar o regramento contido no art. 142 do mesmo diploma legal.
Tempo de serviço rural anterior e posterior à Lei de Benefícios
A aposentadoria do trabalhador rural apresenta algumas especificidades, em razão sobretudo da deficiência dos programas de seguridade voltados a essa categoria de trabalhadores no período anterior à Constituição Federal de 1988 e do descumprimento da legislação trabalhista no campo. Assim é que, no seu art. 55, §2º, a Lei 8.213/91 estabeleceu ser desnecessário o recolhimento de contribuições previdenciárias pelo segurado especial ou trabalhador rural no período anterior à vigência da Lei de Benefícios, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço rural, exceto para efeito de carência. Neste sentido, já decidiu esta E. Corte: SÉTIMA TURMA, APELREEX 0005026-42.2014.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, julgado em 21/07/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:31/07/2014 e TERCEIRA SEÇÃO, AR 0037095-93.2010.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NELSON BERNARDES, julgado em 28/11/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/12/2013.).
Já em relação ao tempo de serviço rural trabalhado a partir da competência de novembro de 1991 (art. 55, §2º, da Lei 8.213/91 c/c o art. 60, X, do Decreto 3.048/99), ausente o recolhimento das contribuições, somente poderá ser aproveitado pelo segurado especial para obtenção dos benefícios previstos no art. 39, I, da Lei 8.213/91.
Responsabilidade pelo recolhimento de contribuições
Preconizava o art. 79, I, da Lei nº 3.807/60, e atualmente prevê o art. 30, I, a, da Lei nº 8.213/91, que a responsabilidade pelo recolhimento das contribuições previdenciárias é do empregador, motivo pelo qual não se pode punir o empregado pela ausência de recolhimentos, sendo computado o período laborado e comprovado para fins de carência, independentemente de indenização aos cofres da Previdência. Neste sentido, TRF3, 10ª Turma, AC 1122771/SP, v.u., Rel. Des. Federal Jediael Galvão, D 13/02/2007, DJU 14/03/2007, p. 633.
Reconhecimento de tempo de serviço e expedição de certidão
Considerando-se que é direito constitucional a obtenção de certidões perante órgãos públicos (art. 5º, XXXIV, b, da Constituição da República), importante questão reside na necessidade de recolhimento de indenização ou das contribuições devidas para a expedição de certidão de tempo de serviço pelo INSS, para que o interessado a utilize no requerimento de benefício mediante contagem recíproca em regimes diversos.
Embora existissem divergências, a 3ª Seção deste Tribunal, seguindo orientação do Superior Tribunal de Justiça e de outros Tribunais Regionais, pacificou seu entendimento no sentido de ser possível a emissão desta certidão pela entidade autárquica, independentemente do recolhimento de indenização ou contribuições, desde que o INSS consigne no documento esta ausência, para fins do art. 96, IV, da Lei 8.213/91 (STJ, 5ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, AGRESP 1036320, j. 08/09/2009, DJE 13/10/2009; TRF3, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Daldice Santana, AR nº 2001.03.00.030984-0/SP, v.u., j. 14/06/2012, DE 21/06/2012).
A prova do exercício de atividade rural
Muito se discutiu acerca da previsão contida no art. 55, §3º, da Lei de Benefícios, segundo a qual a comprovação do tempo de serviço exige início de prova material. O que a Lei nº 8.213/91 exige é apenas o início de prova material e é esse igualmente o teor da Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça.
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Exigir documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se quer reconhecer equivaleria a erigir a prova documental como a única válida na espécie, com desconsideração da prova testemunhal produzida, ultrapassando-se, em desfavor do segurado, a exigência legal. Neste sentido, o C. STJ: AgRg no AREsp 547.042/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014.
Tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
É pacífico o entendimento dos Tribunais, considerando as difíceis condições dos trabalhadores rurais, admitir a extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou companheira, bem como da filha solteira residente na casa paterna. (REsp 707.846/CE, Rel. Min. LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJ de 14/3/2005)
Idade mínima para o trabalho rural
Filio-me à jurisprudência majoritária no sentido de admitir-se o labor rural juvenil, por ser realidade comum no campo, segundo as regras ordinárias de experiência, mormente se a prova testemunhal é robusta e reforçada por documentos que indicam a condição de lavradores dos pais do segurado.
Adoto o raciocínio, invocado em tais decisões, no sentido de que a norma constitucional que veda o trabalho ao menor de 16 anos visa à sua proteção, não podendo ser invocada para, ao contrário, negar-lhe direitos. (RESP 200200855336, Min. Jorge Scartezzini, STJ - Quinta Turma, DJ 02/08/2004, p. 484.).
Caso concreto - elementos probatórios
Cinge-se a controvérsia acerca do reconhecimento do período rural de 25/10/1983 a 30/06/1989.
Atividade Rural
O autor, nascido em 29/12/1960, trouxe aos autos, para comprovar o exercício de atividade rural:
- ficha de alistamento militar, datada de 15/03/1978, na qual consta a profissão de lavrador (ID 287350691/65);
- título eleitoral, emitido em 19/01/1979, constando a profissão de tratorista (ID 287350691/67-68);
- certificado de dispensa de incorporação, datado de 03/04/1979, no qual consta a profissão de lavrador (ID 287350691/69-70);
- contrato de parceria agrícola, datado de 01/11/1983, celebrado pelo genitor do autor, qualificado como lavrador, com Cândido de Sordi Machado, José de Sordi Machado e Antônio de Sordi Machado, com duração de um ano (ID 287350691/71);
- carteira de identidade de beneficiário do INAMPS, em nome do genitor do autor, na qualidade de trabalhador rural, válida até abril/1988 e junho/1990 (ID 287350691/72-73) e
- recibos de contribuições feitas pelo genitor do autor ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Muzambinho para a construção de seu ambulatório médico, no ano de 1983 (ID 287350691/82).
Conforme já decidido pela E. 7ª Turma, e tendo em vista o julgamento do Recurso Especial nº 1.348.633/SP, representativo de controvérsia, pela 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, é possível a admissão de tempo de serviço rural anterior à prova documental, desde que corroborado por prova testemunhal idônea, o que de fato ocorreu.
Em audiência realizada em 10/11/2022, a testemunha Paulo Vieira do Prado afirmou que conhece o autor desde 1978, da roça, situada no Córrego da Lage. Foram vizinhos durante dois anos. O autor, seu pai e irmãos eram meeiros no sítio de Alcebíades Furtuoso. Cultivavam arroz, feijão, milho e café. Somente a família trabalhava. Após 1979, a família do autor se mudou para o Sítio Concórdia, de propriedade do “Candinho”. Lá o autor continuou realizando serviços de roça, durante 6 ou 7 anos.
Por sua vez, a testemunha Cândido de Sordi Machado declarou que o autor e sua família trabalharam na fazenda de seu genitor, de 1980 ou 1981 até 1986 ou 1987. A família do autor era composta pelos seus pais e cerca de 10 irmãos. Eles plantavam no meio da rua de café e colhiam para eles e, às vezes, “de meia”. Cuidavam de uma parte do café. Só a família trabalhava. Esporadicamente, o autor também fazia “bicos” em outras propriedades rurais. Depois que a família do autor saiu da Fazenda, mudou-se para a cidade.
Convém ressaltar que, embora não registrado, o contrato de parceria agrícola pode ser considerado como início de prova material para comprovar o labor rural, tendo em vista que foi corroborado pela prova testemunhal. Ademais, não obstante tenha duração de um ano, a testemunha Cândido de Sordi confirmou que o autor e sua família permaneceram na propriedade até 1986 ou 1987.
Sendo assim, deve ser mantida a sentença quanto ao reconhecimento do trabalho rural desenvolvido pelo autor informalmente no período de 25/10/1983 a 31/12/1987, exceto para efeito de carência.
Considerando que o autor não apresentou documentos em seu nome após 1987 e que a prova testemunhal corroborou o labor rural somente até 1987, não é possível manter o reconhecimento do trabalho rural de 01/01/1988 a 30/06/1989.
Dessa forma, considerando o tempo de serviço rural e especial reconhecido nos autos e na esfera administrativa, bem como o tempo comum com registro em CTPS/constante no CNIS, verifica-se que, em 12/11/2019 (último dia de vigência das regras pré-reforma da Previdência – art. 3º da EC 103/2019), o segurado tem direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição (CF/88, art. 201, § 7º, inc. I, com redação dada pela EC 20/98). O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei 9.876/99, com a incidência do fator previdenciário, uma vez que a pontuação totalizada (95,4 pontos) é inferior a 96 pontos (Lei 8.213/91, art. 29-C, inc. I, incluído pela Lei 13.183/2015).
Outrossim, a parte autora preenche os requisitos, em 15/06/2020 (DER), à percepção da aposentadoria conforme art. 17 das regras de transição da EC 103/2019, porque cumpre a carência de 180 contribuições (Lei 8.213/91, art. 25, II), o tempo mínimo de contribuição até a data da entrada em vigor da EC 103/2019 (mais de 33 anos se homem; mais de 28 anos se mulher), o tempo mínimo de contribuição (35 anos se homem; 30 anos se mulher) e o pedágio de 50%.
Posto isso, fazendo jus o segurado à concessão de mais de uma modalidade do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, lhe é assegurado optar por aquela que lhe seja mais vantajosa, cabendo ao INSS, no momento da implantação, fornecer-lhe os demonstrativos financeiros aptos a possibilitar a escolha, nos termos das IN 77/2015 e 128/2022, bem como do artigo 176-E do Decreto nº 3.048/1999.
No que tange aos critérios de atualização do débito, por tratar-se de consectários legais, revestidos de natureza de ordem pública, são passíveis de correção de ofício, conforme precedentes do Superior Tribunal de Justiça (AgRg no REsp 1291244/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26/02/2013, DJe 05/03/2013)
Assim, corrijo a sentença, e estabeleço que as parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora na forma estabelecida e pelos índices previstos no capítulo 4.3, do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, alterado pela Resolução CJF nº 784/2022, de 08 de agosto de 2022, ou daquele que estiver em vigor na data da liquidação do título executivo judicial.
Por fim, considerando o parcial provimento do recurso, incabível a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015. Precedente do STJ (AgInt nos EREsp n. 1.539.725/DF, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Segunda Seção, julgado em 9/8/2017, DJe de 19/10/2017).
Ante o exposto, de ofício, corrijo a sentença para fixar os critérios de atualização do débito, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, dou parcial provimento à apelação do INSS para afastar o reconhecimento do labor rural durante o período de 01/01/1988 a 30/06/1989 e, em consequência, determinar a concessão do benefício nos termos explicitados na decisão.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. REMESSA NECESSÁRIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TRABALHADOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL.
1. Valor da condenação inferior a 1000 (mil) salários mínimos. Remessa oficial descabida. Preliminar rejeitada.
2. São requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições, ressaltando-se que o tempo de serviço prestado anteriormente à Emenda Constitucional 20/98 equivale a tempo de contribuição, a teor do seu art. 4º.
3. Após a edição da EC 113/2019 houve substancial alteração na redação do § 7.º do art. 201 da Constituição Federal, para a obtenção da aposentadoria voluntária do segurado vinculado ao Regime Geral da Previdência Social. Criação de quatro regras de transição (arts. 15 a 17 e 20) para os segurados que, na data de sua entrada em vigor (13/11/2019), já se encontravam filiados ao RGPS.
4. É possível a admissão de tempo de serviço rural anterior à prova documental, desde que corroborado por prova testemunhal idônea. REsp n.º 1.348.633/SP, representativo de controvérsia.
5. Conjunto probatório suficiente para demonstrar o exercício da atividade rural em parte do período pleiteado.
6. O autor cumpriu o requisito temporal e a carência prevista na Lei de Benefícios, fazendo jus à aposentadoria por tempo de serviço integral, nos termos do art. 201, §7º, I, da Constituição da República, com a redação dada pela EC nº 20/98.
7. Implemento dos requisitos à percepção da aposentadoria conforme art. 17 das regras de transição da EC 103/2019.
8. Fazendo jus o segurado à concessão de mais de uma modalidade do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, lhe é assegurado optar por aquela que lhe seja mais vantajosa, cabendo ao INSS, no momento da implantação, fornecer-lhe os demonstrativos financeiros aptos a possibilitar a escolha, nos termos das IN 77/2015 e 128/2022, bem como do artigo 176-E do Decreto nº 3.048/1999.
9. Juros e correção monetária. Aplicação dos índices previstos no capítulo 4.3, do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, alterado pela Resolução CJF nº 784/2022, de 08 de agosto de 2022, ou daquele que estiver em vigor na data da liquidação do título executivo judicial.
10. Sentença corrigida de ofício. Preliminar rejeitada e, no mérito, apelação do INSS parcialmente provida.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
