
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0008354-94.2015.4.03.6102
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: KIMIKO KOGA DA CRUZ
Advogado do(a) APELANTE: MARIZA MARQUES FERREIRA HENTZ - SP277697-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0008354-94.2015.4.03.6102
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: KIMIKO KOGA DA CRUZ
Advogado do(a) APELANTE: MARIZA MARQUES FERREIRA HENTZ - SP277697-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
“(…) cabe observar que a Lei n° 8.880/94 não deve ser aplicada ao caso, já que dispõe sobre o Programa de Estabilização Econômica e o Sistema Monetário Nacional que instituiu a Unidade Real de Valor e visava a regularização da transitoriedade da moeda. O beneficio da parte autora teve início em 06/02/2007 e, portanto, superou em mais de uma década a instituição do plano Real, não se enquadrando, portanto, nas regras de transição aplicadas aos benefícios concedidos à época.”
Os benefícios concedidos sob a égide da Lei n. 8.213/91, limitados ao teto máximo na concessão, dispuseram de mecanismos legais de recuperação da parcela excedente, previstos nas Leis nºs. 8.870 e 8.880, de 1994.
Art. 26. Os benefícios concedidos nos termos da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, com data de início entre 5 de abril de 1991 e 31 de dezembro de 1993, cuja renda mensal inicial tenha sido calculada sobre salário-de-benefício inferior à média dos 36 últimos salários-de-contribuição, em decorrência do disposto no § 2º do art. 29 da referida lei, serão revistos a partir da competência abril de 1994, mediante a aplicação do percentual correspondente à diferença entre a média mencionada neste artigo e o salário-de-benefício considerado para a concessão.
Parágrafo único. Os benefícios revistos nos termos do caput deste artigo não poderão resultar superiores ao teto do salário-de-contribuição vigente na competência de abril de 1994.
Por sua vez, o artigo 21, §3º, da Lei 8.880/94:
Art. 21 - Nos benefícios concedidos com base na Lei nº 8.213, de 1991, com data de início a partir de 1º de março de 1994, o salário-de-benefício será calculado nos termos do art. 29 da referida Lei, tomando-se os salários-de-contribuição expressos em URV.
...
§ 3º - Na hipótese da média apurada nos termos deste artigo resultar superior ao limite máximo do salário-de-contribuição vigente no mês de início do benefício, a diferença percentual entre esta média e o referido limite será incorporada ao valor do benefício juntamente com o primeiro reajuste do mesmo após a concessão, observado que nenhum benefício assim reajustado poderá superar o limite máximo do salário-de-contribuição vigente na competência em que ocorrer o reajuste.
Salienta-se que, ao contrário do art. 26, da Lei n. 8.870/94, a recuperação, ainda que parcial, da parcela excedente ao limite máximo do benefício, prevista pela Lei 8.880/94 não encontra limite temporal de aplicação, sendo regra permanente, vigente e aplicável aos benefícios concedidos a partir de março de 1994.
Dessa forma, a sentença recorrida merece reforma, neste ponto, revelando-se aplicável, ao menos em tese, a regra do artigo 21, §3º, Lei 8.880/94.
No caso, verifica-se que a perícia contábil apurou haver diferenças favoráveis ao segurado diante da correta aplicação do dispositivo legal supracitado.
Do labor em condições especiais
No tocante ao reconhecimento da atividade especial é firme a jurisprudência no sentido de que a legislação aplicável para a caracterização do denominado trabalho em regime especial é a vigente no período em que a atividade a ser considerada foi efetivamente exercida.
Para a verificação do tempo de serviço em regime especial, no caso, deve ser levada em conta a disciplina estabelecida pelos Decretos nºs 83.080/79 e 53.831/64.
Salvo no tocante aos agentes físicos ruído e calor, a exigência de laudo técnico para a comprovação das condições adversas de trabalho somente passou a ser obrigatória a partir de 05/03/1997, data da publicação do Decreto nº 2.172/97, que regulamentou a Lei nº 9.032/95 e a MP 1.523/96, convertida na Lei nº 9.528/97.
Contudo, acompanhando posicionamento adotado nesta 10ª Turma, no sentido de que em se tratando de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10/12/1997, entendo que a exigência de laudo técnico para a comprovação das condições adversas de trabalho somente passou a ser exigência legal a partir de 11/12/1997, nos termos da referida lei, que alterou a redação do § 1º do artigo 58 da Lei nº 8.213/91. Neste sentido, precedentes do Superior Tribunal de Justiça: REsp nº 422616/RS, Relator Ministro Jorge Scartezzini, j. 02/03/2004, DJ 24/05/2004, p. 323; REsp nº 421045/SC, Relator Ministro Jorge Scartezzini, j. 06/05/2004, DJ 28/06/2004, p. 382.
Todavia, não se exige que a profissão do segurado seja exatamente uma daquelas descritas nos anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, sendo suficiente para reconhecimento da atividade especial que o trabalhador esteja sujeito, em sua atividade, aos agentes agressivos descritos em referido anexo, na esteira de entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme se verifica dos fragmentos de ementas a seguir transcritos:
"A jurisprudência desta Corte Superior firmou-se no sentido de que o rol de atividades consideradas insalubres, perigosas ou penosas é exemplificativo, pelo que, a ausência do enquadramento da atividade desempenhada não inviabiliza a sua consideração para fins de concessão de aposentadoria." (REsp nº 666479/PB, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, j. 18/11/2004, DJ 01/02/2005, p. 668);
"Apenas para registro, ressalto que o rol de atividades arroladas nos Decretos n.os 53.831/64 e 83.080/79 é exemplificativo, não existindo impedimento em considerar que outras atividades sejam tidas como insalubres, perigosas ou penosas, desde que devidamente comprovadas por laudo pericial." (REsp nº 651516/RJ, Relatora Ministra Laurita Vaz, j. 07/10/2004, DJ 08/11/2004, p. 291).
O artigo 201, § 1º, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, passou a exigir a definição das atividades exercidas sob condições especiais mediante lei complementar, com a ressalva contida no art. 15 da referida EC nº 20/98, no sentido de que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 mantêm a sua vigência até que seja publicada a lei complementar exigida. Assim, dúvidas não há quanto à plena vigência, do artigo 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91, no tocante à possibilidade da conversão do tempo trabalhado em condições especiais em tempo de serviço comum.
A propósito, quanto à plena validade das regras de conversão de tempo de serviço especial em comum, de acordo com o disposto no § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, traz-se à colação trecho de ementa de aresto: "Mantida a redação do § 5º do art. 57 da Lei 8.213/91, em face da superveniência da Lei 9.711 de novembro de 1998 que converteu a MP 1.663/15ª sem acolher abolição da possibilidade de soma de tempo de serviço especial com o comum que a medida provisória pretendia instituir, e ainda persistindo a redação do caput desse mesmo art. 57 tal como veiculada na Lei 9.032/95 (manutenção essa ordenada pelo expressamente no art. 15 da Emenda Constitucional nº 20 de 15.12.98) de modo que o regramento da aposentadoria especial continuou reservado a"lei", não existe respiradouro que dê sobrevida às Ordens de Serviço ns. 600, 612 e 623, bem como a aspectos dos D. 2.782/98 e 3.048/99 (que restringiam âmbito de apreciação de aposentadoria especial), já que se destinavam justamente a disciplinar administrativamente o que acabou rejeitado pelo Poder Legislativo. Art. 28 da Lei 9.711/98 - regra de transição - inválido, posto que rejeitada pelo Congresso Nacional a revogação do § 5º do art. 57 do PBPS." (TRF - 3ª Região; AMS nº 219781/SP, 01/04/2003, Relator Desembargador Federal JOHONSOM DI SALVO, j. 01/04/2003, DJU 24/06/2003, p. 178).
Além disso, conforme se extrai do texto do § 1º do art. 201 da Constituição Federal, o trabalhador que se sujeitou a trabalho em atividades consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física tem direito a obter a inatividade de forma diferenciada.
A presunção da norma é de que o trabalhador que exerceu atividades em condições especiais teve um maior desgaste físico ou teve sua saúde ou integridade submetidas a riscos mais elevados, sendo merecedor da aposentação em tempo inferior àquele que exerceu atividades comuns, com o que se estará dando tratamento equânime aos trabalhadores. Assim, se em algum período de sua vida laboral o trabalhador exerceu alguma atividade classificada como insalubre ou perigosa, porém não durante tempo suficiente para obter aposentadoria especial, esse tempo deverá ser somado ao tempo de serviço comum, com a devida conversão, ou seja, efetuando-se a correspondência com o que equivaleria ao tempo de serviço comum, sob pena de não se fazer prevalecer o ditame constitucional que garante ao trabalhador que exerceu atividades em condições especiais atingir a inatividade em menor tempo de trabalho.
É indubitável que o trabalhador que exerceu atividades perigosas, insalubres ou penosas teve ceifada com maior severidade a sua higidez física do que aquele trabalhador que nunca exerceu atividade em condições especiais, de sorte que suprimir o direito à conversão prevista no § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91 significa restringir o alcance da vontade das normas constitucionais que pretenderam dar tratamento mais favorável àquele que labutou em condições especiais.
Assim, o disposto no § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91 tem por escopo garantir àquele que exerceu atividade laborativa em condições especiais a conversão do respectivo período, o qual, depois de somado ao período de atividade comum, deverá garantir ao segurado direito à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço.
Rejeita-se também à alegação de inexistência de previsão de conversão de atividade especial em comum antes de 1980, eis que tendo o legislador estabelecido na Lei 3.807/60, critérios diferenciados de contagem de tempo de serviço para a concessão de aposentadoria especial ao obreiro que esteve sujeito às condições prejudiciais de trabalho, feriria o princípio da isonomia negar o mesmo tratamento diferenciado àquele que em algum período de sua vida exerceu atividade classificada prejudicial à saúde.
Nesse sentido, decidiu a PRIMEIRA SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça, em sede de Recurso Repetitivo:
"RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL E COMUM. CONVERSÃO . POSSIBILIDADE. ART. 9º, § 4º, DA LEI 5.890/1973, INTRODUZIDO PELA LEI 6.887/1980. CRITÉRIO. LEIAPLICÁVEL. LEGISLAÇÃO VIGENTE QUANDO PREENCHIDOS OS REQUISITOS DA APOSENTADORIA.
1. Trata-se de Recurso Especial interposto pela autarquia previdenciária com intuito de desconsiderar, para fins de conversão entre tempo especial e comum, o período trabalhado antes da Lei 6.887/1980, que introduziu o citado instituto da conversão no cômputo do tempo de serviço .
2. Como pressupostos para a solução da matéria de fundo, destaca-se que o STJ sedimentou o entendimento de que, em regra; a) a configuração do tempo especial é de acordo com a lei vigente no momento do labor, e b) a lei em vigor quando preenchidas as exigências da aposentadoria é a que define o fator de conversão entre as espécies de tempo de serviço. Nesse sentido: REsp 1.151.363/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC.
3. A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço. Na mesma linha: REsp 1.151.652/MG, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, DJe 9.11.2009; REsp 270.551/SP, Rel. Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, DJ 18.03.2002; Resp 28.876/SP, Rel. Ministro Assis Toledo, Quinta Turma, DJ 11.09.1995; AgRg nos EDcl no Ag 1.354.799/PR, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 5.10.2011.
4. No caso concreto, o benefício foi requerido em 24.1.2002, quando vigente a redação original do art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991, que previa a possibilidade de conversão de tempo comum em especial.
5. Recurso Especial não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (REsp 1310034-PR, j.24/10/2012, DJe 19.12.2012, Rel. Min. Herman Benjamin)."
No presente caso, a parte autora demonstrou ter laborado em atividade especial no período de 06/03/1978 a 06/02/2007. É o que comprovam as anotações em CTPS (Num. 90468817 - Pág. 20-43) e perfil profissiográfico previdenciário – PPP (ID. 90468817 - Pág. 46-52), trazendo a conclusão de que a parte autora desenvolveu sua atividade profissional, como atendente de enfermagem, auxiliar de enfermagem e técnico de enfermagem, com exposição ao agente biológico (sangue, secreções, etc). Referida atividade e agentes agressivos são classificados como especiais, conforme os códigos 1.3.2 e 2.1.3 do Decreto nº 53.831/64 e os códigos 1.3.4 e 2.1.3 do Decreto 83.080/1979, em razão da habitual e permanente exposição aos agentes ali descritos.
Além disso, a atividade que envolve agentes biológicos em trabalhos e operações em contato permanente com pacientes em hospitais, serviços de emergência, enfermarias, ambulatórios, postos de vacinação e outros estabelecimentos destinados aos cuidados da saúde humana, é considerada insalubre em grau médio, conforme dispõe o Anexo 14, da NR 15, da Portaria 3214/78.
Ademais, há precedentes jurisprudenciais que consideram como especial a atividade desenvolvida nas dependências de hospitais, em que o trabalhador, durante sua jornada laborativa, esteja exposto de forma habitual e permanente a agentes biológicos nocivos à saúde, ainda que não esteja expressamente mencionada nos anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, conforme se verifica a seguir:
"A jurisprudência desta Corte é no sentido de que ao trabalhador que exerce atividade insalubre, ainda que não inscrita em regulamento mas comprovada por perícia judicial, é devido o benefício de aposentadoria especial."
(STJ; REsp nº 228100/RS, Relator Ministro Jorge Scartezzini, j. 13/11/2000, DJ 05/02/2001, p. 122).
No mesmo sentido:
"Indiscutível a condição especial do exercício das atividades de auxiliar de serviços gerais exercida em hospital, bem como a de maqueiro, por estarem as mesmas enquadradas como insalubres e perigosas, por força dos Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79 e Lei nº 8.213/91, até edição da Lei nº 9.032/95".
(TRF - 5ª Região; AC nº 291613/RN, Relator Juiz Federal Petrucio Ferreira, j. 05/10/2004, DJ 25/11/2004, p. 433).
"Tendo a parte autora logrado comprovar que, no exercício de suas atividades de lavanderia junto ao Hospital de Caridade de Mata, ficava exposto a condições prejudiciais à saúde, de modo habitual e permanente, é de ser considerado especial o período de 2.1.77 a 2.1.87, com a devida conversão pelo fator 1,20."
(TRF - 4ª Região; AC nº 535079/RS, Relator Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, j. 16/12/2003, DJU 11/02/2004, p. 333).
O artigo 58, § 1º, da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei 9.732, de 11/12/1998, dispõe que a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será efetuada nos termos da legislação trabalhista.
O art. 194 da CLT aduz que o fornecimento de Equipamento de Proteção Individual pelo empregador, aprovado pelo órgão competente do Poder Executivo, seu uso adequado e a consequente eliminação do agente insalubre são circunstâncias que tornam inexigível o pagamento do adicional correspondente. Portanto, retira o direito ao reconhecimento da atividade como especial para fins previdenciários.
Por sua vez, o art. 195 da CLT estabelece: A caracterização e a classificação da insalubridade e da periculosidade, segundo as normas do Ministério do Trabalho, far-se-ão através de perícia a cargo do Médico do Trabalho ou Engenheiro do Trabalho, registrado no Ministério do Trabalho.
O Supremo Tribunal Federal, ao analisar o ARE 664.335/SC, em 04/12/2014, publicado no DJe de 12/02/2015, da relatoria do Ministro LUIZ FUX, reconheceu a repercussão geral da questão constitucional nele suscitada e, no mérito, fixou o entendimento de que "o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial. (...) Em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete."
Com relação ao fornecimento de equipamento de proteção individual pelo empregador, aprovado pelo órgão competente do Poder Executivo, seu uso adequado e a consequente eliminação do agente insalubre são circunstâncias que tornam inexigível o pagamento do adicional correspondente e retira o direito ao reconhecimento da atividade como especial para fins previdenciários. E, no caso dos autos, o uso de equipamento de proteção individual, por si só, não descaracteriza a natureza especial da atividade a ser considerada, uma vez que não restou comprovada a eliminação da insalubridade do ambiente de trabalho do segurado. As informações trazidas no PPP não são suficientes para aferir se o uso do equipamento de proteção individual eliminou/neutralizou ou somente reduziu os efeitos do agente insalubre no ambiente de trabalho.
Quanto ao período de 24/03/1976 a 05/03/1978, verifica-se que as funções de servente e copeiro não se enquadram nas categorias profissionais reconhecidas como atividade especial, de acordo com os Decretos nºs 83.080/79 e 53.831/64. Além disso, não se verifica exposição aos agentes nocivos, uma vez que o PPP não traz o nível de ruído a que o segurado esteve submetido. Ademais, destaca-se que para o período referido não consta a assinatura de profissional habilitado, qual seja, médico ou engenheiro do trabalho, sendo subscrito apenas pelo representante legal da empresa, com seu valor probante equivalente ao de um formulário, não dispensando a apresentação de laudo para reconhecimento do caráter especial da atividade por exposição ao agente ruído.
Assim, não há dúvida de que a parte autora tem direito ao reconhecimento do período de 06/03/1978 a 06/02/2007 como labor em condições especiais (insalubre – fator biológico), com a conversão em tempo comum, nos termos da legislação em vigor, adotando-se o fator de conversão de 1,2, de modo a recalcular o valor da renda mensal inicial, observando-se a parcela que ultrapassar o teto vigente à época, para fins de aplicação do disposto no art. 21, §3º, da Lei 8.880/94, por ocasião do primeiro reajuste, a ser calculado em fase de liquidação.
Do termo inicial e da prescrição quinquenal
Quanto ao termo inicial para incidência das diferenças, deve ser fixado a partir da data da entrada do requerimento do benefício (06/02/2007), momento em que o segurado já preenchia os requisitos para o reconhecimento do exercício de atividade especial, conforme documentos acostados aos autos.
Conforme ementa a seguir transcrita, é nesse sentido a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL . REVISÃO DE BENEFÍCIO. AÇÃO TRABALHISTA. DECADÊNCIA. TERMO INICIAL APÓS SENTENÇA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. EFEITOS FINANCEIROS RETROATIVOS À DATA DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. (...) 2. O termo inicial dos efeitos financeiros da revisão deve retroagir à data da concessão do benefício, uma vez que o deferimento da ação revisional representa o reconhecimento tardio de direito já incorporado ao patrimônio jurídico do segurado, não obstante a comprovação posterior do salário de contribuição. 3. Recurso especial provido." (REsp 1637856/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/12/2016, DJe 02/02/2017)
Destaca-se, por sua vez, que a prescrição quinquenal alcança as prestações não pagas e nem reclamadas na época própria, não atingindo o fundo de direito. Dessa forma, a considerar que o benefício de aposentadoria por idade, com data de início em 06/02/2007, conforme Id. 90468817 - Pág. 54, a ausência de requerimento administrativo de revisão e o ajuizamento desta ação apenas em 29/09/2015, verifica-se que estão prescritas as parcelas devidas e não reclamadas no período anterior aos 5 (cinco) anos que precedem ao ajuizamento da ação.
Do dano moral
Por fim, pretende a parte autora, por meio desta demanda, seja o INSS condenado a pagar-lhe indenização por dano moral pelos prejuízos sofridos virtude de suposto erro na concessão de seu benefício previdenciário.
Para a obtenção de indenização, deve-se demonstrar a ocorrência do dano e o nexo de causalidade entre ele e a conduta ilícita - comissiva ou omissiva - do agente.
No caso, não está comprovado o prejuízo sofrido pela parte autora, sequer verificada a conduta ilícita do agente, destacando-se que na análise de toda documentação para a concessão do benefício a valoração é contingência própria das situações em que o direito se mostra controvertido, de maneira que não se pode extrair do contexto conduta irresponsável ou inconsequente do INSS para que lhe possa impor indenização por dano moral.
Enfim, não restou demonstrado que a dúvida quanto ao direito ao benefício não fosse razoável, de sorte que era implícito certo atraso no procedimento de aposentadoria da requerente, não significando isto, por si só, a ocorrência de dano moral.
Dos consectários legais
Dada a sucumbência, honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, §§ 3º e 11, do Novo Código de Processo Civil/2015, e da Súmula 111 do STJ, observando-se que o inciso II do § 4º, do artigo 85, estabelece que, em qualquer das hipóteses do §3º, não sendo líquida a sentença, a definição do percentual somente ocorrerá quando liquidado o julgado.
Por fim, a autarquia previdenciária está isenta do pagamento de custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96, do art. 24-A da Lei nº 9.028/95 (dispositivo acrescentado pela Medida Provisória nº 2.180-35/01) e do art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/93, o que não inclui as despesas processuais. Todavia, a isenção de que goza a autarquia não obsta a obrigação de reembolsar as custas suportadas pela parte autora, quando esta é vencedora na lide. Entretanto, no presente caso, não há falar em custas ou despesas processuais, por ser a autora beneficiária da assistência judiciária gratuita.
A correção monetária e os juros de mora serão aplicados de acordo com o vigente Manual de Cálculos da Justiça Federal, atualmente a Resolução nº 267/2013, observado o julgamento final do RE 870.947/SE em Repercussão Geral.
Dispositivo
Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA para, reconhecendo o labor em condições insalubres, no período de 06/03/1978 a 05/02/2007, convertendo-o em comum, determinar o recálculo do salário-de-benefício, assim como a renda mensal inicial, bem rever os valores da renda mensal do benefício de aposentadoria por idade, por aplicação do art. 21, §3º, da Lei 8.880/94, nos termos da fundamentação adotada.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. REVISÃO. APOSENTADORIA POR IDADE. ATIVIDADE ESPECIAL. ENFERMAGEM. CONVERSÃO. INTERESSE DE AGIR. FATOR PREVIDENCIÁRIO. MAJORAÇÃO. ÍNDICE-TETO. LEI 8.880/94. REAJUSTE. DANO MORAL. NÃO CONFIGURADO. TERMO INICIAL. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA.
- Pretensão versa sobre a revisão da renda mensal da aposentadoria por idade, mediante o reconhecimento do labor no período entre 24/03/1976 e 31/05/2007 como exercido em condições especiais, convertendo-o em tempo comum, com recálculo do fator previdenciário, para alterar os valores obtidos no primeiro reajuste, por força do art. 21, §3º, Lei 8.880/94.
- Quanto ao interesse de agir, verifica-se que, apesar da RMI da aposentadoria por idade ter sido fixada no valor do teto vigente à época, eventual majoração do tempo de contribuição elevaria o fator previdenciário, que no caso em tela é aplicável por ser favorável ao segurado.
- Ao contrário do art. 26, da Lei n. 8.870/94, a recuperação, ainda que parcial, da parcela excedente ao limite máximo do benefício, prevista pela Lei 8.880/94 não encontra limite temporal de aplicação, sendo regra permanente, vigente e aplicável aos benefícios concedidos a partir de março de 1994.
- É firme a jurisprudência no sentido de que a legislação aplicável para a caracterização do denominado trabalho em regime especial é a vigente no período em que a atividade a ser considerada foi efetivamente exercida.
- Para a verificação do tempo de serviço em regime especial, no caso, deve ser levada em conta a disciplina estabelecida pelos Decretos nºs 83.080/79 e 53.831/64.
- Salvo no tocante aos agentes físicos ruído e calor, a exigência de laudo técnico para a comprovação das condições adversas de trabalho somente passou a ser obrigatória a partir de 05/03/1997, data da publicação do Decreto nº 2.172/97, que regulamentou a Lei nº 9.032/95 e a MP 1.523/96, convertida na Lei nº 9.528/97.
- No caso, a parte autora demonstrou ter laborado em atividade especial no período de 06/03/1978 a 06/02/2007. É o que comprovam as anotações em CTPS (Num. 90468817 - Pág. 20-43) e perfil profissiográfico previdenciário – PPP (ID. 90468817 - Pág. 46-52), trazendo a conclusão de que a parte autora desenvolveu sua atividade profissional, como atendente de enfermagem, auxiliar de enfermagem e técnico de enfermagem, com exposição ao agente biológico (sangue, secreções, etc). Referida atividade e agentes agressivos são classificados como especiais, conforme os códigos 1.3.2 e 2.1.3 do Decreto nº 53.831/64 e os códigos 1.3.4 e 2.1.3 do Decreto 83.080/1979, em razão da habitual e permanente exposição aos agentes ali descritos.
- Quanto ao período de 24/03/1976 a 05/03/1978, verifica-se que as funções de servente e copeiro não se enquadram nas categorias profissionais reconhecidas como atividade especial, de acordo com os Decretos nºs 83.080/79 e 53.831/64. Além disso, não se verifica exposição aos agentes nocivos, uma vez que o PPP não traz o nível de ruído a que o segurado esteve submetido. Ademais, destaca-se que para o período referido não consta a assinatura de profissional habilitado, qual seja, médico ou engenheiro do trabalho, sendo subscrito apenas pelo representante legal da empresa, com seu valor probante equivalente ao de um formulário, não dispensando a apresentação de laudo para reconhecimento do caráter especial da atividade por exposição ao agente ruído.
-Assim, não há dúvida de que a parte autora tem direito ao reconhecimento do período de 06/03/1978 a 06/02/2007 como labor em condições especiais (insalubre – fator biológico), com a conversão em tempo comum, nos termos da legislação em vigor, adotando-se o fator de conversão de 1,2, de modo a recalcular o valor da renda mensal inicial, observando-se a parcela que ultrapassar o teto vigente à época, para fins de aplicação do disposto no art. 21, §3º, da Lei 8.880/94, por ocasião do primeiro reajuste, a ser calculado em fase de liquidação.
- Destaca-se, por sua vez, que a prescrição quinquenal alcança as prestações não pagas e nem reclamadas na época própria, não atingindo o fundo de direito. Dessa forma, a considerar que o benefício de aposentadoria por idade, com data de início em 06/02/2007, conforme Id. 90468817 - Pág. 54, a ausência de requerimento administrativo de revisão e o ajuizamento desta ação apenas em 29/09/2015, verifica-se que estão prescritas as parcelas devidas e não reclamadas no período anterior aos 5 (cinco) anos que precedem ao ajuizamento da ação.
- Quanto à indenização por danos morais, no caso, não está comprovado o prejuízo sofrido pela parte autora, sequer verificada a conduta ilícita do agente, destacando-se que na análise de toda documentação para a concessão do benefício a valoração é contingência própria das situações em que o direito se mostra controvertido, de maneira que não se pode extrair do contexto conduta irresponsável ou inconsequente do INSS para que lhe possa impor indenização por dano moral.
- Dada a sucumbência, honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, §§ 3º e 11, do Novo Código de Processo Civil/2015, e da Súmula 111 do STJ, observando-se que o inciso II do § 4º, do artigo 85, estabelece que, em qualquer das hipóteses do §3º, não sendo líquida a sentença, a definição do percentual somente ocorrerá quando liquidado o julgado.
- A correção monetária e os juros de mora serão aplicados de acordo com o vigente Manual de Cálculos da Justiça Federal, atualmente a Resolução nº 267/2013, observado o julgamento final do RE 870.947/SE em Repercussão Geral.
- Apelação da parte autora parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Decima Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento a apelacao da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
