
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007222-77.2021.4.03.6110
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: RINALDO APARECIDO FOGACA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: ARGEMIRO SERENI PEREIRA - SP69183-A, KARINA APARECIDA ALEXANDRE - SP364174-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, RINALDO APARECIDO FOGACA
Advogados do(a) APELADO: ARGEMIRO SERENI PEREIRA - SP69183-A, KARINA APARECIDA ALEXANDRE - SP364174-A
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007222-77.2021.4.03.6110
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: RINALDO APARECIDO FOGACA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: ARGEMIRO SERENI PEREIRA - SP69183-A, KARINA APARECIDA ALEXANDRE - SP364174-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, RINALDO APARECIDO FOGACA
Advogados do(a) APELADO: ARGEMIRO SERENI PEREIRA - SP69183-A, KARINA APARECIDA ALEXANDRE - SP364174-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de conhecimento proposta contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, na qual a parte autora busca o reconhecimento de atividade especial, com vistas à concessão de aposentadoria especial ou, subsidiariamente, aposentadoria por tempo de contribuição
A sentença julgou parcialmente procedentes os pedidos para:
(i) enquadrar como atividade especial os intervalos de 16/10/1986 a 26/4/1994 e de 1º/8/2007 a 10/7/2019;
(ii) determinar a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral, desde a data do requerimento administrativo (DER 26/1/2019), fixados os consectários legais e antecipados os efeitos da tutela jurídica.
Inconformado, o INSS interpôs apelação, na qual arguiu a necessidade de atribuição de efeito suspensivo ao recurso e a ocorrência de prescrição quinquenal.
No mérito propriamente dito, sustentou a impossibilidade de reconhecimento da atividade especial, bem como a inviabilidade da concessão do benefício pleiteado. Alegou, ainda, a necessidade de apresentação de declaração de não acumulação de benefícios, nos termos do artigo 24, §§ 1º e 2º, da Emenda Constitucional (EC) n. 103/2019.
No que se refere aos consectários legais, requereu a fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a isenção do pagamento das custas processuais e a compensação dos valores eventualmente pagos na esfera administrativa ou por força de tutela antecipada.
Ao final, o INSS, prequestionou a matéria para fins recursais, com vistas a possível manejo de recursos aos tribunais superiores.
Igualmente inconformada, a parte autora apresentou recurso de apelação reivindicando o enquadramento do interstício afastado na decisão a quo (de 1º/8/2007 a 11/3/2013) e a concessão da aposentadoria especial. Prequestiona a matéria para fins recursais.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007222-77.2021.4.03.6110
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: RINALDO APARECIDO FOGACA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: ARGEMIRO SERENI PEREIRA - SP69183-A, KARINA APARECIDA ALEXANDRE - SP364174-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, RINALDO APARECIDO FOGACA
Advogados do(a) APELADO: ARGEMIRO SERENI PEREIRA - SP69183-A, KARINA APARECIDA ALEXANDRE - SP364174-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Os recursos preenchem os pressupostos de admissibilidade, razão pela qual devem ser conhecidos.
Na espécie, não incide a norma prevista no artigo 496, § 3º, inciso I, do CPC (remessa necessária), pois o valor da condenação ou o proveito econômico estimado não ultrapassa mil salários mínimos. Prevalece, nesse ponto, a certeza matemática em detrimento da aplicação automática da Súmula n. 490 do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Ademais, não merece acolhida a pretensão do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) de suspensão do cumprimento da decisão por esta relatoria, por não configuradas as circunstâncias dispostas no artigo 995 do Código de Processo Civil (CPC).
Desse modo, rejeito a matéria preliminar arguida pela autarquia,
Nos termos do princípio tantum devolutum quantum appellatum, passo à análise das questões efetivamente impugnadas pelas partes em recurso.
Do Tempo de Serviço Especial
A caracterização da atividade especial deve observar a legislação vigente à época da prestação do serviço. A conversão de tempo especial em comum, por sua vez, é regulada pela norma vigente na data em que o segurado reúne os requisitos para a aposentadoria, conforme entendimento consolidado nos Temas Repetitivos 422 e 546 do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A Emenda Constitucional (EC) n. 103/2019 vedou a conversão de tempo especial para comum a partir de sua vigência (13/11/2019), conforme artigo 25, § 2º, mantendo-se, contudo, o direito à conversão dos períodos anteriores, bem como a possibilidade de concessão de aposentadoria especial com base no artigo 19, § 1º, I.
A evolução normativa sobre a matéria pode ser resumida assim:
a) até 28/4/1995: admissível o enquadramento por categoria profissional (Decretos n. 53.831/1964 e 83.080/1979) ou exposição a agentes nocivos, com exceção de ruído e calor, que exigem prova técnica.
b) de 29/4/1995 a 5/3/1997: necessária comprovação da exposição habitual e permanente a agentes nocivos, sendo suficiente o formulário-padrão (SB-40 ou DSS-8030), salvo para ruído e calor.
c) de 6/3/1997 em diante: exigência de formulário fundado em laudo técnico ou produção de perícia (Decreto n. 2.172/1997).
d) a partir de 1º/1/2004: o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) torna-se documento essencial e substitui os antigos formulários, dispensando o laudo técnico se preenchido corretamente.
Da Fonte de Custeio
A ausência de recolhimento de contribuições adicionais pelo empregador não impede o reconhecimento da atividade especial pelo segurado, conforme os princípios da solidariedade e automaticidade (art. 30, I, da Lei n. 8.212/1991).
Segundo o Supremo Tribunal Federal (STF), os benefícios previstos diretamente na Constituição, como a aposentadoria especial, não estão condicionados à prévia fonte de custeio (art. 195, § 5º, da CF).
Do Agente Nocivo Ruído
Os limites legais de tolerância ao ruído são:
(i) até 5/3/1997: acima de 80 dB;
(ii) de 6/3/1997 a 18/11/2003: acima de 90 dB;
(iii) a partir de 19/11/2003: acima de 85 dB.
Nos termos do Tema Repetitivo 694 do STJ, é inviável a aplicação retroativa do novo limite (85 dB). A comprovação da exposição pode ser feita por PPP ou laudo técnico, sendo válida a metodologia diversa quando constatada a insalubridade.
Do Trabalho Nas Linhas De Produção Da Indústria Têxtil
No que concerne ao enquadramento do exercício de atividades na indústria têxtil, cumpre esclarecer, de início, que o Parecer MT-SSMT n. 85/1978, amplamente utilizado pela jurisprudência para fundamentar o reconhecimento da especialidade, é inexistente, conforme restou afirmado no Tema n. 354 da TNU:
“À míngua da existência do Parecer MT-SSMT nº 085/78, impossível o enquadramento especial da atividade de trabalhador em indústria têxtil exercida até edição da lei 9.032/95, por analogia, em relação aos códigos 2.5.1 do Decreto 53.831/64 e 1.2.11 do Decreto 83.080/79, com esteio tão somente nesse fictício parecer.”
Não obstante, o caso retrata exemplo clássico no qual pode o magistrado se valer das máximas da experiência, pois é notório que os ambientes de produção da indústria têxtil sujeitam os trabalhadores a elevado nível de ruído proveniente das máquinas existentes nas fábricas de fiação e tecelagem.
Nesse sentido é o Parecer da Procuradoria Geral Administrativa - PGA n. 696/1982 no processo do Ministério da Previdência e Assistência Social - MPAS n. 681.150/1982, no qual o procurador desse órgão consignou: “esclarecer preliminarmente que conforme tem sido observado através do resultado de inúmeras perícias técnicas realizadas em decorrência de reclamações trabalhistas, os níveis de ruído nos setores de tecelagem sempre ultrapassam a faixa de 90 decibéis”.
Ademais, a exemplo das constatações reveladas nesse PGA está o laudo pericial da empresa “São Paulo Alpargatas S.A.”, homologado pela Diretoria da Delegacia Regional do Trabalho em São Paulo, em 1º/10/1990, no processo DRT n. 24.440-035.668/1990.
Da mesma forma, há Parecer da Secretaria de Segurança e Medicina do Trabalho (SSMT) do Ministério do Trabalho - MTB n. 100.043/1983 no processo MPAS n. 676.147/1982, que acolheu o pedido de enquadramento do trabalho exercido na produção de indústria têxtil.
Nessa toada, ressalta-se, também, a existência de laudo técnico solicitado pelo “Sindicato dos Mestres e Contramestres e Pessoal de Escritório e Cargos de Chefia na Indústria de Fiação e Tecelagem” (do estado de São Paulo) e realizado na empresa “S/A Têxtil Nova Odessa”, o qual aponta a sujeição a ruído em níveis superiores a 90 decibéis em relação ao trabalho desenvolvido no setor da fiação, o que reforça o reconhecimento da especialidade dessas atividades.
Nesse contexto, independentemente das discussões sobre a existência do Parecer MT-SSMT n. 85/1978, é inegável que o ruído excessivo gerado pelas máquinas de fiação e tecelagem, frequentemente evidenciado em pareceres e laudos técnicos, caracteriza a exposição contínua dos trabalhadores da indústria têxtil a agentes prejudiciais à saúde.
Acerca do tema, destaco o entendimento jurisprudencial firmado nesta Corte Regional (g.n.):
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. CATEGORIA PROFISSIONAL. REEXAME NECESSÁRIO. PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO DO INSS IMPROVIDA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA. 1. Inicialmente, rejeito a preliminar que requer o reconhecimento da remessa oficial, pois, embora a sentença tenha sido desfavorável ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, não se encontra condicionada ao reexame necessário, visto que o artigo 496, § 3º, I, do CPC, afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação for inferior a 1000 (mil) salários-mínimos. A concessão da aposentadoria por tempo de serviço, hoje tempo de contribuição, está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91. A par do tempo de serviço/contribuição, deve também o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos do artigo 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91. 2. A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei nº 3.807/60. Dispõe o artigo 57 da Lei nº 8.213/91 que a aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a Lei. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995). 3. Quanto aos períodos controversos, verifico que de 01/08/1979 a 21/07/1984, de 01/09/1984 a 17/01/1985 e de 07/11/1989 a 08/05/1990, laborados na empresa Bertolazzi & Cia Ltda., na função de Tecelão, assim como aos períodos de 01/07/1978 a 29/06/1979, laborado na empresa Têxtil Silcena LTDA como "espulador"; de 18/01/1985 a 15/01/1987 e de 08/09/1988 a 06/11/1988, laborado na empresa Dollo Têxtil S/A como "tecelão" e "suplente de tecelão", respectivamente; de 01/12/1988 a 26/06/1989, trabalhado na empresa Indústria Têxtil Dahruj S/A como "tecelão"; de 27/06/1989 a 06/11/1989, de 08/05/1990 a 09/04/1991, laborado na empresa Feltrin - Irmãos Cia Ind. Têxtil S/A como "tecelão", faz jus a parte autora ao reconhecimento da atividade especial pela categoria profissional, tendo em vista que a atividade profissional de tecelão pode ser reconhecida como especial pelo critério da categoria profissional, até 28/04/1995 (Lei nº 9.032/1995), por analogia ao código 2.5.1 do anexo ao Decreto nº 53.831/1964 e 1.2.11 do Anexo I do Decreto nº 83.080/1979, em conformidade com a jurisprudência da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU). 4. Computados os períodos ora reconhecidos como especiais, somados aos demais períodos comuns considerados incontroversos até a data do requerimento administrativo (12/07/2017), verifica-se que o autor possui mais de 35 anos, conforme planilha anexa, o que -e suficiente para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, nos termos dos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91. 5. Assim, positivados os requisitos legais, faz jus o autor à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição a partir do requerimento administrativo. 6. Matéria preliminar rejeitada. Apelação do INSS improvida. Apelação da parte autora provida. Sentença mantida em parte.” (TRF3, APELAÇÃO CÍVEL, ApCiv 5000437-95.2019.4.03.6134, Relator: Desembargador Federal TORU YAMAMOTO, 7ª Turma, DJEN DATA: 13/10/2022)
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. INDÚSTRIA TÊXTIL. 1. Para a aposentadoria integral exige-se o tempo mínimo de contribuição (35 anos para homem, e 30 anos para mulher) e será concedida levando-se em conta somente o tempo de serviço, sem exigência de idade ou pedágio, nos termos do Art. 201, § 7º, I, da CF. 2. Até 29/04/95 a comprovação do tempo de serviço laborado em condições especiais era feita mediante o enquadramento da atividade no rol dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79. A partir daquela data até a publicação da Lei 9.528/97, em 10/12/1997, por meio da apresentação de formulário que demonstre a efetiva exposição de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais a saúde ou a integridade física. Após 10/12/1997, tal formulário deve estar fundamentado em laudo técnico das condições ambientais do trabalho, assinado por médico do trabalho ou engenheiro do trabalho. Quanto aos agentes ruído e calor, o laudo pericial sempre foi exigido. 3. Admite-se como especial a atividade exposta a ruídos superiores a 80 decibéis até 05/03/1997, a 90 decibéis no período entre 06/03/1997 e 18/11/2003 e, a partir de então, até os dias atuais, em nível acima de 85 decibéis. (REsp 1398260/PR, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014). 4. A atividade na indústria têxtil se enquadra nos itens 1.2.11 e 2.5.1 do Decreto nº 53.831/64. 5. O uso do equipamento de proteção individual - EPI, pode ser insuficiente para neutralizar completamente a nocividade a que o trabalhador esteja submetido. (STF, ARE 664335/SC, Tribunal Pleno, Relator Ministro Luiz Fux, j. 04/12/2014, DJe-029 DIVULG 11/02/2015 Public 12/02/2015). 6. Possibilidade de conversão de atividade especial em comum, mesmo após 28/05/1998. 7. Preenchidos os requisitos, faz jus a parte autora ao benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição. 8. Aplica-se o disposto no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal no que tange aos índices de correção monetária e taxa de juros de mora. 9. Os honorários advocatícios devem observar as disposições contidas no inciso II, do § 4º, do Art. 85, do CPC, e a Súmula 111, do e. STJ. 10. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93. 11. Remessa oficial, havida como submetida, provida em parte e apelação da autarquia desprovida.” (TRF3, APELAÇÃO CÍVEL, ApCiv 5003925-69.2020.4.03.6119, Relator: Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA, 10ª Turma, Intimação via sistema DATA: 03/10/2022)
Assim, o trabalho na linha de produção de indústria têxtil deve ser enquadrado como especial, em razão da atividade, até 28/4/1995.
Do Equipamento de Proteção Individual - EPI
Segundo deliberação do Supremo Tribunal Federal (STF) no Tema 555 da repercussão geral (ARE n. 664.335), o uso de EPI somente afasta o reconhecimento da especialidade da atividade quando comprovadamente eficaz na neutralização da nocividade. Em havendo dúvida quanto à eficácia ou de exposição a níveis de ruído aos limites de tolerância, deve-se reconhecer a especialidade da atividade, ainda que haja indicação, no PPP, de fornecimento de EPI considerado eficaz.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o Tema Repetitivo n. 1.090, firmou as seguintes teses jurídicas sobre a matéria:
I – A informação constante do PPP acerca da utilização de EPI descaracteriza, em princípio, o tempo especial, ressalvadas as hipóteses excepcionais em que, mesmo diante de proteção comprovada, é reconhecido o direito à contagem diferenciada.
II – Compete à parte autora da ação previdenciária demonstrar:
(i) a inadequação do EPI ao risco da atividade exercida;
(ii) a inexistência ou irregularidade do respectivo certificado de conformidade;
(iii) o descumprimento das normas relativas à manutenção, substituição e higienização do EPI;
(iv) a ausência ou insuficiência de orientação e treinamento quanto ao uso correto, guarda e conservação do equipamento;
(v) ou qualquer outro fator que permita concluir pela ineficácia do EPI.
III – Se a análise probatória revelar dúvida razoável ou divergência quanto à real eficácia do EPI, a conclusão deve ser favorável ao segurado.
Conforme disposto no artigo 291 da Instrução Normativa INSS n. 128/2022, a eficácia do EPI não obsta o reconhecimento de atividade especial exercida até 3/12/1998, data da vigência da Medida Provisória n. 1.729/1998, convertida na Lei n. 9.732/1998, para qualquer agente nocivo.
Em análise aos desdobramentos dos Temas 555 (ARE 664.335) do STF e 1.090 do STJ, é preciso destacar que, em determinadas hipóteses de exposição a agentes nocivos, o uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI) não afasta o reconhecimento da especialidade da atividade, seja por inexistência de EPI eficaz, seja por sua ineficácia prática (inocuidade).
As principais situações são:
(i) Agentes Biológicos:
Não há EPI capaz de neutralizar integralmente o risco de contaminação, dada a natureza invisível e difusa do agente, a possibilidade de falhas humanas ou técnicas no uso dos equipamentos e a exposição ser inerente à função. Por isso, há presunção de ineficácia prática dos EPIs;
(ii) Agentes Cancerígenos (até 2020):
Até a edição da IN n. 128/2022 do INSS, era reconhecida a inexistência de EPI eficaz para agentes reconhecidamente cancerígenos, conforme a Lista Nacional de Doenças Relacionadas ao Trabalho – LINACH (Portaria GM/MS n. 2.309/2022). A jurisprudência reconhecia, até então, a impossibilidade de neutralização total do risco cancerígeno.
(iii) Periculosidade:
O risco decorre da possibilidade de acidente de grandes proporções, sendo de natureza acidental e imprevisível. O EPI não elimina o perigo, apenas pode mitigar danos, razão pela qual não se reconhece eficácia plena do EPI nessas hipóteses.
(iv) Ruído acima dos limites legais:
Conforme decidido nos Temas 555 do STF e 1090 do STJ, o fornecimento de EPI, ainda que eficaz, não descaracteriza a especialidade, pois não há como assegurar neutralização plena dos efeitos do ruído sobre a saúde auditiva do trabalhador.
Do Caso Concreto
Analisados os autos, é possível reconhecer a especialidade dos períodos de:
(i) 16/10/1986 a 26/4/1994 - porque anotação em Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) demonstra o trabalho da parte autora na produção de indústria têxtil (ID 334826542, p. 3), fato que permite o enquadramento com base em pareceres técnicos e jurisprudência citada.
(ii) 1º/8/2007 a 11/3/2013 e de 12/3/2013 a 10/7/2019 - há Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP (ID 334826546, p. 6/9) que demonstra o exercício de atividades com exposição habitual e permanente ao agente nocivo ruído em níveis superiores aos limites de tolerância fixados em lei.
O fato de os registros ambientais terem início em época posterior à data inicial do trabalho não tem o condão de afastar o fator de risco apontado no Perfil Profissiográfico Previdenciário, pois a aferição técnica retrata a situação laboral da parte autora já vivenciada desde o início das atividades.
Com efeito, se no lapso posterior foi constatada a presença de agentes nocivos, é crível que a sujeição à insalubridade no período antecedente, no mesmo setor e empresa, não era menor, dado que o avanço tecnológico e evolução da empresa tendem a melhorar as condições do ambiente de trabalho.
Em síntese, os intervalos supracitados devem ser enquadrados como especiais e somados aos lapsos incontroversos.
Da Aposentadoria Especial
Somados o período enquadrado pelo INSS (de 1º/9/1994 a 26/4/2001) aos intervalos especiais reconhecidos judicialmente, a parte autora conta mais de 25 (vinte e cinco) anos de trabalho em atividade especial até a data do requerimento administrativo (DER 26/1/2019) e, desse modo, faz jus à concessão do benefício de aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 e parágrafos da Lei n. 8.213/1991.
Todavia, deve ser observada a incompatibilidade de continuidade do exercício em atividade especial, sob pena de cessação da aposentadoria especial, na forma do artigo 57, § 8º, da Lei n. 8.213/1991 e nos termos do julgamento do Tema 709 do STF.
Assim, a parte autora tem direito à aposentadoria especial, desde a data do requerimento administrativo (DER 26/1/2019), conforme consignado na sentença e não impugnado no recurso de apelação do INSS.
Demais Questões
Afasto a alegação de prescrição quinquenal, tendo em vista que não transcorreu período superior a cinco anos entre o requerimento administrativo do benefício e o ajuizamento desta ação.
Fica mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante § 2º do artigo 85 do CPC, orientação desta Turma e redação da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça. Considerado o parcial provimento ao recurso interposto pela autarquia, não incide, neste caso, a regra do artigo 85, §§ 1º e 11, do CPC, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal.
Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se o valor da condenação ou do proveito econômico ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (art. 85, § 4º, II, do CPC).
Sobre as custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/1974, 8.620/1993 e 9.289/1996, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/1985 e 11.608/2003. Contudo, essa isenção não a exime do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Os demais consectários não foram objeto de questionamento nas razões recursais, de modo que se mantêm à luz do julgado a quo.
Tendo em vista as disposições da EC n. 103/2019 sobre acumulação de benefícios em regimes de previdência social diversos (§§ 1º e 2º do art. 24), é necessária a apresentação de declaração, nos moldes do Anexo I da Portaria PRES/INSS n. 450/2020, na fase de cumprimento do julgado.
Ademais, possíveis valores não cumulativos com o benefício deferido ou recebidos a mais em razão de tutela provisória deverão ser compensados nesse momento.
No que concerne ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade alguma à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Dispositivo
Diante do exposto:
I – rejeito a matéria preliminar arguida pela autarquia;
II – no mérito, dou parcial provimento ao recurso do INSS e dou provimento à apelação da parte autora para, nos termos da fundamentação supra: (i) também enquadrar como atividade especial o intervalo de 1º/8/2007 a 11/3/2013; (ii) reconhecer o direito do autor e determinar a concessão da aposentadoria especial, com a observância da incompatibilidade de continuidade do exercício em atividade especial, sob pena de cessação do benefício; (iii) ajustar os honorários advocatícios em conformidade com a Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça (STJ); (iv) isentar a autarquia das custas processuais.
Por conseguinte, a tutela provisória anteriormente concedida deve ser readequada.
É o voto.
| Autos: | APELAÇÃO CÍVEL - 5007222-77.2021.4.03.6110 |
| Requerente: | RINALDO APARECIDO FOGACA e outros |
| Requerido: | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e outros |
Ementa: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL OU POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. INDÚSTRIA TÊXTIL E EXPOSIÇÃO A RUÍDO. REQUISITO TEMPORAL PREENCHIDO À APOSENTADORIA ESPECIAL. RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS.
I. CASO EM EXAME
-
Apelações interpostas pelas partes em face da sentença que reconheceu parcialmente o tempo especial e determinou a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição integral desde a data do requerimento administrativo (DER).
-
O INSS impugna o reconhecimento da especialidade, a concessão do benefício e os consectários legais; a parte autora pleiteia a inclusão de intervalo afastado pela sentença e a concessão de aposentadoria especial.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
3. As questões em discussão são:
(i) definir se é possível reconhecer o labor especial nos períodos controvertidos, especialmente em indústria têxtil e em razão de exposição a ruído;
(ii) estabelecer se o uso de EPI afasta o reconhecimento da especialidade;
(iii) determinar se a soma dos períodos permite a concessão da aposentadoria especial;
(iv) fixar os consectários legais, honorários advocatícios, custas processuais e observância da EC n. 103/2019.
III. RAZÕES DE DECIDIR
4. A caracterização do tempo especial obedece à legislação vigente na época da prestação do serviço, sendo possível a conversão até a EC n. 103/2019 (Temas 422 e 546/STJ).
5. O trabalho em linhas de produção da indústria têxtil deve ser reconhecido como especial, até 28/4/1995, diante da notória exposição a níveis elevados de ruído, comprovada por pareceres e laudos técnicos.
6. A exposição a ruído caracteriza atividade especial conforme os limites normativos: 80 dB até 5/3/1997; 90 dB entre 6/3/1997 e 18/11/2003; e 85 dB a partir de 19/11/2003, vedada a retroatividade (Tema 694/STJ).
7. O fornecimento de EPI não descaracteriza, por si só, a especialidade quando houver dúvida quanto à sua eficácia, especialmente em casos de ruído (Tema 555/STF e Tema 1090/STJ).
8. Somados os períodos reconhecidos judicial e administrativamente, a parte autora ultrapassa 25 (vinte e cinco) anos de atividade especial até a DER, fazendo jus à aposentadoria especial (art. 57 da Lei n. 8.213/1991), com a ressalva do artigo 57, § 8º, da mesma lei (Tema 709/STF).
9. A prescrição quinquenal não se aplica, pois não transcorreu prazo superior a cinco anos entre o requerimento administrativo e o ajuizamento da ação.
10. Os honorários advocatícios devem observar a Súmula n. 111 do STJ e o artigo 85 do CPC, sendo cabível redução na execução caso o valor da condenação ultrapasse 200 salários mínimos.
11. O INSS é isento de custas no Estado de São Paulo, mas deve restituí-las em caso de antecipação pela parte autora.
12. Na fase de cumprimento do julgado, exige-se declaração de não acumulação de benefícios (art. 24, §§ 1º e 2º, da EC n. 103/2019).
IV. DISPOSITIVO E TESE
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Matéria preliminar rejeitada. Recursos parcialmente providos.
Tese de julgamento:
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O tempo de serviço especial deve ser reconhecido conforme a legislação vigente na época da prestação da atividade.
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A ausência de recolhimento adicional pelo empregador não impede a concessão da aposentadoria especial.
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O trabalho em linhas de produção da indústria têxtil deve ser considerado especial até 28/4/1995 em razão da exposição a ruído.
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A exposição a ruído caracteriza tempo especial conforme limites legais vigentes em cada período, sem retroatividade.
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O fornecimento de EPI não descaracteriza a especialidade quando não há prova inequívoca de sua eficácia.
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O segurado que comprova mais de 25 (vinte e cinco) anos de atividade especial até a DER tem direito à aposentadoria especial, vedada sua continuidade em atividade nociva após a concessão.
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 195, § 5º; Lei n. 8.212/1991, art. 30, I; Lei n. 8.213/1991, art. 57, §§ 1º e 8º; CPC, arts. 85 e 995; EC n. 103/2019, arts. 19, § 1º, I, 24, §§ 1º e 2º, e 25, § 2º.
Jurisprudência relevante citada: STF, ARE 664.335 (Tema 555, Repercussão Geral); STF, RE 791.961 (Tema 709, Repercussão Geral); STJ, REsp 1.306.113/SC (Tema 694, Repetitivo); STJ, REsp 1.310.034/PR (Temas 422 e 546, Repetitivos); STJ, REsp 1.828.606/SP (Tema 1090, Repetitivo); TNU, Tema 354.
ACÓRDÃO
Desembargadora Federal
