
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5037036-73.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA ISABEL RAMOS DE ALMEIDA DOS SANTOS
Advogados do(a) APELADO: DANILO LEANDRO TEIXEIRA TREVISAN - SP331300-N, ISIS DE OLIVEIRA MUNARIN - SP378633-N
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5037036-73.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA ISABEL RAMOS DE ALMEIDA DOS SANTOS
Advogados do(a) APELADO: DANILO LEANDRO TEIXEIRA TREVISAN - SP331300-N, ISIS DE OLIVEIRA MUNARIN - SP378633-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator):
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo INSS em face da sentença que julgou parcialmente procedente a pretensão inicial nos seguintes termos:
“(...) Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado por MARIA ISABEL RAMOS DE ALMEIDA DOS SANTOS em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, para declarar o tempo de atividade rural sem registro em CTPS de 05 de janeiro 1979 a 07 de março de 1988 e, em consequência, condeno o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL a averbar o período de tempo de atividade rural acima mencionado, como válidos para todos os fins previdenciários, inclusive carência e aposentadoria, bem como a conceder ao autor a aposentadoria integral por tempo de contribuição, eis que atinge o lapsotemporal exigido pela lei, a partir da data da citação, calculado o valor do benefício de acordo com a lei. As prestações em atraso serão pagas de uma só vez, acrescidas de correção monetária a partir da data em que o autor deveria recebê-las, e os juros de mora devem ser conforme a Lei nº 11.960/09, obedecendo-se os índices oficiais da caderneta de poupança, considerando da data da citação. A correção monetária e os juros de mora adotados na r. sentença ficam mantidos até 25.03.2015, observando-se, após, a correção monetária pelo IPCA-E, e juros de mora de acordo com os índices da caderneta de poupança (Leis 11.960/09 e 12.703/2012 0,5% ao mês enquanto a meta da taxa SELIC ao ano for superior a 8,5%; ou 70% da meta da taxa SELIC ao ano, mensalizada, enquanto a meta da taxa SELIC ao ano for igual ou inferior a 8,5%), tudo em conformidade com a modulação dos efeitos da inconstitucionalidade parcial da EC nº 62/09, realizada em 25.03.2015 pelo Eg. STF em relação aos precatórios, cujos critérios devem ser aplicados desde logo para evitar aplicações de índices diversos com a mesma finalidade, mantendose a unicidade do cálculo. Julgo extinto o processo, com apreciação do mérito, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Condeno o réu ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da condenação. Sem condenação de custas, por ser
autarquia federal.
Indefiro o pedido de tutela antecipada do direito, uma vez que não estão presentes os requisitos legais para a concessão.
Com o trânsito em julgado, oficie-se ao INSS para proceder a implantação definitiva do benefício concedido nos autos, encaminhando-se por mensagem eletrônica para maior celeridade. Comunicada a implantação, intime-se o INSS para a apresentação de cálculo no prazo de 45 dias.
P.I.C. ”.
Apelação do INSS em que alega que a parte autora não preencheu os requisitos legais autorizadores da concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, haja vista a ausência de início de prova material acerca do período rural reconhecido na sentença (ID 253608564).
Sem contrarrazões (certidão de ID 253608568).
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5037036-73.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA ISABEL RAMOS DE ALMEIDA DOS SANTOS
Advogados do(a) APELADO: DANILO LEANDRO TEIXEIRA TREVISAN - SP331300-N, ISIS DE OLIVEIRA MUNARIN - SP378633-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator):
Formalmente regular, recebo o recurso (CPC, art. 1.011).
*** Aposentadoria por tempo de contribuição ***
A concessão da aposentadoria por tempo de serviço, hoje tempo de contribuição, está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei Federal nº. 8.213/91.
A par do tempo de serviço/contribuição, deve também o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos do artigo 25, inciso II, da Lei Federal nº 8.213/91. Aos já filiados quando do advento da mencionada lei, vige a tabela de seu artigo 142 (norma de transição), em que, para cada ano de implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de meses de contribuição inferior aos 180 (cento e oitenta) exigidos pela regra permanente do citado artigo 25, inciso II.
Para aqueles que implementaram os requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de serviço até a data de publicação da EC nº 20/98 (16/12/1998), fica assegurada a percepção do benefício, na forma integral ou proporcional, conforme o caso, com base nas regras anteriores ao referido diploma legal.
Por sua vez, para os segurados já filiados à Previdência Social, mas que não tinham implementado os requisitos para a percepção da aposentadoria por tempo de serviço antes da sua entrada em vigor, a EC nº 20/98 impôs as condições constantes do seu artigo 9º, incisos I e II.
Ressalte-se, contudo, que as regras de transição previstas no artigo 9º, incisos I e II, da EC nº 20/98, aplicam-se somente para a aposentadoria proporcional por tempo de serviço, e não para a integral, uma vez que tais requisitos não foram previstos nas regras permanentes para obtenção do referido benefício.
Desse modo, caso o segurado complete o tempo suficiente para a percepção da aposentadoria na forma integral, faz jus ao benefício independentemente de cumprimento do requisito etário e do período adicional de contribuição previstos no artigo 9º da EC nº 20/98.
Por sua vez, para aqueles filiados à Previdência Social após a EC nº 20/98, não há mais possibilidade de percepção da aposentadoria proporcional, mas apenas na forma integral, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e de 30 (trinta) anos, para as mulheres.
Portanto, atualmente vigoram as seguintes regras para a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição:
Segurados filiados à Previdência Social antes da EC nº 20/98:
a) têm direito à aposentadoria (integral ou proporcional), calculada com base nas regras anteriores à EC nº 20/98, desde que cumprida a carência do artigo 25 c/c 142 da Lei Federal nº 8.213/91, e o tempo de serviço/contribuição dos artigos 52 e 53 da Lei Federal nº 8.213/91 até 16/12/1998;
b) têm direito à aposentadoria proporcional, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que cumprida a carência do artigo 25 c/c 142 da Lei Federal nº 8.213/91, o tempo de serviço/contribuição dos artigos 52 e 53 da Lei Federal nº 8.213/91, além dos requisitos adicionais do art. 9º da EC nº 20/98 (idade mínima e período adicional de contribuição de 40%);
c) têm direito à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e de 30 (trinta) anos, para as mulheres.
Segurados filiados à Previdência Social após a EC nº 20/98:
-
têm direito somente à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e 30 (trinta) anos, para as mulheres.
***Aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência***
A Constituição Federal, art. 201, §1º, veda, em regra, a adoção de requisitos ou de critérios diferenciados para a concessão de benefícios. Entretanto, no mesmo dispositivo, ressalva-se a possibilidade de, nos termos de lei complementar, conceder aposentadoria com possibilidade de previsão de idade e tempo de contribuição distintos, aos segurados com deficiência, previamente submetidos à avaliação biopsicossocial realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar.
Assim, foi editada a Lei Complementar 142, de 08 de maio de 2013, que determina:
Art. 1o Esta Lei Complementar regulamenta a concessão de aposentadoria da pessoa com deficiência segurada do Regime Geral de Previdência Social - RGPS de que trata o § 1o do art. 201 da Constituição Federal.
Art. 2o Para o reconhecimento do direito à aposentadoria de que trata esta Lei Complementar, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Art. 3o É assegurada a concessão de aposentadoria pelo RGPS ao segurado com deficiência, observadas as seguintes condições:
I - aos 25 (vinte e cinco) anos de tempo de contribuição, se homem, e 20 (vinte) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência grave;
II - aos 29 (vinte e nove) anos de tempo de contribuição, se homem, e 24 (vinte e quatro) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência moderada;
III - aos 33 (trinta e três) anos de tempo de contribuição, se homem, e 28 (vinte e oito) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência leve;
Como garantia da efetividade dos dispositivos acima mencionados, o Decreto 3.048/99 regulamenta o benefício em análise, impondo que a redução do tempo de contribuição da pessoa com deficiência não poderá ser acumulada, no mesmo período contributivo, com a redução aplicada aos períodos de contribuição relativos a atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física
Por fim, permite-se a conversão do tempo de contribuição cumprido em condições especiais para a obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência (artigo 70-F, parágrafo 1º).
*** Tempo de labor rural ***
Os Tribunais Pátrios possuem entendimento remansoso que para a comprovação do exercício de atividade para fins previdenciários, pressupõe do “início de prova material”, que não necessita de demonstração exaustiva ou cabal, mas de um mero “ponto de partida” que forneça ao Juiz, meios de seu convencimento.
O art. 55, § 3º, da Lei Federal nº 8.213 estatui que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido, a Súmula nº 149 do Superior Tribunal de Justiça: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Acresça-se que, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmada em regime de julgamentos repetitivos, deve-se provar o exercício da atividade rural em momento imediatamente anterior ao implemento do requisito etário (1ª Seção, REsp nº 1.354.908/SP, Rel., j. 09/09/2015, DJe: 10/02/2016, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES).
Não se exige a presença de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer. Assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com efetivo potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse entendimento prevalece nesta C. 7ª Turma e no STJ, destacando-se:
"AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL. REQUISITOS NÃO DEMONSTRADOS.
(...)
3. Não se exige que a prova material se estenda por todo o período de carência, mas é imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em que foi constituído o documento. (...)".
(TRF-3, 7ª Turma, APELREEX 0008835-06.2015.4.03.9999, j. 30/11/2015, DJe: 07/12/2015, Rel. Des. Fed. PAULO DOMINGUES).
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DE TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ALTERAÇÃO DO JULGADO. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
(...)
2) não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de carência estabelecido pelo artigo 143 da Lei 8.213/1991, desde que a prova testemunhal amplie sua eficácia probatória. (...)".
(STJ, 2ª Turma, AgRg no AREsp 547.042/SP, j. 23/09/2014, DJe: 30/09/2014, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES).
No que diz respeito ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos seguintes termos:
"Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(...)
VII - como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade:
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;
2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do caput do art. 2º da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal meio de vida;
b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida; e
c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo.
§1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes."
Nesse campo, é oportuno consignar que “(...) consoante entendimento desta Eg. Sétima Turma, admite-se aextensãodaqualificaçãode lavrador em documento de terceiro- familiarpróximo - quando se tratar de agricultura de subsistência, em regime deeconomia familiar” (TRF-3, 7ª Turma, ApCiv. 5140577-93.2020.4.03.9999, Dje 01/07/2020, Rel. Des. Fed. INÊS VIRGÍNIA).
Segundo jurisprudência pacífica, é dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, destacando-se os seguintes precedentes:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CÔMPUTO DE TEMPO RURAL ANTERIOR À LEI 8.213/1991. DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DO TRIBUTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS PARA SANAR OMISSÃO SEM EFEITO MODIFICATIVO.
(...)
2. No presente caso, impõe-se sanar omissão para asseverar que a jurisprudência do STJ possui entendimento no sentido de que é dispensável o recolhimento de contribuições previdenciárias, para fins de reconhecimento de tempo de serviço rural, quanto ao labor exercido antes da Lei 8.213/1991. (...)".
(STJ, 2ª Turma, EDcl no AgRg no REsp 1537424/SC, j. 27/10/2015, DJe: 05/11/2015, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES).
"AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. ARTIGO 485, V, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 55, § 2º, DA LEI N. 8.213/91. OCORRÊNCIA. SEGURADA VINCULADA AO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL-RGPS. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. APOSENTADORIA. CONTRIBUIÇÕES. DESNECESSIDADE. ANTES DA VIGÊNCIA DA REFERIDA LEI. PRECEDENTES. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
1. A autora sempre esteve vinculada ao Regime Geral de Previdência Social.
2. Não é exigível o recolhimento das contribuições previdenciárias, relativas ao tempo de serviço prestado como trabalhador rural, antes da vigência da Lei n 8.213/91, para fins de aposentadoria urbana pelo Regime Geral de Previdência Social. Precedentes da Terceira Seção. Ação rescisória procedente".
(STJ, 3ª Seção, AR 3.650/RS, j. 11/11/2015, DJe: 04/12/2015, Rel. Des. Convoc. ERICSON MARANHO).
"APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR A PROVA DOCUMENTAL.
1. O tempo de serviço do segurado trabalhador rural exercido antes da data de início de vigência da Lei nº 8.213/1991, é de ser computado e averbado, independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, mas não se presta para efeito de carência. (...)".
(TRF-3, 7ª Turma, AC nº 0029462-51.2003.4.03.9999, j. 30/11/2015, DJe: 03/12/2015, Rel. Des. Fed. FAUSTO DE SANCTIS).
*** Caso concreto ***
No caso concreto, o período controvertido nos autos em sede recursal é o tempo de atividade rural sem registro em CTPS de 05 de janeiro 1979 a 07 de março de 1988, na condição de trabalhador rural conforme recurso do INSS.
Para comprovar o exercício de atividade rural, juntou os seguintes documentos, os quais passo a examinar:
-
CTPS e CNIS da parte autora;
-
Certidão de Nascimento da autora, constando o seu genitor como lavrador (ID 253608503);
-
Declaração de Juvêncio Rodrigues da Silva de que a autora exerceu labor rural “no plantio e colheitas de abóbora, melancia e milho verde e outros no período de safras de 14/07/1983 a 25/02/1984” (ID 253608504), imóvel rural cuja matrícula em nome do declarante foi acostada no ID 253608510;
-
Declaração de exercício de atividade rural n. 71/2018 feita pela segurada perante o Sindicato dos Empregados rurais de Tupã e Região no período de safras de 14/07/1983 a 25/02/1984 e declarações escolares (ID 253608505, ID 253608506, ID 253608507);
-
Notas fiscais do produtor em nome do genitor da autora dos anos de 1979, 1980 e 1982, Recibo de entrega de declaração de rendimentos – imposto de renda de pessoa física – dos ano-exercício de 1975 de seu genitor e Declaração de cadastro de parceiro ou arrendatário rural do genitor da autora perante o Incra (ID 253608508).
As declarações escolares referentes aos filhos da autora não constituem início de prova material, pois não fazem menção ao exercício de atividade rural pela parte autora ou familiares próximos.
Por outro lado, a certidão de casamento em que consignado a profissão de agricultor ou lavrador da parte ou de um cônjuge tem sido admitida como início de prova documental do exercício do labor rural por parte do outro cônjuge, exatamente na linha do entendimento jurisprudencial consolidado.
As certidões de nascimento constituem início de prova material da atividade rural se nelas estiver consignado a profissão de agricultor ou lavrador dos pais.
O Superior Tribunal de Justiça tem adotado tal entendimento, embora não seja ainda pacificado. Nesses termos, cito o seguinte precedente:
..EMEN: PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. SALÁRIO MATERNIDADE. DEMONSTRAÇÃO DO TRABALHO NO CAMPO. DOCUMENTOS EM NOME PAIS DA AUTORA. VÍNCULO URBANO DE UM DOS MEMBROS DA UNIDADE FAMILIAR QUE NÃO DESCARACTERIZA A CONDIÇÃO DE RURÍCOLA DOS DEMAIS. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. 1. A concessão de salário-maternidade rural, benefício previdenciário previsto no art. 71 da Lei 8213/91, exige que a trabalhadora demonstre o exercício de atividade laboral no campo, por início de prova material, desde que ampliado por prova testemunhal, nos dez meses imediatamente anteriores ao do início do benefício, mesmo que de forma descontínua. 2. Para esse fim, são aceitos, como início de prova material, os documentos em nome dos pais da autora que os qualificam como lavradores, aliados à robusta prova testemunhal. De outro lado, o posterior exercício de atividade urbana por um dos membros da família, por si só, não descaracteriza a autora como segurada especial, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar (REsp 1.304.479/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 19/12/2012, recurso submetido ao rito do art. 543-C do CPC) . 3. No caso dos autos, o juízo de origem, ao examinar o contexto fático-probatório dos autos, concluiu que ficou amplamente demonstrado o labor rural da segurada. Assim, a averiguação de que não existe regime de economia familiar em virtude de vínculo urbano mantido por um dos membros da unidade familiar, esbarra no óbice da Súmula 7/STJ ("A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial"). 4. Agravo regimental a que se nega provimento. ..EMEN:” (destacamos) (STJ; AGARESP 201302054031 AGARESP - AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – 363462; Relator(a) SÉRGIO KUKINA; Órgão julgador PRIMEIRA TURMA; Fonte DJE DATA:04/02/2014).
Quanto à declaração emitida perante o Incra, é evidente que somente a pessoa vocacionada para o trabalho rural e que normalmente já se encontra acampada (aguardando a concessão da gleba rural) é que pode ser depois contemplada com um lote de terras nos tantos projetos de assentamento promovidos pelo INCRA. Assim, a certidão do INCRA serve como início de prova documental do trabalho rural ainda na condição de boia fria e prova plena da atividade rural já na condição de assentada por todo período equivalente ao da carência exigida.
Desse modo, entendo que os documentos apresentados constituem início de prova material relativamente ao período controvertido. No caso em tela a parte autora juntou documentação suficiente como início razoável de prova material da atividade campesina, não refutada categoricamente pelo INSS em sede recursal. Ademais, o Colendo STJ e os Tribunais Regionais Federais possuem entendimento unânime de que os documentos encartados nos presentes autos configuram início razoável de prova material da atividade de rurícola, em atenção à solução pro misero.
Os depoimentos das testemunhas, com efetivo potencial para ampliar a eficácia probatória da prova documental, confirmaram o exercício de atividade rural pelo requerente.
A r. sentença atacada enfrentou bem as questões postas, motivando e fundamentando as suas razões de decidir, razão pela qual merece ser mantida, nos termos da fundamentação que ora transcrevo:
“(...) O pedido é procedente.
Com efeito, demonstrou a autora que, no período alegado na inicial, qual seja, 05 de janeiro 1979 a 07 de março de 1988, exerceu atividade rural em regime de economia familiar. A documentação acostada aos autos representa início de prova documental, que foi corroborada pela prova oral. Vejamos:
Nivaldo Ananias da Silva, a fls. 141/142, disse que conhece a autora desde criança. Aduziu que a autora trabalhava com a família, na lavoura de café e também trabalhou como diarista em várias propriedades. Informou que a autora trabalhava na roça de segunda a sexta feira. Presenciava a autora no labor rural, já que trabalharam juntas. Narrou que que trabalhou com a autora de diarista de 1972 a 1988.
Maurisvaldo Rodrigues da Silva, a fls. 139/140, disse que conhece a autora desde 1981 e ela já trabalhava como boia fria na Fazenda Curva e outras propriedades da região. Informou que a autora trabalhava de segunda a sábado. Aduziu que trabalhava com a autora na roça. Relatou que a autora permaneceu no labor rural até 1988.
Assim, cumpridamente demonstrado o exercício da atividade rural mencionado na inicial, até que viesse a trabalhar com registro em carteira de trabalho.
É possível o reconhecimento do labor rural a partir dos 12 anos de idade.
A lei é inequívoca ao permitir que o período laborado em atividade rural, antes do início de sua vigência, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondente.
Reconhecido o período de labor rural de 05 de janeiro 1979 a 07 de março de 1988, resta analisar se a autora faz jus à aposentadoria por tempo de contribuição.
Conclui se que a autora cumpriu o período de carência.
Computando-se o período rural acima reconhecido àquele constante no CNIS de fls. 89/100, há que se concluir que atinge o lapso temporal superior a 30 anos, a partir da citação, tempo este exigido pela lei para concessão da aposentadoria integral por tempo de contribuição.
Em consequência, procede o pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
O termo inicial do benefício, ora concedido, é devido a partir da data da citação, qual seja, 19 de setembro de 2019 (...)”.
Sendo assim, encampo os fundamentos da sentença como razões de decidir. Convém realçar que o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, em reiteradas decisões, entendem satisfeita a exigênciaconstitucional da fundamentação das decisões judiciaisquando os juízes se utilizam da motivação referenciada ou “per relationem”, vale dizer, quando a decisãojudicial faz remissão a outras manifestações ou peças processuais existentes nos autos. Conferir os seguintes julgados do STF: ARE-AgR - AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO, 2ª Turma, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, por unanimidade, Sessão Virtual de 6.9.2019 a 12.9.2019; HC-AgR - AG.REG. NO HABEAS CORPUS, 1ª Turma, Sessão Virtual de 29.5.2020 a 5.6.2020, Relatora Ministra Rosa Weber. Nesse mesmo sentido: STJ, REsp 1.206.805/PR, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 21/10/2014, DJe 7/11/2014; STJ, AgInt nos EDcl no AREsp 1067603/RS, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/05/2018, DJe 25/05/2018.
No mais, anoto ser suficiente que sejam expostas as razões de decidir do julgador, para que se dê por completa e acabada a prestação jurisdicional, não havendo a necessidade de expressa referência a todo e qualquer dispositivo legal mencionado, a título de prequestionamento. Assim, não vislumbro dos argumentos deduzidos no processo qualquer outro fundamento relevante capaz de, em tese, infirmar a conclusão ora adotada.
Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do RE 870947, até a edição da EC 113/2021, a partir de quando será aplicada exclusivamente a taxa Selic.
O INSS é isento de custas processuais, arcando com as demais despesas, inclusive honorários periciais (Res. CJF nºs. 541 e 558/2007), além de reembolsar custas recolhidas pela parte contrária, o que não é o caso dos autos, ante a gratuidade processual concedida (art. 4º, I e parágrafo único, da Lei 9.289/1996, art. 24-A da Lei 9.028/1995, n.r., e art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/1993).
Considerado o trabalho adicional realizado pelos advogados, em decorrência da interposição de recurso, majoro os honorários advocatícios em 1% (um por cento), sobre o valor arbitrado na sentença, nos termos do artigo 85, §11, do Código de Processo Civil.
Com essas considerações, nego provimento ao recurso do INSS e mantenho a sentença tal como fora proferida.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. TRABALHO RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. REQUISITOS CUMPRIDOS. BENEFÍCIO CONCEDIDO.
1. A concessão da aposentadoria por tempo de serviço, hoje tempo de contribuição, está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei Federal nº 8.213/91. A par do tempo de serviço/contribuição, deve também o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos do artigo 25, inciso II, da Lei Federal nº 8.213/91.
2. A Constituição Federal, art. 201, §1º, veda, em regra, a adoção de requisitos ou de critérios diferenciados para a concessão de benefícios. Entretanto, no mesmo dispositivo, ressalva-se a possibilidade de, nos termos de lei complementar, conceder aposentadoria com possibilidade de previsão de idade e tempo de contribuição distintos, aos segurados com deficiência, previamente submetidos à avaliação biopsicossocial realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar.
3. Como garantia da efetividade dos dispositivos acima mencionados, o Decreto 3.048/99 regulamenta o benefício em análise, impondo que a redução do tempo de contribuição da pessoa com deficiência não poderá ser acumulada, no mesmo período contributivo, com a redução aplicada aos períodos de contribuição relativos a atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física
4. Por fim, permite-se a conversão do tempo de contribuição cumprido em condições especiais para a obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência (artigo 70-F, parágrafo 1º).
5. O art. 55, § 3º, da Lei Federal nº 8.213 estatui que a comprovação do tempo de serviço rural somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido, a Súmula nº 149 do Superior Tribunal de Justiça.
6. No caso concreto, o período controvertido nos autos em sede recursal é o tempo de atividade rural sem registro em CTPS de 05 de janeiro 1979 a 07 de março de 1988, na condição de trabalhador rural conforme recurso do INSS.
7. Para comprovar o exercício de atividade rural, juntou documentos que constituem início de prova material relativamente ao período controvertido.
8. Os depoimentos das testemunhas, com efetivo potencial para ampliar a eficácia probatória da prova documental, confirmaram o exercício de atividade rural pelo requerente.
9. Computando-se os períodos de atividade rural e os períodos de atividade comum urbana presentes no CNIS, até a data do requerimento administrativo verifica-se que a parte autora faz jus à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, conforme constante na sentença.
10. Considerando que toda a documentação foi apresentada em sede administrativa e que foram cumpridos os requisitos legais, faz jus a parte autora à concessão do benefício desde citação, momento em que o INSS ficou ciente da pretensão.
11. Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do RE 870947, até a edição da EC 113/2021, a partir de quando será aplicada exclusivamente a taxa Selic.
12. O INSS é isento de custas processuais, arcando com as demais despesas, inclusive honorários periciais (Res. CJF nºs. 541 e 558/2007), além de reembolsar custas recolhidas pela parte contrária, o que não é o caso dos autos, ante a gratuidade processual concedida (art. 4º, I e parágrafo único, da Lei 9.289/1996, art. 24-A da Lei 9.028/1995, n.r., e art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/1993).
13. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 1% do valor arbitrado na sentença. Artigo 85, § 11, Código de Processo Civil. Exigibilidade suspensa em razão de gratuidade de justiça.
14. Apelação do INSS não provida.
