Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0007156-66.2013.4.03.6110
Relator(a)
Desembargador Federal VALDECI DOS SANTOS
Órgão Julgador
1ª Turma
Data do Julgamento
23/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 29/11/2021
Ementa
E M E N T A
APELAÇÃO. CIVIL. CONTRATOS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM FOLHA DE
PAGAMENTO. FALECIMENTO DO MUTUÁRIO CONSIGNANTE. EXTINÇÃO DA DÍVIDA.
INOCORRÊNCIA. APELO PROVIDO.
1. O cerne da discussão no presente feito é relativo à exigibilidade de dívida oriunda de
empréstimo consignado em folha de pagamento, na hipótese de morte do mutuário consignante.
2. O E. Superior Tribunal de Justiça entendeu pela "ab-rogação tácita ou indireta da Lei 1.046/50
pela Lei 8.112/90, pois esta tratou, inteiramente, da matéria contida naquela, afastando, em
consequência, a sua vigência no ordenamento jurídico" (REsp 1.498.200, Rel. Min. Nancy
Andrighi, Terceira Turma, DJe: 07/06/2018). E, por sua vez, a Lei nº 8.112/90 não previu a
extinção da dívida pela morte do mutuário-consignante.
3. Neste mesmo sentido, a Lei nº 10.820, de 17 de dezembro de 2003, que trata da consignação
em folha de pagamento dos empregados celetistas e dos beneficiários do Regime Geral da
Previdência Social (RGPS), também não prevê a morte do consignante como causa de extinção
da dívida.
4. OE. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.753.135/PR, de relatoria da
Ministra Nancy Andrighi, fixou o entendimento de que - seja pela Lei nº 8.112/90, seja pela Lei nº
10.820/90 - o ordenamento jurídico não mais prevê a possibilidade de extinção da dívida
contraída pelo consignante em caso de sua morte, sujeitando-se o pagamento às disposições do
Código Civil sobre a sucessão: "8. Malgrado a condição da consignante - se servidora pública
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
estatutária ou empregada celetista; se ativa ou inativa - não tenha sido considerada no
julgamento dos embargos à execução opostos pelos recorrentes, tal fato não impede o
julgamento deste recurso especial, porquanto, sob qualquer ângulo que se analise a controvérsia,
a conclusão é uma só: o art. 16 da Lei 1.046/50, que previa a extinção da dívida em virtude do
falecimento do consignante, não está mais em vigor, e seu texto não foi reproduzido na legislação
vigente sobre o tema. 9. No particular, a morte da consignante não extingue a dívida por ela
contraída mediante consignação em folha, mas implica o pagamento por seu espólio ou, se já
realizada a partilha, por seus herdeiros, sempre nos limites da herança transmitida (art. 1.997 do
CC/02)." (REsp 1753135/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em
13/11/2018, DJe 22/11/2018).
5. A dívida decorrente do contrato de crédito consignado extingue-se com o óbito do mutuário
apenas na hipótese do contrato prever a cobertura securitária, o que não ocorreu no caso dos
autos, pois o contrato acostado não contém qualquer indício de contratação do seguro em
comento, e nem qualquer outro documento trata do assunto.
6. Não havendo extinção pela morte do consignante no presente caso, a dívida transmite-se aos
sucessores, desde que nos limites da herança a eles transmitida.
7. Apelação a que se dáprovimento.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0007156-66.2013.4.03.6110
RELATOR:Gab. 01 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS
APELANTE: CAIXA ECONOMICA FEDERAL
APELADO: DEBORA ALMEIDA DE CAMARGO
Advogados do(a) APELADO: ELIANA GUITTI - SP171224-A, VITOR HENRIQUE DUARTE -
SP254602-A, SHEILA MOREIRA BELLO XAVIER - SP295962-A, THAIS SEAWRIGHT DE
ANDRADE - SP273755-A
OUTROS PARTICIPANTES:
SUCEDIDO: PAULO ROBERTO PINHEIRO CAMARGO
ADVOGADO do(a) SUCEDIDO: ELIANA GUITTI - SP171224-A
ADVOGADO do(a) SUCEDIDO: VITOR HENRIQUE DUARTE - SP254602-A
ADVOGADO do(a) SUCEDIDO: SHEILA MOREIRA BELLO XAVIER - SP295962-A
ADVOGADO do(a) SUCEDIDO: THAIS SEAWRIGHT DE ANDRADE - SP273755-A
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região1ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0007156-66.2013.4.03.6110
RELATOR:Gab. 01 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS
APELANTE: CAIXA ECONOMICA FEDERAL
APELADO: DEBORA ALMEIDA DE CAMARGO
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SP254602-A, SHEILA MOREIRA BELLO XAVIER - SP295962-A, THAIS SEAWRIGHT DE
ANDRADE - SP273755-A
OUTROS PARTICIPANTES
SUCEDIDO: PAULO ROBERTO PINHEIRO CAMARGO
ADVOGADO do(a) SUCEDIDO: ELIANA GUITTI - SP171224-A
ADVOGADO do(a) SUCEDIDO: VITOR HENRIQUE DUARTE - SP254602-A
ADVOGADO do(a) SUCEDIDO: SHEILA MOREIRA BELLO XAVIER - SP295962-A
ADVOGADO do(a) SUCEDIDO: THAIS SEAWRIGHT DE ANDRADE - SP273755-A
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta contra sentença que acolheu os embargos à monitória para
declarar extinta a dívida cobrada, desde a data do falecimento do contratante PAULO
ROBERTO PINHEIRO CAMARGO, e, por conseguinte, extinguir o processo, com análise do
mérito, julgando improcedente o pedido (art. 487, I, do CPC) formulado pela CEF. Custas e
honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa,
com fundamento no art. 85, § 2º do CPC, pela CEF.
CAIXA ECONÔMICA FEDERAL ajuizou demanda monitória em face de PAULO ROBERTO
PINHEIRO CAMARGO, fundamentada no contrato bancário n. 25.0356.110.0760050-17,
modalidade EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.
Em razões de apelação, a CEF sustenta, em síntese, que a sentença está fundamentada no art.
16 da Lei 1.046/50, segundo o qual a dívida de empréstimo feito mediante simples garantia da
consignação em folha extingue-se com a morte do contratante. Aduz que a posterior Lei
10.820/03 não tratou das hipóteses de morte do contratante e, na verdade, versa sobre
situações distintas daquelas anteriormente previstas pela Lei 1.046/50, revogando-a. Diante
disso, independentemente da condição do consignante (estatutário ou celetista – este segundo
revogado pela Lei 8.112/90), concluiu-se que o artigo 16 da Lei 1.046/50, que previa a extinção
da dívida em caso de morte do consignante, não está mais em vigor, pois encontra-se revogado
por leis posteriores.
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0007156-66.2013.4.03.6110
RELATOR:Gab. 01 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS
APELANTE: CAIXA ECONOMICA FEDERAL
APELADO: DEBORA ALMEIDA DE CAMARGO
Advogados do(a) APELADO: ELIANA GUITTI - SP171224-A, VITOR HENRIQUE DUARTE -
SP254602-A, SHEILA MOREIRA BELLO XAVIER - SP295962-A, THAIS SEAWRIGHT DE
ANDRADE - SP273755-A
OUTROS PARTICIPANTES:
SUCEDIDO: PAULO ROBERTO PINHEIRO CAMARGO
ADVOGADO do(a) SUCEDIDO: ELIANA GUITTI - SP171224-A
ADVOGADO do(a) SUCEDIDO: VITOR HENRIQUE DUARTE - SP254602-A
ADVOGADO do(a) SUCEDIDO: SHEILA MOREIRA BELLO XAVIER - SP295962-A
ADVOGADO do(a) SUCEDIDO: THAIS SEAWRIGHT DE ANDRADE - SP273755-A
V O T O
O cerne da discussão no presente feito é relativo à exigibilidade de dívida oriunda de
empréstimo consignado em folha de pagamento, na hipótese de morte do mutuário
consignante.
In casu, a CEF propôs a presente ação de cobrança, objetivando exigir dos sucessores do de
cujus o pagamento da dívida por ele contraída, cujas parcelas eram descontadas de seu
benefício previdenciário.
Sobre a consignação em folha de pagamento, os arts. 1º, 4º e 16 da Lei nº 1.046, de 2 de
dezembro de 1950, dispõem, respectivamente:
Art. 1º É permitida a consignação em fôlha de vencimento, remuneração, salário, provento,
subsídio, pensão, montepio, meio-sôldo e gratificação adicional por tempo de serviço.
[...]
Art. 4º Poderão consignar em fôlha: (Vide Lei nº 5.725, de 1971)
I - Funcionários públicos ou extranumerários, mensalistas, diaristas, contratados e tarefeiros;
II - Militares do Exército, Marinha, Aeronáutica, Polícia Militar e Corpo de Bombeiros do Distrito
Federal;
III - Juízes, membros do Ministério Público e serventuários da Justiça;
IV - Senadores e Deputados;
V - Servidos e segurados ou associados de autarquias, sociedades de economia mista,
emprêsas concessionárias de serviços de utilidade pública, ou inucorporada ao patrimônio
público;
VI - Associados e servidores de cooperativas de consumo, com fins beneficentes, legalmente
constituídas;
VII - Servidores civis aposentados, e militares reformados, ou da reserva remunerada;
VIII - Pensionistas civis e militares.
[...]
Art. 16. Ocorrido o falecimento do consignante, ficará extinta a dívida do empréstimo feito
mediante simples garantia da consignação em fôlha.
Assim, verifica-se que referida Lei destina-se especificamente aos servidores públicos. Ainda, o
E. Superior Tribunal de Justiça entendeu pela "ab-rogação tácita ou indireta da Lei 1.046/50
pela Lei 8.112/90, pois esta tratou, inteiramente, da matéria contida naquela, afastando, em
consequência, a sua vigência no ordenamento jurídico" (REsp 1.498.200, Rel. Min. Nancy
Andrighi, Terceira Turma, DJe: 07/06/2018). E, por sua vez, a Lei nº 8.112/90 não previu a
extinção da dívida pela morte do mutuário-consignante.
Neste mesmo sentido, a Lei nº 10.820, de 17 de dezembro de 2003, que trata da consignação
em folha de pagamento dos empregados celetistas e dos beneficiários do Regime Geral da
Previdência Social (RGPS), também não prevê a morte do consignante como causa de extinção
da dívida.
Desta forma, o E. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.753.135/PR, de
relatoria da Ministra Nancy Andrighi, fixou o entendimento de que - seja pela Lei nº 8.112/90,
seja pela Lei nº 10.820/90 - o ordenamento jurídico não mais prevê a possibilidade de extinção
da dívida contraída pelo consignante em caso de sua morte, sujeitando-se o pagamento às
disposições do Código Civil sobre a sucessão. Confira-se:
RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. NEGATIVA DE
PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AFASTADA. CONTRATO DE CRÉDITO CONSIGNADO EM
FOLHA DE PAGAMENTO. FALECIMENTO DA CONSIGNANTE. EXTINÇÃO DA DÍVIDA.
AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. ART. 16 DA LEI 1.046/50. REVOGAÇÃO TÁCITA.
IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA. SÚMULA 7/STJ. MAJORAÇÃO DE
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. Embargos à execução opostos em 02/10/13. Recurso especial interposto em 25/01/18 e
concluso ao gabinete em 20/07/18.
2. O propósito recursal é dizer sobre a extinção da dívida decorrente de contrato de crédito
consignado em folha de pagamento, em virtude do falecimento da consignante.
3. Devidamente analisadas e discutidas as questões de mérito, e fundamentado corretamente o
acórdão recorrido, de modo a esgotar a prestação jurisdicional, não há que se falar em violação
do art. 489, §1º, IV, do CPC.
4. Pelo princípio da continuidade, inserto no art. 2º da Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro - LINDB, excetuadas as hipóteses legalmente admitidas, a lei tem caráter
permanente, vigendo até que outra a revogue. E, nos termos do § 1º do referido dispositivo, a
lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare (revogação expressa), quando
seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior
(revogação tácita).
5. A leitura dos arts. 3º e 4º da Lei 1.046/50 evidencia que se trata de legislação sobre
consignação em folha de pagamento voltada aos servidores públicos civis e militares.
6. Diferentemente da Lei 1.046/50, a Lei 10.820/03 regula a consignação em folha de
pagamento dos empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT e dos
titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social.
7. Segundo a jurisprudência do STJ, houve a ab-rogação tácita ou indireta da Lei 1.046/50 pela
Lei 8.112/90, pois esta tratou, inteiramente, da matéria contida naquela, afastando, em
consequência, a sua vigência no ordenamento jurídico.
8. Malgrado a condição da consignante - se servidora pública estatutária ou empregada
celetista; se ativa ou inativa - não tenha sido considerada no julgamento dos embargos à
execução opostos pelos recorrentes, tal fato não impede o julgamento deste recurso especial,
porquanto, sob qualquer ângulo que se analise a controvérsia, a conclusão é uma só: o art. 16
da Lei 1.046/50, que previa a extinção da dívida em virtude do falecimento do consignante, não
está mais em vigor, e seu texto não foi reproduzido na legislação vigente sobre o tema.
9. No particular, a morte da consignante não extingue a dívida por ela contraída mediante
consignação em folha, mas implica o pagamento por seu espólio ou, se já realizada a partilha,
por seus herdeiros, sempre nos limites da herança transmitida (art. 1.997 do CC/02).
10. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido, com majoração
de honorários advocatícios recursais.
(STJ, REsp 1753135/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em
13/11/2018, DJe 22/11/2018) (g. n.).
Cabe salientar, ainda, que a dívida decorrente do contrato de crédito consignado extingue-se
com o óbito do mutuário apenas na hipótese do contrato prever a cobertura securitária, o que
não ocorreu no caso dos autos, pois o contrato acostado aos autos não contém qualquer indício
de contratação do seguro em comento, e nem qualquer outro documento trata do assunto.
Desta feita, não havendo extinção pela morte do consignante no presente caso, a dívida
transmite-se aos sucessores, desde que nos limites da herança a eles transmitida.
Isto posto, dou provimento à apelação,na forma fundamentada acima.
Ante a sucumbência das partes rés,inverto o ônus da sucumbência e condeno-as
exclusivamente ao pagamento de 10% (dez por cento)sobre o valor da causa a título de
honorários advocatícios, bem como, nos termos do art. 85, § 11, do CPC, majoro os honorários
para 11% (onze por cento).
É o voto.
O Exmo. Desembargador Federal Carlos Francisco: Com a devida vênia da divergência,
acompanho o e.Relator.
A Lei nº 1.046/1950 (com alterações) permitiu a consignação em folha de vencimento,
remuneração, salário, provento, subsídio, pensão, montepio, meio-soldo e gratificação adicional
por tempo de serviço, servindo como garantia de fiança (para o exercício do próprio cargo,
função ou emprego), de juros e amortização de empréstimo em dinheiro, de aluguel de casa
para residência do consignante e da família, dentre outras hipóteses previstas nessa lei.
Nos termos do art. 4º da Lei nº 1.046/1950, a consignação alcançou funcionários públicos ou
extranumerários, mensalistas, diaristas, contratados e tarefeiros, bem como militares do
Exército, Marinha, Aeronáutica, Polícia Militar e Corpo de Bombeiros do Distrito Federal,
membros do Ministério Público e serventuários da Justiça, senadores e deputados, segurados
ou associados de autarquias, sociedades de economia mista, empresas concessionárias de
serviços de utilidade pública, ou incorporada ao patrimônio público, associados e servidores de
cooperativas de consumo (com fins beneficentes, legalmente constituídas), e ainda servidores
civis aposentados, e militares reformados, ou da reserva remunerada, e pensionistas civis e
militares.
Após dispor sobre critérios para a consignação, o art. 16 da Lei nº 1.046/1950 previu:
Art. 16. Ocorrido o falecimento do consignante, ficará extinta a dívida do empréstimo feito
mediante simples garantia da consignação em fôlha.
Como regra geral, as obrigações pecuniárias devem ser adimplidas pelo devedor ou por seus
sucessores (na extensão do quinhão recebido), razão pela qual o art. 16 da Lei nº 1.046/1950
representou exceção e, por isso, somente se impôs juridicamente por se tratar de previsão
expressa. Em princípio não haveria impeditivo para a recepção das disposições da Lei nº
1.046/1950 pelos ordenamentos constitucionais supervenientes à ordem constitucional de 1946,
inclusive pela Constituição de 1988, pois o legislador ordinário tem discricionariedade política
para dispensar o cumprimento de obrigações por parte dos eventuais sucessores do falecido
que contraiu o empréstimo consignado (embora, a rigor, seja necessário também dispor sobre
fontes de financiamento para tanto). E por certo um diploma normativo pode manter sua eficácia
jurídica por várias décadas, desde que não seja revogado expressa ou implicitamente.
Contudo, novas legislações foram editadas após o início da eficácia jurídica da Lei nº
1.046/1950 (cujas alterações formais deixaram de ocorrer nos idos da década de 1970),
notadamente a Lei nº 8.112/1990, o Código Civil (com seus regramentos de sucessão) e a Lei
nº 10.820/2003, dando nova conformação normativa tanto para servidores quanto para
celetistas que fazem empréstimos consignados, porém, sem reproduzir a exceção que extingue
a dívida do empréstimo feito mediante garantia da consignação em folha.
Se de um lado é verdade que legislação geral posterior não revoga legislação especial anterior,
de outro lado também é verdade que a substituição integral de um conjunto normativo não
permite que seu fragmento tenha vigência prorrogada, especialmente se representa exceção
que depende de expressa previsão normativa.
O art. 45 da Lei nº 8.112/1990, já em sua redação original, cuidou da consignação sem trazer a
extinção da dívida tal como fez art. 16 da Lei nº 1.046/1950. E quanto aos empregados regidos
pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, o empréstimo consignado em folha de
pagamento foi tratado na Lei nº 10.820/2003, que também não contemplou a hipótese de
extinção da dívida em razão da morte do consignante.
Assim, com as alterações legislativas promovidas pela Lei nº 8.112/1990, pelo Código Civil,
pela Lei nº 10.820/2003 e demais aplicáveis, a extinção da dívida não se impõe de per si pelo
falecimento do consignante (servidor público, trabalhador celetista ou beneficiário do RGPS),
em vista da revogação do art. 16 da Lei nº 1.046/1950.
O E.STJ tem decidido que o art. 16 da Lei 1.046/1950 não está mais em vigor, porque seu texto
não foi reproduzido na legislação superveniente, conforme é possível constatar nos seguintes
julgados que trago à colação:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. FALECIMENTO DO
CONSIGNANTE. EXTINÇÃO DA DÍVIDA. IMPOSSIBILIDADE. DECISÃO MANTIDA.
1. O art. 16 da Lei n. 1.046/1950, que previa a extinção da dívida em virtude do falecimento do
consignante, não está mais em vigor e seu texto não foi reproduzido na legislação vigente sobre
o tema. Precedentes.
2. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt nos EDcl no AREsp 1437667/MS, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA,
QUARTA TURMA, julgado em 17/02/2020, DJe 20/02/2020)
ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO
ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. ÓBITO DO
CONSIGNANTE. REVOGAÇÃO DAS LEIS 1.046/1950 E 2.339/1954 PELA EDIÇÃO DA LEI
8.112/1990. EXTINÇÃO DA DÍVIDA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. AGRAVO INTERNO
Do PARTICULAR DESPROVIDO.
1. O STJ firmou entendimento de que, no âmbito das entidades e dos servidores sujeitos ao seu
regime, a disciplina de consignação em folha de pagamento disposta pelas Leis 1.046/1950 e
2.339/1954 encontra-se revogada pela edição da Lei 8.112/1990, motivo pelo qual não subsiste
o disposto no art. 16 da Lei 1.046/1950, que previa a extinção da dívida em virtude do
falecimento do consignante. Nesse sentido: REsp. 1.753.135/RS, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI,
DJe 22.11.2018; REsp. 1.672.397/PR, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 9.10.2017 e AgInt
no REsp. 1.564.784/DF, Rel. Min. REGINA HELENA COSTA, DJe 12.6.2017.
2. Agravo Interno do Particular desprovido.
(AgInt no AgInt no AREsp 1071335/PB, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO,
PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/02/2020, DJe 03/03/2020)
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO.
CONSIGNAÇÃO EM FOLHA. FALECIMENTO DA CONSIGNANTE. EXTINÇÃO DA DÍVIDA.
IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO PROVIDO.
1. É incabível o pleito da parte autora de quitação do empréstimo consignado em folha em
virtude do falecimento da consignante, porquanto a Lei 1.046/50, que previa a extinção da
dívida em caso de falecimento do consignante - e que não está mais em vigor - não teve seu
texto reproduzido pela Lei 10.820/2003, aplicável aos celetistas, tampouco pela Lei 8.112/90,
aplicável aos servidores civis.
2. "Malgrado a condição da consignante - se servidora pública estatutária ou empregada
celetista; se ativa ou inativa - não tenha sido considerada no julgamento dos embargos à
execução opostos pelo espólio, tal fato não impede o julgamento deste recurso especial,
porquanto, sob qualquer ângulo que se analise a controvérsia, a conclusão é uma só: o art. 16
da Lei 1.046/50, que previa a extinção da dívida em virtude do falecimento do consignante, não
está mais em vigor, e seu texto não foi reproduzido na legislação vigente sobre o tema. No
particular, a morte da consignante não extingue a dívida por ela contraída mediante
consignação em folha, mas implica o pagamento por seu espólio ou, se já realizada a partilha,
por seus herdeiros, sempre nos limites da herança transmitida (art. 1.997 do CC/02)" (REsp
1.498.200/PR, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/06/2018,
DJe de 07/06/2018).
3. Agravo interno provido para dar provimento ao recurso especial, a fim de julgar
improcedentes os pedidos formulados na inicial.
(AgInt no REsp 1414744/CE, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em
05/09/2019, DJe 25/09/2019)
DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CONTRATO DE
CRÉDITO CONSIGNADO EM FOLHA DE PAGAMENTO. FALECIMENTO DA CONSIGNANTE.
EXTINÇÃO DA DÍVIDA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. ART. 16 DA LEI 1.046/50.
REVOGAÇÃO TÁCITA. JULGAMENTO: CPC/73.
1. Embargos à execução de contrato de crédito consignado opostos em 11/04/2013, de que foi
extraído o presente recurso especial, interposto em 29/04/2014 e atribuído ao gabinete em
25/08/2016.
2. O propósito recursal é dizer sobre a extinção da dívida decorrente de contrato de crédito
consignado em folha de pagamento, em virtude do falecimento da consignante.
3. Pelo princípio da continuidade, inserto no art. 2º da Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro - LINDB, excetuadas as hipóteses legalmente admitidas, a lei tem caráter
permanente, vigendo até que outra a revogue. E, nos termos do § 1º do referido dispositivo, a
lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare (revogação expressa), quando
seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior
(revogação tácita).
4. A leitura dos arts. 3º e 4º da Lei 1.046/50 evidencia que se trata de legislação sobre
consignação em folha de pagamento voltada aos servidores públicos civis e militares. 5.
Diferentemente da Lei 1.046/50, a Lei 10.820/03 regula a consignação em folha de pagamento
dos empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT e dos titulares de
benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social.
6. Segundo a jurisprudência do STJ, houve a ab-rogação tácita ou indireta da Lei 1.046/50 pela
Lei 8.112/90, pois esta tratou, inteiramente, da matéria contida naquela, afastando, em
consequência, a sua vigência no ordenamento jurídico.
7. Malgrado a condição da consignante - se servidora pública estatutária ou empregada
celetista; se ativa ou inativa - não tenha sido considerada no julgamento dos embargos à
execução opostos pelo espólio, tal fato não impede o julgamento deste recurso especial,
porquanto, sob qualquer ângulo que se analise a controvérsia, a conclusão é uma só: o art. 16
da Lei 1.046/50, que previa a extinção da dívida em virtude do falecimento do consignante, não
está mais em vigor, e seu texto não foi reproduzido na legislação vigente sobre o tema. 8. No
particular, a morte da consignante não extingue a dívida por ela contraída mediante
consignação em folha, mas implica o pagamento por seu espólio ou, se já realizada a partilha,
por seus herdeiros, sempre nos limites da herança transmitida (art. 1.997 do CC/02).
9. Em virtude do exame do mérito, por meio do qual foi rejeitada a tese sustentada pela
recorrente, fica prejudicada a análise da divergência jurisprudencial.
10. Recurso especial conhecido e desprovido.
(REsp 1498200/PR, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em
05/06/2018, DJe 07/06/2018)
Ante o exposto, voto por dar provimento ao apelo.
O Desembargador Federal Wilson Zauhy. Compulsando melhor os autos, peço vênia ao E.
Relator para divergir de seu voto.
Considerando que o contratante faleceu no curso regular do contrato, razão assiste à parte
autora quanto à previsão de extinção da dívida do empréstimo feito mediante simples garantia
da consignação em folha.
Dispõe o artigo 16 da Lei Federal 1.046/50:
Art. 16. Ocorrido o falecimento do consignante, ficará extinta a dívida do empréstimo feito
mediante simples garantia da consignação em folha.
Assim, ainda que não haja a previsão contratual de um seguro que favoreça o consignante, por
se tratar de um empréstimo em consignação, regido pela Lei nº 1.046/50, em caso de morte do
devedor, a dívida deve ser extinta.
Neste ponto importa consignar que essa lei não foi revogada no tocante à extinção da dívida no
caso de falecimento do consignante. Ocorre que tanto a Lei 8.112/90, quanto a Lei nº
10.820/2003, que posteriormente vieram a dispor sobre autorização para desconto de
prestações em folha de pagamento, não abordaram essa questão específica, que permanece
em vigor.
Portanto, sendo norma de natureza especial, sobrepõe-se às disposições do Código Civil que
determinam que os herdeiros do devedor falecido devem arcar com suas dívidas até o limite de
seus quinhões (artigo 1997).
Por fim, é de se registrar que o tema já restou sedimentado, nessa mesma direção, conforme
julgamento da apelação nº 0001229-27.2014.4.03.6000, da Segunda Turma, ultimado na
técnica do artigo 942 do CPC/2015 em 10 de dezembro de 2020. Eis a ementa do julgado:
DIREITO PRIVADO.EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. EXTINÇÃO DA DÍVIDA. LEI Nº
1.046/1950.
I – Hipótese de extinção da dívidaem decorrência de falecimento daconsignante, nos termos o
art. 16 da Lei nº 1.046/1950, sendo inaplicável ao caso a Lei 8.112/90, que abrange servidores
públicos federais.Precedentes.
II - Recurso desprovido, com majoração da verba honorária.
(TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0001229-27.2014.4.03.6000, Rel.
Desembargador Federal OTAVIO PEIXOTO JUNIOR, julgado em 15/12/2020, e - DJF3 Judicial
1 DATA: 18/12/2020)
Considerando que a sentença foi publicada após 18 de março de 2016, que houve condenação
ao pagamento de honorários advocatícios em valor abaixo dos limites do § 2º do art. 85 do
Código de Processo Civil de 2015 e o não provimento do recurso (STJ, EDcl no AgInt no RESP
n° 1.573.573 RJ. Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze. Terceira Turma. DJe 08/05/2017), majoro os
honorários advocatícios devidos pela apelante para 12% sobre o valor atualizado da causa,
com fundamento no § 11 do artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015.
Ante o exposto, divirjo do E. Relator e voto por negar provimento à apelação e majorar os
honorários advocatícios devidos pela apelante para 12% sobre o valor atualizado da causa.
E M E N T A
APELAÇÃO. CIVIL. CONTRATOS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM FOLHA DE
PAGAMENTO. FALECIMENTO DO MUTUÁRIO CONSIGNANTE. EXTINÇÃO DA DÍVIDA.
INOCORRÊNCIA. APELO PROVIDO.
1. O cerne da discussão no presente feito é relativo à exigibilidade de dívida oriunda de
empréstimo consignado em folha de pagamento, na hipótese de morte do mutuário
consignante.
2. O E. Superior Tribunal de Justiça entendeu pela "ab-rogação tácita ou indireta da Lei
1.046/50 pela Lei 8.112/90, pois esta tratou, inteiramente, da matéria contida naquela,
afastando, em consequência, a sua vigência no ordenamento jurídico" (REsp 1.498.200, Rel.
Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe: 07/06/2018). E, por sua vez, a Lei nº 8.112/90 não
previu a extinção da dívida pela morte do mutuário-consignante.
3. Neste mesmo sentido, a Lei nº 10.820, de 17 de dezembro de 2003, que trata da
consignação em folha de pagamento dos empregados celetistas e dos beneficiários do Regime
Geral da Previdência Social (RGPS), também não prevê a morte do consignante como causa
de extinção da dívida.
4. OE. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.753.135/PR, de relatoria da
Ministra Nancy Andrighi, fixou o entendimento de que - seja pela Lei nº 8.112/90, seja pela Lei
nº 10.820/90 - o ordenamento jurídico não mais prevê a possibilidade de extinção da dívida
contraída pelo consignante em caso de sua morte, sujeitando-se o pagamento às disposições
do Código Civil sobre a sucessão: "8. Malgrado a condição da consignante - se servidora
pública estatutária ou empregada celetista; se ativa ou inativa - não tenha sido considerada no
julgamento dos embargos à execução opostos pelos recorrentes, tal fato não impede o
julgamento deste recurso especial, porquanto, sob qualquer ângulo que se analise a
controvérsia, a conclusão é uma só: o art. 16 da Lei 1.046/50, que previa a extinção da dívida
em virtude do falecimento do consignante, não está mais em vigor, e seu texto não foi
reproduzido na legislação vigente sobre o tema. 9. No particular, a morte da consignante não
extingue a dívida por ela contraída mediante consignação em folha, mas implica o pagamento
por seu espólio ou, se já realizada a partilha, por seus herdeiros, sempre nos limites da herança
transmitida (art. 1.997 do CC/02)." (REsp 1753135/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI,
TERCEIRA TURMA, julgado em 13/11/2018, DJe 22/11/2018).
5. A dívida decorrente do contrato de crédito consignado extingue-se com o óbito do mutuário
apenas na hipótese do contrato prever a cobertura securitária, o que não ocorreu no caso dos
autos, pois o contrato acostado não contém qualquer indício de contratação do seguro em
comento, e nem qualquer outro documento trata do assunto.
6. Não havendo extinção pela morte do consignante no presente caso, a dívida transmite-se
aos sucessores, desde que nos limites da herança a eles transmitida.
7. Apelação a que se dáprovimento. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no
julgamento, nos termos do artigo 942 do
Código de Processo Civil, a Primeira Turma, por maioria, deu provimento à apelação, e, ante a
sucumbência das partes rés, inverteu o ônus da sucumbência e as condenou exclusivamente
ao pagamento de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa a título de honorários
advocatícios, bem como, nos termos do art. 85, § 11, do CPC, majorou os honorários para 11%
(onze por cento), nos termos do voto do senhor Desembargador Federal relator, acompanhado
pelos votos da senhora Juíza Federal Convocada Giselle França e do senhor Desembargador
Federal Carlos Francisco; vencidos os senhores Desembargadores Federais Wilson Zauhy e
Peixoto Junior, que lhe negavam provimento e majoravam os honorários advocatícios devidos
pela apelante para 12% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
