
| D.E. Publicado em 13/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, reconhecer, de ofício, a ilegitimidade passiva do INSS e extinguir o processo sem resolução do mérito, bem como conhecer em parte da apelação da parte autora e, na parte conhecida, negar-lhe provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0011349-34.2012.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária em que se objetiva a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, desde a citação, mediante o reconhecimento do labor rural (28/07/61 a 17/02/74), bem como de período trabalhado em atividades especiais (23/05/77 a 25/09/96 - como policial militar na Polícia Militar do Estado do Paraná), sua conversão em tempo comum e cômputo aos demais períodos de trabalho.
A sentença julgou improcedente o pedido e condenou a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários de advogado, arbitrados estes em R$ 400,00 (quatrocentos reais), sujeitando-se ao disposto no art. 12 da Lei nº 1.060/50.
Os embargos de declaração opostos pela parte autora - quanto à omissão sobre o pedido de reconhecimento de tempo especial - foram rejeitados.
Apela a parte autora, alegando que produziu prova material, corroborada por prova oral, comprovando o exercício de atividade rural sem registro em CTPS. Sustenta que, embora o juízo a quo não tenha apreciado o pedido de reconhecimento de tempo especial, foi apresentada a certidão de tempo de serviço emitida pelo Polícia Militar do Paraná quanto ao período de 23/05/77 a 25/09/96, devendo ser reconhecido como tempo especial. Aduz que preencheu o tempo total necessário para o reconhecimento do direito ao benefício previdenciário. Requer a reforma da r. sentença para que sejam julgados procedentes os pedidos formulados na petição inicial.
Contrarrazões pela parte apelada. Sustenta que: os documentos não são suficientes para provar o tempo rural; no caso de contagem recíproca de contribuições entre diferentes regimes de previdência, é vedada a conversão do tempo de serviço exercido em atividade sujeita a condições especiais (art. 96, I da Lei n° 8.213/91 e art. 125, II, §1° do Decreto n° 3.048/90); o vínculo de 18/02/74 a 15/05/75 foi lançado na CTPS emitida em 2004 e fora da ordem cronológica dos vínculos anotados. Requer a manutenção da sentença.
Intimados para se manifestar sobre a legitimidade passiva do INSS quanto ao pedido de reconhecimento do exercício do trabalho em condições especiais em relação ao período em que o autor esteve vinculado à Polícia Militar do Estado do Paraná, o INSS reiterou os termos das contrarrazões e o autor defendeu a legitimidade passiva da autarquia, colacionando julgados nesse sentido.
Vieram os autos ao Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Legitimidade passiva
De ofício, passo à análise da questão relativa à ilegitimidade passiva ad causam do INSS quanto ao reconhecimento da especialidade do período de trabalho prestado perante Regime Próprio de Previdenciária Social.
Dispõe o art. 201, da Constituição Federal:
"Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados os critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:
(...)
§ 9º. Para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos regimes de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei."
A Lei de Benefícios disciplina ainda a contagem recíproca de tempo de serviço no caput do artigo 94 e inciso IV do artigo 96, que transcrevo:
"Art. 94. Para efeito dos benefícios previstos no Regime Geral de Previdência Social ou no serviço público é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na atividade privada, rural e urbana, e do tempo de contribuição ou de serviço na administração pública, hipótese em que os diferentes sistemas de previdência social se compensarão financeiramente." (Redação dada pela Lei nº 9.711, de 20.11.98)
"Art. 96. O tempo de contribuição ou de serviço de que trata esta Seção será contado de acordo com a legislação pertinente, observadas as normas seguintes:
I - não será admitida a contagem em dobro ou em outras condições especiais;(...)
Nos termos do art. 201, §9º da Constituição Federal, bem como dos artigos 94, caput e 96 ambos da Lei nº 8.213/91, assegura-se ao INSS o direito de consignar na certidão de tempo de serviço a falta de recolhimento ou indenização das contribuições previdenciárias correspondentes ao período, para fins de contagem recíproca junto ao regime próprio de previdência do autor.
A iniciativa da compensação entre o Regime Geral da Previdência Social e o regime estatutário, e a correspondente prova da indenização, deverá partir do regime em que for concedido o benefício, consoante a elucidativa ementa do julgado seguinte:
"AGRAVO LEGAL. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO URBANO EXERCIDO SEM REGISTRO. PARCIAL PROCEDÊNCIA. SERVIDOR PÚBLICO. CONTAGEM RECÍPROCA. EXPEDIÇÃO DA RESPECTIVA CERTIDÃO DE TEMPO DE SERVIÇO URBANO VINCULADO AO REGIME GERAL. POSSIBILIDADE. EXERCÍCIO DO PODER-DEVER DO INSS. AGRAVO LEGAL DESPROVIDO.
- No presente caso, a parte autora afirma que trabalhou no escritório da Fazenda Cachoeira, na função de auxiliar de escritório, no período de 16.06.80 a 31.07.85. - Com respeito ao exercício da atividade urbana, o conjunto probatório revela razoável início de prova material. - De sua vez, a prova testemunhal corrobora a documentação contemporânea aos fatos e basta à comprovação da atividade de trabalhador urbano, para efeito de cômputo do tempo de serviço do segurado. - Comprovado se acha, portanto, o tempo de serviço no período de 20.01.84 a 1º.01.85.
- Cumpre salientar que incumbe aos empregadores recolher as contribuições previdenciárias, em decorrência da relação de emprego, a teor do art. 5º, I, e art. 69, I e III, da L. 3.807/60. - A certidão a ser expedida é assegurada a todos, nos termos do artigo 5º, XXXIV, "b", da Constituição, pois, no caso em tela, a sua obtenção se destina à defesa de direitos e esclarecimentos de situações de interesse pessoal relacionados à contagem recíproca. - Aliás, pondo uma pá de cal nessa questão, cumpre ter em mente que, na hipótese vertente, a autarquia carece de legitimidade para opor-se à certidão de contagem recíproca, em alegando faltar a indenização das contribuições correspondentes ao período reconhecido.
- Em sendo caso de servidor público, sempre quem tem essa legitimidade é o regime instituidor do beneficio, nos termos do artigo 4º da L. 9.796/99, isto porque a contagem recíproca é direito assegurado pela Constituição, independentemente de compensação financeira entre os regimes de previdência social, e pode nem sequer se concretizar se por algum motivo o servidor não utilizar a certidão. - Destarte, a legitimidade para exigir a prova da indenização das contribuições é do regime instituidor do benefício, isto é, do regime próprio do servidor (RPPS), por isso mesmo, reconhecido o tempo de serviço, descabe ao regime de origem (INSS) recusar-se a cumprir seu dever-poder de expedir a certidão de contagem recíproca. - Ressalte-se, com isso, que a parte autora, enquanto filiada ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS), não está obrigada ao recolhimento das contribuições para aposentar-se (RE 148.510 SP, Min. Marco Aurélio). - Não, porém, quando se cogitar de regime próprio, pois, nesta hipótese, a autarquia poderá consignar que a utilização do tempo certificado, para fins de benefício em regime diverso do RGPS, poderá gerar indenização das contribuições previdenciárias correspondentes ao período trabalhado. - Agravo legal desprovido.
(AC 00352224920014039999, DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, TRF3 - SÉTIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:26/06/2013 .FONTE_REPUBLICACAO:.)
Esclareça-se que o reconhecimento do trabalho em condições especiais exercido no âmbito do regime próprio de previdência é questão diversa e que antecede a contagem recíproca de tempo especial entre regimes diversos.
Constata-se que o autor pleiteia aposentadoria por tempo de serviço/contribuição perante o Regime Geral de Previdência, mediante o reconhecimento de atividades rurais exercidas perante o regime geral da previdência e de atividades especiais exercidas no âmbito da polícia militar, regidas pelo regime próprio de previdência.
Neste contexto, no pertinente ao reconhecimento das atividades especiais exercidas por policiais militares estaduais, no caso em tela, no período compreendido entre 23/05/77 a 25/09/96, o tema tem merecido atenção específica dos tribunais.
Nos casos em que a migração de regime ocorre compulsoriamente pela lei, o Supremo Tribunal Federal tem entendido possível a conversão de tempo de serviço especial, desde que anterior ao advento da Lei nº 8.112/90, pois a partir daí seria necessária a devida regulamentação exigida pela CF no artigo 40, §4º.
Contudo, no julgamento do Mandado de Injunção nº 721, em 30/11/2007, de Relatoria do Ministro Marco Aurélio, o STF considerou superada a exigência da regulamentação, reconhecendo à servidora o direito à aposentadoria especial, tendo em vista que o regime geral já disciplinava a matéria, conforme se verifica da transcrição do aresto:
"MANDADO DE INJUNÇÃO - NATUREZA. Conforme disposto no inciso LXXI do artigo 5º da Constituição Federal, conceder-se-á mandado de injunção quando necessário ao exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Há ação mandamental e não simplesmente declaratória de omissão. A carga de declaração não é objeto da impetração, mas premissa da ordem a ser formalizada.
MANDADO DE INJUNÇÃO - DECISÃO - BALIZAS. Tratando-se de processo subjetivo, a decisão possui eficácia considerada a relação jurídica nele revelada.
APOSENTADORIA - TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS - PREJUÍZO À SAUDE DO SERVIDOR - INEXISTÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR - ARTIGO 40, §4º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Inexistente a disciplina específica da aposentadoria especial do servidor, impõe-se a adoção, via pronunciamento judicial, daquela própria aos trabalhadores em geral - artigo 57,§1º, da Lei 8.213/91."
Assim, não resta dúvida ser possível o reconhecimento das atividades especiais.
No entanto, para o reconhecimento das atividades especiais do servidor, a ação deve ser proposta contra o ente público que arcará com o benefício de aposentadoria ou, em casos como o presente, em que se pleiteia a contagem recíproca, que arcará com a indenização ao órgão concessor, inclusive do tempo ficto.
Confiram-se decisões desta Corte Regional:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. POLICIAL MILITAR. REGRAMENTO PRÓPRIO. ILEGITIMIDADE DO INSS. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. VIGIA. APOSENTADORIA ESPECIAL. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
I. A legitimidade para o reconhecimento do tempo de serviço especial é do ente ao qual o segurado estava vinculado à época da prestação do serviço e não daquele onde se pleiteia a averbação. Configurada a ilegitimidade passiva do INSS no tocante ao reconhecimento da especialidade do período laborado na Polícia Militar do Estado de São Paulo, uma vez que o trabalho supostamente exercido sob condições especiais não ocorreu sob as normas do Regime Geral da Previdência Social, mas sob as regras de Regime Próprio de Previdência.
(...)
(AC 00142913420154039999, DESEMBARGADOR FEDERAL GILBERTO JORDAN, TRF3 - NONA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:27/06/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. RECONHECIMENTO DA ESPECIALIDADE DE ATIVIDADE DESENVOLVIDA EM RPPS. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. APOSENTADORIA ESPECIAL. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PARA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. CONVERSÃO DE TEMPO ESPECIAL EM TEMPO COMUM. POSSIBILIDADE. APOSENTADORIA INTEGRAL POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PARA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TERMO INICIAL. DER. RECURSO PROVIDO EM PARTE.
- A legitimidade para o reconhecimento do tempo de serviço especial é do ente ao qual o segurado estava vinculado à época da prestação do serviço e não daquele onde se pleiteia a averbação. Ilegitimidade passiva do INSS no tocante ao reconhecimento da especialidade do período de 28/07/1981 a 25/03/1993, quando o autor laborou vinculado à Secretaria de Estado dos Negócios da Segurança Pública do Estado de São Paulo, uma vez que o trabalho supostamente exercido em condições especiais não ocorreu sob as normas do Regime Geral da Previdência Social, mas perante as regras de Regime Próprio de Previdência do Serviço Público do Estado de São Paulo.
(...)
- Preliminar de ilegitimidade passiva quanto ao período de 28/07/81 a 25/03/93 acolhida. Preliminar de cerceamento de defesa afastada. Apelação a que se dá parcial provimento.
(TRF 3ª Região, OITAVA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1842300 - 0010102-10.2011.4.03.6133, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI, julgado em 19/02/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/03/2018)
Assim, está configurada a ilegitimidade passiva do INSS quanto ao pedido de reconhecimento do exercício do trabalho em condições especiais em relação ao período em que o autor esteve vinculado à Polícia Militar do Estado do Paraná.
Prejudicada, assim, a apreciação da questão relativa à conversão do tempo de serviço exercido em atividade sujeita a condições especiais, na hipótese de contagem recíproca de contribuições entre diferentes regimes de previdência (art. 96, I da Lei n° 8.213/91 e art. 125, II, §1° do Decreto n° 3.048/90).
Por outro lado, não há óbice quanto à apreciação dos demais pleitos: reconhecimento do tempo rural sem registro em CTPS e concessão da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, não sendo hipótese de ilegitimidade passiva do INSS.
Admissibilidade
Deixo de conhecer a apelação do autor no tocante ao pedido recursal correspondente ao reconhecimento das atividades especiais exercidas como policial militar na Polícia Militar do Estado do Paraná, no período de 23/05/77 a 25/09/96.
No mais, presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Passo ao exame do mérito.
Aposentadoria por tempo de serviço/contribuição - requisitos
A aposentadoria por tempo de serviço, atualmente denominada aposentadoria por tempo de contribuição, admitia a forma proporcional e a integral antes do advento da Emenda Constitucional 20/98, fazendo jus à sua percepção aqueles que comprovem tempo de serviço (25 anos para a mulher e 30 anos para o homem na forma proporcional, 30 anos para a mulher e 35 anos para o homem na forma integral) desenvolvido totalmente sob a égide do ordenamento anterior, respeitando-se, assim, o direito adquirido.
Aqueles segurados que já estavam no sistema e não preencheram o requisito temporal à época da Emenda Constitucional 20 de 15 de dezembro de 1998, fazem jus à aposentadoria por tempo de serviço proporcional desde que atendam às regras de transição expressas em seu art. 9º, caso em que se conjugam o requisito etário (48 anos de idade para a mulher e 53 anos de idade para o homem) e o requisito contributivo (pedágio de 40% de contribuições faltantes para completar 25 anos, no caso da mulher e para completar 30 anos, no caso do homem).
Atualmente, são requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições (30 anos para a mulher e 35 anos para o homem), ressaltando-se que o tempo de serviço prestado anteriormente à referida Emenda equivale a tempo de contribuição, a teor do art. 4º da Emenda Constitucional 20/98.
Tempo de serviço rural anterior e posterior à Lei de Benefícios
A aposentadoria do trabalhador rural apresenta algumas especificidades, em razão sobretudo da deficiência dos programas de seguridade voltados a essa categoria de trabalhadores no período anterior à Constituição Federal de 1988 e do descumprimento da legislação trabalhista no campo. Assim é que, no seu art. 55, §2º, a Lei 8.213/91 estabeleceu ser desnecessário o recolhimento de contribuições previdenciárias pelo segurado especial ou trabalhador rural no período anterior à vigência da Lei de Benefícios, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço rural, exceto para efeito de carência. Neste sentido, já decidiu esta E. Corte: SÉTIMA TURMA, APELREEX 0005026-42.2014.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, julgado em 21/07/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:31/07/2014 e TERCEIRA SEÇÃO, AR 0037095-93.2010.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NELSON BERNARDES, julgado em 28/11/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/12/2013.)
Já em relação ao tempo de serviço rural trabalhado a partir da competência de novembro de 1991 (art. 55, §2º, da Lei 8.213/91 c/c o art. 60, X, do Decreto 3.048/99), ausente o recolhimento das contribuições, somente poderá ser aproveitado pelo segurado especial para obtenção dos benefícios previstos no art. 39, I, da Lei 8.213/91.
A prova do exercício de atividade rural
Muito se discutiu acerca da previsão contida no art. 55, §3º, da Lei de Benefícios, segundo a qual a comprovação do tempo de serviço exige início de prova material. O que a Lei nº 8.213/91 exige é apenas o início de prova material e é esse igualmente o teor da Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça.
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Exigir documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se quer reconhecer equivaleria a erigir a prova documental como a única válida na espécie, com desconsideração da prova testemunhal produzida, ultrapassando-se, em desfavor do segurado, a exigência legal. Neste sentido, o C. STJ: AgRg no AREsp 547.042/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014.
Tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
É pacífico o entendimento dos Tribunais, considerando as difíceis condições dos trabalhadores rurais, admitir a extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou companheira, bem como da filha solteira residente na casa paterna. (REsp 707.846/CE, Rel. Min. LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJ de 14/3/2005)
Idade mínima para o trabalho rural
Não se olvida que há jurisprudência no sentido de admitir-se o labor rural a partir dos 12 (doze) anos de idade, por ser realidade comum no campo, segundo as regras ordinárias de experiência, mormente se a prova testemunhal é robusta e reforçada por documentos que indicam a condição de lavradores dos pais do segurado.
O raciocínio invocado em tais decisões é o de que a norma constitucional que veda o trabalho ao menor de 16 anos visa à sua proteção, não podendo ser invocada para, ao contrário, negar-lhe direitos. (RESP 200200855336, Min. Jorge Scartezzini, STJ - Quinta Turma, DJ 02/08/2004, p. 484.).
Tal ponderação não é isenta de questionamentos. De fato, emprestar efeitos jurídicos para situação que envolve desrespeito a uma norma constitucional, ainda que para salvaguardar direitos imediatos, não nos parece a solução mais adequada à proposta do constituinte - que visava dar ampla e geral proteção às crianças e adolescentes, adotando a doutrina da proteção integral, negando a possibilidade do trabalho infantil.
Não se trata, assim, de restringir direitos ao menor que trabalha, mas sim, de evitar que se empreste efeitos jurídicos, para fins previdenciários, de trabalho realizado em desacordo com a Constituição. Considero, desta forma, o ordenamento jurídico vigente à época em que o(a) autor(a) alega ter iniciado o labor rural para admiti-lo ou não na contagem geral do tempo de serviço, para o que faço as seguintes observações:
As Constituições Brasileiras de 1824 e 1891 não se referiram expressamente à criança e adolescente tampouco ao trabalho infantil.
A Constituição de 1934 foi a primeira a tratar expressamente da proteção à infância e à juventude e em seu artigo 121 consagrou, além de outros direitos mais favoráveis aos trabalhadores, a proibição de qualquer trabalho para os menores de 14 anos; de trabalho noturno para os menores de 16 anos; e de trabalho em indústrias insalubres para menores de 18 anos.
Por sua vez, a Constituição de 1937, repetiu a fórmula da proibição de qualquer trabalho para os menores de 14 anos; de trabalho noturno para os menores de 16 anos e de trabalho em indústrias insalubres para menores de 18 anos.
A Constituição de 1946 elevou a idade mínima para a execução de trabalho noturno de 16 para 18 anos, mantendo as demais proibições de qualquer trabalho para menores de 14 anos e em indústrias insalubres para menores de 18 anos, além de proibir a diferença de salário para o mesmo trabalho por motivo de idade.
A Constituição de 1967, embora tivesse mantido a proibição para o trabalho noturno e insalubre para menores de 18 anos, reduziu de 14 para 12 anos a idade mínima para qualquer trabalho.
Por fim, a Constituição da República de 1988, proíbe o trabalho noturno, perigoso e insalubre para os menores de 18 anos; e, inicialmente, de qualquer trabalho para menores de 14 anos, como constava nas Constituições de 1934, 1937 e 1946. Todavia, com a Emenda Constitucional 20, de 1998, a idade mínima foi elevada para 16 anos, salvo na condição de aprendiz a partir de 14 anos.
Entretanto, em atenção ao entendimento consolidado nesta E. 7ª Turma, no sentido de considerar as peculiaridades de um Brasil com elevado contingente populacional no meio rural antes da década de 70, admito, para o cômputo geral do tempo de serviço, o trabalho rural desenvolvido antes da Constituição de 1967, a partir dos 12 anos de idade. A partir da Constituição Federal de 1988, todavia, prevalece a idade nela estabelecida.
Caso concreto - elementos probatórios
De início, ante o reconhecimento da ilegitimidade passiva do INSS quanto ao pedido de reconhecimento de tempo especial no período de 23/05/77 a 25/09/96 e frente ao teor da apelação da parte autora, verifica-se que a controvérsia cinge-se ao reconhecimento do trabalho rural no período de 28/07/61 a 17/02/74 e ao direito ao benefício previdenciário.
Atividade rural
A parte autora, nascida em 28/07/47, trouxe aos autos dois documentos, com vistas a compor o início de prova material quanto o exercício de atividade rural.
Entretanto, o documento emitido pela Polícia Militar do Estado do Paraná em 10/01/78 contém registros funcionais no período de trabalho do segundo semestre de 1977 (fl. 14). O primeiro registro corresponde à certificação do ingresso da parte autora nos quadros da corporação em 23/05/77, contendo sua qualificação - inclusive a profissão de lavrador -, cujas informações/declarações são válidas para o momento deste ingresso. Assim, o documento que contempla a qualificação de lavrador em 23/05/77 - data essa que é posterior a 17/02/74 - não serve de início de prova material do trabalho rural para o período pleiteado nos autos.
O histórico escolar relativo ao ensino fundamental emitido em 11/09/08 (fl. 15), apenas comprova que a parte autora estudou na Escola Mista da Fazenda Aliança em 1956 (2ª série) e 1958 (3ª série), bem como no Grupo Escolar Coronel Marcos Ribeiro em 1959 (4ª série). Não há qualquer informação sobre o labor rural da parte autora ou dos seus pais. Logo, o documento não é apto a servir de início de prova material do trabalho rural para o período pleiteado nos autos.
Não obstante o depoimento pessoal do autor e a oitiva das testemunhas se revelem homogêneos e satisfatórios, contemplando menção ao trabalho rural de meados de 1960 a 1972/1973, não há documento apto a se caracterizar como início de prova material dentro interregno em análise.
Reitere-se que a prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola.
Assim, pela análise do conjunto probatório, ausente o início de prova material corroborado pela prova testemunhal, não é possível o reconhecimento do alegado tempo de serviço rural sem registro em CTPS.
Em contestação, o INSS alegou que o vínculo de 18/02/74 a 15/05/75 não poderia ser computado na contagem do tempo de serviço, pois não consta do Sistema CNIS, bem como foi lançado na CTPS emitida em 2004 e fora da ordem cronológica dos vínculos nela anotados (tal argumento foi reiterado nas contrarrazões apresentadas frente à apelação da parte autora). Todavia, tendo apresentado réplica, a parte autora não se manifestou sobre esse ponto.
Assiste razão ao INSS. De acordo com as cópias da CTPS, o vínculo de 18/02/74 a 15/05/75 é antigo em relação à data de emissão da CTPS (24/05/04) e foi o último vínculo nela anotado (na última página), inclusive após o vínculo mais recente (10/05/07 a 28/12/07), o que conduz à conclusão de que a sua anotação ocorreu após 28/12/07. Assim, ante a impugnação específica e fundamentada do INSS, e ausência da justificativa da parte autora quanto a tal proceder, não há como incluir esse período na contagem de tempo.
Desta forma, considerando o tempo de serviço comum reconhecido pelo INSS e com registro em CTPS, verifica-se que à época da data do ajuizamento da ação a parte autora não já havia preenchido o tempo de serviço necessário à concessão do benefício e cumprido a carência mínima exigida pela Lei de Benefícios.
Sendo assim, verifica-se que o autor não ultrapassou os 35 anos exigidos para a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço integral, nos termos do art. 201, §7º, I, da Constituição da República.
Em consulta ao Sistema CNIS, observo que não há vínculos de trabalho registrados após o ajuizamento desta ação, constando apenas a concessão de aposentadoria por idade (NB 156.096.392-9 - DER: 29/10/12).
Ante o exposto, de ofício, reconheço a ilegitimidade passiva do INSS e extingo o processo sem resolução do mérito, na forma do artigo 485, VI e §3° do Código de Processo Civil de 2015, quanto ao pedido de reconhecimento do tempo especial trabalhado como policial militar na Polícia Militar do Estado do Paraná, e conheço em parte da apelação da parte autora e, na parte conhecida, nego-lhe provimento.
É como voto.
PAULO DOMINGUES
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