Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA / SP
5017129-56.2018.4.03.6183
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
27/05/2021
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 08/06/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. DECISÃO FUNDAMENTADA. INEXISTÊNCIA DE NULIDADE.
APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. NÃO COMPROVAÇÃO DAS
CONDIÇÕES ESPECIAIS. VIBRAÇÃO DE CORPO INTEIRO. NÃO IMPLEMENTAÇÃO DOS
REQUISITOS. INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA.
DEVOLUÇÃO DE VALORES.
1. Preliminar de nulidade rejeitada. Não se vislumbra a ausência da análise de qualquer questão
relevante no decisum, que, embora sucinto, traz em seu bojo o necessário para a compreensão
de seus fundamentos.
2. São requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com
os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições, ressaltando-se
que o tempo de serviço prestado anteriormente à Emenda Constitucional 20/98 equivale a tempo
de contribuição, a teor do seu art. 4º.
3. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o
reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua
demonstração.
4. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da
atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no
período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário (a
partir de 11/12/97).
5. A exposição à vibração de corpo inteiro (VCI), no desempenho da atividade de motorista de
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
ônibus, não enseja o reconhecimento do tempo especial por ausência de preceito legal prevendo
tal hipótese, sendo que aquela somente caracteriza a atividade especial quando vinculada à
realização de trabalhos "com perfuratrizes e marteletes pneumáticos", nos termos do código 1.1.5
do Decreto n° 53.831/64, código 1.1.4 do Decreto n° 83.080/79, código 2.0.2 do Decreto n°
2.172/97 e código 2.0.2 do Anexo IV do Decreto nº 3.048/99.
6. Não alcançados os níveis de aceleração previstos pelo item 2.2, Anexo VIII, da NR 15.
7. O autor não implementou os requisitos necessários à concessão do benefício.
8. Inversão do ônus da sucumbência. Exigibilidade condicionada à hipótese do §3º do artigo 98
do CPC/2015.
9. Tutela antecipada revogada. Devolução dos valores. Precedente: REsp nº 1401560/MT.
10. Preliminar rejeitada; no mérito, apelação do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
provida para julgar improcedente o pedido.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5017129-56.2018.4.03.6183
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: AMAURICIO AUGUSTO DOS SANTOS
Advogados do(a) APELADO: CLOVIS BEZERRA - SP271515-A, ANTONIA EDMAR VIEIRA
MOREIRA - SP362026-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5017129-56.2018.4.03.6183
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: AMAURICIO AUGUSTO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: ANTONIA EDMAR VIEIRA MOREIRA - SP362026-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação ordinária em que se objetiva a concessão de aposentadoria por tempo de
serviço/contribuição, mediante o reconhecimento de período trabalhado em atividades
especiais, sua conversão em tempo comum e cômputo aos demais períodos de trabalho
urbano.
A sentença julgou procedente o pedido para reconhecer como laborado(s) em atividade(s)
especial(ais) o(s) período(s) de 15/09/2003 a 15/08/2007 e 16/08/2007 a 22/02/2018,
determinando ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a concessão da aposentadoria por
tempo de serviço integral na forma da Lei nº. 8213/91, com DIB na DER (22/02/2018),
condenando-o, em consequência, ao pagamento das parcelas em atraso, corrigidas
monetariamente na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na
Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal e acrescidas de juros de mora à
razão de 1% ao mês, a partir da citação, nos termos do art. 406 do CC e do art. 161, § 1º, do
CTN. Condenou o réu, também, ao pagamento de honorários de advogado, fixados em 15%
(quinze por cento) do valor da condenação.
Foi determinada, ainda, em sede de antecipação de tutela, a implantação imediata do benefício.
Sentença não submetida ao reexame necessário.
Apela o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, alegando, preliminarmente, a nulidade da
sentença por ausência de fundamentação. No mérito, alega que o autor não comprovou o
exercício de atividade especial, sendo insuficiente o conjunto probatório produzido.
Subsidiariamente, requer a reforma da sentença quanto aos critérios de correção monetária e
juros de mora para que seja aplicada a Lei nº 11.960/2009, bem como a redução do montante
arbitrado a título de honorários advocatícios.
Contrarrazões pela parte apelada, requerendo a manutenção da sentença.
É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5017129-56.2018.4.03.6183
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: AMAURICIO AUGUSTO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: ANTONIA EDMAR VIEIRA MOREIRA - SP362026-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Deve ser rejeitada a alegação de nulidade da r. sentença por ausência de fundamentação, pois
conforme se depreende do art. 489 do CPC, tudo o que for relevante para a decisão deve
constar do relatório e ser analisado na fundamentação, sendo destacados os efeitos
decorrentes em seu dispositivo, resolvendo-se, assim, todas as questões que foram suscitadas
pelas partes.
Assim, não se vislumbra a ausência da análise de qualquer questão relevante no decisum, que,
embora sucinto, traz em seu bojo o necessário para a compreensão dos fundamentos que
levaram o MM. Juiz a julgar procedente o pedido da parte autora.
Neste sentido, já se pronunciaram o E. Supremo Tribunal Federal e C. Superior Tribunal de
Justiça: STF, 2ª Turma, Rel. Min. Carlos Velloso, AI 162.089-8/DF, j. 12.12.95, DJU 15.03.96, p.
7.209 e STJ, 2ª Turma, Rel. Min. Ari Pargendler, Resp 15.450/SP, j. 01.04.96, DJU 06.05.96, p.
14.399.
Passo ao exame do mérito.
Aposentadoria por tempo de serviço/contribuição – requisitos
A aposentadoria por tempo de serviço, atualmente denominada aposentadoria por tempo de
contribuição, admitia a forma proporcional e a integral antes do advento da Emenda
Constitucional 20/98, fazendo jus à sua percepção aqueles que comprovem tempo de serviço
(25 anos para a mulher e 30 anos para o homem na forma proporcional, 30 anos para a mulher
e 35 anos para o homem na forma integral) desenvolvido totalmente sob a égide do
ordenamento anterior, respeitando-se, assim, o direito adquirido.
Aqueles segurados que já estavam no sistema e não preencheram o requisito temporal à época
da Emenda Constitucional 20 de 15 de dezembro de 1998, fazem jus à aposentadoria por
tempo de serviço proporcional desde que atendam às regras de transição expressas em seu
art. 9º, caso em que se conjugam o requisito etário (48 anos de idade para a mulher e 53 anos
de idade para o homem) e o requisito contributivo (pedágio de 40% de contribuições faltantes
para completar 25 anos, no caso da mulher e para completar 30 anos, no caso do homem).
Atualmente, são requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de
acordo com os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições (30
anos para a mulher e 35 anos para o homem), ressaltando-se que o tempo de serviço prestado
anteriormente à referida Emenda equivale a tempo de contribuição, a teor do art. 4º da Emenda
Constitucional 20/98.
Aposentadoria Especial
A aposentadoria por tempo de serviço especial teve assento primeiro no artigo 31 da Lei nº
3.807, de 26 de agosto de 1960, Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS, que estabeleceu
que seria concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinquenta) anos de idade e 15
(quinze) anos de contribuições, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e
cinco) anos, conforme a atividade profissional, em serviços que, para esse efeito, fossem
considerados penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo.
Prevê ainda, o mencionado diploma legal, no art. 162, o reconhecimento de atividade especial
prestada em data anterior à sua edição, na hipótese de seu cômputo ser mais benéfico ao
segurado.
Como assentado pelas Cortes Superiores "tal hipótese, apesar de similar, não se confunde com
a questão da legislação aplicável ao caso de concessão de aposentadoria, tampouco com
aquela que diz respeito à possibilidade de aplicação retroativa da lei nova que estabeleça
restrição ao cômputo do tempo de serviço. (...) Interpretação diversa levaria à conclusão de que
o segurado, sujeito a condições insalubres de trabalho, só teria direito à aposentadoria especial
após 15, 20 e 25 anos de trabalho exercida depois da Lei nº 3.807/60, desconsiderando,
portanto, todo o período de labor, também exercido em tal situação, porém em data anterior à
lei de regência" (Ag Rg no REsp nº 1015694, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza Assis de
Moura, DJe 01/02/2011)
Essa norma foi expressamente revogada pela Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973, que passou
a discipliná-la no artigo 9º, alterando, em efeitos práticos, apenas o período de carência de 15
(quinze) anos para 5 (cinco) anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
Sobreveio, então, o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, reclassificando as atividades
profissionais segundo os agentes nocivos e os grupos profissionais tidos por perigosos,
insalubres ou penosos, com os respectivos tempos mínimos de trabalho.
Importante ressaltar que os Decretos nºs. 53.831/64 e 83.080/79 tiveram vigências simultâneas,
de modo que, conforme reiteradamente decidido pelo C. STJ, havendo colisão entre as
mencionadas normas, prevalece a mais favorável ao segurado. (REsp nº 412351, 5ª Turma,
Rel. Min. Laurita Vaz, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, pág. 355).
As atividades insalubres previstas nas aludidas normas são meramente exemplificativas,
podendo outras funções ser assim reconhecidas, desde que haja similitude em relação àquelas
legalmente estatuídas ou, ainda, mediante laudo técnico-pericial demonstrativo da nocividade
da ocupação exercida. Nesse sentido, o verbete 198 da Súmula do TFR.
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, a matéria passou a ser prevista no inciso
II do artigo 202 e disciplinada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação original previa que o
benefício de aposentadoria especial seria devido ao segurado que, após cumprir a carência
exigida, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme
a atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a
integridade física, restando assegurada, ainda, a conversão do período trabalhado no exercício
de atividades danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em seguida, foi editada a Lei nº 9.032/95, alterando o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, dispondo
que a partir desse momento não basta mais o mero enquadramento da atividade exercida pelo
segurado na categoria profissional considerada especial, passando a ser exigida a
demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e
biológicos, que poderá se dar por meio da apresentação de informativos e formulários, tais
como o SB-40 ou o DSS-8030.
Posteriormente, com a edição do Decreto n.º 2.172, de 05/03/1997, que estabeleceu requisitos
mais rigorosos para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos,
passou-se a exigir-se a apresentação de laudo técnico para a caracterização da condição
especial da atividade exercida. Todavia, por se tratar de matéria reservada à lei, tal exigência
apenas tem eficácia a partir da edição da Lei n.º 9.528, de 10/12/1997.
Cumpre observar que a Lei nº 9528/97 também passou a aceitar o Perfil Profissiográfico
Previdenciário - PPP, documento que busca retratar as características de cada emprego do
segurado, de forma a facilitar a futura concessão de aposentadoria especial. Assim, identificado
no documento o perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, é possível a sua
utilização para comprovação da atividade especial em substituição ao laudo pericial.
Ressalto que no tocante ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e
à forma da sua demonstração, deve ser observada a legislação vigente à época da prestação
do trabalho, conforme jurisprudência pacificada da matéria (STJ - Pet 9.194/PR, Rel. Ministro
ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
A extemporaneidade do documento comprobatório das condições especiais de trabalho não
prejudica o seu reconhecimento como tal, "pois a situação em época remota era pior ou ao
menos igual a constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do
ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica." (Des. Fed. Fausto De
Sanctis, AC nº 2012.61.04.004291-4, j. 07/05/2014)
Especificamente em relação ao ruído, o Decreto nº 53.831/64 considerava insalubre o labor
desempenhado com exposição permanente a ruído acima de 80 dB; já o Decreto nº 83.080/79
fixava a pressão sonora em 90 dB. Na medida em que as normas tiveram vigência simultânea,
prevalece disposição mais favorável ao segurado (80 dB).
Com a edição do Decreto nº 2.172/97, a intensidade de ruído considerada para fins de
reconhecimento de insalubridade foi elevada para 90 dB, mas, em 2003, essa medida foi
reduzida para 85 dB, por meio do Decreto nº 4.882, de 18 de novembro de 2003.
Até 09 de outubro de 2013, os Tribunais adotavam o enunciado pela Súmula nº 32 da TNU.
Contudo, esta Súmula foi cancelada em decorrência do julgamento da PET 9059 pelo Superior
Tribunal de Justiça (Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJe
09/09/2013) cujo entendimento foi sufragado no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Ministro
Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), sob a sistemática dos
recursos repetitivos.
Em relação ao agente ruído, vigora o princípio do tempus regit actum. Considera-se especial a
atividade desenvolvida acima do limite de 80dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº
2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90dB
até 18/11/2003, quando foi editado o Decreto nº 4882/2003. A partir de 19/11/2003 o limite
passou a ser de 85 dB.
Saliente-se que a especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento
legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou
formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico
previdenciário (a partir de 11/12/97).
É corrente em nossos tribunais a tese de que sempre se exigiu laudo técnico para comprovar a
exposição do trabalhador aos agentes físicos ruído e calor em níveis superiores aos limites
máximos de tolerância. Entretanto, no tocante às atividades profissionais exercidas até 10/12/97
- quando ainda não havia a exigência legal de laudo técnico -, essa afirmação deve ser
compreendida, não na literalidade, mas no sentido de ser necessário o atesto efetivo e seguro
dos níveis de intensidade dos agentes nocivos a que o trabalhador esteve exposto durante sua
jornada laboral.
Logo, para as atividades profissionais exercidas até 10/12/97, é suficiente que os documentos
apresentados façam expressa menção aos níveis de intensidade dos agentes nocivos.
Uso de equipamento de proteção individual - EPI, como fator de descaracterização do tempo de
serviço especial
A questão foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do ARE nº 664335, da
relatoria do E. Ministro Luiz Fux, com reconhecimento de repercussão geral, na data de
04.12.2014, em que restou decidido que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva
exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente
capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional ao reconhecimento das
atividades especiais.
Restou assentado também que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico
Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não
descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
O fato de a empresa fornecer equipamento de proteção individual - EPI para neutralização dos
agentes agressivos não afasta, por si só, a contagem do tempo especial, pois cada caso deve
ser examinado em suas peculiaridades, comprovando-se a real efetividade do aparelho e o uso
permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. Precedentes do Superior Tribunal
de Justiça (REsp 1428183/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em
25/02/2014, DJe 06/03/2014).
Ainda, conforme a jurisprudência citada, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído,
desde que em níveis acima dos limites legais, constata-se que, apesar do uso de Equipamento
de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável,
até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao
organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas.
Conversão do tempo de serviço especial em comum
Deve ser afastada qualquer tese de limitação temporal de conversão de tempo de serviço
especial em comum, seja em períodos anteriores à vigência da Lei nº 6.887, de 10/12/1980, ou
posteriores a Lei nº 9.711, de 20/11/1998, permanecendo, assim, a possibilidade legal de
conversão, inclusive para períodos posteriores a maio de 1998, uma vez que a norma prevista
no artigo 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91 permanece em vigor, tendo em vista que a revogação
pretendida pela 15ª reedição da MP 1663 não foi mantida quando da conversão na Lei nº
9.711/98. Nesse sentido decidiu a Terceira Seção do STJ no Resp 1.151.363/MG, Relator
Ministro Jorge Mussi, data do julgamento: 23/03/2011.
O Decreto nº 83.080/79 foi renovado pelo Decreto nº 3.048/99 e este, por sua vez, prevê
expressamente em seu art. 70 e seguintes (na redação dada pelo Decreto nº 4.827/03), que os
fatores de conversão (multiplicadores) nele especificados aplicam-se na conversão de tempo de
atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum ao trabalho prestado em
qualquer período.
Caso concreto - elementos probatórios
De início, verifica-se que a controvérsia cinge-se à especialidade das atividades trabalhadas
no(s) período(s) de 15/09/2003 a 15/08/2007 e 16/08/2007 a 22/02/2018.
Neste contexto, do exame dos autos verifico que os períodos em questão, laborados nas
empresas São Luiz Viação Ltda. e Viação Campo Belo Ltda., na função de motorista, não
podem ser considerados como trabalhados em condições especiais, porquanto os PPP’s -
Perfis Profissiográficos Previdenciários (Id 71580761/35-36 e 41-42), indicam a exposição do
requerente a ruído de 80,2 decibéis, patamar este inferior aos níveis de ruído toleráveis para o
período em análise, que era de 90 decibéis e foi reduzido para 85 decibéis, por meio do Decreto
nº 4.882, de 18 de novembro de 2003.
A exposição à vibração de corpo inteiro, no exercício da função de motorista de ônibus, não
caracteriza a atividade especial, ante a ausência de preceito legal prevendo tal hipótese. Para o
enquadramento da atividade especial em razão de agente nocivo vibração é necessária à
realização de trabalhos "com perfuratrizes e marteletes pneumáticos", nos termos do código
1.1.5 do Decreto n° 53.831/64, código 1.1.4 do Decreto n° 83.080/79, código 2.0.2 do Decreto
n° 2.172/97 e código 2.0.2 do Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, o que não é o caso dos autos.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. ADVENTO NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. LEI N.º 13.105/15.
NÃO CONHECIMENTO DA REMESSA OFICIAL. APOSENTADORIA ESPECIAL. ART. 57 DA
LEI N.º 8.213/91. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ARTS. 52 E 53 DA
LEI N.º 8.213/91. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE PROFISSIONAL SOB CONDIÇÕES ESPECIAIS
EM PARTE DO PERÍODO PLEITEADO. TEMPO INSUFICIENTE PARA A CONCESSÃO DA
BENESSE.
I - O Novo CPC modificou o valor de alçada para causas que devem obrigatoriamente ser
submetidas ao segundo grau de jurisdição, dizendo que não necessitam ser confirmadas pelo
Tribunal condenações da União em valores inferior a 1.000 salários mínimos; esse preceito tem
incidência imediata aos feitos em tramitação nesta Corte, não-obstante remetidos pelo juízo a
quo.
II- Caracterização de atividade especial em virtude da exposição do segurado ao agente
agressivo ruído. Perfil Profissiográfico Previdenciário comprovando a sujeição habitual e
permanente do autor a níveis sonoros superiores a 80 dB(A), até 05.03.1997.
III- Ausência de previsão legal para o enquadramento da atividade de motorista de ônibus em
virtude da vibração de corpo inteiro (VCI), restrita aos trabalhadores que se utilizam de
perfuratrizes e marteletes pneumáticos, a teor do código 1.1.5 do anexo III, do Decreto n.º
53.831/64, código 1.1.5 do anexo III, do Decreto n.º 53.831/64, código 1.1.4 do anexo I, do
Decreto n.º 83.080/79 e código 2.0.2 do anexo IV, do Decreto n.º 3.048/99. Inadmissibilidade de
laudo pericial elaborado por iniciativa unilateral, em face de empresas paradigmas.
IV - Tempo insuficiente para concessão da aposentadoria especial ou por tempo de
contribuição.
V - Remessa oficial não conhecida. Apelação do INSS parcialmente provida.
(TRF 3ª Região, OITAVA TURMA, APELREEX - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA -
2238900 - 0007690-48.2014.4.03.6183, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS,
julgado em 26/06/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:10/07/2017)
Ademais, observo não ser possível o reconhecimento da especialidade, pois não comprovada a
exposição da parte autora à vibração de corpo inteiro, vez que os PPP’s não apontam tal
exposição.
Em regra, havendo nos autos documentos específicos emitidos pela empresa empregadora em
nome do autor, atestando as condições do ambiente de trabalho no período analisado, não há
que se falar em aceitação, como prova emprestada, dos laudos periciais judiciais produzidos
em reclamatórias trabalhistas ajuizadas pelo sindicato da categoria em face de empresas
diversas daquela em que o autor trabalhou, bem como não há que se falar em aceitação do
laudo técnico particular - que se refere, genericamente, à categoria profissional - como meio de
prova apto a prevalecer em relação aos documentos específicos aludidos.
A esse respeito, trago julgado de relatoria do E. Des. Federal Toru Yamamoto:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL RECONHECIDA. NOVO CÁLCULO DA RMI. JUROS
DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DO INSS
IMPROVIDA. REMESSA OFICIAL PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA MANTIDA EM
PARTE.
1. Para o requerimento da aposentadoria especial, instituída pelo artigo 31 da Lei nº 3.807/60,
determina o critério de especificação da categoria profissional com base na penosidade,
insalubridade ou periculosidade, definidas por Decreto do Poder Executivo, foi mantido até a
edição da Lei nº 8.213/91, ou seja, as atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo
Poder Executivo seriam consideradas penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de
comprovação por laudo técnico, bastando, assim, a anotação da função em CTPS ou a
elaboração do então denominado informativo SB-40.
2. O uso de equipamento de proteção individual não descaracteriza a natureza especial da
atividade a ser considerada, uma vez que tal tipo de equipamento não elimina os agentes
nocivos à saúde que atingem o segurado em seu ambiente de trabalho, mas somente reduz
seus efeitos. Nesse sentido, precedentes desta E. Corte (AC nº 2000.03.99.031362-0/SP; 1ª
Turma; Rel. Des. Fed. André Nekatschalow; v.u; J. 19.08.2002; DJU 18.11) e do Colendo
Superior Tribunal de Justiça: REsp 584.859/ES, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta
Turma, julgado em 18/08/2005, DJ 05/09/2005 p. 458).
3. Para comprovar a atividade especial nos períodos de 17/09/1986 a 09/04/1994, laborado na
empresa São Paulo Transportes Urbanos S/A e de 10/04/1994 a 28/04/1995, laborado na
empresa Eletrobus Consórcio Paulista de Transportes por ônibus, o autor apresentou contratos
de trabalho demonstrando que o autor exercia a função de cobrador em ambos os períodos,
cuja atividade é enquadrada como especial com base no código 2.4.4 do Anexo III do Decreto
nº 53.831/64 e no código 2.4.2 do Anexo II do Decreto nº 83.080/79 (CTPS, fl. 23).
4. Quanto ao período posterior a 29/04/1995, observo não ser possível o reconhecimento da
atividade especial, vez que não pose ser enquadrada a profissão como atividade especial e,
quanto à exposição à vibração (VCI) alegada pela parte autora, nos termos da Instrução
Normativa INSS/PRES nº 45/2010 - publicada no DOU de 11/08/2010, para comprovação da
vibração no corpo inteiro (VCI) e acima dos limites legalmente admitidos justifica a contagem de
tempo especial para fins previdenciários.
5. No caso dos autos, não houve apresentação de Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP
ou laudo técnico, mas apenas laudo pericial judicial produzido em ação reclamatória trabalhista
proposta pelo Sindicato dos Motoristas e Trabalhadores em Transporte Rodoviário Urbano de
São Paulo, em face de empresa Auto Viação Taboão Ltda., empresa diversa das quais o autor
prestou serviço (fls. 474/479).
6. E, ainda que o expert tenha atestado que os motoristas e cobradores de ônibus trabalhavam
expostos a vibrações acima dos limites legais, não há como concluir que as condições eram
idênticas àquelas enfrentadas pelo autor em seu trabalho, ou ainda, que os veículos utilizados
no desempenho da atividade de 'cobrador' apresentavam as mesmas características
(ano/modelo/marca) daqueles periciados e indicados nos laudos acostados aos autos.
7. Apelações da parte autora e do INSS improvidas.
8. Remessa oficial parcialmente provida.
9. Sentença mantida em parte.
(TRF 3ª Região, AC nº 0012027-17.2013.4.03.6183/SP, Rel. Des. Federal Toru Yamamoto, DJe
11/06/2018)
Ainda que o laudo pericial, produzido na ação trabalhista nº 01803201004802000, de interesse
do Sindicato dos Motoristas e Trabalhadores em Transportes (Id 71580763), fosse considerado
como prova emprestada em relação ao período laborado na empresa Viação Campo Belo Ltda.,
observo não ser possível o reconhecimento da especialidade, pois não foi comprovada a
exposição da parte autora a níveis de aceleração superiores aos previstos pela Instrução
Normativa INSS/PRES nº 45/2010 - publicada no DOU de 11/08/2010.
Dispõe o referido documento que a comprovação da vibração no corpo inteiro (VCI) e acima
dos limites legalmente admitidos justifica a contagem de tempo especial para fins
previdenciários, in verbis:
"Art. 242. A exposição ocupacional a vibrações localizadas ou no corpo inteiro dará ensejo à
aposentadoria especial quando forem ultrapassados os limites de tolerância definidos pela
Organização Internacional para Normalização - ISSO, em suas Normas ISSO nº 2.631 e
ISSO/DIS nº 5.349, respeitando-se as metodologias e os procedimentos de avaliação que elas
autorizam."
Tais limites são elencados no item 2.2 do Anexo VIII da NR-15:
"2.2. Caracteriza-se a condição insalubre caso sejam superados quaisquer dos limites de
exposição ocupacional diária a VCI:
a) valor da aceleração resultante de exposição normalizada (aren) de 1,1 m/s2;
b) valor da dose de vibração resultante (VDVR) de 21,0 m/s1,75".
Dessa forma, a soma dos períodos anotados na CTPS não perfaz o tempo suficiente à
concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço proporcional e tampouco a
integral, motivo pelo qual deve ser julgado improcedente o pedido.
Inverto o ônus da sucumbência e condeno a parte autora ao pagamento de honorários de
advogado que ora fixo em 10% (dez por cento) do valor da causa atualizado, de acordo com o
§6º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, cuja exigibilidade, diante da assistência
judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo
98 do Código de Processo Civil/2015.
Revogo a antecipação de tutela anteriormente concedida e, em consequência, determino a
devolução dos valores recebidos a esse título, consoante decidido pela Primeira Seção do
Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso representativo de controvérsia, REsp nº
1401560/MT, julgado em 12/02/2014, DJe 13/10/2015.
Ante o exposto, rejeito a preliminar e, no mérito,dou provimento à apelação do INSS para julgar
improcedente o pedido e, em consequência, revogo a tutela antecipada e determino a
devolução dos valores indevidamente pagos a esse título, conforme fundamentação.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. DECISÃO FUNDAMENTADA. INEXISTÊNCIA DE
NULIDADE. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. NÃO
COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. VIBRAÇÃO DE CORPO INTEIRO. NÃO
IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. TUTELA
ANTECIPADA REVOGADA. DEVOLUÇÃO DE VALORES.
1. Preliminar de nulidade rejeitada. Não se vislumbra a ausência da análise de qualquer
questão relevante no decisum, que, embora sucinto, traz em seu bojo o necessário para a
compreensão de seus fundamentos.
2. São requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com
os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições, ressaltando-se
que o tempo de serviço prestado anteriormente à Emenda Constitucional 20/98 equivale a
tempo de contribuição, a teor do seu art. 4º.
3. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o
reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua
demonstração.
4. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da
atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no
período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário (a
partir de 11/12/97).
5. A exposição à vibração de corpo inteiro (VCI), no desempenho da atividade de motorista de
ônibus, não enseja o reconhecimento do tempo especial por ausência de preceito legal
prevendo tal hipótese, sendo que aquela somente caracteriza a atividade especial quando
vinculada à realização de trabalhos "com perfuratrizes e marteletes pneumáticos", nos termos
do código 1.1.5 do Decreto n° 53.831/64, código 1.1.4 do Decreto n° 83.080/79, código 2.0.2 do
Decreto n° 2.172/97 e código 2.0.2 do Anexo IV do Decreto nº 3.048/99.
6. Não alcançados os níveis de aceleração previstos pelo item 2.2, Anexo VIII, da NR 15.
7. O autor não implementou os requisitos necessários à concessão do benefício.
8. Inversão do ônus da sucumbência. Exigibilidade condicionada à hipótese do §3º do artigo 98
do CPC/2015.
9. Tutela antecipada revogada. Devolução dos valores. Precedente: REsp nº 1401560/MT.
10. Preliminar rejeitada; no mérito, apelação do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
provida para julgar improcedente o pedido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a preliminar e, no mérito, dar provimento à apelação do INSS, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
