Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5440063-04.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
22/04/2021
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 28/04/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. DECISÃO FUNDAMENTADA. INEXISTÊNCIA DE NULIDADE.
PENSÃO POR MORTE. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. UNIÃO ESTÁVEL. CONJUNTO
PROBATÓRIO SUFICIENTE. REQUISITOS PREENCHIDOS. JUROS E CORREÇÃO
MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
HONORÁRIOS DE ADVOGADO MAJORADOS.
1. Preliminar de nulidade rejeitada. Não se vislumbra a ausência da análise de qualquer questão
relevante no decisum, que, embora sucinto, traz em seu bojo o necessário para a compreensão
de seus fundamentos.
2. O benefício de pensão por morte está disciplinado nos artigos 74 a 79 da Lei nº 8.213/1991,
sendo requisitos para a sua concessão a qualidade de segurado do de cujus e a comprovação de
dependência do pretenso beneficiário.
3. Conjunto probatório suficiente à comprovação da união estável e da dependência econômica
da parte autora em relação ao segurado falecido de modo a preencher os requisitos para
concessão do benefício.
4. Devem ser excluídas da condenação as parcelas do benefício recebidas pela filha da autora e
do segurado falecido sob pena de pagamento em duplicidade.
5. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a
elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-
se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE n. 870.947,
tema de repercussão geral n. 810, em 20.09.2017, Rel. Ministro Luiz Fux. Correção de ofício.
6. Sentença corrigida de ofício. Preliminar rejeitada. No mérito, apelação do INSS parcialmente
provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5440063-04.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JULIANA APARECIDA OLIVEIRA MARQUES
Advogado do(a) APELADO: IVONE APARECIDA CIPRIANO GONCALVES - SP219564-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5440063-04.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JULIANA APARECIDA OLIVEIRA MARQUES
Advogado do(a) APELADO: IVONE APARECIDA CIPRIANO GONCALVES - SP219564-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação ajuizada por JULIANA APARECIDA OLIVEIRA MARQUES em face do Instituto
Nacional do Seguro Social – INSS, objetivando a concessão do benefício de pensão por morte
em decorrência do óbito de Antônio Carlos Bandeira, ocorrido em 21/05/2002.
A sentença julgou procedente o pedido para condenar o INSS a conceder o benefício ao autor a
partir da data do indeferimento administrativo (27/10/2014) e ao pagamento das parcelas em
atraso, corrigidas monetariamente pelo INPC e acrescidas de juros de mora nos termos do art. 1º
- F da Lei n. 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009. Condenou, ainda, o INSS ao
pagamento de honorários de advogado, em percentual a ser definido por ocasião da liquidação
da sentença, nos termos do artigo 85, § 4º, inciso II, do CPC/2015, incidente sobre o valor da
condenação, considerado como termo final desta a data da sentença, nos termos da Súmula n.
111 do STJ.
Foi determinada, ainda, em sede de antecipação de tutela, a implantação imediata do benefício.
Sentença não submetida ao reexame necessário.
Apela o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS alegando, preliminarmente, a nulidade da
sentença por ausência de fundamentação. No mérito sustentando, em síntese, que não restou
comprovada a união estável e a dependência econômica, sendo indevido o benefício pretendido.
Subsidiariamente, requer o afastamento da condenação ao pagamento das parcelas em atraso,
bem como a fixação do tempo de união estável para adequação ao artigo 77 da Lei n. 8.213/91.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5440063-04.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JULIANA APARECIDA OLIVEIRA MARQUES
Advogado do(a) APELADO: IVONE APARECIDA CIPRIANO GONCALVES - SP219564-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
PRELIMINAR
Deve ser rejeitada a alegação de nulidade da r. sentença por ausência de fundamentação, pois
conforme se depreende do art. 489 do CPC, tudo o que for relevante para a decisão deve constar
do relatório e ser analisado na fundamentação, sendo destacados os efeitos decorrentes em seu
dispositivo, resolvendo-se, assim, todas as questões que foram suscitadas pelas partes.
Assim, não se vislumbra a ausência da análise de qualquer questão relevante no decisum, que,
embora sucinto, traz em seu bojo o necessário para a compreensão dos fundamentos que
levaram o MM. Juiz a julgar parcialmente procedente o pedido da parte autora.
Neste sentido, já se pronunciaram o E. Supremo Tribunal Federal e C. Superior Tribunal de
Justiça: STF, 2ª Turma, Rel. Min. Carlos Velloso, AI 162.089-8/DF, j. 12.12.95, DJU 15.03.96, p.
7.209 e STJ, 2ª Turma, Rel. Min. Ari Pargendler, Resp 15.450/SP, j. 01.04.96, DJU 06.05.96, p.
14.399.
MÉRITO
Os requisitos a serem observados para a concessão da pensão por morte estão previstos nos
artigos 74 a 79 da Lei nº 8.213/1991, sendo necessária a comprovação, cumulativamente: a) do
óbito ou morte presumida de pessoa que seja segurada (obrigatória ou facultativa) da Previdência
Social; b) da existência de beneficiário dependente do de cujus, em idade hábil ou preenchendo
outras condições previstas em lei; e c) da qualidade de segurado do falecido.
No tocante aos dependentes do segurado falecido, o direito à pensão por morte encontra-se
disciplinado na Lei n. 8.213/91, art. 16, in verbis:
" Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes
do segurado: I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer
condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou
mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente; II - os pais;
III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou
que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim
declarado judicialmente."
Vale lembrar que esse benefício é devido ao conjunto de dependentes do de cujus que reúnam
as condições previstas nos art. 77 da Lei 8.213/1991, obviamente cessando para o dependente
que não mais se enquadre nas disposições desse preceito normativo. Nem mesmo a constatação
de dependente ausente obsta a concessão da pensão, cabendo sua habilitação posterior (art. 76
da Lei 8.213/1991).
Por sua vez, o § 4º desse mesmo artigo estabelece que "a dependência econômica das pessoas
indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada".
A dependência econômica não precisa ser exclusiva, de modo que persiste ainda que a parte
autora tenha outros meios de complementação de renda. Interpretação abrangente do teor da
Súmula 229, do extinto E. TFR.
Nesse sentido, também não impede a concessão do benefício em tela o fato de o dependente
receber aposentadoria, pois o art. 124 da Lei nº 8.213/1991 não veda a acumulação da pensão
por morte com aposentadoria, quando presentes os requisitos legais. Nega, apenas, a
acumulação de mais de uma pensão, deixada por cônjuge ou companheiro, assegurado o direito
de se optar pelo pagamento da mais vantajosa.
O caso dos autos
Contesta a autarquia apelante a condição de dependente da apelada em relação ao segurado
falecido, por entender não estar comprovada a união estável e a dependência econômica.
Nos termos do §6º do artigo 16 do Decreto n. 3.308/99, a união estável é aquela configurada na
convivência pública, contínua e duradoura entre o homem e a mulher, estabelecida com intenção
de constituição de família, observado o §1º do artigo 1.723 do Código Civil (Lei n. 10.406/2002).
Constatada a relação de união estável, a dependência econômica da companheira é presumida,
conforme disposto no inciso I do artigo 16 da Lei n. 8.213/91, sendo desnecessária a prova nesse
sentido.
A sentença de primeiro grau julgou procedente o pedido de concessão do benefício sob os
seguintes fundamentos:
"(...)
Na hipótese dos autos, a união estável entre o de cujus e a autora restou comprovada pelo
documento de p. 25/30, sentença declaratória de união estável transitada em julgado. Assim,
logrou êxito em comprovar a união estável mantida com o de cujus.
O artigo 16, inciso I e § 4º, da Lei 8.213/91, veicula preceitos legais relevantes na discussão do
conflito de interesses trazido a juízo. In verbis:
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes
do segurado: I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado,de qualquer
condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;[...]§ 4° A dependência econômica das
pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.
Segundo Wladimir Novaes Martinez, em sua obra Comentários à Lei Básica da Previdência
Social, Tomo II, 5ª edição, editora LTR:
(...) companheiros são pessoas vivendo como se casados fossem, assim entendida a vida em
comum, apresentando-se publicamente juntos, partilhando o mesmo lar ou não, dividindo
encargos da affectio societatis conjugal. A estabilidade de tal união não é fácil de ser
caracterizada e, embora não mais exigida a prova de dependência econômica, agora presumida,
só tem sentido o direito à pensão por morte se ambos se auxiliavam e se mantinham numa
família, e isso pressupõe, de regra, certa convivência sob o mesmo teto e não relacionamento às
escondidas.
A prova da dependência do autor em relação à segurada é desnecessária, uma vez que,
comprovada a união estável, tal qual na hipótese em testilha, a dependência econômica é
presumida, nos exatos termos do disposto no artigo 16, § 4º, da Lei nº 8.213/91.
Frise-se que o requerido não produziu nenhuma prova que pudesse elidir esta presunção.
Nos termos do art. 74, caput c.c. art. 26, I, da Lei n.º 8.213/91, a concessãode pensão por morte
independe do cumprimento de carência. Assim, a pensão por morte é devida aos dependentes do
segurado que, na data do óbito, mantinha tal qualidade junto à Previdência Social, o que resultou
comprovado no feito.
Dessa forma, a requerente faz jus ao benefício pensão por morte."
A sentença proferida em processo no qual o INSS não foi parte pode, sem dúvida, ser objeto de
questionamento por parte deste, tendo em vista a limitação dos efeitos subjetivos da coisa
julgada. Essa questão é relevante em especial nas ações de estado, em que a existência de
vínculo familiar pode levar à imposição de ônus ao ente estatal previdenciário, que não participou
da ação originária.
Todavia, para atacar a sentença, o INSS deve fazê-lo de forma adequada, trazendo elementos
aptos a colocar em dúvida o que foi reconhecido na ação anterior o que não ocorreu no caso em
exame.
Nesse passo, observo que a sentença reconheceu a existência da união estável pelo período de
10 anos até a data do óbito de Antônio Carlos Bandeira (id. 46041903).
Verifica-se, assim, que o MM. Juiz sentenciante concluiu pela existência da união estável e da
dependência econômica da autora em relação ao segurado falecido com base no conjunto
probatório acostado aos autos, sendo de rigor a manutenção da sentença de procedência por
seus próprios fundamentos legais.
Observa-se que a autora é genitora e representante legal da filha do falecido que foi beneficiária
da pensão por morte em sua integralidade, a partir da data do óbito à data em que atingiu a
maioridade, no período de 21/04/2002 a 017/07/2015, conforme consulta CNIS acostada aos
autos (id 46041947). Sendo assim, considerando que o termo inicial do benefício da autora foi
fixado em 27/10/2014, devem ser descontadas as parcelas atrasadas de seu benefício, referentes
ao período de 27/10/2014 a 17/07/2015, sob pena de pagamento em duplicidade.
No que tange aos critérios de atualização do débito, verifico que a sentença desborda do
entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de
repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
Assim, tratando-se de matéria cognoscível de ofício (AgRg no AREsp 288026/MG, AgRg no REsp
1291244/RJ), corrijo a sentença e estabeleço que as parcelas vencidas deverão ser atualizadas
monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de
Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da
conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à
TR – Taxa Referencial. Anoto que os embargos de declaração opostos perante o STF que
objetivavam a modulação dos efeitos da decisão supra, para fins de atribuição de eficácia
prospectiva, foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019.
Ante o exposto, de ofício, corrijo a sentença para fixar os critérios de atualização do débito, rejeito
a preliminar e, no mérito, dou parcial provimento à apelação do INSS para excluir da condenação
o pagamento das parcelas em atraso referentes ao período de 27/10/2014 a 07/07/2015, nos
termos da fundamentação.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. DECISÃO FUNDAMENTADA. INEXISTÊNCIA DE NULIDADE.
PENSÃO POR MORTE. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. UNIÃO ESTÁVEL. CONJUNTO
PROBATÓRIO SUFICIENTE. REQUISITOS PREENCHIDOS. JUROS E CORREÇÃO
MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
HONORÁRIOS DE ADVOGADO MAJORADOS.
1. Preliminar de nulidade rejeitada. Não se vislumbra a ausência da análise de qualquer questão
relevante no decisum, que, embora sucinto, traz em seu bojo o necessário para a compreensão
de seus fundamentos.
2. O benefício de pensão por morte está disciplinado nos artigos 74 a 79 da Lei nº 8.213/1991,
sendo requisitos para a sua concessão a qualidade de segurado do de cujus e a comprovação de
dependência do pretenso beneficiário.
3. Conjunto probatório suficiente à comprovação da união estável e da dependência econômica
da parte autora em relação ao segurado falecido de modo a preencher os requisitos para
concessão do benefício.
4. Devem ser excluídas da condenação as parcelas do benefício recebidas pela filha da autora e
do segurado falecido sob pena de pagamento em duplicidade.
5. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a
elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-
se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa
Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE n. 870.947,
tema de repercussão geral n. 810, em 20.09.2017, Rel. Ministro Luiz Fux. Correção de ofício.
6. Sentença corrigida de ofício. Preliminar rejeitada. No mérito, apelação do INSS parcialmente
provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu, de ofício, corrigir a sentença para fixar os critérios de atualização do débito,
rejeitar a preliminar e, no mérito, dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
