
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5174474-78.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JURAMIR ANTUNES DA ROSA
Advogados do(a) APELADO: HENRIQUE TORTATO - SP340958-N, LETICIA DE MATTOS SCHRODER - SP298110-N
OUTROS PARTICIPANTES:
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5174474-78.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JURAMIR ANTUNES DA ROSA
Advogados do(a) APELADO: HENRIQUE TORTATO - SP340958-N, LETICIA DE MATTOS SCHRODER - SP298110-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Exma. Desembargadora Federal SILVIA ROCHA (Relatora):
Trata-se de ação previdenciária ajuizada por JURAMIR ANTUNES DA ROSA em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, na qual pretende a averbação de período comum (01/09/1970 a 31/03/1975) e a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER.
Deferidos os benefícios da justiça gratuita (id 216694029).
Deferida a produção da prova testemunhal (id 216694041).
Decisão saneadora proferida no id 216694065.
Foi realizada audiência de instrução e julgamento (id 216694072).
A sentença proferida pelo Juízo de 1º grau julgou procedentes os pedidos formulados na inicial, condenando o INSS a averbar como tempo de serviço comum o período de 01/09/1970 a 31/03/1975 e conceder à parte autora aposentadoria por tempo de contribuição a partir da DER (22/05/2019) (id 216694074).
O INSS interpôs apelação (id 216694083), alegando que não é possível computar o período como menor aprendiz como tempo de serviço, visto que, após a edição do Decreto n. 3.048/99, para ser reconhecido como tempo de contribuição, deve ser comprovado que restou caracterizada relação de emprego e não somente a atividade de aluno aprendiz, que é essencialmente educacional. Aduziu que é possível a contagem de tempo de serviço do período em que o segurado exerceu a atividade de aluno aprendiz caso tenha se dado durante a vigência do Decreto n. 4.073, porquanto somente este diploma reconheceu o aprendiz como empregado. Prequestiona as matérias para fins de interposição de recurso. Ao final, requereu o provimento do pleito recursal para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido.
O apelado apresentou contrarrazões (id 216694087).
Vieram os autos conclusos.
É o relatório.
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5174474-78.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JURAMIR ANTUNES DA ROSA
Advogados do(a) APELADO: HENRIQUE TORTATO - SP340958-N, LETICIA DE MATTOS SCHRODER - SP298110-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Exma. Desembargadora Federal SILVIA ROCHA (Relatora):
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado foi interposto no prazo legal.
Considerando que a data de entrada de requerimento da parte autora é anterior à edição da EC 103/2019, o pedido será apreciado em consonância com as regras vigentes anteriores a ela.
Da aposentadoria por tempo de contribuição
A concessão da aposentadoria por tempo de serviço, atualmente denominada por tempo de contribuição, está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91.
Além do tempo de serviço/contribuição, deve também o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos do artigo 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91. Aos já filiados quando do advento da mencionada lei, vige a tabela de seu artigo 142 (norma de transição), na qual, para cada ano de implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de meses de contribuição inferior aos 180 (cento e oitenta) exigidos pela regra permanente do citado artigo 25, inciso II.
Para aqueles que implementaram os requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de serviço até a data de publicação da EC nº 20/98 (16/12/1998), fica assegurada a percepção do benefício, na forma integral ou proporcional, conforme o caso, com base nas regras anteriores ao referido diploma legal.
Já para os segurados já filiados à Previdência Social, mas que não implementaram os requisitos para a percepção da aposentadoria por tempo de serviço antes da sua entrada em vigor, a EC nº 20/98 impôs as condições constantes do seu artigo 9º, incisos I e II.
Ressalte-se, contudo, que as regras de transição previstas no artigo 9º, incisos I e II, da EC nº 20/98 aplicam-se somente para a aposentadoria proporcional por tempo de serviço, e não para a integral, uma vez que tais requisitos não foram previstos nas regras permanentes para obtenção do referido benefício.
Assim, caso o segurado complete o tempo suficiente para a percepção da aposentadoria na forma integral, faz jus ao benefício independentemente de cumprimento do requisito etário e do período adicional de contribuição previstos no artigo 9º da EC nº 20/98.
Por outro lado, para aqueles filiados à Previdência Social após a EC nº 20/98, não há mais possibilidade de percepção da aposentadoria proporcional, mas apenas na forma integral, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e de 30 (trinta) anos, para as mulheres.
Desse modo, atualmente vigoram as seguintes regras para a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição:
Segurados filiados à Previdência Social antes da EC nº 20/98:
a) têm direito à aposentadoria (integral ou proporcional), calculada com base nas regras anteriores à EC nº 20/98, desde que cumprida a carência do artigo 25 c/c 142 da Lei nº 8.213/91, e o tempo de serviço/contribuição dos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91 até 16/12/1998;
b) têm direito à aposentadoria proporcional, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que cumprida a carência do artigo 25 c/c 142 da Lei nº 8.213/91, o tempo de serviço/contribuição dos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91, além dos requisitos adicionais do art. 9º da EC nº 20/98 (idade mínima e período adicional de contribuição de 40%);
c) têm direito à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e de 30 (trinta) anos, para as mulheres;
Segurados filiados à Previdência Social após a EC nº 20/98:
Têm direito somente à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e 30 (trinta) anos, para as mulheres.
Da atividade sem anotação na CTPS
O juízo a quo reconheceu que o autor exerceu atividade laborativa de “aprendiz/office boy” no período de 01/09/1970 a 31/03/1975 para o empregador Jorge Antunes da Rosa.
Para comprovar a atividade, o autor juntou declaração de Jorge Antunes da Rosa, firmada no ano de 2017, e livros contábeis que remontam à época da prestação dos serviços com sua caligrafia (id 216694025). Também foi realizada audiência de instrução e a prova oral produzida corroborou a versão do autor, porquanto testemunhas e informante foram uníssonas ao relatarem o exercício da atividade de office boy pelo autor.
Ouvido em juízo, o informante Alceu Antunes da Rosa, primo do autor, alegou que ele e o autor começaram a trabalhar com seu tio Jorge Antunes da Rosa; que faziam “serviços de rua”, cobrança, correios, coletas, limpeza; que recebiam salário, mas não se recorda o valor; que, no início, o escritório era de José Agostinho Guizi, mas a partir de 1970 se tornou de Jorge; que trabalhavam de segunda a sábado em horário comercial; que o autor saiu do escritório antes do informante; que o autor saiu porque foi trabalhar em uma empresa em que seria registrado.
A testemunha Amilton Santos Claudino afirmou que conhece o autor do escritório de Jorge Rosa; que entrou em 1978, mas o autor já tinha saído; que sabe que o autor entrou no escritório com 12 anos e fazia serviço de banco, cobrança, “tipo office boy”; que o autor trabalhava todo dia, em horário comercial e era subordinado a Jorge Rosa.
No mesmo sentido, foi o testemunho de Bernadete de Lourdes das Neves Copetti, a qual alegou ter sido vizinha do autor; que ele era adolescente e trabalhava no escritório de contabilidade de seu tio, Jorge Rosa; que o autor trabalhava todos os dias e recebia salário.
Em sua apelação, o INSS sustenta a impossibilidade de contabilizar o tempo de contribuição reconhecido na sentença como menor aprendiz, e alega que também não restou caracterizada relação de emprego.
No entanto, entendo que o início de prova material amealhado nos autos, aliado à prova oral produzida em juízo, é suficiente para comprovar a existência de vínculo empregatício, restando demonstrado que o autor, ainda adolescente, realizava atividades administrativas em escritório de contabilidade, como, por exemplo, serviços bancários e de correio.
Friso que, além da declaração do empregador do autor, há início de prova material contemporânea aos fatos, qual seja, as anotações contábeis, atendendo-se ao parágrafo 3º do artigo 55 da Lei nº 8.213/91, não havendo que se falar em reconhecimento de vínculo com base exclusivamente em prova testemunhal.
Ainda, convém destacar que, em que pese a Constituição Federal de 1988 limite a idade do exercício de atividade laborativa para 16 anos, ou 14, como menor aprendiz (art. 7º, XXXIII), a fim de obstar a exploração de trabalho infantil, o INSS não pode fixar idade mínima para o reconhecimento de tempo de contribuição, uma vez que as normas têm o condão de proteger o menor e não prejudicá-lo.
É possível o cômputo do tempo de contribuição decorrente da atividade laborativa exercida pela criança e pelo adolescente, ainda que urbana, haja vista a necessidade de se reduzir o prejuízo sofrido por eles na infância em razão do exercício do trabalho, e se evitar, assim, uma dupla punição, viabilizando o aproveitamento desse tempo para concessão de aposentadoria.
Colaciona-se decisão monocrática do Supremo Tribunal Federal que decidiu a respeito do tema:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PREVIDENCIÁRIO. CONTAGEM DE TEMPO PARA CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. TRABALHO RURAL E URBANO. TEMPO DE ATIVIDADE QUANDO MENOR DE QUATORZE ANOS. POSSIBILIDADE. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO DE FORMA INTEGRAL. SÚMULA N. 279 DO STF. 1. A aposentadoria por tempo de serviço pode ser integrada pela contagem de tempo laborado quando o trabalhador menor de idade não tenha completado quatorze anos. Precedentes: AI 529.694, 2ª Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 11/03/05, e RE 104.654, 2ª Turma, Rel. Min. Francisco Rezek, DJ 25.04.86. 2. In casu, o acórdão considerou como início da contagem do tempo para concessão do benefício a data de 01/01/60, quando o recorrido tinha apenas 09 (nove) anos de idade. [...] Sem razão a recorrente. [...] No mérito, quanto à impossibilidade de contagem de tempo de serviço para aposentação do trabalhador com menos de 14 (quatorze) anos de idade, há de se levar em conta a natureza da norma que estabeleceu tal vedação. O art. 157, IX, da CF/ 46 possuía a seguinte redação: “Art. 157 – A legislação do trabalho e a da previdência social obedecerão nos seguintes preceitos, além de outros que visem a melhoria da condição dos trabalhadores: (...) IX – proibição de trabalho a menores de dezoito anos; em indústrias insalubres, a mulheres e a menores, de dezoito anos; e de trabalho noturno a menores de dezoito anos, respeitadas, em qualquer caso, as condições estabelecidas em lei e as admitidas pelo Juiz competente”. Da simples leitura do dispositivo, percebe-se que o objetivo do constituinte da época era instituir proteção para as crianças à exposição extemporânea ao trabalho, ou seja, a regra foi erigida em proveito desses trabalhadores, não podendo ser utilizada agora para tolher seus direitos, dessa forma, mesmo que tenha sido vedado, na teoria, o trabalho infantil, se este ocorreu no mundo dos fatos, não há como sustentar que uma norma constitucional que lhe conferia benefícios seja utilizada em seu prejuízo. [...] Nesse passo, confira-se parte do voto do e. Min. Francisco Rezek quando do julgamento do RE 104.654, 2ª Turma, DJ de 25/04/86: “Está claro, ainda, que a regra do inciso X do mesmo dispositivo constitucional – proibindo qualquer trabalho ao menor de doze anos – foi inscrita na lista das garantias dos trabalhadores em proveito destes, e não em seu detrimento. Não me parece, assim, razoável o entendimento da origem, que invoca justamente uma norma voltada para a melhoria da condição social do trabalhador, e faz dela a premissa de uma conclusão que contraria o interesse de seu beneficiário, como que a prover nova espécie de ilustração para a secular ironia summum jus, summa injuria.” [...] Ex Positis, NEGO PROVIMENTO ao recurso extraordinário. Publique-se. Brasília, 8 de abril de 2011. (RE 633797, Relator(a): Min. LUIZ FUX, julgado em 08/04/2011, publicado em DJe079 DIVULG 28.04.11 PUBLIC 29.04.11)
Também já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça relativamente ao labor rural das crianças:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. TRABALHADOR URBANO. CÔMPUTO DO TRABALHO RURAL ANTERIOR À LEI 8.213/1991 SEM O RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES. POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DO TRABALHO RURAL ANTERIOR AOS 12 ANOS DE IDADE. INDISPENSABILIDADE DA MAIS AMPLA PROTEÇÃO PREVIDENCIÁRIA ÀS CRIANÇAS E ADOLESCENTES. POSSIBILIDADE DE SER COMPUTADO PERÍODO DE TRABALHO PRESTADO PELO MENOR, ANTES DE ATINGIR A IDADE MÍNIMA PARA INGRESSO NO MERCADO DE TRABALHO. EXCEPCIONAL PREVALÊNCIA DA REALIDADE FACTUAL DIANTE DE REGRAS POSITIVADAS PROIBITIVAS DO TRABALHO DO INFANTE. ENTENDIMENTO ALINHADO À ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DA TNU. ATIVIDADE CAMPESINA DEVIDAMENTE COMPROVADA. AGRAVO INTERNO DO SEGURADO PROVIDO.”
1. Cinge-se a controvérsia em reconhecer a excepcional possibilidade de cômputo do labor de menor de 12 anos de idade, para fins previdenciários. Assim, dada a natureza da questão envolvida, deve a análise judicial da demanda ser realizada sob a influência do pensamento garantístico, de modo a que o julgamento da causa reflita e espelhe o entendimento jurídico que confere maior proteção e mais eficaz tutela dos direitos subjetivos dos hipossuficientes.
2. Abono da legislação infraconstitucional que impõe o limite mínimo de 16 anos de idade para a inscrição no RGPS, no intuito de evitar a exploração do trabalho da criança e do adolescente, ancorado no art. 7o., XXXIII da Constituição Federal. Entretanto, essa imposição etária não inibe que se reconheça, em condições especiais, o tempo de serviço de trabalho rural efetivamente prestado pelo menor, de modo que não se lhe acrescente um prejuízo adicional à perda de sua infância.
3. Nos termos da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o art. 7o., XXXIII, da Constituição não pode ser interpretado em prejuízo da criança ou adolescente que exerce atividade laboral, haja vista que a regra constitucional foi criada para a proteção e defesa dos Trabalhadores, não podendo ser utilizada para privá-los dos seus direitos (RE 537.040/SC, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, DJe 9.8.2011). A interpretação de qualquer regra positivada deve atender aos propósitos de sua edição; no caso de regras protetoras de direitos de menores, a compreensão jurídica não poderá, jamais, contrariar a finalidade protetiva inspiradora da regra jurídica.
4. No mesmo sentido, esta Corte já assentou a orientação de que a legislação, ao vedar o trabalho infantil, teve por escopo a sua proteção, tendo sido estabelecida a proibição em benefício do menor e não em seu prejuízo. Reconhecendo, assim, que os menores de idade não podem ser prejudicados em seus direitos trabalhistas e previdenciário, quando comprovado o exercício de atividade laboral na infância.
5. Desta feita, não é admissível desconsiderar a atividade rural exercida por uma criança impelida a trabalhar antes mesmo dos seus 12 anos, sob pena de punir duplamente o Trabalhador, que teve a infância sacrificada por conta do trabalho na lide rural e que não poderia ter tal tempo aproveitado no momento da concessão de sua aposentadoria. Interpretação em sentido contrário seria infringente do propósito inspirador da regra de proteção.
6. Na hipótese, o Tribunal de origem, soberano na análise do conjunto fático-probatório dos autos, asseverou que as provas materiais carreadas aliadas às testemunhas ouvidas, comprovam que o autor exerceu atividade campesina desde a infância até 1978, embora tenha fixado como termo inicial para aproveitamento de tal tempo o momento em que o autor implementou 14 anos de idade (1969).
7. Há rigor, não há que se estabelecer uma idade mínima para o reconhecimento de labor exercido por crianças e adolescentes, impondo-se ao julgador analisar em cada caso concreto as provas acerca da alegada atividade rural, estabelecendo o seu termo inicial de acordo com a realidade dos autos e não em um limite mínimo de idade abstratamente pré-estabelecido. Reafirma-se que o trabalho da criança e do adolescente deve ser reprimido com energia inflexível, não se admitindo exceção que o justifique; no entanto, uma vez prestado o labor o respectivo tempo deve ser computado, sendo esse cômputo o mínimo que se pode fazer para mitigar o prejuízo sofrido pelo infante, mas isso sem exonerar o empregador das punições legais a que se expõe quem emprega ou explora o trabalho de menores.
8. Agravo Interno do Segurado provido.” (grifou-se)
(AgInt no AREsp n. 956.558/SP, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 2/6/2020, DJe de 17/6/2020.)
Desse modo, considerando o início de prova material, ratificado pela prova testemunhal, verifico que o arcabouço probatório é suficiente para comprovação do labor exercido sem anotação em CTPS no interregno de 01/09/1970 a 31/03/1975.
A propósito, há recente julgado da Oitava Turma deste Tribunal nesse sentido:
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DO TEMPO DE ATIVIDADE URBANA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL, CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL. RECURSO DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA.
- Recurso de apelação, ofertado pelo instituto previdenciário.
- Pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, após averbação do tempo de atividade urbana.
- O cerne da questão trazida aos autos é possibilidade de reconhecimento do tempo urbano, impugnado pelo INSS porque o reconhecimento se deu sem base em início de prova material.
- Inteligência do art. 55, da Lei nº 8.213/91.
- O conjunto probatório, consistente em início de prova material corroborado pela prova testemunhal, é suficiente para comprovar o alegado período de trabalho.
- Os elementos trazidos aos autos evidenciam, portanto, a relação de trabalho.
- Incidência do princípio da livre persuasão racional, descrito no art. 371, da lei processual civil.
(TRF 3ª Região, 8ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5108903-63.2021.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA, julgado em 08/07/2024, DJEN DATA: 12/07/2024)
Saliento, ainda, que tais períodos não vão de encontro com nenhum outro registrado em CTPS (id 216694024).
Cabe destacar que compete ao empregador o registro do labor em CTPS e respectivo recolhimento das contribuições, de acordo com o artigo 30, inciso I, alíneas “a” e “b” da Lei n. 8.212/1991, não podendo sua omissão prejudicar o trabalhador.
Esse é o entendimento da Oitava Turma deste Tribunal:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. MATÉRIA PRELIMINAR REJEITADA. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE COMUM E ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A RUÍDO. PARCIAL COMPROVAÇÃO. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO MANTIDA. ISENÇÃO DE CUSTAS. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. (...) 3. A controvérsia nos presentes autos, portanto, refere-se ao reconhecimento dos períodos de 24/11/1984 a 20/12/1984, 01/05/2016 a 31/03/2018 e 01/02/2019 a 30/06/2019 como tempo de contribuição comum, bem como o reconhecimento de atividade especial nos períodos de 19/09/1986 a 25/10/1986, 02/03/1990 a 08/06/1993, 13/07/1993 a 26/03/1996 e 26/06/2008 a 25/11/2010, para fins de concessão de aposentadoria aposentadoria por tempo de contribuição. 4. No tocante ao período de 24/11/1984 a 20/12/1984, verifica-se a existência de registro em CTPS junto à empresa "Pórtico Engenharia Empreendimentos Ltda.", e anotações referentes ao vínculo com a empresa, em que consta que o autor foi admitido pelo prazo experimental de 30 dias. Note-se que o vínculo se mostra em ordem cronológica, com respectivo carimbo da empresa e assinatura, devendo ser considerado como tempo comum. E no que concerne ao pagamento das respectivas contribuições, relativamente ao interregno do labor reconhecido, é de se ressaltar que compete ao empregador a arrecadação e o recolhimento do produto aos cofres públicos, a teor do artigo 30, inciso I, "a" e "b" da Lei 8.212/91 e ao Instituto Nacional da Seguridade Social a arrecadação, fiscalização, lançamento e recolhimento de contribuições, consoante dispõe o artigo 33 do aludido diploma legal, não podendo ser penalizado o empregado pela ausência de registro em CTPS, quando deveria ter sido feito em época oportuna, e muito menos pela ausência das contribuições respectivas, quando não deu causa. (...) (TRF 3ª Região, 8ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5002571-57.2020.4.03.6103, Rel. Desembargador Federal TORU YAMAMOTO, julgado em 30/01/2024, DJEN DATA: 02/02/2024)
Assim, a sentença que reconheceu como tempo de contribuição os interregnos supracitados mostra-se acertada.
Portanto, em 22/05/2019, o autor completou 36 anos e 16 dias de contribuição, tendo direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição. O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei 9.876/99, garantido o direito a não incidência do fator previdenciário, caso mais vantajoso, uma vez que a pontuação totalizada é superior a 96 pontos e o tempo mínimo de contribuição foi observado (Lei 8.213/91, art. 29-C, inc. I, incluído pela Lei 13.183/2015).
Segue a respectiva tabela:
Nº | Nome / Anotações | Início | Fim | Fator | Tempo | Carência |
| 1 | - | 01/09/1970 | 31/03/1975 | 1.00 | 4 anos, 7 meses e 0 dias | 55 |
| 2 | RODOVIARIO ITARARE (AVRC-DEF) | 10/04/1975 | 31/10/1975 | 1.00 | 0 anos, 6 meses e 21 dias | 7 |
| 3 | AUTO PECAS SUL PAULISTA LTDA (AVRC-DEF) | 03/05/1976 | 31/07/1977 | 1.00 | 1 anos, 2 meses e 28 dias | 15 |
| 4 | AUTO PECAS SUL PAULISTA LTDA | 01/11/1977 | 11/09/1979 | 1.00 | 1 anos, 10 meses e 11 dias | 23 |
| 5 | MUNICIPIO DE ITARARE (AVRC-DEF) | 28/01/1980 | 27/09/1980 | 1.00 | 0 anos, 8 meses e 0 dias | 9 |
| 6 | BANCO NACIONAL S.A. | 01/10/1980 | 24/08/1981 | 1.00 | 0 anos, 10 meses e 24 dias | 11 |
| 7 | RIVEL RIO VERDE VEICULOS LTDA | 01/11/1981 | 30/11/1981 | 1.00 | 0 anos, 1 meses e 0 dias | 1 |
| 8 | DULBERTO BITTENCOURT MALLEGNI | 01/08/1982 | 30/06/1983 | 1.00 | 0 anos, 11 meses e 0 dias | 11 |
| 9 | FLORA TERRAPLENAGEM E CONSTRUCOES LTDA | 09/08/1986 | 15/01/1987 | 1.00 | 0 anos, 5 meses e 7 dias | 6 |
| 10 | TRANSFADA TRANSPORTE COLETIVO E ENCOMENDAS LTDA (AVRC-DEF) | 19/05/1987 | 31/07/1988 | 1.00 | 1 anos, 2 meses e 12 dias | 15 |
| 11 | COOPERATIVA AGRO PECUARIA SUL PAULISTA | 01/09/1988 | 18/08/1990 | 1.00 | 1 anos, 11 meses e 18 dias | 24 |
| 12 | ITARARE CEREAIS LTDA | 01/04/1991 | 04/11/1991 | 1.00 | 0 anos, 7 meses e 4 dias | 8 |
| 13 | ITARARE TRANSPORTES LTDA | 01/11/1993 | 05/05/1995 | 1.00 | 1 anos, 6 meses e 5 dias | 19 |
| 14 | INCOMIL MATERIAIS DE CONSTRUCAO LTDA | 01/11/1996 | 12/08/1997 | 1.00 | 0 anos, 9 meses e 12 dias | 10 |
| 15 | 31 - AUXILIO DOENCA PREVIDENCIARIO (NB 1039548382) | 15/12/1996 | 11/08/1997 | 1.00 | 0 anos, 0 meses e 0 dias Ajustada concomitância | 0 |
| 16 | JORGE ANTUNES DA ROSA | 01/06/1999 | 15/05/2001 | 1.00 | 1 anos, 11 meses e 15 dias | 24 |
| 17 | CENTRO DE FORMACAO DE CONDUTORES BRASILIA LTDA | 01/02/2002 | 18/06/2008 | 1.00 | 6 anos, 4 meses e 18 dias | 77 |
| 18 | 31 - AUXILIO DOENCA PREVIDENCIARIO Matrícula do (NB 3001206065) | 06/07/2002 | 30/11/2002 | 1.00 | 0 anos, 0 meses e 0 dias Ajustada concomitância | 0 |
| 19 | JR DESPACHANTE LTDA (AEXT-VT IREM-INDPEND PSC-MEN-SM-EC103) | 02/01/2009 | 30/09/2021 | 1.00 | 12 anos, 4 meses e 29 dias Período parcialmente posterior à DER | 149 |
| 20 | CENTRO DE FORMACAO DE CONDUTORES BRASILIA LTDA | 02/01/2009 | 31/10/2017 | 1.00 | 0 anos, 0 meses e 0 dias Ajustada concomitância | 0 |
| 21 | JR DESPACHANTE LTDA (IREM-INDPEND PSC-MEN-SM-EC103) | 02/01/2009 | 01/09/2022 | 1.00 | 1 anos, 0 meses e 0 dias Ajustada concomitância Período parcialmente posterior à DER | 12 |
| 22 | 31 - AUXILIO DOENCA PREVIDENCIARIO (NB 5348884703) | 26/03/2009 | 20/06/2009 | 1.00 | 0 anos, 0 meses e 0 dias Ajustada concomitância | 0 |
| 23 | 31 - AUXILIO DOENCA PREVIDENCIARIO (NB 5434776379) | 01/10/2010 | 01/10/2010 | 1.00 | 0 anos, 0 meses e 0 dias Ajustada concomitância | 0 |
| Marco Temporal | Tempo de contribuição | Carência | Idade | Pontos (Lei 13.183/2015) |
| Até a data da EC nº 20/98 (16/12/1998) | 17 anos, 3 meses e 22 dias | 214 | 41 anos, 10 meses e 15 dias | inaplicável |
Pedágio (EC 20/98) | 5 anos, 0 meses e 27 dias | |||
| Até a data da Lei 9.876/99 (28/11/1999) | 17 anos, 9 meses e 20 dias | 220 | 42 anos, 9 meses e 27 dias | inaplicável |
| Até a DER (22/05/2019) | 36 anos, 0 meses e 16 dias | 440 | 62 anos, 3 meses e 21 dias | 98.3528 |
Diante de todo o exposto, nego provimento à apelação do INSS, mantendo na íntegra a sentença recorrida, na forma da fundamentação, com a majoração da verba honorária em 2% (dois por cento) a título de sucumbência recursal do INSS, nos termos do §11 do artigo 85 do CPC/2015.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO DO INSS. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. MENOR APRENDIZ. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO URBANO SEM REGISTRO EM CTPS. OFFICE BOY. MENOR DE IDADE. POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO.
- O INSS apelou questionando o reconhecimento do período de 01/09/1970 a 31/03/1975, sob o argumento de que os serviços prestados pelo autor não se enquadram como de menor aprendiz, eis que não preenche os requisitos legais, tampouco resta comprovado o vínculo empregatício.
- É possível o reconhecimento de vínculo empregatício, ainda que sem anotação em CTPS, desde que haja início de prova material contemporânea aos fatos, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, consoante estabelece o parágrafo 3º do artigo 55 da Lei nº 8.213/91.
- Para comprovar o exercício da atividade de office boy, o autor juntou declaração do empregador, Jorge Antunes da Rosa, firmada no ano de 2017, e livros contábeis que remontam à época da prestação dos serviços com sua caligrafia. Também foi realizada audiência de instrução e a prova oral produzida corroborou a versão do autor, porquanto testemunhas e informante foram uníssonas ao relatarem o exercício de atividades administrativas pelo autor, quando adolescente, em escritório de contabilidade, como, por exemplo, serviços bancários e de correio, as quais demonstram a função de office boy.
- É necessário frisar que é possível o cômputo do tempo de contribuição decorrente da atividade laborativa exercida pela criança e pelo adolescente, ainda que urbana, haja vista a necessidade de se reduzir o prejuízo sofrido por eles na infância em razão do exercício do trabalho, e se evitar, assim, uma dupla punição, viabilizando o aproveitamento desse tempo para concessão de aposentadoria.
- Também cabe destacar que compete ao empregador o registro do labor em CTPS e respectivo recolhimento das contribuições, de acordo com o artigo 30, inciso I, alíneas “a” e “b” da Lei n. 8.212/1991, não podendo sua omissão prejudicar o trabalhador.
- Assim, reconhecendo-se os períodos de 01/09/1970 a 31/03/1975 como atividade urbana comum, na data da DER (22/05/2019), o autor completou 36 anos e 16 dias de contribuição, fazendo jus à aposentadoria integral por tempo de contribuição e tendo direito a não incidência do fator previdenciário, caso mais vantajoso, eis que a pontuação totalizada é superior a 96 pontos.
- Apelação do INSS conhecida e não provida.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADORA FEDERAL
