D.E. Publicado em 10/09/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Nº de Série do Certificado: | 11DE18032058641B |
Data e Hora: | 29/08/2018 17:00:11 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009739-21.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A EXMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora): Trata-se de apelação interposta por Adeu Barreto de Oliveira em face da r. sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do Benefício de Prestação Continuada previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, condenando a parte autora ao pagamento de custas e despesas processuais e honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor da causa, observando o artigo 98, §3º, do CPC.
A autora pede a reforma do decisum, em síntese, ao argumento de que estão satisfeitos os requisitos necessários à concessão do benefício pleiteado.
Regularmente processado o feito, com contrarrazões, os autos subiram a este Eg. Tribunal.
Certificado pela Subsecretaria da Sétima Turma, nos termos da Ordem de Serviço nº 13/2016, artigo 8º, que a apelação foi interposta no prazo legal e, ainda, que a parte autora é beneficiária da justiça gratuita.
A Procuradoria Regional da República manifestou-se pelo provimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
A EXMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora): Por primeiro, recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua regularidade formal, conforme certidão de fls. 215, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Codex processual.
MÉRITO
O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da Lei 8.742/1993.
Em resumo, o Benefício da Prestação Continuada (BPC) é a garantia de um salário mínimo mensal ao idoso com 65 anos ou mais ou pessoa com deficiência de qualquer idade com impedimentos de natureza física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo (que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 anos), que o impossibilite de participar, em igualdade de condições, com as demais pessoas da vida em sociedade de forma plena e efetiva. Tratando-se de benefício assistencial, não há período de carência, tampouco é necessário que o requerente seja segurado do INSS ou desenvolva alguma atividade laboral, sendo imprescindível, porém, a comprovação da hipossuficiência própria e/ou familiar.
O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal garante o benefício em comento às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à sua própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
O §2º do artigo 20 da Lei 8742/1993, atualmente, define o conceito de pessoa com deficiência como aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Vale ressaltar que a atual legislação, na redação da Lei 13.146/2015 - que ampliou ainda mais o conceito de pessoa com deficiência, ao preceituar que as barreiras limitadoras não precisam ser "diversas", bastando "uma" -, está em harmonia com o conceito adotado pela ONU na Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, a qual foi ratificada pelo Brasil e promulgada pelo Decreto nº 6.949/2009.
Verifica-se que as limitações de que trata a Lei atual vão além de um conceito simplista de incapacidade pura e simples para o trabalho e para a vida independente, eis que devem ser considerados, também, para uma perfeita análise da situação de vulnerabilidade do requerente, fatores sociais e o meio em que a pessoa com deficiência vive, isto é, um conjunto de circunstâncias capazes de impedir a integração justa, plena e igualitária na sociedade daquele que necessita de proteção social.
Nesse sentido, as avaliações de que trata o §6º do artigo 20, que sujeita a concessão do benefício às avaliações médica e social, devendo a primeira considerar as deficiências nas funções e nas estruturas do corpo do requerente, e, a segunda, os fatores ambientais, sociais e pessoais a que está sujeito.
Insta saliente, ainda, que o fato de a incapacidade ser temporária não impede a concessão do benefício, nos termos da Súmula 48 da TNU:
No que diz respeito ao requisito socioeconômico, o §3º do artigo 20 da Lei 8742/1993, em linhas gerais, considera como hipossuficiente para consecução deste benefício, pessoa cuja renda por pessoa do grupo familiar seja inferior a ¼ (um quarto) do salário-mínimo.
Andou bem o legislador, ao incluir o §11 no artigo 20, com a publicação da Lei 13.146/2015, normatizando expressamente que a comprovação da miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade do requerente possa ser comprovada por outros elementos probatórios, além da limitação da renda per capita familiar.
Com efeito, cabe ao julgador avaliar o estado de necessidade daquele que pleiteia o benefício, consideradas suas especificidades, não devendo se ater à presunção absoluta de miserabilidade que a renda per capita sugere (AGARESP 201301166404, NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:03/02/2017 ..DTPB:.; AGRESP 201500259775, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:24/05/2016 ..DTPB:.; RESP 200800142128, MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, STJ - SEXTA TURMA, DJE DATA:29/09/2008 ..DTPB:.).
Para efeitos da mensuração da renda per capita, o Decreto nº 6.214/2007, em seu artigo 4º, regulamentou o que se entende por Grupo Familiar, assim dispondo:
Mencionado artigo também normatizou, em seu inciso VI e §2º, as rendas que poderão ser excluídas no cômputo da renda familiar, bem como as que devem ser consideradas nesse cálculo, vejamos:
Por fim, cabe uma última ponderação, que é a consideração feita ao artigo 19, mencionado no inciso VI do artigo supra citado:
De acordo com esse artigo, se algum dos membros do Grupo Familiar receber igual benefício assistencial, referido benefício deve ser excluído da renda per capita familiar.
O Eg. STJ, em sede de Recurso Repetitivo já sedimentou o entendimento de que a mesma regra deve ser aplicada, por analogia, também para quando houver benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo.
Vejamos:
Nesse sentido, os julgados desta C. Corte Regional (TRF3ªRegião, AC 30993.55.2015.04.03.9999, Des Fed Carlos Delgado, DJ 24/10/2016; TRF3ª Região, AC 2014.03.00.013459-1, Des. Fed. Toru Yamamoto, DJ 27/04/2017; APELREEX 00015662120134036139, DESEMBARGADORA FEDERAL TANIA MARANGONI, TRF3 - OITAVA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/09/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:.).
CASO CONCRETO
No presente caso, a parte autora comprovou o requisito etário pelo documento de fl. 07, no qual se verifica a data de seu nascimento em 30/10/1944.
Noutra banda, o estudo social (datado de 23/03/2017) atestou que a autora vive com seu esposo (74 anos) e recebe apoio da filha aos finais de semana para preparar alimentos e na higienização da residência.
O imóvel é próprio, de alvenaria, com telhas francesas, água encanada, saneamento, energia elétrica, piso tipo cerâmica, dois quartos, sala, cozinha e banheiro, com boas condições de higiene e limpeza.
A renda familiar é de R$ 1.145,09 oriunda do benefício do INSS. Segundo o relatório social, a família está em situação de vulnerabilidade social e econômica, com dificuldade na aquisição de medicamentos que não são encontrados na rede básica de saúde. Autora com problema de saúde que limita suas atividades habituais. A família recebe ajuda com cesta básica da Prefeitura Municipal de Adolfo.
DESPESAS
Água e energia elétrica: R$ 180,00
Alimentação: cerca de R$ 600,00
Farmácia: aproximadamente R$ 300,00
Pois bem.
Por força do disposto no artigo 229/CF, os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, de sorte que, o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação da família de prestar a assistência necessária.
Dentro desse contexto, tem-se que o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode ser interpretado de forma isolada na aferição da miserabilidade.
Insta dizer que, a Lei Assistencial, ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de miserabilidade, que não obsta a comprovação da insuficiência de recursos para prover a manutenção do deficiente ou idoso por outros meios de prova.
A questão foi decidida pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU), em 23 de fevereiro de 2017, em sede de pedido de uniformização de jurisprudência formulado pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, que firmou o entendimento de que "o benefício assistencial de prestação continuada pode ser indeferido se ficar demonstrado que os devedores legais podem prestar alimentos civis sem prejuízo de sua manutenção".
Portanto, o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade é, em primeiro lugar, da família, não se prestando o benefício assistencial à complementação de renda..
No caso concreto, em que pese a situação difícil enfrentada pela autora, depreende-se do estudo social que coabita em residência com boas condições de uso e higiene, havendo possibilidade das suas necessidades básicas serem supridas pela família.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso.
É o voto.
INÊS VIRGÍNIA
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | INES VIRGINIA PRADO SOARES:10084 |
Nº de Série do Certificado: | 11DE18032058641B |
Data e Hora: | 29/08/2018 17:00:08 |