
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002326-27.2016.4.03.6183
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IZOLINA GONZAGA CENDAROGLO
Advogado do(a) APELADO: RENATA GARCIA CHICON - SP255459-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002326-27.2016.4.03.6183
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IZOLINA GONZAGA CENDAROGLO
Advogado do(a) APELADO: RENATA GARCIA CHICON - SP255459
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação ajuizada em face do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, objetivando a parte autora a concessão do benefício de pensão por morte em decorrência do óbito de seu marido, Demitro Cendaroglo, ocorrido em 16/11/2014.
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido para condenar o INSS a conceder a pensão por morte à autora, a partir da data do requerimento administrativo (08/09/2015) e ao pagamento das parcelas em atraso, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal. Determinou a devolução dos valores recebidos a título de benefício assistencial mediante desconto mensal limitado a 10% do benefício. Diante da sucumbência recíproca, estabeleceu que as despesas processuais e os honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação até a data da sentença, nos termos da Súmula n. 111 do STJ, serão proporcionalmente distribuídos entre as partes.
Dispensado o reexame necessário, nos termos do §3º do artigo 496 do Código de Processo Civil/2015.
Apela o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS requerendo, preliminarmente, o reconhecimento da nulidade da sentença ante o julgamento extra petita, a revogação da tutela antecipada e o conhecimento da remessa oficial. No mérito, sustenta em síntese, que não restou comprovada a dependência econômica, devendo ser julgado improcedente o pedido. Subsidiariamente, requer a dedução integral, em sede de liquidação do julgado, dos valores percebidos pela parte autora a título de benefício assistencial nos períodos concomitantes dos benefícios, a observância do art. 1º - F da Lei n. 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009 quanto aos juros de mora e a correção monetária, bem como a redução do montante fixado a título de honorários advocatícios.
Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002326-27.2016.4.03.6183
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IZOLINA GONZAGA CENDAROGLO
Advogado do(a) APELADO: RENATA GARCIA CHICON - SP255459
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação do INSS.
PRELIMINARES
Inicialmente, ressalto que a sentença não incorreu em julgamento extra petita porquanto não decidiu pretensão diversa daquela pleiteada nos presentes autos. A determinação do desconto do benefício assistencial decorre da impossibilidade de cumulação deste benefício com a pensão por morte concedida, nos termos do §4º do art. 20 da Lei n. 8.742/93.
Também observo que é plenamente possível a antecipação dos efeitos da tutela contra a Fazenda Pública nas causas de natureza previdenciária e assistencial. Precedentes (STF, Rcl 1067 / RS, Tribunal Pleno, Relatora Min. Ellen Gracie, j. 05/9/2002, v.u., DJ 14/02/2003, p. 60; STJ, RESP 539621, Sexta Turma, Relator Min. Hamilton Carvalhido, j. 26/5/2004, v.u., DJ 02/8/2004, p. 592)
Nos termos do artigo 300 do Código de Processo Civil/2015, vigente à época da sentença, o juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que evidenciada a prova do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
No caso, conforme avaliação do Juízo a quo, restaram configurados os requisitos autorizadores da concessão do benefício, pelo que mantenho seus efeitos.
Embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo termo inicial do benefício (08/09/2015), seu valor aproximado e a data da sentença (08/09/2016), que o valor total da condenação será inferior à importância de 1.000 (mil) salários mínimos estabelecida no inciso I do §3º do artigo 496 do Código de Processo Civil de 2015.
Afinal, o valor que superaria a remessa oficial é equivalente a 14 anos de benefícios calculados no valor máximo, o que certamente não será o caso dos autos.
Assim, é nítida a inadmissibilidade, na hipótese em tela, da remessa necessária.
Rejeito as preliminares e passo ao exame do mérito.
MÉRITO
Os requisitos a serem observados para concessão da pensão por morte estão previstos nos artigos 74 a 79 da Lei nº 8.213/91, sendo necessária a comprovação, cumulativamente: a) do óbito ou morte presumida da pessoa que seja segurada (obrigatória ou facultativa) da Previdência Social; b) da existência de beneficiário dependente do de cujus, em idade hábil ou preenchendo outras condições previstas em lei; c) da qualidade de segurado do falecido.
A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.110.565 SE, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, fixou que o deferimento do benefício de pensão por morte está vinculado ao cumprimento da condição de segurado do falecido, salvo na hipótese prevista na Súmula 461/STJ: “É devida a pensão por morte aos dependentes do segurado que, apesar de ter perdido essa qualidade, preencheu os requisitos legais para a obtenção de aposentadoria até a data do seu óbito”
A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes.
O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça, durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária.
Por sua vez, o §4º desse dispositivo legal estabelece que haverá a perda da qualidade de segurado no dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de segurado.
Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o término do período de graça, independentemente de contribuição, mantendo para si e para os seus dependentes o direito aos benefícios previdenciários.
Anote-se que a eventual inadimplência das obrigações trabalhistas e previdenciárias acerca do tempo trabalhado deve ser imputada ao empregador, responsável tributário, conforme preconizado na alínea a do inciso I do artigo 30 da Lei nº 8.213/91, não sendo cabível a punição do empregado urbano pela ausência de recolhimentos, computando-se, assim, o período laborado para fins de verificação da qualidade de segurado.
Nesse passo, importa consignar que a redação original do inciso I do artigo 26 da Lei de Benefícios, bem como aquela que lhe foi dada pela Lei nº 9.786/99, mantida pela Lei nº 13.135/2015, dispensa o cumprimento de carência para fins de concessão do benefício de pensão por morte.
No tocante aos dependentes do segurado falecido, o direito à pensão por morte encontra-se disciplinado na Lei n. 8.213/91, art. 16 in verbis:
"Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;
II - os pais;
III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente."
Por sua vez, o §4º desse mesmo artigo estabelece que “a dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.”
Vale lembrar que esse benefício é devido ao conjunto de dependentes do de cujus que reúnam as condições previstas nos artigos 77 da Lei nº 8.213/91, obviamente cessando para o dependente que não mais se enquadre nas disposições desse preceito normativo. Nem mesmo a constatação de dependente ausente obsta a concessão da pensão, cabendo sua habilitação posterior (art. 76 da Lei nº 8.213/91).
A dependência econômica não precisa ser exclusiva, de modo que persiste ainda que a parte autora tenha outros meios de complementação de renda. Interpretação abrangente do teor da Súmula 229, do extinto E. TRF.
Nesse sentido, também não impede a concessão do benefício tem tela o fato de o dependente receber aposentadoria, pois o art. 124 da Lei nº 8.213/91 não veda a acumulação da pensão por morte com aposentadoria, quando presentes os requisitos legais. Nega, apenas, a acumulação de mais de uma pensão, deixada por cônjuge ou companheiro, assegurado o direito de se optar pelo pagamento da mais vantajosa.
Caso concreto
Comprovado o óbito de Demitro Cendaroglo em 16/11/2014.
A qualidade de segurado do falecido restou incontroversa tendo em vista que era beneficiário de aposentadoria por tempo de contribuição.
Quanto à dependência econômica observa-se inicialmente que a parte autora era beneficiária de Amparo Social ao Idoso desde 22/07/2004 (NB 134477441-2), motivo pelo qual o INSS indeferiu a concessão da pensão por morte.
No entanto, a parte autora alega que nunca se separou de seu falecido marido, mantendo sua condição de dependente até a época do óbito.
Para comprovar suas alegações acostou aos autos:
- certidão de casamento sem averbação de separação;
- certidão de óbito com a anotação do estado civil de casado do falecido;
- comprovantes de endereço comum;
As testemunhas ouvidas em audiência confirmaram que a autora e o falecido viveram juntos como marido e mulher até a data do óbito e que não houve separação.
Assim, não havendo rompimento da relação conjugal, não há que se falar em prova da efetiva dependência econômica, uma vez que esta é presumida.
Dessa forma, diante do conjunto probatório, restou comprovada a dependência econômica da autora em relação ao segurado falecido de modo a preencher os requisitos para concessão do benefício de pensão por morte à autora.
Observo que a autora recebeu o benefício de amparo social ao idoso no período de 22/07/2004 a 18/08/2016 e que o termo inicial da pensão por morte foi fixado em 08/09/2015. Nestes termos, deve ser anotada a obrigatoriedade da dedução, na fase de liquidação, dos valores pagos à parte autora a título de Amparo Social ao Idoso após o termo inicial assinalado ao benefício ora concedido, tendo em vista que sua cumulação é vedada por lei.
No que tange aos critérios de atualização do débito, verifico que a sentença desborda do entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
Assim, tratando-se de matéria cognoscível de ofício (AgRg no AREsp 288026/MG, AgRg no REsp 1291244/RJ), corrijo a sentença e estabeleço que as parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial. Anoto que os embargos de declaração opostos perante o STF que objetivavam a modulação dos efeitos da decisão supra, para fins de atribuição de eficácia prospectiva, foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019.
Inaplicável a sucumbência recursal, considerando o parcial provimento do recurso, mantendo-se os honorários de advogado tal como fixados na sentença.
Ante o exposto, de ofício, fixo os critérios de atualização do débito, rejeito as preliminares arguidas e, no mérito, dou parcial provimento à apelação do INSS para determinar a dedução, na fase de liquidação, dos valores pagos à parte autora a título de Amparo Social ao Idoso após o termo inicial assinalado ao benefício ora concedido, nos termos da fundamentação.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA AFASTADA. REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. FAZENDA PÚBLICA. POSSIBILIDADE. PENSÃO POR MORTE. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. REQUISITOS PREENCHIDOS. DEDUÇÃO NA FASE DE LIQUIDAÇÃO DOS VALORES PAGOS A TÍTULO DE LOAS. CUMULAÇÃO VEDADA POR LEI. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO.
1. A sentença julgou dentro dos limites da exordial. Nulidade afastada.
2. Valor da condenação inferior a 1.000 salários mínimos. Remessa necessária não conhecida.
3. É plenamente possível a antecipação dos efeitos da tutela contra a Fazenda Pública nas causas de natureza previdenciária e assistencial.
4. O benefício de pensão por morte está disciplinado nos artigos 74 a 79 da Lei nº 8.213/91, sendo requisitos para sua concessão a qualidade de segurado do de cujus e a comprovação de dependência do pretenso beneficiário.
5. Conjunto probatório suficiente à comprovação da dependência econômica entre a autora e o segurado falecido de modo a preencher os requisitos para concessão do benefício de pensão por morte à autora.
6. Os valores recebidos a título de LOAS após o termo inicial da pensão por morte devem ser deduzidos na fase de liquidação, uma vez que sua cumulação é vedada por lei.
7. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20/09/2017, Relator Ministro Luiz Fux.
8. Inaplicável a sucumbência recursal, considerando o parcial provimento do recurso. Honorários de advogado mantidos.
9. Sentença corrigida de ofício. Preliminares rejeitadas. No mérito, apelação do INSS parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu, de ofício, fixar os critérios de atualização do débito, rejeitar as preliminares arguidas e, no mérito, dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
