
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000879-35.2011.4.03.6003
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: LUIS ANTONIO MONTEIRO PACHECO - SP155916
APELADO: MARELENE MARQUES MIRANDA
Advogado do(a) APELADO: MARCIO AURELIO DE OLIVEIRA - SP281598-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000879-35.2011.4.03.6003
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: LUIS ANTONIO MONTEIRO PACHECO - SP155916
APELADO: MARELENE MARQUES MIRANDA
Advogado do(a) APELADO: MARCIO AURELIO DE OLIVEIRA - SP281598-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação ordinária ajuizada em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando a parte autora a declaração a inexistência de débito decorrente do pagamento indevido de pensão por morte, bem como a condenação da parte ré a restituir os valores descontados e ao pagamento de danos morais.
A sentença julgou procedente em parte o pedido para declarar a inexistência de relação jurídica de débito, consistente na restituição dos valores indevidos recebidos pela autora a título de pensão por morte, bem como condenar o INSS à restituição de valores descontados, com correção monetária e juros de mora nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal. Em vista da sucumbência recíproca, deixou de fixar os honorários advocatícios.
Ratificada a antecipação de tutela anteriormente concedida.
Dispensada a remessa necessária.
Apela o INSS sustentando em síntese, que a decisão recorrida contraria o art. 115 da Lei n. 8.213/91, o princípio da legalidade, da contributividade e equilíbrio financeiro da Previdência Social. Aduz que a ausência de demonstração de má-fé não afasta a necessidade de ressarcimento dos valores indevidamente recebidos.
Recurso adesivo da parte autora pugnando pela condenação da autarquia ao pagamento dos danos morais.
Com contrarrazões da parte autora vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000879-35.2011.4.03.6003
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: LUIS ANTONIO MONTEIRO PACHECO - SP155916
APELADO: MARELENE MARQUES MIRANDA
Advogado do(a) APELADO: MARCIO AURELIO DE OLIVEIRA - SP281598-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço da apelação do INSS e do recurso adesivo da parte autora.
O compulsar dos autos revela que a parte autora é beneficiária de pensão por morte desde 04/02/1981, quando a legislação vigente estabelecia o limite máximo de 50% (cinquenta por cento) do valor da aposentadoria a que teria direito o falecido.
Com o advento das Leis n. 8.213/91 e 9.032/95 obteve, judicialmente, a majoração de seu benefício em 100% do valor da aposentadoria que o segurado instituidor faria jus. Posteriormente, a sentença foi rescindida com fulcro na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, e o INSS passou a descontar mensalmente, no valor do seu benefício, os valores que recebeu a mais neste período, o que, somados às quotas de empréstimo consignado que efetuou, totalizam 60% (sessenta por cento) do total do benefício.
Sendo assim, pretende a declaração da inexistência do débito e a condenação da autarquia à restituição de todos os valores descontados em seu benefício.
A questão referente aos valores recebidos em razão de decisão que antecipou a tutela jurisdicional encontra-se suspensa pelo STJ (Tema 692).
“PROCESSUAL CIVIL. QUESTÃO DE ORDEM EM RECURSO ESPECIAL. RECURSOS REPETITIVOS. COMPETÊNCIA DA PRIMEIRA SEÇÃO DESTA CORTE SUPERIOR. PROPOSTA DE REVISÃO DO ENTENDIMENTO FIRMADO NO TEMA REPETITIVO 692/STJ. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS POR FORÇA DE DECISÃO LIMINAR REVOGADA POSTERIORMENTE. JURISPRUDÊNCIA CONTRÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA MATÉRIA. VARIEDADE DE SITUAÇÕES JURÍDICAS ENSEJADORAS DE DÚVIDAS SOBRE A APLICAÇÃO DO PRECEDENTE. ART. 927, §4º, DO CPC/2015. ARTS. 256-S, 256-T, 256-U E 256-V do RISTJ. QUESTÃO DE ORDEM ACOLHIDA.
1. O art. 927, §4º, do CPC/2015 permite a revisão de entendimento firmado em tese repetitiva, visto que assegurados os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia. Tal previsão se encontra regulamentada pelos art.s 256-S e seguintes do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, com a redação dada pela Emenda Regimental n. 24, de 28 de setembro de 2016.
2. Com a finalidade de rever o Tema 692/STJ, firmado sob a sistemática dos recursos repetitivos, resultado do julgamento do REsp 1.401.560/MT, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Rel. p/ acórdão Ministro Ari Pargendler, julgado em 12/02/2014, é formulada a presente questão de ordem.
3. A proposta de revisão de entendimento tem como fundamentos principais a variedade de situação que ensejam dúvidas quanto à persistência da orientação firmada pela tese repetitiva relacionado ao Tema 692/STJ, bem como a jurisprudência do STF, estabelecida em sentido contrário, mesmo que não tendo sido com repercussão geral ou em controle concentrado de constitucionalidade.
4. Nesse sentido, a tese repetitiva alusiva ao Tema 692 merecer ser revisitada par que, com um debate mais ampliado e consequencialista da decisão, sejam enfrentados todos os pontos relevantes. Assim, a tese de que “a reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos” pode ser reafirmada, restringida no seu âmbito de alcance ou mesmo cancelada. Mas todo com a consideração necessária de todas as situações trazidas, sejam no âmbito das questões debatidas nos processos nos quais proposta a questão de ordem, sejam em referência ao próprio entendimento do STJ na matéria.
5. Questão de ordem acolhida.
(STJ, 1ª Seção, QO no Recurso Especial n. 1.734.685/SP, 2018/0082137-0, j. 14/11/2018, Rel. Min. Og Fernandes).
Também se encontra suspensa a questão da devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social (Tema 979).
“PREVIDENCIÁRIO. PROPOSTA DE AFETAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. RITO DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ. EM RAZÃO DE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA, MÁ APLICAÇÃO DA LEI OU ERRO DA ADMINISTRAÇÃO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL.
1. Delimitação da controvérsia: Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social.
2. Recurso especial afetado ao rito do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015 e art. 256 – I do RISTJ, incluído pela Emenda Regimental 24, de 28/09/2016.”
(STJ, Primeira Seção, ProAfR no Recurso Especial 1.381.734-RN, Rel. Min. Benedito Gonçalves, j. 09/08/2016).
No caso posto em questão, os valores descontados pelo INSS no benefício da parte autora não foram recebidos em razão de decisão que antecipou a tutela jurisdicional, nem tampouco decorreram de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social.
Tais valores descontados são decorrentes de sentença judicial transitada em julgado que posteriormente foi rescindida.
Nesse contexto, observo que as questões da provisoriedade e da boa-fé devem ser analisadas para fins de análise da possibilidade de desconto de valores no benefício da autora, considerando ademais, o caráter alimentar dos benefícios previdenciários.
Com efeito, tratando-se de valores recebidos por força de sentença judicial com trânsito em julgado não há que se falar em natureza precária e muito menos em má-fé da parte autora no recebimento destes valores. Tanto é assim, que a parte autora contratou empréstimo consignado.
Como bem asseverou o MM. Juiz a quo trata-se de situação geradora de justificada expectativa de que os valores recebidos ingressariam de maneira definitiva no patrimônio da autora, tendo ela agido de maneira consentânea com a confiança adquirida, na percepção das parcelas posteriormente consideradas indevidas.
Portanto, deve ser mantida a sentença que declarou a inexistência da relação jurídica de débito, na qual pretendia a ré cobrar parcelas recebidas indevidamente a título de benefício de pensão por morte e condenou o INSS a restituir os valores já descontados.
Passo à análise do pedido de indenização por danos morais.
Nos termos do artigo 927 do Código Civil, o fundamento da indenização por dano moral reside em ato ilícito, não configurado no caso dos autos.
O deferimento do pedido de indenização por danos morais requer a demonstração da existência de nexo de causalidade entre uma conduta ilícita do agente e a ocorrência do dano.
Compete ao INSS avaliar a viabilidade dos pedidos formulados a partir de requisitos estabelecidos na legislação previdenciária. A mera necessidade de ajuizamento de ação para obtenção de um direito que se mostra controverso não configura ilicitude passível de reparação.
Ressalte-se que a autarquia deu uma das interpretações possíveis ao pedido administrativo, não se extraindo do contexto conduta irresponsável ou inconsequente diante do direito controvertido apresentado.
Além disso, a parte autora não demonstrou a existência de dano extrapatrimonial, vale dizer, não comprovou o notório sofrimento psíquico, o vexame, o abalo à honra ou à sua imagem, razão pela qual não há que se falar em indenização por danos morais. Nesse sentido é a jurisprudência desta E. Corte, que ora transcrevo: AC 1390060, 8ª Turma, Rel. Des. Fed. Therezinha Cazerta, j. 08/03/2010, v.u., DJF3 CJ1 30/03/2010, p. 987; AC 1107103, Turma Suplementar da 3ª Seção, Rel. Juíza Fed. Convocada Louise Filgueiras, j. 12/08/2008, v.u., DJF3 18/09/2008; AC 1166724, 10ª Turma, Rel. Juiz Fed. Convocado David Diniz, j. 15/07/2008, v.u., DJF3 20/08/2008.
No que tange aos critérios de atualização do débito, verifico que a sentença desborda do entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
Assim, tratando-se de matéria cognoscível de ofício (AgRg no AREsp 288026/MG, AgRg no REsp 1291244/RJ), corrijo a sentença e estabeleço que as parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial. Anoto que os embargos de declaração opostos perante o STF que objetivavam a modulação dos efeitos da decisão supra, para fins de atribuição de eficácia prospectiva, foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019.
Nesse passo, no que tange aos honorários de advogado, verifico que ambas as partes foram vencedoras e vencidas na causa em proporção semelhante.
Contudo, às sentenças prolatadas sob a égide do CPC/73 não se aplicam as normas previstas no artigo 85, §§ 1º a 11º do CPC/2015, inclusive no que pertine à sucumbência recursal, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal (Enunciado Administrativo nº 7/STJ). A razão desse entendimento é a de que tal condenação implicaria surpresa à parte que teve sua situação agravada em segundo grau, sem que houvesse previsão legal à época da interposição do recurso.
O mesmo entendimento é aplicável à vedação à compensação em caso de sucumbência recíproca, conforme critérios do artigo 85, caput e § 14, do Novo CPC. Sua aplicação traria novo ônus a uma das partes ou mesmo a ambas, sem que houvesse previsão a respeito quando da interposição do recurso.
Assim, cada parte arcará com os honorários de seus respectivos patronos, nos termos do caput do artigo 21 do CPC/73.
Com relação aos honorários de advogado, estes devem ser mantidos em 10% do valor da condenação, consoante entendimento desta Turma e artigo 20, parágrafos 3º e 4º do Código de Processo Civil de 1973, aplicável ao caso concreto eis que o recurso foi interposto na sua vigência, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça, não se aplicando, também, as normas dos §§1º a 11º do artigo 85 do CPC/2015, inclusive no que pertine à sucumbência recursal, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal (Enunciado Administrativo nº 7/STJ).
Ante o exposto, de ofício, corrijo a sentença para fixar os critérios de atualização do débito e nego provimento à apelação do INSS e ao recurso adesivo da parte autora, nos termos da fundamentação.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. RECURSO ADESIVO. PENSÃO POR MORTE. DESCONTOS NO VALOR DO BENEFÍCIO. VALORES DECORRENTES DE SENTENÇA JUDICIAL TRANSITADA EM JULGADO E POSTERIORMENTE RESCINDIDA. DANOS MORAIS. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA.
1. Indevida a devolução de valores pagos pelo INSS por força de sentença judicial transitada em julgado, posteriormente rescindida.
2. A mera necessidade de ajuizamento da ação para obtenção de um direito que se mostra controverso não configura ilicitude passível de reparação, não sendo devida a indenização por danos morais.
3. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manuel de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE n. 870.947, tema de repercussão geral n. 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux. Correção de ofício.
4. Sucumbência recíproca.
5. Sentença corrigida de ofício. Apelação do INSS e recurso adesivo não providos.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu, de ofício, corrigir a sentença para fixar os critérios de atualização do débito e negar provimento à apelação do INSS e ao recurso adesivo da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
