Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA / SP
0000777-78.2014.4.03.6303
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
30/09/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 06/10/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. REMESSA NECESSÁRIA. APOSENTADORIA ESPECIAL.
COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. RADIAÇÃO IONIZANTE. EXPOSIÇÃO
PERMANENTE.PRÉVIO CUSTEIO.IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. DIB. VEDAÇÃO DO
§8º DO ART. 57 DA LEI 8213/91. JUROS E CORREÇÃO. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
HONORÁRIOS DE ADVOGADO MAJORADOS. MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA
JUSTIÇA FEDERAL.
1. Valor da condenação inferior a 1.000 (mil) salários mínimos. Remessa oficial não conhecida.
2. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o
reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua
demonstração.
3. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da
atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no
período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário (a
partir de 11/12/97).
4. A exposição à radiação ionizante, torna a atividade especial, nos termos dos códigos 1.3.2 do
Decreto nº 53.831/64 e nos itens 1.3.4 e 1.3.5 do Decreto nº 83.080/79.
5. A exigência legal de comprovação de exposição a agente insalubre de forma permanente,
introduzida pela Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao § 3º do artigo 57 da Lei nº 8.213, deve
ser interpretada como o labor continuado, não eventual ou intermitente, de modo que não
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
significa a exposição ininterrupta a agente insalubre durante toda a jornada de trabalho.
6. Inexiste vinculação do ato de reconhecimento de tempo de atividade perigosa/nociva ao
eventual pagamento de encargos tributários com alíquotas diferenciadas, pois o empregado não
pode ser por isso prejudicado.
7. A soma dos períodos redunda no total de mais de 25 anos de tempo de serviço especial, o que
autoriza a concessão da aposentadoria especial, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
8. DIB na data do requerimento administrativo.
9. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a
elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-
se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa
Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947,
tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
10. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na
sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015.
11. Sentença corrigida de ofício. Remessa oficial não conhecida. Apelação do Instituto Nacional
do Seguro Social - INSS não provida.
Acórdao
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº0000777-78.2014.4.03.6303
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ROSEMEIRE PLENAMENTE
Advogados do(a) APELADO: GLAUCO AYLTON CERAGIOLI - SP72603-A, MARIA DA PENHA
DE SOUZA ARRUDA - SP73781-A, ERICA MARCONI CERAGIOLI - SP159556-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº0000777-78.2014.4.03.6303
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ROSEMEIRE PLENAMENTE
Advogados do(a) APELADO: GLAUCO AYLTON CERAGIOLI - SP72603-A, MARIA DA PENHA
DE SOUZA ARRUDA - SP73781-A, ERICA MARCONI CERAGIOLI - SP159556-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação ordinária em que se objetiva a concessão de aposentadoria especial, mediante
o reconhecimento de período trabalhado em atividades especiais.
A sentença julgou procedente o pedido para reconhecer como laborado(s) em atividade(s)
especial(ais) o(s) período(s) de 10/12/1987 a 28/09/2010 e de 12/12/2002 a 15/05/2013,
determinando ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a concessão da aposentadoria
especial, com DIB no requerimento administrativo, condenando-o, em consequência, ao
pagamento das parcelas em atraso, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora,
nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal,
conforme Resolução nº 267/2013, do CJF. Condenou o réu, também, ao pagamento de
honorários de advogado, fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação, considerado
como termo final desta a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do C. STJ.
Sentença submetida à remessa necessária.
Apela o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, alegando, preliminarmente, a ausência de
interesse recursal no que se refere aos períodos reconhecidos administrativamente. No mérito,
aduza impossibilidade do enquadramento das atividades exercidas pela parte autora como
especiais, notadamente em razão do uso de EPI, bem como a ausência de habitualidade e
permanência. Sustenta, ainda, ausência de fonte de custeio e pretende a aplicação da restrição
contida no art. 57, §8º, da Lei nº8.213/91. Subsidiariamente, requer a reforma da sentença quanto
aos critérios de correção monetária e juros de mora, com incidência exclusiva da Lei nº
11.960/09.
Contrarrazões pela parte apelada, pugnando pela manutenção da sentença.
É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº0000777-78.2014.4.03.6303
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ROSEMEIRE PLENAMENTE
Advogados do(a) APELADO: GLAUCO AYLTON CERAGIOLI - SP72603-A, MARIA DA PENHA
DE SOUZA ARRUDA - SP73781-A, ERICA MARCONI CERAGIOLI - SP159556-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo
termo inicial do benefício, seu valor aproximado e a data da sentença, que o valor total a
condenação será inferior à importância de 1.000 (mil) salários mínimos estabelecida no inciso I do
§3º do artigo 496 do Código de Processo Civil de 2015.
Afinal, o valor que superaria a remessa oficial é equivalente a 14 anos de benefícios calculados
no valor máximo, o que certamente não será o caso dos autos.
Assim, é nítida a inadmissibilidade, na hipótese em tela, da remessa necessária.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
A preliminar de impossibilidade jurídica do pedido se confunde com o mérito e com este será
analisada.
Passo ao exame do mérito.
Aposentadoria Especial
A aposentadoria por tempo de serviço especial teve assento primeiro no artigo 31 da Lei nº 3.807,
de 26 de agosto de 1960, Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS, que estabeleceu que seria
concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinquenta) anos de idade e 15 (quinze)
anos de contribuições, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco)
anos, conforme a atividade profissional, em serviços que, para esse efeito, fossem considerados
penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo.
Prevê ainda, o mencionado diploma legal, no art. 162, o reconhecimento de atividade especial
prestada em data anterior à sua edição, na hipótese de seu cômputo ser mais benéfico ao
segurado.
Como assentado pelas Cortes Superiores "tal hipótese, apesar de similar, não se confunde com a
questão da legislação aplicável ao caso de concessão de aposentadoria, tampouco com aquela
que diz respeito à possibilidade de aplicação retroativa da lei nova que estabeleça restrição ao
cômputo do tempo de serviço. (...) Interpretação diversa levaria à conclusão de que o segurado,
sujeito a condições insalubres de trabalho, só teria direito à aposentadoria especial após 15, 20 e
25 anos de trabalho exercida depois da Lei nº 3.807/60, desconsiderando, portanto, todo o
período de labor, também exercido em tal situação, porém em data anterior à lei de regência" (Ag
Rg no REsp nº 1015694, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza Assis de Moura, DJe 01/02/2011)
Essa norma foi expressamente revogada pela Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973, que passou a
discipliná-la no artigo 9º, alterando, em efeitos práticos, apenas o período de carência de 15
(quinze) anos para 5 (cinco) anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
Sobreveio, então, o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, reclassificando as atividades
profissionais segundo os agentes nocivos e os grupos profissionais tidos por perigosos,
insalubres ou penosos, com os respectivos tempos mínimos de trabalho.
Importante ressaltar que os Decretos nºs. 53.831/64 e 83.080/79 tiveram vigências simultâneas,
de modo que, conforme reiteradamente decidido pelo C. STJ, havendo colisão entre as
mencionadas normas, prevalece a mais favorável ao segurado. (REsp nº 412351, 5ª Turma, Rel.
Min. Laurita Vaz, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, pág. 355).
As atividades insalubres previstas nas aludidas normas são meramente exemplificativas, podendo
outras funções ser assim reconhecidas, desde que haja similitude em relação àquelas legalmente
estatuídas ou, ainda, mediante laudo técnico-pericial demonstrativo da nocividade da ocupação
exercida. Nesse sentido, o verbete 198 da Súmula do TFR.
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, a matéria passou a ser prevista no inciso II
do artigo 202 e disciplinada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação original previa que o
benefício de aposentadoria especial seria devido ao segurado que, após cumprir a carência
exigida, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a
atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade
física, restando assegurada, ainda, a conversão do período trabalhado no exercício de atividades
danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em seguida, foi editada a Lei nº 9.032/95, alterando o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, dispondo que
a partir desse momento não basta mais o mero enquadramento da atividade exercida pelo
segurado na categoria profissional considerada especial, passando a ser exigida a demonstração
da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, que poderá
se dar por meio da apresentação de informativos e formulários, tais como o SB-40 ou o DSS-
8030.
Posteriormente, com a edição do Decreto n.º 2.172, de 05/03/1997, que estabeleceu requisitos
mais rigorosos para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos,
passou-se a exigir-se a apresentação de laudo técnico para a caracterização da condição
especial da atividade exercida. Todavia, por se tratar de matéria reservada à lei, tal exigência
apenas tem eficácia a partir da edição da Lei n.º 9.528, de 10/12/1997.
Cumpre observar que a Lei nº 9528/97 também passou a aceitar o Perfil Profissiográfico
Previdenciário - PPP, documento que busca retratar as características de cada emprego do
segurado, de forma a facilitar a futura concessão de aposentadoria especial. Assim, identificado
no documento o perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, é possível a sua
utilização para comprovação da atividade especial em substituição ao laudo pericial.
Ressalto que no tocante ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e à
forma da sua demonstração, deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do
trabalho, conforme jurisprudência pacificada da matéria (STJ - Pet 9.194/PR, Rel. Ministro
ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
A extemporaneidade do documento comprobatório das condições especiais de trabalho não
prejudica o seu reconhecimento como tal, "pois a situação em época remota era pior ou ao
menos igual a constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do
ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica." (Des. Fed. Fausto De Sanctis,
AC nº 2012.61.04.004291-4, j. 07/05/2014)
Especificamente em relação ao ruído, o Decreto nº 53.831/64 considerava insalubre o labor
desempenhado com exposição permanente a ruído acima de 80 dB; já o Decreto nº 83.080/79
fixava a pressão sonora em 90 dB. Na medida em que as normas tiveram vigência simultânea,
prevalece disposição mais favorável ao segurado (80 dB).
Com a edição do Decreto nº 2.172/97, a intensidade de ruído considerada para fins de
reconhecimento de insalubridade foi elevada para 90 dB, mas, em 2003, essa medida foi reduzida
para 85 dB, por meio do Decreto nº 4.882, de 18 de novembro de 2003.
Até 09 de outubro de 2013, os Tribunais adotavam o enunciado pela Súmula nº 32 da TNU.
Contudo, esta Súmula foi cancelada em decorrência do julgamento da PET 9059 pelo Superior
Tribunal de Justiça (Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJe
09/09/2013) cujo entendimento foi sufragado no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Ministro
Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), sob a sistemática dos
recursos repetitivos.
Em relação ao agente ruído, vigora o princípio do tempus regit actum. Considera-se especial a
atividade desenvolvida acima do limite de 80dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº
2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90dB
até 18/11/2003, quando foi editado o Decreto nº 4882/2003. A partir de 19/11/2003 o limite
passou a ser de 85 dB.
Saliente-se que a especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento
legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou
formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico
previdenciário (a partir de 11/12/97).
É corrente em nossos tribunais a tese de que sempre se exigiu laudo técnico para comprovar a
exposição do trabalhador aos agentes físicos ruído e calor em níveis superiores aos limites
máximos de tolerância. Entretanto, no tocante às atividades profissionais exercidas até 10/12/97 –
quando ainda não havia a exigência legal de laudo técnico –, essa afirmação deve ser
compreendida, não na literalidade, mas no sentido de ser necessário o atesto efetivo e seguro
dos níveis de intensidade dos agentes nocivos a que o trabalhador esteve exposto durante sua
jornada laboral.
Logo, para as atividades profissionais exercidas até 10/12/97, é suficiente que os documentos
apresentados façam expressa menção aos níveis de intensidade dos agentes nocivos.
Uso de equipamento de proteção individual - EPI, como fator de descaracterização do tempo de
serviço especial
A questão foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do ARE nº 664335, da
relatoria do E. Ministro Luiz Fux, com reconhecimento de repercussão geral, na data de
04.12.2014, em que restou decidido que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva
exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente
capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional ao reconhecimento das
atividades especiais.
Restou assentado também que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico
Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não
descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
O fato de a empresa fornecer equipamento de proteção individual - EPI para neutralização dos
agentes agressivos não afasta, por si só, a contagem do tempo especial, pois cada caso deve ser
examinado em suas peculiaridades, comprovando-se a real efetividade do aparelho e o uso
permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. Precedentes do Superior Tribunal de
Justiça (REsp 1428183/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 25/02/2014,
DJe 06/03/2014).
Ainda, conforme a jurisprudência citada, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído,
desde que em níveis acima dos limites legais, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de
Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até
no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao
organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas.
Caso concreto - elementos probatórios
De início, verifica-se que a controvérsia cinge-se à especialidade das atividades trabalhadas no(s)
período(s) de 06/03/1997 a 28/09/2010 e de 12/12/2002 a 15/05/2013, considerando que em
relação aos demais, quais sejam, de 10/12/1987 a 05/03/1997 e de 15/10/1991 a 31/07/1993, já
houve reconhecimento na esfera administrativa do INSS (ID nº 43977868/204).
A exposição à radiação foi inicialmente prevista no item 5, in fine, do Quadro Anexo II do Decreto
n. 48.959-A/60, bem como no código 1.1.4 do Quadro Anexo ao Decreto n. 53.831/64, no
contexto de "operações em locais com radiações capazes de serem nocivas à saúde - infra-
vermelho, ultra-violeta, raios X, rádium e substâncias radiativas", englobando "trabalhos expostos
a radiações para fins industriais, diagnósticos e terapêuticos - operadores de raio X, de rádium e
substâncias radiativas, soldadores com arco elétrico e com oxiacetilênio, aeroviários de
manutenção de aeronaves e motores, turbo-hélices e outros".
Posteriormente, o código 1.1.3 do Quadro Anexo I do Decreto n. 63.230/68 previu a radiação
ionizante como agente nocivo, nos termos seguintes: "Extração de minerais radioativos
(tratamento, purificação, isolamento e preparo para distribuição). Operações com reatores
nucleares com fontes de nêutrons ou de outras radiações corpusculares. Trabalhos executados
com exposições aos raios X, rádio e substâncias radioativas para fins industriais, terapêuticos e
diagnósticos. Fabricação de ampolas de raios X e radioterapia (inspeção de qualidade).
Fabricação e manipulação de produtos químicos e farmacêuticos radioativos (urânio, rádon,
mesotório, tório X, césio 137 e outros). Fabricação e aplicação de produtos luminescentes
radíferos. Pesquisas e estudos dos raios X e substâncias radioativas em laboratórios". As
atividades profissionais de médico radiologista ou radioterapeuta e de técnico de raios X também
foram expressamente consignadas como especiais no código 2.1.3 do Quadro Anexo II do
Decreto n. 63.230/68.
Como agente nocivo, a radiação ionizante também foi elencada nos códigos 1.1.3 do Quadro
Anexo I do Decreto n. 72.771/73 e do Anexo I do Decreto n. 83.080/79, nos mesmos termos
empregados no Decreto n. 63.230/68, mantido o enquadramento das categorias de médico
radiologista ou radioterapeuta e de técnico de raios X, cf. códigos 2.1.3 do Quadro Anexo II do
Decreto n. 72.771/73 e do Anexo II do Decreto n. 83.080/79.
Por fim, os códigos 2.0.3 dos Anexos IV de ambos os Decretos n. 2.172/97 e n. 3.048/99
estabeleceram a especialidade do trabalho com exposição a radiações ionizantes, no contexto de
"a) extração e beneficiamento de minerais radioativos; b) atividades em minerações com
exposição ao radônio; c) realização de manutenção e supervisão em unidades de extração,
tratamento e beneficiamento de minerais radioativos com exposição às radiações ionizantes; d)
operações com reatores nucleares ou com fontes radioativas; e) trabalhos realizados com
exposição aos raios Alfa, Beta, Gama e X, aos nêutrons e às substâncias radioativas para fins
industriais, terapêuticos e diagnósticos; f) fabricação e manipulação de produtos radioativos; g)
pesquisas e estudos com radiações ionizantes em laboratórios".
É de se observar que nenhum dos decretos estabeleceu intensidade mínima de radiação para a
qualificação da atividade como especial, para fins previdenciários.
Nessa linha, a própria orientação administrativa do INSS era de que a qualificação da atividade
pela exposição a radiações ionizantes independia do atingimento dos limites de tolerância, que
são estabelecidos, em âmbito nacional, pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEM).
Assim dispunha o artigo 3º, inciso V, da IN INSS/DC n. 39, de 26.10.2000 (in verbis: "Vibrações,
radiações ionizantes e pressão atmosférica anormal: O enquadramento como especial em função
destes agentes será devido se as tarefas executadas estiverem descritas nas atividades e
códigos específicos dos Anexos do Regulamento da Previdência Social - RPS respectivos,
independentemente de limites de tolerância, desde que executadas de modo habitual e
permanente, não ocasional nem intermitente"), entendimento que foi mantido em atos
supervenientes, a saber: artigo 175 da IN INSS/DC n. 57, de 10.10.2001; artigo 183 da IN
INSS/DC n. 78, de 16.07.2002; artigo 182 da IN INSS/DC n. 84, de 17.12.2002; e artigo 182 da IN
INSS/DC n. 95, de 07.10.2003.
Essa disciplina foi alterada com a edição da IN INSS/DC n. 99, de 05.12.2003 e se manteve com
a edição da IN INSS/DC n. 118, de 14.04.2005 (artigo 182), da IN INSS/PRES n. 11, de
20.09.2006 (artigo 182), da IN INSS/PRES n. 20, de 10.10.2007 (artigo 182), e da IN INSS/PRES
n. 45, de 11.08.2010 (artigo 241). Atualmente vigora a IN INSS/PRES n. 77, de 21.01.2015
(D.O.U. de 22.01.2015).
Quanto às atividades que envolvem o uso de raios X, em serviços de radiologia, a Norma de
Higiene Ocupacional Fundacentro n. 5 refere que a exposição ocupacional (entendida como
"exposição de um indivíduo em decorrência de seu trabalho em práticas autorizadas", cf.
glossário constante do item 4) à radiação deve obedecer a limites de dose equivalentes em
função do tipo de área: até 0,4mSv/semana, em área controlada ("área sujeita a regras especiais
de proteção e segurança, com a finalidade de controlar as exposições normais e evitar as
exposições não autorizadas ou acidentais"), e até 0,02Sv/semana, em área livre ("área isenta de
controle especial de proteção radiológica, onde os níveis de equivalente de dose ambiente devem
ser inferiores a 0,5mSv/ano").
Note-se que estas normas técnicas não estabelecem limites de tolerância determinantes de
insalubridade laboral (termo que sequer é nelas empregado), mas parâmetros de exposição que,
não observados, revelam considerável comprometimento da segurança dos procedimentos.
As instruções são atos administrativos que veiculam "normas gerais de orientação interna das
repartições, emanadas de seus chefes, a fim de prescreverem o modo pelo qual seus
subordinados deverão dar andamento aos seus serviços" (Celso Antônio Bandeira de Mello,
Curso de Direito Administrativo, 23ª. ed., São Paulo: Malheiros, 2007, p. 424). Como tais, não são
instrumento hábil à inovação da ordem normativa, e sua edição deve ater-se à finalidade de
ordenação executiva dos atos e normas hierarquicamente superiores.
Bem se vê, portanto, que a IN INSS/DC n. 99/03, assim como as que se sucederam,
extrapolaram o texto da lei e dos decretos regulamentares no que concerne à qualificação do
tempo especial por exposição ao agente nocivo radiação ionizante.
Ainda que houvesse, por hipótese, regular delegação normativa à Presidência ou à Diretoria
Colegiada do INSS para dispor acerca do tema, assim mesmo haveria abuso do dever
regulamentar, porque as instruções em comento vincularam a qualificação do tempo de serviço
especial à própria desobediência das normas de segurança da área radiológica, o que é
manifestamente desarrazoado. Deve-se ter em mente que o agente agressivo em apreço é
determinante não apenas de insalubridade laboral, mas de perigo à vida.
Fixadas essas premissas, analiso o caso concreto, à vista da documentação constante dos autos.
Verifica-se que, no pertinente aos períodos de 06/03/1997 a 28/09/2010 e de 12/12/2002 a
15/05/2003, possível o reconhecimento como especial em razão do enquadramento profissional.
Consta no ID nº43977868/170/177 a função de "operador de raio X" na Santa Casa de
Misericórdia de Itapira, que assim descreve a atividade: "realiza exames convencionais de Raio X
em pacientes externos e internados, conforme pedidos médicos. Auxiliava o radiologista em
exames contrastados. Manipulava aparelhos de Raio X no Centro Cirúrgico. Zelava pela limpeza
e bom estado de manutenção dos aparelhos e acessórios do serviço de radiologia. Revelava na
câmara escura os exames realizados. Atendia pacientes com patologias diversas".
Assim, fixadas essas premissas, verifico que o período em questão deve ser considerado como
trabalhado em condições especiais, porquanto pela análise dos documentos, restou comprovado
que a autora nas funções de operador de raio X estava exposta a radiação ionizante,
enquadrando-se nos códigos 1.3.2 do Decreto nº 53.831/64 e nos itens 1.3.4 e 1.3.5 do Decreto
nº 83.080/79.
Ademais, observo que a exigência legal de comprovação de exposição a agente insalubre de
forma permanente, introduzida pela Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao § 3º do artigo 57
da Lei nº 8.213, deve ser interpretada como o labor continuado, não eventual ou intermitente, de
modo que não significa a exposição ininterrupta a agente insalubre durante toda a jornada de
trabalho.
Quanto à alegação de necessidade de prévio custeio, ressalto que inexiste vinculação do ato de
reconhecimento de tempo de atividade perigosa/nociva ao eventual pagamento de encargos
tributários com alíquotas diferenciadas, eis que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91, não
demandam tal exigência, que constituiria encargo para o empregador, não podendo o empregado
ser por isso prejudicado.
Dessa forma, a soma do(s) período(s) especial(ais) aqui reconhecido(s) com aqueles já
reconhecidos pelo INSS no âmbito administrativo, totaliza mais de 25 anos de tempo de serviço
especial, o que autoriza a concessão da aposentadoria especial, nos termos do art. 57 da Lei nº
8.213/91, restando mantida asentença.
O termo inicial do benefício foi corretamente fixado na data do requerimento administrativo
(11/04/2013), uma vez que a parte autora demonstrou que já havia preenchido os requisitos
necessários à concessão do benefício desde então.
Tendo em vista o recente julgado do C. STF no RE 791961/PR, que reafirmou a
constitucionalidade do art. 57, §8º, da Lei de Benefícios, conclui-seque, optando o autor em
retornar às atividades especiais, não fará jus à aposentadoria especial.
Quanto ao termo inicial do benefício de aposentadoria especial, deverá ser a data do
requerimento administrativo, ainda que, à época, esteja desenvolvendo atividade de cunho
especial.
No que tange aos critérios de atualização do débito, verifico que a sentença desborda do
entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de
repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
Tratando-se de matéria cognoscível de ofício (AgRg no AREsp 288026/MG, AgRg no REsp
1291244/RJ), corrijo a sentença e estabeleço que as parcelas vencidas deverão ser atualizadas
monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de
Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da
conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à
TR – Taxa Referencial.
Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do
CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de
advogado arbitrados na sentença em 2%.
Ante a constatação de que o autor já recebe atualmente benefício de aposentadoria por tempo de
contribuição (NB 1795470914 - DIB 03/07/2017), anoto que lhe é assegurado o direito de optar
pelo benefício que entender mais vantajoso, em observância ao ditame do art. 124, Lei nº
8.213/91.
Na hipótese de opção pelo benefício cujo direito foi reconhecido na esfera judicial, obrigatória a
dedução, na fase de liquidação, dos valores eventualmente pagos administrativamente à parte
autora, a mesmo título ou cuja cumulação seja vedada por lei, após o termo inicial ora assinalado.
Por outro lado, a controvérsia atinente à possibilidade de execução do crédito decorrente das
parcelas vencidas do benefício judicial, na hipótese de escolha por aquele concedido na esfera
administrativa, é matéria cuja análise se encontra suspensa sob a sistemática de apreciação de
recurso especial repetitivo (STJ, Tema afetado nº 1.018), nos termos do § 1º do art. 1.036 do
CPC, pelo que deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de acordo com a futura deliberação
do tema pelo E. STJ.
Ante o exposto, de ofício, corrijo a sentença para fixar os critérios de atualização do débito,não
conheço da remessa oficial, nego provimento à apelação do INSS e, com fulcro no §11º do artigo
85 do Código de Processo Civil, majoro os honorários de advogado em 2% sobre o valor
arbitrado na sentença.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. REMESSA NECESSÁRIA. APOSENTADORIA ESPECIAL.
COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. RADIAÇÃO IONIZANTE. EXPOSIÇÃO
PERMANENTE.PRÉVIO CUSTEIO.IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. DIB. VEDAÇÃO DO
§8º DO ART. 57 DA LEI 8213/91. JUROS E CORREÇÃO. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
HONORÁRIOS DE ADVOGADO MAJORADOS. MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA
JUSTIÇA FEDERAL.
1. Valor da condenação inferior a 1.000 (mil) salários mínimos. Remessa oficial não conhecida.
2. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o
reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua
demonstração.
3. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da
atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no
período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário (a
partir de 11/12/97).
4. A exposição à radiação ionizante, torna a atividade especial, nos termos dos códigos 1.3.2 do
Decreto nº 53.831/64 e nos itens 1.3.4 e 1.3.5 do Decreto nº 83.080/79.
5. A exigência legal de comprovação de exposição a agente insalubre de forma permanente,
introduzida pela Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao § 3º do artigo 57 da Lei nº 8.213, deve
ser interpretada como o labor continuado, não eventual ou intermitente, de modo que não
significa a exposição ininterrupta a agente insalubre durante toda a jornada de trabalho.
6. Inexiste vinculação do ato de reconhecimento de tempo de atividade perigosa/nociva ao
eventual pagamento de encargos tributários com alíquotas diferenciadas, pois o empregado não
pode ser por isso prejudicado.
7. A soma dos períodos redunda no total de mais de 25 anos de tempo de serviço especial, o que
autoriza a concessão da aposentadoria especial, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
8. DIB na data do requerimento administrativo.
9. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a
elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-
se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa
Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947,
tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
10. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na
sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015.
11. Sentença corrigida de ofício. Remessa oficial não conhecida. Apelação do Instituto Nacional
do Seguro Social - INSS não provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu de ofício, corrigir a sentença para fixar os critérios de atualização do débito,
não conhecer da remessa oficial, e negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório
e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
