
9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5001723-25.2024.4.03.6105
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIZ CARLOS GAGLIARDI
Advogados do(a) APELADO: ANGELA GONCALVES - SP291006-A, MARCUS VINICIUS PRIMO DE ALMEIDA - SP312874-A, ROBERTA AMERICO DE OLIVEIRA FURTADO - SP443181-A
OUTROS PARTICIPANTES:
JUIZO RECORRENTE: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CAMPINAS/SP - 4ª VARA FEDERAL
9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5001723-25.2024.4.03.6105
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIZ CARLOS GAGLIARDI
Advogados do(a) APELADO: ANGELA GONCALVES - SP291006-A, MARCUS VINICIUS PRIMO DE ALMEIDA - SP312874-A, ROBERTA AMERICO DE OLIVEIRA FURTADO - SP443181-A
OUTROS PARTICIPANTES:
JUIZO RECORRENTE: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CAMPINAS/SP - 4ª VARA FEDERAL
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de conhecimento proposta contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, na qual a parte autora busca o reconhecimento de atividade especial, com vistas à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
A sentença julgou procedente em parte o pedido para:
"CONDENAR o Réu a reconhecer os períodos especiais de 01.07.1996 a 16.11.1999 e 01.02.2001 a 11.11.2020 (fator de conversão 1.4), e implantar aposentadoria por tempo de contribuição, pelas regras do art. 15, 16, 17 ou 20 da EC 103/2019, em favor do Autor, LUIZ CARLOS GAGLIARDI, com data de início na data da DER (26.05.2023), bem como a proceder ao pagamento dos valores devidos relativos às parcelas vencidas, a partir de então, observando-se, quanto à correção monetária e juros, que as parcelas vencidas deverão ser corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e a partir da vigência da Lei nº 11.960/09 e a aplicação da taxa SELIC a partir da publicação da EC 113/2021, cabendo ao autor optar pelo benefício que lhe for mais vantajoso. Custas ex lege. Condeno o Réu no pagamento dos honorários advocatícios, no percentual mínimo previsto no inciso I, do §3º, sobre o valor da condenação, respeitada a proporção dos incisos subsequentes, conforme previsto no §5º, todos do art. 85 do Código de Processo Civil, excluídas as parcelas vincendas, ao teor da Súmula 111 do E. Superior Tribunal de Justiça. Decisão sujeita ao reexame necessário, porquanto ilíquida (Tema 17, Súmula 490 STJ)."
Inconformada, a autarquia interpôs apelação. Invocou, inicialmente, efeito suspensivo ativo nos termos do artigo 1.012, §3º, I, do Código de Processo Civil (CPC). No mérito, sustentou a impossibilidade do enquadramento efetuado dos períodos indicados, à míngua de comprovação de exposição a agentes biológicos. Alegou, ainda, a necessidade de apresentação de declaração de não acumulação de benefícios, nos termos do artigo 24, §§ 1º e 2º, da Emenda Constitucional (EC) n. 103/2019.
No que se refere aos consectários legais, requereu a fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a isenção do pagamento das custas processuais e a compensação dos valores eventualmente pagos na esfera administrativa ou por força de tutela antecipada.
Ao final, prequestionou a matéria para fins recursais, com vistas a possível manejo de recursos aos tribunais superiores.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5001723-25.2024.4.03.6105
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIZ CARLOS GAGLIARDI
Advogados do(a) APELADO: ANGELA GONCALVES - SP291006-A, MARCUS VINICIUS PRIMO DE ALMEIDA - SP312874-A, ROBERTA AMERICO DE OLIVEIRA FURTADO - SP443181-A
OUTROS PARTICIPANTES:
JUIZO RECORRENTE: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CAMPINAS/SP - 4ª VARA FEDERAL
V O T O
O recurso preenche os pressupostos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido.
Por outro lado, na espécie, não incide a norma prevista no artigo 496, § 3º, inciso I, do CPC (remessa necessária), pois o valor da condenação ou o proveito econômico estimado não ultrapassa mil salários mínimos. Prevalece, nesse ponto, a certeza matemática em detrimento da aplicação automática da Súmula n. 490 do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Outrossim, não se cogita de efeito suspensivo ativo da decisão recorrida, à míngua dos pressupostos necessários do § 1º do artigo 1.012 do CPC.
Nos termos do princípio tantum devolutum quantum appellatum, passo à análise das questões efetivamente impugnadas.
Do Tempo de Serviço Especial
A caracterização da atividade especial deve observar a legislação vigente à época da prestação do serviço. A conversão de tempo especial em comum, por sua vez, é regulada pela norma vigente na data em que o segurado reúne os requisitos para a aposentadoria, conforme entendimento consolidado nos Temas Repetitivos 422 e 546 do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A Emenda Constitucional (EC) n. 103/2019 vedou a conversão de tempo especial para comum a partir de sua vigência (13/11/2019), conforme artigo 25, § 2º, mantendo-se, contudo, o direito à conversão dos períodos anteriores, bem como a possibilidade de concessão de aposentadoria especial com base no artigo 19, § 1º, I.
A evolução normativa sobre a matéria pode ser resumida assim:
a) até 28/4/1995: admissível o enquadramento por categoria profissional (Decretos n. 53.831/1964 e 83.080/1979) ou exposição a agentes nocivos, com exceção de ruído e calor, que exigem prova técnica.
b) de 29/4/1995 a 5/3/1997: necessária comprovação da exposição habitual e permanente a agentes nocivos, sendo suficiente o formulário-padrão (SB-40 ou DSS-8030), salvo para ruído e calor.
c) de 6/3/1997 em diante: exigência de formulário fundado em laudo técnico ou produção de perícia (Decreto n. 2.172/1997).
d) a partir de 1º/1/2004: o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) torna-se documento essencial e substitui os antigos formulários, dispensando o laudo técnico se preenchido corretamente.
Da Fonte de Custeio
A ausência de recolhimento de contribuições adicionais pelo empregador não impede o reconhecimento da atividade especial pelo segurado, conforme os princípios da solidariedade e automaticidade (art. 30, I, da Lei n. 8.212/1991).
Segundo o Supremo Tribunal Federal (STF), os benefícios previstos diretamente na Constituição, como a aposentadoria especial, não estão condicionados à prévia fonte de custeio (art. 195, § 5º, da CF).
Do Agente Nocivo Ruído
Os limites legais de tolerância ao ruído são:
(i) até 5/3/1997: acima de 80 dB;
(ii) de 6/3/1997 a 18/11/2003: acima de 90 dB;
(iii) a partir de 19/11/2003: acima de 85 dB.
Nos termos do Tema Repetitivo 694 do STJ, é inviável a aplicação retroativa do novo limite (85 dB). A comprovação da exposição pode ser feita por PPP ou laudo técnico, sendo válida a metodologia diversa quando constatada a insalubridade.
Dos Agentes Químicos - Óleos e Graxas
Ainda que a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU), ao julgar o Tema 298, tenha firmado entendimento pela insuficiência da exposição genérica a óleos e graxas para fins de reconhecimento de atividade especial, esta Corte admite o enquadramento da exposição a tais agentes quando forem derivados de petróleo, especialmente os hidrocarbonetos aromáticos, os quais são classificados como potencialmente cancerígenos, conforme disposto na Portaria Interministerial MTE/MS/MPS n. 9/2014.
A jurisprudência predominante tem assentado o entendimento de que a exposição a hidrocarbonetos aromáticos dispensa a mensuração quantitativa, sendo possível o reconhecimento da especialidade da atividade com base na periculosidade intrínseca à natureza do agente, nos termos da legislação previdenciária e da regulamentação vigente.
Do Equipamento de Proteção Individual - EPI
Segundo deliberação do Supremo Tribunal Federal (STF), no Tema n. 555 da repercussão geral (ARE n. 664.335), o uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI) somente afasta o reconhecimento da natureza especial da atividade quando comprovadamente eficaz na neutralização da nocividade. Havendo dúvida quanto à eficácia do equipamento ou em caso de exposição a níveis de ruído superiores aos limites de tolerância, deve-se promover o enquadramento, ainda que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) indique o fornecimento de EPI tido como eficaz.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o Tema Repetitivo n. 1.090, firmou as seguintes teses jurídicas sobre a matéria:
I – A informação constante do PPP acerca da utilização de EPI descaracteriza, em princípio, o tempo especial, ressalvadas as hipóteses excepcionais em que, mesmo diante de proteção comprovada, é reconhecido o direito à contagem diferenciada;
II – Compete à parte autora da ação previdenciária demonstrar:
(i) a inadequação do EPI ao risco da atividade exercida;
(ii) a inexistência ou irregularidade do respectivo certificado de conformidade;
(iii) o descumprimento das normas relativas à manutenção, substituição e higienização do EPI;
(iv) a ausência ou insuficiência de orientação e treinamento quanto ao uso correto, guarda e conservação do equipamento;
(v) ou qualquer outro fator que permita concluir pela ineficácia do EPI;
III – Se a análise probatória revelar dúvida razoável ou divergência quanto à real eficácia do EPI, a conclusão deve ser favorável ao segurado.
Conforme disposto no artigo 291 da Instrução Normativa INSS n. 128/2022, a eficácia do EPI não obsta o reconhecimento de atividade especial exercida até 3/12/1998, data de vigência da Medida Provisória n. 1.729/1998, posteriormente convertida na Lei n. 9.732/1998, para qualquer agente nocivo.
À luz dos desdobramentos dos Temas 555 do STF e 1.090 do STJ, verifica-se que, em determinadas hipóteses de exposição a agentes nocivos, o uso de EPI não afasta o reconhecimento do caráter nocente da atividade, seja pela inexistência de equipamento eficaz, seja por sua ineficácia prática (inocuidade).
As principais hipóteses em que se presume a ineficácia prática do EPI são:
(i) Agentes Biológicos:
Não há EPI capaz de neutralizar integralmente o risco de contaminação, em razão da natureza invisível e difusa dos agentes, da possibilidade de falhas humanas ou técnicas no uso dos equipamentos e do fato de a exposição ser inerente à função. Por isso, há presunção de ineficácia prática nesse caso.
(ii) Agentes Cancerígenos (até 2020):
Até a edição da IN INSS n. 128/2022, era reconhecida a inexistência de EPI eficaz para agentes reconhecidamente cancerígenos, conforme a Lista Nacional de Doenças Relacionadas ao Trabalho – LINACH (Portaria GM/MS n. 2.309/2022). A jurisprudência, até então, reconhecia a impossibilidade de neutralização total do risco cancerígeno.
(iii) Periculosidade:
O risco decorre da possibilidade de acidente de grandes proporções, de natureza acidental e imprevisível. O EPI, nesse caso, não elimina o perigo, apenas atenua os danos, razão pela qual não se reconhece eficácia plena do equipamento.
(iv) Ruído acima dos limites legais:
Conforme deliberação nos citados Temas 555 do STF e 1.090 do STJ, o fornecimento de EPI, ainda que considerado eficaz, não descaracteriza a prejudicialidade do ofício, pois não é possível assegurar a neutralização integral dos efeitos agressivos do ruído sobre o organismo do trabalhador, os quais vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas.
Do Caso Concreto
No caso, a parte autora busca o reconhecimento da natureza especial dos períodos laborais indicados (de 1º/7/1996 a 16/11/1999 e de 1º/2/2001 a 11/11/2020), durante os quais atuou na função de ortoptista, alegando exposição a agentes biológicos.
Para tanto, foram apresentados Perfis Profissiográficos Previdenciários (PPPs) emitidos pela "Clínica dos Oculistas Associados de Campinas Ltda." e pelo "Instituto F. Raskin S/C Ltda.", os quais registram a presença de “vírus e bactérias” no ambiente de trabalho, durante o desempenho das atividades de ortoptista (oculista).
Os referidos formulários descrevem de forma genérica suas atribuições, indicando apenas que o profissional era “responsável pelo atendimento a pacientes” (sic).
Com efeito, ainda que se admita a existência de exposição a agentes biológicos ao longo da jornada de trabalho, não é possível concluir que tal exposição se dava de forma habitual e permanente, mas apenas de maneira eventual.
Ressalte-se que a simples menção, nos PPPs, à exposição a agentes biológicos (como vírus e bactérias) não é suficiente para caracterizar a atividade de ortoptista (oculista) como especial ou insalubre, diferentemente do que ocorre, por exemplo, com as funções de médico ou enfermeiro, que envolvem contato direto e habitual com pacientes contaminados e manuseio de materiais altamente infectocontagiosos, especialmente em ambiente hospitalar.
Neste sentido (g.n.):
"AGRAVO LEGAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTE BIOLÓGICO. NATUREZA ESPECIAL DA ATIVIDADE. NÃO COMPROVAÇÃO. EXPOSIÇÃO OCASIONAL E/OU INTERMITENTE. SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO INSUFICIENTE PARA APOSENTAÇÃO. ILEGALIDADE OU ABUSO DE PODER INEXISTENTE. AGRAVO IMPROVIDO.
I. No agravo do art. 557, do CPC de 1973 (art. 1.021 do CPC-2015), a controvérsia limita-se ao exame da ocorrência, ou não, de flagrante ilegalidade ou abuso de poder, a gerar dano irreparável ou de difícil reparação para a parte, vícios inexistentes na decisão agravada.
II. O reconhecimento do tempo especial depende da comprovação do trabalho exercido em condições especiais que, de alguma forma, prejudiquem a saúde e a integridade física do autor.
III. No caso, incabível a caracterização de tempo de serviço especial por atividade profissional, fazendo-se necessário a exposição habitual e permanente, não ocasional nem intermitente aos agentes nocivos de natureza biológica.
IV. Não basta a parte autora pertencer à área de saúde ou, simplesmente, trabalhar dentro das dependências de um hospital para que a sua atividade venha a ser reconhecida como insalubre face à eventual exposição a agentes biológicos.
V. Tal assertiva se aplica ao caso concreto uma vez que a parte autora, nos períodos de 15/01/1979 a 05/07/1989 e 03/02/1990 a 06/05/1990 exerceu as atividades de copeira e atendente de nutrição, o que inviabiliza o enquadramento tão-somente pela atividade. Ademais, o conjunto probatório carreado aos autos indica, apenas, exposição ocasional e/ou intermitente aos agentes biológicos fungos, vírus e bactérias, o que inviabiliza o reconhecimento da atividade especial nos moldes pleiteados na inicial.
VI. Razões recursais que não contrapõem tal fundamento a ponto de demonstrar o desacerto do decisum, limitando-se a reproduzir argumento visando à rediscussão da matéria nele decidida.
VII. Agravo legal improvido.
(TRF 3ª Região, NONA TURMA, APELREEX - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1788612 - 0002796-54.2009.4.03.6102, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS, julgado em 12/09/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:26/09/2016)
Ademais, de acordo com o anexo do Decreto n. 83.080/1979, para caracterização do agente biológico, a parte autora haveria de ter executado "trabalhos permanentes em contato com produtos de animais infectados, carnes, vísceras, glândulas, sangue, ossos e materiais infecto-contagiantes", atividades típicas dos profissionais da saúde como médicos, veterinários, enfermeiros, técnicos de laboratório, dentistas e biologistas, o que não ocorreu.
Frisa-se, ainda, que a parte autora nem sequer percebia adicional de insalubridade, indicador de possível exercício de atividade nocente, o que reforça o caráter meramente comum das funções.
Por fim, assinalo de passagem que o Projeto de Lei n. 7.289/2006, em trâmite na Câmara dos Deputados, que regula o exercício da profissão de "ortoptista" não a prevê como de natureza especial.
Em suma, à míngua de comprovação da alegada exposição aos agentes agressivos de forma habitual e permanente, é inviável o enquadramento.
Consequentemente, o litigante não reúne as condições ao benefício na DER.
Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º e 11, do CPC.
Diante do exposto, não conheço da remessa oficial, rejeito a matéria preliminar e dou provimento à apelação do INSS para julgar improcedente o pedido.
É o voto.
| Autos: | APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5001723-25.2024.4.03.6105 |
| Requerente: | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
| Requerido: | LUIZ CARLOS GAGLIARDI |
Ementa: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. TEMPO ESPECIAL. ATIVIDADE DE ORTOPTISTA. AGENTES BIOLÓGICOS. EXPOSIÇÃO EVENTUAL OU INTERMITENTE. IMPOSSIBILIDADE DE ENQUADRAMENTO. RECURSO PROVIDO.
I. CASO EM EXAME
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Apelação interposta pelo INSS contra sentença que reconheceu como especial os períodos de labor da parte autora exercidos na função de ortoptista, com consequente concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
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Há duas questões em discussão: (i) definir se o trabalho exercido como ortoptista, com indicação em PPP de exposição a agentes biológicos, caracteriza atividade especial; (ii) estabelecer se, diante da ausência de habitualidade e permanência da exposição, há direito à aposentadoria especial ou à conversão do tempo de serviço.
III. RAZÕES DE DECIDIR
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A atividade especial deve ser analisada conforme a legislação vigente à época da prestação do serviço, sendo que, após a EC n. 103/2019, é vedada a conversão de tempo especial em comum, preservando-se, contudo, o direito adquirido quanto aos períodos anteriores.
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A caracterização da especialidade exige exposição habitual e permanente a agentes nocivos, não sendo suficiente a menção genérica a vírus e bactérias nos PPPs apresentados pela parte autora.
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O exercício da função de ortoptista não pressupõe, por si só, exposição direta e contínua a agentes infectocontagiosos, como ocorre em atividades típicas de médicos e enfermeiros, tampouco restou comprovado contato permanente com materiais infectantes.
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Fica afastado o reconhecimento de atividade especial quando demonstrada apenas a exposição eventual ou intermitente a agentes biológicos.
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À míngua de comprovação da efetiva exposição a agentes nocivos de forma habitual e permanente, é inviável o enquadramento da atividade como especial, inviabilizando a concessão do benefício pleiteado.
IV. DISPOSITIVO E TESE
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Remessa oficial não conhecida. Matéria preliminar rejeitada. Recurso do INSS provido.
Tese de julgamento:
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O reconhecimento de tempo especial por exposição a agentes biológicos exige comprovação de contato habitual e permanente com pacientes contaminados ou materiais infectocontagiosos.
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A função de ortoptista não pressupõe, por si só, exposição direta e contínua a agentes nocivos, não se enquadrando como atividade especial na ausência de prova robusta.
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 195, § 5º; EC nº 103/2019, art. 25, § 2º, e art. 19, § 1º, I; CPC, arts. 496, § 3º, I; 1.012, § 1º; 85, §§ 1º e 11; Lei n. 8.212/1991, art. 30, I; Decretos n. 53.831/1964, n. 83.080/1979 e n. 2.172/1997.
Jurisprudência relevante citada: STF, ARE n. 664.335 (Tema 555, repercussão geral); STJ, Temas Repetitivos n. 422, 546, 694 e 1.090; TRF-3, ApelReex n. 0002796-54.2009.4.03.6102, Nona Turma, Rel. Des. Fed. Marisa Santos, j. 12.09.2016.
ACÓRDÃO
Desembargadora Federal
