Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0004371-61.2015.4.03.6143
Relator(a)
Desembargador Federal MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
07/10/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 13/10/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. DESAPOSENTAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. RECONHECIMENTO DE
ATIVIDADE ESPECIAL. INTERESSE DE AGIR. EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS. RUÍDO.
ÓLEOS. PPP. PERÍCIA.
- Inicialmente, impõe-se destacar a presença do interesse de agir da parte autora no
reconhecimento da natureza especial dos períodos laborados, ainda que impossível a
desaposentação com a conversão em aposentadoria especial, tendo em vista a possibilidade de
conversão em tempo comum (art. 57, §5º, L. 8.213/91), para revisão da aposentadoria por tempo
de contribuição.
- Em relação à preliminar arguida pela parte autora, em relação à realização de nova perícia
complementar, não há que se falar em cerceamento do direito de defesa, uma vez que cabe tão-
somente ao magistrado, como destinatário da prova, aferir a necessidade ou não da produção de
prova pericial (art. 464, § 1º, inciso II, c/c art. 370, ambos do CPC).
- Não é possível o cômputo da atividade especial exercida pela parte autora posteriormente à
data de seu requerimento administrativo e início de seu benefício, pois configuraria
"desaposentação", o que não é permitido pelo ordenamento jurídico atual, sendo esse o
entendimento do Colendo Supremo Tribunal Federal, no julgamento Recurso Extraordinário
661256/SC, com repercussão geral.
- Para a verificação do tempo de serviço em regime especial, no caso, deve ser levada em conta
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
a disciplina estabelecida pelos Decretos nºs 83.080/79 e 53.831/64.
- Salvo no tocante aos agentes físicos ruído e calor, é inexigível laudo técnico das condições
ambientais de trabalho para a comprovação de atividade especial até o advento da Lei nº
9.528/97, ou seja, até 10/12/97. Precedentes do STJ.
- Comprovada a atividade insalubre, demonstrada por meio de laudo técnico ou Perfil
Profissiográfico Previdenciário - PPP, é aplicável o disposto no § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
- No presente caso, a parte autora demonstrou haver laborado em atividade especial nos
períodos de 02/05/1999 a 07/10/2003, no cargo de “operador” do setor de produção da empresa
KML IND de Máquinas e Equipamentos Industriais LTDA. É o que comprova o Perfil
Profissiográfico Previdenciário – PPP, elaborado nos termos do art. 68, § 2º, do Decreto nº
3.048/99 (Id. 131296681 - Pág. 127-128), subscrito por profissional habilitado, trazendo a
conclusão de que a parte autora desenvolveu sua atividade profissional com exposição ao agente
agressivo ruído em nível de 92 dB(A). Referido agente agressivo encontra classificação no código
1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 e código 1.1.5 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79, bem como no
código 2.0.1, Decreto 3.048, com redação dada pelo Decreto nº 4.882, de 2003, em razão da
habitual e permanente exposição ao agente agressivo descrito.
- Quanto ao período de 01/04/2004 até a concessão do benefício em revisão (DIB 12/01/2006),
exercido ainda na empresa KML IND de Máquinas e Equipamentos Industriais LTDA, verifica-se
do PPP apresentado que o ruído foi aferido em 84 dB(A), apontando para a presença do fator de
risco químico “óleo”. Após alegação de inconsistências e de divergências apontadas no Perfil
Profissiográfico Previdenciário – PPP emitido pelo empregador, determinou-se a realização de
perícia no local de trabalho que, em virtude da baixa da empresa, ocorreu em indústria similar
indicada pelo próprio segurado, em 14/05/2018, presentes nas diligências o autor e seu
advogado. O laudo pericial concluiu pela inexistência de exposição do segurado a fatores de
risco, aferindo-se no ambiente de trabalho o ruído de 73 dB(A), abaixo do limite tolerado, calor
também inferior ao limite máximo e, por fim, consignando que, de acordo com a NR15, IN
45/2010, Dec. 3.048/99 e demais normas vigentes, não haveria agente nocivo químico eis que o
óleo utilizado no processo não é de origem mineral.
- Portanto, não há dúvida de que faz jus a parte autora ao enquadramento do labor
desempenhado nos períodos supracitados como atividade especial para fins de conversão para
tempo comum, nos termos do art. 57, §5º, L. 8.213/91, com o recálculo da RMI do benefício em
gozo (42/139.858.815-3) e o pagamento das diferenças.
- No caso dos autos, os efeitos financeiros da revisão do benefício devem ser mantidos na data
do requerimento administrativo, momento em que o segurado já preenchia os requisitos para o
reconhecimento da atividade especial.
- Por sua vez, há de se ressaltar que a prescrição quinquenal alcança as prestações não pagas e
nem reclamadas na época própria, não atingindo o fundo de direito. Dessa forma, estão prescritas
as parcelas devidas e não reclamadas no período anterior aos 5 (cinco) anos que precedem ao
ajuizamento da ação.
- A correção monetária e os juros de mora serão aplicados de acordo com o vigente Manual de
Cálculos da Justiça Federal, atualmente a Resolução nº 267/2013, observado o julgamento final
do RE 870.947/SE em Repercussão Geral.
- Honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, §§ 3º e 11, do Novo
Código de Processo Civil/2015, e da Súmula 111 do STJ, observando-se que o inciso II do § 4º,
do artigo 85, estabelece que, em qualquer das hipóteses do §3º, não sendo líquida a sentença, a
definição do percentual somente ocorrerá quando liquidado o julgado.
- Apelação da parte autora provida em parte.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0004371-61.2015.4.03.6143
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: ADEMIR BELINELI
Advogado do(a) APELANTE: THAIS TAKAHASHI - PR34202-S
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0004371-61.2015.4.03.6143
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: ADEMIR BELINELI
Advogado do(a) APELANTE: THAIS TAKAHASHI - PR34202-S
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Proposta ação revisional de
benefício previdenciário, mediante o reconhecimento de atividade urbana de natureza especial,
inclusive posteriormente à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição
(42/139.858.815-3), para fins de recálculo da sua renda mensal inicial, sobreveio sentença de
improcedência, condenando-se o autor ao pagamento dos honorários advocatícios fixados em
10% sobre o valor da causa, observado o art. 98, §3º, CPC/15.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação sustentando, preliminarmente, o
interesse de agir na demanda apesar do pedido de desaposentação, vez que a revisão do
benefício é inerente ao pedido realizado, e a nulidade da sentença por cerceamento de defesa,
diante da necessidade de complementação do laudo pericial, em virtude deste padecer de
contradição quanto ao agente químico (óleo mineral – hidrocarboneto). No mérito, requer o
reconhecimento do labor de natureza especial nos períodos pleiteados inicialmente e a
condenação da autarquia ao recálculo da RMI e ao pagamento das diferenças, destacando que o
PPP comprova a exposição a ruído de 92 dB(A) e ao agente químico.
Sem as contrarrazões, os autos foram remetidos a este Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0004371-61.2015.4.03.6143
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: ADEMIR BELINELI
Advogado do(a) APELANTE: THAIS TAKAHASHI - PR34202-S
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Recebo o recurso tempestivo de
apelação, nos termos do art. 1.011 do Código de Processo Civil.
Inicialmente, impõe-se destacar a presença do interesse de agir da parte autora no
reconhecimento da natureza especial dos períodos laborados, ainda que impossível a conversão
em aposentadoria especial, tendo em vista a possibilidade de conversão em tempo comum (art.
57, §5º, L. 8.213/91), para revisão da aposentadoria por tempo de contribuição.
Em relação à preliminar de cerceamento de defesa, arguida pela parte autora, em relação à
pretensão de realização de nova perícia complementar, saliente-se que, o artigo 464, § 1º, inciso
II, do Código de Processo Civil, disciplina que o Juiz indeferirá a perícia quando for desnecessária
em vista de outras provas produzidas.
Desta forma, não há que se falar em cerceamento do direito de defesa, uma vez que cabe tão-
somente ao magistrado, como destinatário da prova, aferir a necessidade ou não da produção de
prova pericial (art. 464, § 1º, inciso II, c/c art. 370, ambos do CPC).
Nesse sentido:
"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PERÍCIA. INDEFERIMENTO DE
QUESITOS. ARTS. 130 E 426, I, DO CPC. JUIZ: DESTINATÁRIO DA PROVA.
.....................................................................................................................II - O Magistrado é, por
excelência, o destinatário da prova, incumbindo-lhe determinar a demonstração de fatos que
julgue necessários para formar seu livre convencimento, a teor do art. 130 do CPC.
......................................................................................................................IV - Agravo de
instrumento a que se nega provimento". (TRF da 1ª Região, AG nº 199701000010057, Rel. Juiz
Cândido Ribeiro, j. 09/03/1999, DJ 11/06/1999, p. 186).
No caso concreto, consta dos autos a prova pericial e o PPP, não se vislumbrando a necessidade
de anulação da sentença recorrida para a confecção de novo laudo pericial, pois o conjunto
probatório é suficiente para o julgamento da demanda.
Convém destacar que não é possível o cômputo da atividade especial exercida pela parte autora
posteriormente à data de seu requerimento administrativo e início de seu benefício, pois
configuraria "desaposentação", o que não é permitido pelo ordenamento jurídico atual, sendo
esse o entendimento do Colendo Supremo Tribunal Federal, conforme se observa no julgamento
Recurso Extraordinário 661256/SC que reconheceu a repercussão geral da questão "sub judice"
e encerrou o seu julgamento fixando a tese de que, "in litteram":
"No âmbito do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), somente lei pode criar benefícios e
vantagens previdenciárias, não havendo, por ora, previsão legal do direito à 'desaposentação',
sendo constitucional a regra do artigo 18, parágrafo 2º, da Lei 8.213/91." (ATA Nº 31, de
26/10/2016, DJE nº 234, divulgado em 03/11/2016)
Quanto à caracterização do denominado trabalho em regime especial, é firme a jurisprudência
que a legislação aplicável é a vigente no período em que a atividade a ser considerada foi
efetivamente exercida.
Para a verificação do tempo de serviço em regime especial, no caso, deve ser levada em conta a
disciplina estabelecida pelos Decretos nºs 83.080/79 e 53.831/64.
Salvo no tocante aos agentes físicos ruído e calor, a exigência de laudo técnico para a
comprovação das condições adversas de trabalho somente passou a ser obrigatória a partir de
05/03/1997, data da publicação do Decreto nº 2.172/97, que regulamentou a Lei nº 9.032/95 e a
MP 1.523/96, convertida na Lei nº 9.528/97.
Contudo, acompanhando posicionamento adotado nesta 10ª Turma, no sentido de que em se
tratando de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº
9.528, de 10/12/1997, entendo que a exigência de laudo técnico para a comprovação das
condições adversas de trabalho somente passou a ser exigência legal a partir de 11/12/1997, nos
termos da referida lei, que alterou a redação do § 1º do artigo 58 da Lei nº 8.213/91. Neste
sentido, precedentes do Superior Tribunal de Justiça: REsp nº 422616/RS, Relator Ministro Jorge
Scartezzini, j. 02/03/2004, DJ 24/05/2004, p. 323; REsp nº 421045/SC, Relator Ministro Jorge
Scartezzini, j. 06/05/2004, DJ 28/06/2004, p. 382.
O artigo 201, § 1º, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº
20, de 15 de dezembro de 1998, passou a exigir a definição das atividades exercidas sob
condições especiais mediante lei complementar, com a ressalva contida no art. 15 da referida EC
nº 20/98, no sentido de que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 mantêm a sua vigência até que
seja publicada a lei complementar exigida. Assim, dúvidas não há quanto à plena vigência, do
artigo 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91, no tocante à possibilidade da conversão do tempo trabalhado
em condições especiais em tempo de serviço comum.
A propósito, quanto à plena validade das regras de conversão de tempo de serviço especial em
comum, de acordo com o disposto no § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, traz-se à colação trecho
de ementa de aresto: "Mantida a redação do § 5º do art. 57 da Lei 8.213/91, em face da
superveniência da Lei 9.711 de novembro de 1998 que converteu a MP 1.663/15ª sem acolher
abolição da possibilidade de soma de tempo de serviço especial com o comum que a medida
provisória pretendia instituir, e ainda persistindo a redação do caput desse mesmo art. 57 tal
como veiculada na Lei 9.032/95 (manutenção essa ordenada pelo expressamente no art. 15 da
Emenda Constitucional nº 20 de 15.12.98) de modo que o regramento da aposentadoria especial
continuou reservado a"lei", não existe respiradouro que dê sobrevida às Ordens de Serviço ns.
600, 612 e 623, bem como a aspectos dos D. 2.782/98 e 3.048/99 (que restringiam âmbito de
apreciação de aposentadoria especial), já que se destinavam justamente a disciplinar
administrativamente o que acabou rejeitado pelo Poder Legislativo. Art. 28 da Lei 9.711/98 - regra
de transição - inválido, posto que rejeitada pelo Congresso Nacional a revogação do § 5º do art.
57 do PBPS." (TRF - 3ª Região; AMS nº 219781/SP, 01/04/2003, Relator Desembargador Federal
JOHONSOM DI SALVO, j. 01/04/2003, DJU 24/06/2003, p. 178).
Além disso, conforme se extrai do texto do § 1º do art. 201 da Constituição Federal, o trabalhador
que se sujeitou a trabalho em atividades consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física
tem direito a obter a inatividade de forma diferenciada.
A presunção da norma é de que o trabalhador que exerceu atividades em condições especiais
teve um maior desgaste físico ou teve sua saúde ou integridade submetidas a riscos mais
elevados, sendo merecedor da aposentação em tempo inferior àquele que exerceu atividades
comuns, com o que se estará dando tratamento equânime aos trabalhadores. Assim, se em
algum período de sua vida laboral o trabalhador exerceu alguma atividade classificada como
insalubre ou perigosa, porém não durante tempo suficiente para obter aposentadoria especial,
esse tempo deverá ser somado ao tempo de serviço comum, com a devida conversão, ou seja,
efetuando-se a correspondência com o que equivaleria ao tempo de serviço comum, sob pena de
não se fazer prevalecer o ditame constitucional que garante ao trabalhador que exerceu
atividades em condições especiais atingir a inatividade em menor tempo de trabalho.
É indubitável que o trabalhador que exerceu atividades perigosas, insalubres ou penosas teve
ceifada com maior severidade a sua higidez física do que aquele trabalhador que nunca exerceu
atividade em condições especiais, de sorte que suprimir o direito à conversão prevista no § 5º do
art. 57 da Lei nº 8.213/91 significa restringir o alcance da vontade das normas constitucionais que
pretenderam dar tratamento mais favorável àquele que labutou em condições especiais.
Assim, o disposto no § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91 tem por escopo garantir àquele que
exerceu atividade laborativa em condições especiais a conversão do respectivo período, o qual,
depois de somado ao período de atividade comum, deverá garantir ao segurado direito à
concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço.
Todavia, não se exige que a profissão do segurado seja exatamente uma daquelas descritas nos
anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, sendo suficiente para reconhecimento da
atividade especial que o trabalhador esteja sujeito, em sua atividade, aos agentes agressivos
descritos em referido anexo, na esteira de entendimento firmado pelo Superior Tribunal de
Justiça, conforme se verifica dos fragmentos de ementas a seguir transcritos:
"A jurisprudência desta Corte Superior firmou-se no sentido de que o rol de atividades
consideradas insalubres, perigosas ou penosas é exemplificativo, pelo que, a ausência do
enquadramento da atividade desempenhada não inviabiliza a sua consideração para fins de
concessão de aposentadoria." (REsp nº 666479/PB, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, j.
18/11/2004, DJ 01/02/2005, p. 668);
"Apenas para registro, ressalto que o rol de atividades arroladas nos Decretos n.os 53.831/64 e
83.080/79 é exemplificativo, não existindo impedimento em considerar que outras atividades
sejam tidas como insalubres, perigosas ou penosas, desde que devidamente comprovadas por
laudo pericial." (REsp nº 651516/RJ, Relatora Ministra Laurita Vaz, j. 07/10/2004, DJ 08/11/2004,
p. 291).
Ressalte-se que o artigo 58, § 1º, da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei 9.732, de
11/12/1998, dispõe que a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos
será efetuada nos termos da legislação trabalhista.
O art. 194 da CLT aduz que o fornecimento de Equipamento de Proteção Individual pelo
empregador, aprovado pelo órgão competente do Poder Executivo, seu uso adequado e a
consequente eliminação do agente insalubre são circunstâncias que tornam inexigível o
pagamento do adicional correspondente. Portanto, retira o direito ao reconhecimento da atividade
como especial para fins previdenciários.
Por sua vez, o art. 195 da CLT estabelece: A caracterização e a classificação da insalubridade e
da periculosidade, segundo as normas do Ministério do Trabalho, far-se-ão através de perícia a
cargo do Médico do Trabalho ou Engenheiro do Trabalho, registrado no Ministério do Trabalho.
A respeito da matéria, a Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sessão de
julgamento realizada em 14/05/2014, em sede de recurso representativo da controvérsia
(Recurso Especial Repetitivo 1.398.260/PR, Rel. Min. Herman Benjamin), firmou orientação no
sentido de que o nível de RUÍDO que caracteriza a insalubridade para contagem de tempo de
serviço especial deve ser superior a 80 (oitenta) decibéis até a edição do Decreto nº 2.171/1997,
de 05/03/1997, superior a 90 (noventa) decibéis entre a vigência do Decreto nº 2.171/1997 e a
edição do Decreto nº 4.882/2003, de 18/11/2003, e após a entrada em vigor do Decreto nº
4.882/2003, ou seja, a partir de 19/11/2003, incide o limite de 85 (oitenta e cinco) decibéis,
considerando o princípio tempus regit actum.
Ainda com relação à matéria, o Supremo Tribunal Federal, ao analisar o ARE 664.335/SC, em
04/12/2014, publicado no DJe de 12/02/2015, da relatoria do Ministro LUIZ FUX, reconheceu a
repercussão geral da questão constitucional nele suscitada e, no mérito, fixou o entendimento de
que a eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de
serviço especial para aposentadoria, quando o segurado estiver exposto ao agente nocivo ruído,
bem assim que "o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador
a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a
nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial. (...) Em caso de
divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a
nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da
aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar
suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se
submete.".
Não obstante a ausência de contemporaneidade entre a elaboração dos laudos periciais e o
exercício dos períodos laborais, não se pode infirmar os laudos periciais elaborados. A propósito,
enfrentando a questão relativa a não contemporaneidade do laudo pericial à prestação laboral, a
Décima Turma desta Corte Regional assim decidiu:
"Não há qualquer óbice ao reconhecimento do pleito do autor por ser o laudo técnico não
contemporâneo ao labor exercido, pois se este foi confeccionado em data relativamente recente e
considerou a atividade laborativa insalubre, certamente à época em que o trabalho fora executado
as condições eram mais adversas, pois é sabido que o desenvolvimento tecnológico otimizou a
proteção aos trabalhadores." (AC 1999.03.99.073687- 2/SP, Relator Desembargador Federal
Sérgio Nascimento, j. 08/11/2005, DJU 23/11/2005, p. 711).
Fazendo as vezes do laudo técnico, o Perfil Profissiográfico Previdenciário é documento hábil à
comprovação do tempo de serviço sob condições insalubre, pois embora continue a ser
elaborado e emitido por profissional habilitado, qual seja, médico ou engenheiro do trabalho, o
laudo permanece em poder da empresa que, com base nos dados ambientais ali contidos, emite
o referido PPP, que reúne em um só documento tanto o histórico profissional do trabalhador como
os agentes nocivos apontados no laudo ambiental, e no qual consta o nome do profissional que
efetuou o laudo técnico, sendo assinado pela empresa ou seu preposto.
No presente caso, a parte autora demonstrou haver laborado em atividade especial nos períodos
de 02/05/1999 a 07/10/2003, no cargo de “operador” do setor de produção da empresa KML IND
de Máquinas e Equipamentos Industriais LTDA. É o que comprova o Perfil Profissiográfico
Previdenciário – PPP, elaborado nos termos do art. 68, § 2º, do Decreto nº 3.048/99 (Id.
131296681 - Pág. 127-128), subscrito por profissional habilitado, trazendo a conclusão de que a
parte autora desenvolveu sua atividade profissional com exposição ao agente agressivo ruído em
nível de 92 dB(A). Referido agente agressivo encontra classificação no código 1.1.6 do Decreto nº
53.831/64 e código 1.1.5 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79, bem como no código 2.0.1, Decreto
3.048, com redação dada pelo Decreto nº 4.882, de 2003, em razão da habitual e permanente
exposição ao agente agressivo descrito.
Quanto ao período de 01/04/2004 até a concessão do benefício em revisão (DIB 12/01/2006),
exercido ainda na empresa KML IND de Máquinas e Equipamentos Industriais LTDA, verifica-se
do PPP apresentado que o ruído foi aferido em 84 dB(A), apontando para a presença do fator de
risco químico “óleo” - Id. 131296681 - Pág. 129-130.
Após alegação de inconsistências e de divergências apontadas no Perfil Profissiográfico
Previdenciário – PPP emitido pelo empregador, determinou-se a realização de perícia no local de
trabalho que, em virtude da baixa da empresa, ocorreu em indústria similar indicada pelo próprio
segurado, em 14/05/2018, presentes nas diligências o autor e seu advogado. O laudo pericial
concluiu pela inexistência de exposição do segurado a fatores de risco, aferindo-se no ambiente
de trabalho o ruído de 73 dB(A), abaixo do limite tolerado, calor também inferior ao limite máximo
e, por fim, consignando que, de acordo com a NR15, IN 45/2010, Dec. 3.048/99 e demais normas
vigentes, não haveria agente nocivo químico eis que o óleo utilizado no processo não é de origem
mineral – Id. 131296681 - Pág. 253-293.
Assim, restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte
autora no período indicado, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua
exposição ao agente nocivo supra.
Portanto, não há dúvida de que faz jus a parte autora ao enquadramento do labor desempenhado
nos períodos supracitados como atividade especial para fins de conversão para tempo comum,
nos termos do art. 57, §5º, L. 8.213/91, com o recálculo da RMI do benefício em gozo
(42/139.858.815-3) e o pagamento das diferenças.
No caso dos autos, os efeitos financeiros da revisão do benefício devem ser mantidos na data do
requerimento administrativo, momento em que o segurado já preenchia os requisitos para o
reconhecimento da atividade especial.
Nesse sentido é a jurisprudência do STJ, conforme ementa a seguir transcrita:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO
ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. TERMO INICIAL. DATA DO
PRIMEIRO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.
1. Os efeitos financeiros do deferimento da aposentadoria devem retroagir à data do primeiro
requerimento administrativo, independentemente da adequada instrução do pedido." (AgRg no
REsp 1103312/CE, Rel. Min. NEFI CORDEIRO, j. 27/05/2014, DJe 16/06/2014)
Por sua vez, há de se ressaltar que a prescrição quinquenal alcança as prestações não pagas e
nem reclamadas na época própria, não atingindo o fundo de direito. Dessa forma, estão prescritas
as parcelas devidas e não reclamadas no período anterior aos 5 (cinco) anos que precedem ao
ajuizamento da ação.
A correção monetária e os juros de mora serão aplicados de acordo com o vigente Manual de
Cálculos da Justiça Federal, atualmente a Resolução nº 267/2013, observado o julgamento final
do RE 870.947/SE em Repercussão Geral.
Honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, §§ 3º e 11, do Novo
Código de Processo Civil/2015, e da Súmula 111 do STJ, observando-se que o inciso II do § 4º,
do artigo 85, estabelece que, em qualquer das hipóteses do §3º, não sendo líquida a sentença, a
definição do percentual somente ocorrerá quando liquidado o julgado.
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, para
reconhecer a natureza especial do labor exercido no período de 02/05/1999 a 07/10/2003, com a
conversão e a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, nos termos da
fundamentação adotada.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. DESAPOSENTAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. RECONHECIMENTO DE
ATIVIDADE ESPECIAL. INTERESSE DE AGIR. EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS. RUÍDO.
ÓLEOS. PPP. PERÍCIA.
- Inicialmente, impõe-se destacar a presença do interesse de agir da parte autora no
reconhecimento da natureza especial dos períodos laborados, ainda que impossível a
desaposentação com a conversão em aposentadoria especial, tendo em vista a possibilidade de
conversão em tempo comum (art. 57, §5º, L. 8.213/91), para revisão da aposentadoria por tempo
de contribuição.
- Em relação à preliminar arguida pela parte autora, em relação à realização de nova perícia
complementar, não há que se falar em cerceamento do direito de defesa, uma vez que cabe tão-
somente ao magistrado, como destinatário da prova, aferir a necessidade ou não da produção de
prova pericial (art. 464, § 1º, inciso II, c/c art. 370, ambos do CPC).
- Não é possível o cômputo da atividade especial exercida pela parte autora posteriormente à
data de seu requerimento administrativo e início de seu benefício, pois configuraria
"desaposentação", o que não é permitido pelo ordenamento jurídico atual, sendo esse o
entendimento do Colendo Supremo Tribunal Federal, no julgamento Recurso Extraordinário
661256/SC, com repercussão geral.
- Para a verificação do tempo de serviço em regime especial, no caso, deve ser levada em conta
a disciplina estabelecida pelos Decretos nºs 83.080/79 e 53.831/64.
- Salvo no tocante aos agentes físicos ruído e calor, é inexigível laudo técnico das condições
ambientais de trabalho para a comprovação de atividade especial até o advento da Lei nº
9.528/97, ou seja, até 10/12/97. Precedentes do STJ.
- Comprovada a atividade insalubre, demonstrada por meio de laudo técnico ou Perfil
Profissiográfico Previdenciário - PPP, é aplicável o disposto no § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
- No presente caso, a parte autora demonstrou haver laborado em atividade especial nos
períodos de 02/05/1999 a 07/10/2003, no cargo de “operador” do setor de produção da empresa
KML IND de Máquinas e Equipamentos Industriais LTDA. É o que comprova o Perfil
Profissiográfico Previdenciário – PPP, elaborado nos termos do art. 68, § 2º, do Decreto nº
3.048/99 (Id. 131296681 - Pág. 127-128), subscrito por profissional habilitado, trazendo a
conclusão de que a parte autora desenvolveu sua atividade profissional com exposição ao agente
agressivo ruído em nível de 92 dB(A). Referido agente agressivo encontra classificação no código
1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 e código 1.1.5 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79, bem como no
código 2.0.1, Decreto 3.048, com redação dada pelo Decreto nº 4.882, de 2003, em razão da
habitual e permanente exposição ao agente agressivo descrito.
- Quanto ao período de 01/04/2004 até a concessão do benefício em revisão (DIB 12/01/2006),
exercido ainda na empresa KML IND de Máquinas e Equipamentos Industriais LTDA, verifica-se
do PPP apresentado que o ruído foi aferido em 84 dB(A), apontando para a presença do fator de
risco químico “óleo”. Após alegação de inconsistências e de divergências apontadas no Perfil
Profissiográfico Previdenciário – PPP emitido pelo empregador, determinou-se a realização de
perícia no local de trabalho que, em virtude da baixa da empresa, ocorreu em indústria similar
indicada pelo próprio segurado, em 14/05/2018, presentes nas diligências o autor e seu
advogado. O laudo pericial concluiu pela inexistência de exposição do segurado a fatores de
risco, aferindo-se no ambiente de trabalho o ruído de 73 dB(A), abaixo do limite tolerado, calor
também inferior ao limite máximo e, por fim, consignando que, de acordo com a NR15, IN
45/2010, Dec. 3.048/99 e demais normas vigentes, não haveria agente nocivo químico eis que o
óleo utilizado no processo não é de origem mineral.
- Portanto, não há dúvida de que faz jus a parte autora ao enquadramento do labor
desempenhado nos períodos supracitados como atividade especial para fins de conversão para
tempo comum, nos termos do art. 57, §5º, L. 8.213/91, com o recálculo da RMI do benefício em
gozo (42/139.858.815-3) e o pagamento das diferenças.
- No caso dos autos, os efeitos financeiros da revisão do benefício devem ser mantidos na data
do requerimento administrativo, momento em que o segurado já preenchia os requisitos para o
reconhecimento da atividade especial.
- Por sua vez, há de se ressaltar que a prescrição quinquenal alcança as prestações não pagas e
nem reclamadas na época própria, não atingindo o fundo de direito. Dessa forma, estão prescritas
as parcelas devidas e não reclamadas no período anterior aos 5 (cinco) anos que precedem ao
ajuizamento da ação.
- A correção monetária e os juros de mora serão aplicados de acordo com o vigente Manual de
Cálculos da Justiça Federal, atualmente a Resolução nº 267/2013, observado o julgamento final
do RE 870.947/SE em Repercussão Geral.
- Honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, §§ 3º e 11, do Novo
Código de Processo Civil/2015, e da Súmula 111 do STJ, observando-se que o inciso II do § 4º,
do artigo 85, estabelece que, em qualquer das hipóteses do §3º, não sendo líquida a sentença, a
definição do percentual somente ocorrerá quando liquidado o julgado.
- Apelação da parte autora provida em parte. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por
unanimidade, decidiu DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
