Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5034403-31.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
11/08/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 14/08/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. SENTENÇA CONDICIONAL. NULIDADE. ARTIGO 1.013, §3º,
III, DO CPC/2015. JULGAMENTO DO MÉRITO. APOSENTADORIA ESPECIAL.
COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. ENQUADRAMENTO PROFISSIONAL.
AGENTES BIOLÓGICOS. EXPOSIÇÃO PERMANENTE. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS.
DIB. VEDAÇÃO DO §8º DO ART. 57 DA LEI 8213/91. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA.
MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. CUSTAS.
JUSTIÇA ESTADUAL. TUTELA ANTECIPADA. IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO.
1. Preliminar acolhida. Sentença condicional. Nulidade na forma do caput do artigo 492 do
CPC/2015.
2. Condições de imediato julgamento. Aplicação da regra do inciso III do §3º do artigo 1.013 do
Código de Processo Civil/2015. Exame do mérito.
3. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o
reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua
demonstração.
4. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da
atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no
período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário (a
partir de 11/12/97).
5. As atividades de auxiliar de laboratório, técnico de laboratório, técnico em análises clínicas e
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
farmacêutico bioquímico devem ser reconhecidas como especiais a teor do código 2.1.3, do
Decreto nº 83.080.
6. Condição especial de trabalho configurada. Exposição habitual e permanente a agentes
biológicos (microorganismos), enquadrando-se no código 1.3.2 do Decreto nº 53.831/64, item
1.3.4 do Decreto nº 83.080/79 e item 3.0.1 do Decreto n° 2.172/97.
7. A exigência legal de comprovação de exposição a agente insalubre de forma permanente,
introduzida pela Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao § 3º do artigo 57 da Lei nº 8.213, deve
ser interpretada como o labor continuado, não eventual ou intermitente, de modo que não
significa a exposição ininterrupta a agente insalubre durante toda a jornada de trabalho.
8. A soma dos períodos redunda no total de mais de 25 anos de tempo de serviço especial, o que
autoriza a concessão da aposentadoria especial, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
9. Enquanto pendente de análise, pelo E. STF, o § 8º do art. 57 da Lei nº 8.213/91 no RE
791961/PR de relatoria do Ministro Dias Toffoli, não há como se reconhecer sua
inconstitucionalidade.
10. Provada que a recusa da autarquia na concessão do benefício no âmbito administrativo se
deu de forma injustificada, o termo inicial do benefício deve ser mantido na data do requerimento
administrativo.
11. DIB na data do requerimento administrativo.
12. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a
elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-
se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa
Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947,
tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
13. Honorários de advogado fixados em 10% do valor da condenação. Artigo 85, §§ 2º e 3º,
Código de Processo Civil/2015 e Súmula nº 111 do STJ.
14. A cobrança de custas nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da
jurisdição federal, rege-se pela legislação estadual. Art. 1º, §1º, da Lei 9.289/96.
15. As Leis Estaduais nºs 4.952/85 e 11.608/03 asseguram a isenção de custas processuais ao
Instituto Nacional do Seguro Social - INSS nas ações que tramitam perante a Justiça Estadual de
São Paulo.
16. Prestação de caráter alimentar. Implantação imediata do benefício. Tutela antecipada
concedida.
17. Preliminar do INSS acolhida. Sentença declarada nula. Pedido inicial procedente. No mérito,
apelação do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS e apelação da parte autora prejudicadas.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5034403-31.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: EDEMILSON MANFREDI, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
Advogado do(a) APELANTE: GUSTAVO DE SALVI CAMPELO - SP288255-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, EDEMILSON MANFREDI
Advogado do(a) APELADO: GUSTAVO DE SALVI CAMPELO - SP288255-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5034403-31.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: EDEMILSON MANFREDI, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
Advogado do(a) APELANTE: GUSTAVO DE SALVI CAMPELO - SP288255-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, EDEMILSON MANFREDI
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação ordinária em que se objetiva a concessão de aposentadoria especial, mediante
o reconhecimento de período trabalhado em atividades especiais.
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido para reconhecer como laborado(s) em
atividade(s) especial(ais) o(s) período(s) de 22/12/1986 a 11/08/1987, 12/08/1987 a 19/03/1990 e
20/03/1990 a 27/04/1995, determinando ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a
concessão da aposentadoria por tempo de serviço integral ou proporcional, se preenchidos os
requisitos necessários, condenando-o, em consequência, ao pagamento das parcelas em atraso,
corrigidas monetariamente, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os
cálculos na Justiça Federal e acrescidas de juros de mora, fixados em 6% ao ano. Condenou o
autor ao pagamento de honorários de advogado, fixados em R$ 1.500,00, cuja exigibilidade,
diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, ficou condicionada à hipótese
prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
Apela o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, requerendo, preliminarmente, que seja
conhecida a remessa necessária e alega a nulidade da sentença, por ser condicional, violando o
art. 492, caput e parágrafo único, do CPC/2015. No mérito, sustenta a impossibilidade do
enquadramento das atividades exercidas pela parte autora como especiais, notadamente em
razão do uso de EPI e de ausência de laudo técnico contemporâneo.
A parte autora, por sua vez, afirma o exercício de atividades especiais também no(s) período(s)
de 28/04/1995 a 06/08/2013, pleiteando o seu reconhecimento e a concessão da aposentadoria
especial.
Sem contrarrazões pelas partes.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5034403-31.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: EDEMILSON MANFREDI, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
Advogado do(a) APELANTE: GUSTAVO DE SALVI CAMPELO - SP288255-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, EDEMILSON MANFREDI
Advogado do(a) APELADO: GUSTAVO DE SALVI CAMPELO - SP288255-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos de apelação.
Preliminarmente, verifico que a sentença julgou parcialmente procedente o pedido para
reconhecer como laborados em atividades especiais os períodos de 22/12/1986 a 11/08/1987,
12/08/1987 a 19/03/1990 e 20/03/1990 a 27/04/1995, condicionando, contudo, a concessão da
aposentadoria por tempo de serviço integral ou proporcional ao preenchimento dos demais
requisitos legais, os quais, saliente-se, não foram apreciados pela sentença.
Dessa forma, acolho a preliminar arguida pelo INSS para reconhecer a ocorrência de julgamento
condicional a ensejar a nulidade da sentença, diante da afronta ao artigo 492 do Código de
Processo Civil/2015.
Entretanto, estando o processo em condições de imediato julgamento, aplico a regra do artigo
1.013, § 3º, III, da norma processual e passo ao exame do mérito.
Aposentadoria Especial
A aposentadoria por tempo de serviço especial teve assento primeiro no artigo 31 da Lei nº 3.807,
de 26 de agosto de 1960, Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS, que estabeleceu que seria
concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinquenta) anos de idade e 15 (quinze)
anos de contribuições, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco)
anos, conforme a atividade profissional, em serviços que, para esse efeito, fossem considerados
penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo.
Prevê ainda, o mencionado diploma legal, no art. 162, o reconhecimento de atividade especial
prestada em data anterior à sua edição, na hipótese de seu cômputo ser mais benéfico ao
segurado.
Como assentado pelas Cortes Superiores "tal hipótese, apesar de similar, não se confunde com a
questão da legislação aplicável ao caso de concessão de aposentadoria, tampouco com aquela
que diz respeito à possibilidade de aplicação retroativa da lei nova que estabeleça restrição ao
cômputo do tempo de serviço. (...) Interpretação diversa levaria à conclusão de que o segurado,
sujeito a condições insalubres de trabalho, só teria direito à aposentadoria especial após 15, 20 e
25 anos de trabalho exercida depois da Lei nº 3.807/60, desconsiderando, portanto, todo o
período de labor, também exercido em tal situação, porém em data anterior à lei de regência" (Ag
Rg no REsp nº 1015694, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza Assis de Moura, DJe 01/02/2011)
Essa norma foi expressamente revogada pela Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973, que passou a
discipliná-la no artigo 9º, alterando, em efeitos práticos, apenas o período de carência de 15
(quinze) anos para 5 (cinco) anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
Sobreveio, então, o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, reclassificando as atividades
profissionais segundo os agentes nocivos e os grupos profissionais tidos por perigosos,
insalubres ou penosos, com os respectivos tempos mínimos de trabalho.
Importante ressaltar que os Decretos nºs. 53.831/64 e 83.080/79 tiveram vigências simultâneas,
de modo que, conforme reiteradamente decidido pelo C. STJ, havendo colisão entre as
mencionadas normas, prevalece a mais favorável ao segurado. (REsp nº 412351, 5ª Turma, Rel.
Min. Laurita Vaz, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, pág. 355).
As atividades insalubres previstas nas aludidas normas são meramente exemplificativas, podendo
outras funções ser assim reconhecidas, desde que haja similitude em relação àquelas legalmente
estatuídas ou, ainda, mediante laudo técnico-pericial demonstrativo da nocividade da ocupação
exercida. Nesse sentido, o verbete 198 da Súmula do TFR.
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, a matéria passou a ser prevista no inciso II
do artigo 202 e disciplinada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação original previa que o
benefício de aposentadoria especial seria devido ao segurado que, após cumprir a carência
exigida, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a
atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade
física, restando assegurada, ainda, a conversão do período trabalhado no exercício de atividades
danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em seguida, foi editada a Lei nº 9.032/95, alterando o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, dispondo que
a partir desse momento não basta mais o mero enquadramento da atividade exercida pelo
segurado na categoria profissional considerada especial, passando a ser exigida a demonstração
da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, que poderá
se dar por meio da apresentação de informativos e formulários, tais como o SB-40 ou o DSS-
8030.
Posteriormente, com a edição do Decreto n.º 2.172, de 05/03/1997, que estabeleceu requisitos
mais rigorosos para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos,
passou-se a exigir-se a apresentação de laudo técnico para a caracterização da condição
especial da atividade exercida. Todavia, por se tratar de matéria reservada à lei, tal exigência
apenas tem eficácia a partir da edição da Lei n.º 9.528, de 10/12/1997.
Cumpre observar que a Lei nº 9528/97 também passou a aceitar o Perfil Profissiográfico
Previdenciário - PPP, documento que busca retratar as características de cada emprego do
segurado, de forma a facilitar a futura concessão de aposentadoria especial. Assim, identificado
no documento o perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, é possível a sua
utilização para comprovação da atividade especial em substituição ao laudo pericial.
Ressalto que no tocante ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e à
forma da sua demonstração, deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do
trabalho, conforme jurisprudência pacificada da matéria (STJ - Pet 9.194/PR, Rel. Ministro
ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
A extemporaneidade do documento comprobatório das condições especiais de trabalho não
prejudica o seu reconhecimento como tal, "pois a situação em época remota era pior ou ao
menos igual a constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do
ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica." (Des. Fed. Fausto De Sanctis,
AC nº 2012.61.04.004291-4, j. 07/05/2014)
Especificamente em relação ao ruído, o Decreto nº 53.831/64 considerava insalubre o labor
desempenhado com exposição permanente a ruído acima de 80 dB; já o Decreto nº 83.080/79
fixava a pressão sonora em 90 dB. Na medida em que as normas tiveram vigência simultânea,
prevalece disposição mais favorável ao segurado (80 dB).
Com a edição do Decreto nº 2.172/97, a intensidade de ruído considerada para fins de
reconhecimento de insalubridade foi elevada para 90 dB, mas, em 2003, essa medida foi reduzida
para 85 dB, por meio do Decreto nº 4.882, de 18 de novembro de 2003.
Até 09 de outubro de 2013, os Tribunais adotavam o enunciado pela Súmula nº 32 da TNU.
Contudo, esta Súmula foi cancelada em decorrência do julgamento da PET 9059 pelo Superior
Tribunal de Justiça (Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJe
09/09/2013) cujo entendimento foi sufragado no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Ministro
Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), sob a sistemática dos
recursos repetitivos.
Em relação ao agente ruído, vigora o princípio do tempus regit actum. Considera-se especial a
atividade desenvolvida acima do limite de 80dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº
2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90dB
até 18/11/2003, quando foi editado o Decreto nº 4882/2003. A partir de 19/11/2003 o limite
passou a ser de 85 dB.
Saliente-se que a especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento
legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou
formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico
previdenciário (a partir de 11/12/97).
É corrente em nossos tribunais a tese de que sempre se exigiu laudo técnico para comprovar a
exposição do trabalhador aos agentes físicos ruído e calor em níveis superiores aos limites
máximos de tolerância. Entretanto, no tocante às atividades profissionais exercidas até 10/12/97 –
quando ainda não havia a exigência legal de laudo técnico –, essa afirmação deve ser
compreendida, não na literalidade, mas no sentido de ser necessário o atesto efetivo e seguro
dos níveis de intensidade dos agentes nocivos a que o trabalhador esteve exposto durante sua
jornada laboral.
Logo, para as atividades profissionais exercidas até 10/12/97, é suficiente que os documentos
apresentados façam expressa menção aos níveis de intensidade dos agentes nocivos.
Uso de equipamento de proteção individual - EPI, como fator de descaracterização do tempo de
serviço especial
A questão foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do ARE nº 664335, da
relatoria do E. Ministro Luiz Fux, com reconhecimento de repercussão geral, na data de
04.12.2014, em que restou decidido que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva
exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente
capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional ao reconhecimento das
atividades especiais.
Restou assentado também que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico
Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não
descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
O fato de a empresa fornecer equipamento de proteção individual - EPI para neutralização dos
agentes agressivos não afasta, por si só, a contagem do tempo especial, pois cada caso deve ser
examinado em suas peculiaridades, comprovando-se a real efetividade do aparelho e o uso
permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. Precedentes do Superior Tribunal de
Justiça (REsp 1428183/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 25/02/2014,
DJe 06/03/2014).
Ainda, conforme a jurisprudência citada, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído,
desde que em níveis acima dos limites legais, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de
Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até
no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao
organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas.
Caso concreto - elementos probatórios
De início, verifica-se que a controvérsia cinge-se à especialidade das atividades trabalhadas no(s)
período(s) de 22/12/86 a 11/08/87, 12/08/87 a 19/03/90, 11/01/89 a 11/10/03, 08/11/03 a
12/03/10, 21/06/10 a 01/12/10 e 30/05/11 a 06/08/13.
Neste contexto, do exame dos autos verifico que o(s) período(s) de 22/12/86 a 11/08/87, 12/08/87
a 19/03/90 e 11/01/89 a 28/04/95, laborados no cargo de bioquímico, conforme anotações na
CTPS (ID 4982868/2) devem ser reconhecidos como especiais, por enquadrarem-se no código
2.1.3, do Decreto nº 83.080.
No pertinente aos períodos de 29/04/95 a 11/10/03, 08/11/03 a 12/03/10, 21/06/10 a 01/12/10 e
30/05/11 a 06/08/13, laborados nos cargos de bioquímico, de encarregado técnico de laboratório
e de analista de laboratório, devem ser considerados especiais, porquanto restou comprovada a
exposição a agentes biológicos (microorganismos), conforme os PPP ́s - Perfis Profissiográficos
Previdenciários (ID 4982868/23-32), enquadrando-se no código 1.3.2 do Decreto nº 53.831/64,
item 1.3.4 do Decreto nº 83.080/79 e item 3.0.1 do Decreto n° 2.172/97.
Embora o PPP aponte a eficácia dos equipamentos de proteção individual, tal informação não
obsta a efetiva exposição aos agentes nocivos, notadamente os infecciosos, que deve ser
interpretada como potencialmente insalubre e perigosa, considerando o risco de perfuração do
material protetor no atendimento ambulatorial/hemocentro (Resp 1470537 - RS (2014/0188441-
2).
Ademais, observo que a exigência legal de comprovação de exposição a agente insalubre de
forma permanente, introduzida pela Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao § 3º do artigo 57
da Lei nº 8.213, deve ser interpretada como o labor continuado, não eventual ou intermitente, de
modo que não significa a exposição ininterrupta a agente insalubre durante toda a jornada de
trabalho.
Dessa forma, a soma do(s) período(s) especial(ais) aqui reconhecido(s) totaliza mais de 25 anos
de tempo de serviço especial, o que autoriza a concessão da aposentadoria especial, nos termos
do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (08/10/13),
uma vez que a parte autora demonstrou que já havia preenchido os requisitos necessários à
concessão do benefício desde então.
Ademais, enquanto pendente de análise, pelo E. STF, do § 8º do art. 57 da Lei nº 8.213/91 no RE
791961/PR de relatoria do Ministro Dias Toffoli, entendo que não há como se reconhecer sua
inconstitucionalidade. Trata-se de norma de natureza protetiva ao trabalhador, que permite que o
período de trabalho para a aposentadoria seja menor para não obrigar aquele que trabalha em
condições insalubres ou perigosas a exercê-la por tanto tempo quanto aquele que labora em
condições normais. Ora, se o objetivo da proteção é permitir aposentadoria precoce,
reconhecendo a penosidade do trabalho e um discrimen em relação ao trabalho comum, não faria
sentido permitir que, em optando por se aposentar nessas condições, o trabalhador que exerceu
a faculdade de livrar-se da penosidade viesse a optar por permanecer laborando em condições
especiais. A ratio da norma específica tornar-se-ia vazia. É certo que o legislador poderia ter
optado por dispor de forma diferente sobre o tema, mas o fato de não tê-lo feito não torna a
norma inconstitucional.
Por outro lado, tendo em vista que no presente caso ficou provada que a recusa da autarquia na
concessão do benefício no âmbito administrativo se deu de forma injustificada, mantenho o termo
inicial do benefício na data do requerimento administrativo, sendo devidos os valores em atraso a
partir de tal data.
As parcelas vencidas deverão ser corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos
índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal
vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a
aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário
do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em
20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux. Anoto que os embargos de declaração opostos perante o
STF que objetivavam a modulação dos efeitos da decisão supra, para fins de atribuição de
eficácia prospectiva, foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019.
Condeno o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS ao pagamento de honorários de advogado
fixados em 10% do valor da condenação, consoante o entendimento desta Turma e o disposto §§
2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, considerando as parcelas vencidas até a
data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
O art. 4º, I, da Lei 9.289/96, que dispõe sobre as custas devidas à União, estabelece que as
autarquias federais são isentas do pagamento de custas processuais nos processos em trâmite
perante a Justiça Federal.
Entretanto, consoante disposto no § 1º do artigo 1º da mencionada lei, “rege-se pela legislação
estadual respectiva a cobrança de custas nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no
exercício da jurisdição federal.”. Conclui-se, assim, que a isenção de custas nas causas
processadas na Justiça Estadual depende de lei local que a preveja.
Nesse passo, verifico que no que se refere às ações que tramitam perante a Justiça Estadual de
São Paulo, como in casu, a isenção de custas processuais para o Instituto Nacional do Seguro
Social - INSS está assegurada nas Leis Estaduais nºs 4.952/85 e 11.608/03.
Ante o exposto, acolho a preliminar do INSS para, com fulcro no caput do artigo 492 do
CPC/2015, declarar nula a sentença e, de acordo com o seu artigo 1.013, § 3º, III, julgar
procedente o pedido formulado na inicial para determinar a concessão da aposentadoria especial,
a partir da DER, fixando os consectários legais nos termos explicitados na decisão e, no mérito,
julgo prejudicadas a apelação do INSS e a apelação da parte autora.
Por fim, considerando o caráter alimentar das prestações reclamadas e que os recursos aos
Tribunais Superiores não são dotados de efeito suspensivo (art. 995 CPC/2015), determino, com
apoio nos artigos 300 e 497 do CPC/2015, a imediata implantação do benefício de aposentadoria
especial, com data de início – DIB em 08/10/13 e renda mensal inicial - RMI a ser apurada pelo
Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.
Para tanto, expeça-se ofício àquele órgão, instruído com os documentos do segurado
EDEMILSON MANFREDI, necessários para o cumprimento da ordem.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. SENTENÇA CONDICIONAL. NULIDADE. ARTIGO 1.013, §3º,
III, DO CPC/2015. JULGAMENTO DO MÉRITO. APOSENTADORIA ESPECIAL.
COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. ENQUADRAMENTO PROFISSIONAL.
AGENTES BIOLÓGICOS. EXPOSIÇÃO PERMANENTE. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS.
DIB. VEDAÇÃO DO §8º DO ART. 57 DA LEI 8213/91. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA.
MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. CUSTAS.
JUSTIÇA ESTADUAL. TUTELA ANTECIPADA. IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO.
1. Preliminar acolhida. Sentença condicional. Nulidade na forma do caput do artigo 492 do
CPC/2015.
2. Condições de imediato julgamento. Aplicação da regra do inciso III do §3º do artigo 1.013 do
Código de Processo Civil/2015. Exame do mérito.
3. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o
reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua
demonstração.
4. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da
atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no
período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário (a
partir de 11/12/97).
5. As atividades de auxiliar de laboratório, técnico de laboratório, técnico em análises clínicas e
farmacêutico bioquímico devem ser reconhecidas como especiais a teor do código 2.1.3, do
Decreto nº 83.080.
6. Condição especial de trabalho configurada. Exposição habitual e permanente a agentes
biológicos (microorganismos), enquadrando-se no código 1.3.2 do Decreto nº 53.831/64, item
1.3.4 do Decreto nº 83.080/79 e item 3.0.1 do Decreto n° 2.172/97.
7. A exigência legal de comprovação de exposição a agente insalubre de forma permanente,
introduzida pela Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao § 3º do artigo 57 da Lei nº 8.213, deve
ser interpretada como o labor continuado, não eventual ou intermitente, de modo que não
significa a exposição ininterrupta a agente insalubre durante toda a jornada de trabalho.
8. A soma dos períodos redunda no total de mais de 25 anos de tempo de serviço especial, o que
autoriza a concessão da aposentadoria especial, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
9. Enquanto pendente de análise, pelo E. STF, o § 8º do art. 57 da Lei nº 8.213/91 no RE
791961/PR de relatoria do Ministro Dias Toffoli, não há como se reconhecer sua
inconstitucionalidade.
10. Provada que a recusa da autarquia na concessão do benefício no âmbito administrativo se
deu de forma injustificada, o termo inicial do benefício deve ser mantido na data do requerimento
administrativo.
11. DIB na data do requerimento administrativo.
12. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a
elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-
se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa
Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947,
tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
13. Honorários de advogado fixados em 10% do valor da condenação. Artigo 85, §§ 2º e 3º,
Código de Processo Civil/2015 e Súmula nº 111 do STJ.
14. A cobrança de custas nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da
jurisdição federal, rege-se pela legislação estadual. Art. 1º, §1º, da Lei 9.289/96.
15. As Leis Estaduais nºs 4.952/85 e 11.608/03 asseguram a isenção de custas processuais ao
Instituto Nacional do Seguro Social - INSS nas ações que tramitam perante a Justiça Estadual de
São Paulo.
16. Prestação de caráter alimentar. Implantação imediata do benefício. Tutela antecipada
concedida.
17. Preliminar do INSS acolhida. Sentença declarada nula. Pedido inicial procedente. No mérito,
apelação do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS e apelação da parte autora prejudicadas.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu acolher a preliminar para declarar a nulidade da sentença, julgar procedente
o pedido inicial, no mérito, julgar prejudicadas as apelações e determinar a implantação imediata
do benefício, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
