Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0014518-19.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
29/07/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 31/07/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. TRABALHADOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL
INSUFICIENTE. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO.
RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. CONJUNTO PROBATÓRIO
INSUFICIENTE. NÃO IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS.
1. São requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com
os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições, ressaltando-se
que o tempo de serviço prestado anteriormente à Emenda Constitucional 20/98 equivale a tempo
de contribuição, a teor do seu art. 4º.
2. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o
reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua
demonstração.
3. Insuficiente o conjunto probatório a demonstrar o exercício da atividade rural pelo período
pretendido pela parte autora.
4. Ausentes os requisitos, é indevido o benefício de aposentadoria por tempo de serviço, nos
termos do art. 201, §7º, I, da Constituição da República.
5. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na
sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015.
6. Apelação da parte autora não provida.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0014518-19.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ELSA APARECIDA DE ARAUJO SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: FABIANO SILVEIRA MACHADO - SP246103-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0014518-19.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ELSA APARECIDA DE ARAUJO SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: FABIANO SILVEIRA MACHADO - SP246103-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação ordinária em que se objetiva a concessão de aposentadoria por tempo de
serviço/contribuição, mediante o reconhecimento de período trabalhado em atividades rurais, sua
conversão em tempo comum e cômputo aos demais períodos de trabalho urbano ou a
aposentadoria por invalidez.
A sentença julgou procedente o pedido, determinando ao Instituto Nacional do Seguro Social -
INSS a concessão da aposentadoria por invalidez, a partir da data da citação, condenando-o, em
consequência, ao pagamento das parcelas em atraso, corrigidas monetariamente e acrescidas de
juros de mora, nos termos da Lei nº 6.899/1981, pelos índices previstos no Manual de Orientação
de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal. Condenou o réu, também, ao pagamento
de honorários de advogado, fixados em 15% (quinze por cento) do valor da condenação,
considerado como termo final desta a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do C. STJ.
Foi determinada, ainda, em sede de antecipação de tutela, a implantação imediata do benefício.
Apela a parte autora afirmando o exercício de atividades rurais no(s) período(s) mencionados na
inicial, pleiteando o seu reconhecimento, bem como a concessão da aposentadoria por tempo de
contribuição.
Sem contrarrazões, vieram os autos ao Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0014518-19.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ELSA APARECIDA DE ARAUJO SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: FABIANO SILVEIRA MACHADO - SP246103-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Aposentadoria por tempo de serviço/contribuição – requisitos
A aposentadoria por tempo de serviço, atualmente denominada aposentadoria por tempo de
contribuição, admitia a forma proporcional e a integral antes do advento da Emenda
Constitucional 20/98, fazendo jus à sua percepção aqueles que comprovem tempo de serviço (25
anos para a mulher e 30 anos para o homem na forma proporcional, 30 anos para a mulher e 35
anos para o homem na forma integral) desenvolvido totalmente sob a égide do ordenamento
anterior, respeitando-se, assim, o direito adquirido.
Aqueles segurados que já estavam no sistema e não preencheram o requisito temporal à época
da Emenda Constitucional 20 de 15 de dezembro de 1998, fazem jus à aposentadoria por tempo
de serviço proporcional desde que atendam às regras de transição expressas em seu art. 9º,
caso em que se conjugam o requisito etário (48 anos de idade para a mulher e 53 anos de idade
para o homem) e o requisito contributivo (pedágio de 40% de contribuições faltantes para
completar 25 anos, no caso da mulher e para completar 30 anos, no caso do homem).
Atualmente, são requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de
acordo com os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições (30
anos para a mulher e 35 anos para o homem), ressaltando-se que o tempo de serviço prestado
anteriormente à referida Emenda equivale a tempo de contribuição, a teor do art. 4º da Emenda
Constitucional 20/98.
Tempo de serviço rural anterior e posterior à Lei de Benefícios
A aposentadoria do trabalhador rural apresenta algumas especificidades, em razão sobretudo da
deficiência dos programas de seguridade voltados a essa categoria de trabalhadores no período
anterior à Constituição Federal de 1988 e do descumprimento da legislação trabalhista no campo.
Assim é que, no seu art. 55, §2º, a Lei 8.213/91 estabeleceu ser desnecessário o recolhimento de
contribuições previdenciárias pelo segurado especial ou trabalhador rural no período anterior à
vigência da Lei de Benefícios, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço rural, exceto para
efeito de carência. Neste sentido, já decidiu esta E. Corte: SÉTIMA TURMA, APELREEX
0005026-42.2014.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS,
julgado em 21/07/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:31/07/2014 e TERCEIRA SEÇÃO, AR 0037095-
93.2010.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NELSON BERNARDES, julgado em
28/11/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/12/2013.)
Já em relação ao tempo de serviço rural trabalhado a partir da competência de novembro de 1991
(art. 55, §2º, da Lei 8.213/91 c/c o art. 60, X, do Decreto 3.048/99), ausente o recolhimento das
contribuições, somente poderá ser aproveitado pelo segurado especial para obtenção dos
benefícios previstos no art. 39, I, da Lei 8.213/91.
A prova do exercício de atividade rural
Muito se discutiu acerca da previsão contida no art. 55, §3º, da Lei de Benefícios, segundo a qual
a comprovação do tempo de serviço exige início de prova material. O que a Lei nº 8.213/91 exige
é apenas o início de prova material e é esse igualmente o teor da Súmula 149 do Superior
Tribunal de Justiça.
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito
de obtenção do benefício previdenciário".
Exigir documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se quer
reconhecer equivaleria a erigir a prova documental como a única válida na espécie, com
desconsideração da prova testemunhal produzida, ultrapassando-se, em desfavor do segurado, a
exigência legal. Neste sentido, o C. STJ: AgRg no AREsp 547.042/SP, Rel. Ministro MAURO
CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014.
Tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido
de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
É pacífico o entendimento dos Tribunais, considerando as difíceis condições dos trabalhadores
rurais, admitir a extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou companheira,
bem como da filha solteira residente na casa paterna. (REsp 707.846/CE, Rel. Min. LAURITA
VAZ, Quinta Turma, DJ de 14/3/2005)
Idade mínima para o trabalho rural
Não se olvida que há jurisprudência no sentido de admitir-se o labor rural a partir dos 12 (doze)
anos de idade, por ser realidade comum no campo, segundo as regras ordinárias de experiência,
mormente se a prova testemunhal é robusta e reforçada por documentos que indicam a condição
de lavradores dos pais do segurado.
O raciocínio invocado em tais decisões é o de que a norma constitucional que veda o trabalho ao
menor de 16 anos visa à sua proteção, não podendo ser invocada para, ao contrário, negar-lhe
direitos. (RESP 200200855336, Min. Jorge Scartezzini, STJ - Quinta Turma, DJ 02/08/2004, p.
484.).
Tal ponderação não é isenta de questionamentos. De fato, emprestar efeitos jurídicos para
situação que envolve desrespeito a uma norma constitucional, ainda que para salvaguardar
direitos imediatos, não nos parece a solução mais adequada à proposta do constituinte - que
visava dar ampla e geral proteção às crianças e adolescentes, adotando a doutrina da proteção
integral, negando a possibilidade do trabalho infantil.
Não se trata, assim, de restringir direitos ao menor que trabalha, mas sim, de evitar que se
empreste efeitos jurídicos, para fins previdenciários, de trabalho realizado em desacordo com a
Constituição. Considero, desta forma, o ordenamento jurídico vigente à época em que o(a)
autor(a) alega ter iniciado o labor rural para admiti-lo ou não na contagem geral do tempo de
serviço, para o que faço as seguintes observações:
As Constituições Brasileiras de 1824 e 1891 não se referiram expressamente à criança e
adolescente tampouco ao trabalho infantil.
A Constituição de 1934 foi a primeira a tratar expressamente da proteção à infância e à juventude
e em seu artigo 121 consagrou, além de outros direitos mais favoráveis aos trabalhadores, a
proibição de qualquer trabalho para os menores de 14 anos; de trabalho noturno para os menores
de 16 anos; e de trabalho em indústrias insalubres para menores de 18 anos.
Por sua vez, a Constituição de 1937, repetiu a fórmula da proibição de qualquer trabalho para os
menores de 14 anos; de trabalho noturno para os menores de 16 anos e de trabalho em
indústrias insalubres para menores de 18 anos.
A Constituição de 1946 elevou a idade mínima para a execução de trabalho noturno de 16 para
18 anos, mantendo as demais proibições de qualquer trabalho para menores de 14 anos e em
indústrias insalubres para menores de 18 anos, além de proibir a diferença de salário para o
mesmo trabalho por motivo de idade.
A Constituição de 1967, embora tivesse mantido a proibição para o trabalho noturno e insalubre
para menores de 18 anos, reduziu de 14 para 12 anos a idade mínima para qualquer trabalho.
Por fim, a Constituição da República de 1988, proíbe o trabalho noturno, perigoso e insalubre
para os menores de 18 anos; e, inicialmente, de qualquer trabalho para menores de 14 anos,
como constava nas Constituições de 1934, 1937 e 1946. Todavia, com a Emenda Constitucional
20, de 1998, a idade mínima foi elevada para 16 anos, salvo na condição de aprendiz a partir de
14 anos.
Entretanto, em atenção ao entendimento consolidado nesta E. 7ª Turma, no sentido de considerar
as peculiaridades de um Brasil com elevado contingente populacional no meio rural antes da
década de 70, admito, para o cômputo geral do tempo de serviço, o trabalho rural desenvolvido
antes da Constituição de 1967, a partir dos 12 anos de idade. A partir da Constituição Federal de
1988, todavia, prevalece a idade nela estabelecida.
Caso concreto - elementos probatórios
Atividade rural
A parte autora, nascida em 31/05/1965, trouxe aos autos, para comprovar o exercício de atividade
rural:
- certidão de casamento celebrado em 12/11/1983, onde seu marido é qualificado como lavrador
(ID 87769738, fls. 15).
É pacífico o entendimento dos Tribunais, considerando as difíceis condições dos trabalhadores
rurais, admitir a extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou companheira.
Assim, a certidão de casamento apresentada poderia servir, a princípio, como início de prova
material.
No entanto, não há nos autos nenhum documento que comprove que a autora continuou a
trabalhar na lavoura após 1983.
Entendo que não é razoável que longos períodos de suposto trabalho rural sejam comprovados
apenas com a certidão de casamento da autora.
Além disso, não foi produzida prova testemunhal apta a corroborar o trabalho desenvolvido pela
autora no labor rural.
Portanto, o conjunto probatório não foi suficiente para comprovar que a autora tenha efetivamente
trabalhado como rurícola por todo o período pleiteado.
Desta forma, pode ser reconhecido o trabalho rural desenvolvido pelo autor informalmente desde
20/09/1975 a 31/05/1980 e de 04/10/1983 a 31/12/1983, exceto para efeito de carência.
Assim, o período anotado na CTPS acrescido do tempo rural declarado, não perfaz o tempo
suficiente, nem a carência necessária à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de
serviço proporcional e tampouco a integral, motivo pelo qual deve ser mantida a sentença que
concedeu ao autor a aposentadoria por invalidez.
Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do
CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de
advogado arbitrados na sentença em 2%.
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora e, com fulcro no §11º do artigo 85 do
Código de Processo Civil, majoro os honorários de advogado em 2% sobre o valor arbitrado na
sentença.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. TRABALHADOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL
INSUFICIENTE. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO.
RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. CONJUNTO PROBATÓRIO
INSUFICIENTE. NÃO IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS.
1. São requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com
os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições, ressaltando-se
que o tempo de serviço prestado anteriormente à Emenda Constitucional 20/98 equivale a tempo
de contribuição, a teor do seu art. 4º.
2. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o
reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua
demonstração.
3. Insuficiente o conjunto probatório a demonstrar o exercício da atividade rural pelo período
pretendido pela parte autora.
4. Ausentes os requisitos, é indevido o benefício de aposentadoria por tempo de serviço, nos
termos do art. 201, §7º, I, da Constituição da República.
5. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na
sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015.
6. Apelação da parte autora não provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora e, com fulcro no §11º do
artigo 85 do Código de Processo Civil, majorar os honorários de advogado em 2% sobre o valor
arbitrado na sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
